O Pão-Nosso de crianças cegas

É o meu rito dominical: nas manhãs do canal FRANCE 2, saborear a missa católica sem esquecer algumas amostras das cerimónias do Islão, Protestantismo, Judaísmo e Budismo, de que procuro tirar o maior proveito.

Todas as celebrações a que assisti foram ao ar livre, por vezes dirigidas por um bispo ou por mais do que um sacerdote. O terreno ocupado parece pertencer a mosteiros, capelas ou igrejas seculares e situadas de acordo com os melhores princípios de beleza e valorizando o interesse histórico.

A missa do XIX domingo do TC (8 de Agosto de 2021), transmitida ao ar livre, seguindo o costume, era enaltecida pelo feliz aproveitamento da circundante paisagem, harmonizante do corpo e espírito. Era dedicada e organizada pela instituição Enfants aveugles. As crianças davam a mão a adultos que as conduziam ao altar. E a 2ª leitura foi lida por uma senhora cega, em texto Braille. Toda a gente à volta, em cadeiras de exterior ou em pé ou ainda no mais simples ponto de apoio fornecido pela natureza, manifestava o agrado de ter decidido estar presente, em convívio alegre e enriquecedor de autêntica qualidade de vida.

É tão bom encontrar cerimónias católicas que nos levam com alegria e naturalidade a um especial encontro com o Senhor!

A homilia, a cargo de um dominicano, foi exemplo de partilha espiritual, em voz clara e bem-disposta, como quem se dirige naturalmente a cada participante do «grupo». Certamente que não agradou totalmente a todos – nem a mim, que reajo negativamente a algumas expressões de pura especulação teológica, apoiada em nebulosa filosofia e até mitologização do «fenómeno» Jesus Cristo: expressões secularmente e acriticamente enraizadas.

Felizmente, já encontramos teólogos capazes de enfrentar antigas maneiras de representar a vivência mais ou menos popular de alguns artigos catequéticos, hoje sem significado, ou até ridículos. Lembremos que o Papa Francisco alertou para que a «doutrina» católica apenas testemunha modos de pensar prevalecentes numa dada época – e que a imprescindível mudança é um problema tão fundamental como difícil de fundamentar e gerir.

Tomei nota, ao meu estilo, de algumas ideias da homilia:

Precisamos de pão tanto mais quanto mais cansados estivermos. E sobretudo quando não podemos mais. (1ª leitura).

Mas quando estamos cansados, tristes, enfermos ou somos deficientes, vê-se bem que o «pão mais saboroso» é sem dúvida alguma a dedicação (= oração posta em prática) de cada um de nós ao bem-estar, saúde e sobretudo alegria de viver de todos os outros. Não será verdade que uma pessoa cega, de modo especial uma criança cega, experimenta mais vida, mais alegria, mais coragem, mais amor e mais sentido da existência… quando à sua volta sente todos esses sentimentos agradavelmente manifestos?

Só assim podemos estar confiantes de que não contristamos o Espírito de Deus: fazendo com que a nossa vida contribua para fortalecer os alicerces da «vida do mundo».

Deixo aqui o contacto das cerimónias católicas (pois não se limita à missa): Le jour du Seigneur; 45bis, Rue de la Glacière, 75013 Paris; courrier@lejourduseigneur.com.

Aveiro, 11-08-2021

 

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