Raras vezes procuro um cantinho escondido. Prefiro uma vista aberta
para a natureza ou qualquer cenário de bom gosto. Mas sem nunca
deixar de sentir à minha volta a dança da vida.
Agora há mais espaço e mais mesas sem ninguém. E o ser humano gosta
do calor do grupo, seja para melhor sentir a alegria ou a tristeza,
o carinho e a protecção.
Pois é, temos que nos precaver para aquilo de que não gostamos.
Porém, o mais importante, é procurar detectar as causas prováveis. E
sem esquecer que uma lei da psicologia animal é a do aumento de
violência e doenças quando a densidade de população excede um certo
nível. Quem esperava o Covid 19? Talvez alguém… e convém não fechar
os olhos por comodismo. Mas voltemos aos cafés e restaurantes da
minha meditação:
Enfrentaram graves problemas de subsistência e sobrevivência. Muitos
deles, graças a Deus, não se limitaram a empilhar mesas e cadeiras a
um canto: transformaram o novo espaço, juntando o máximo de
funcionalidade com um novo tipo de bem-estar, de proximidade não
invasora e que até por isso permite relações mais seguras e
autênticas. E sem o ruído e ajuntamento que podemos encontrar
noutros locais. Com beleza simples e, se tal parecer vantajoso,
música variada apenas como painel de fundo.
Cafés e restaurantes que geram clima de simpatia – são notoriamente
os que atraem mais clientes. E que transmitem o ambiente próprio de
uma Casa, onde quem é Chefe vela por que tudo corra bem. Para tanto,
tem que lhe ser reconhecida verdadeira autoridade, que lhe permite
intervir com firme delicadeza.
E como às vezes gosto de brincar aos poetas, termino com uma recente
brincadeira adaptada aos tempos deste Natal:
Café do Natal
Oiço dizer
Que os portugueses passam no café
Metade do seu dia
Na preguiça, má língua, inveja até.
Será de crer?
A
crítica parece em demasia,
Embora diga o povo
Que «não há fumo sem fogo».
De resto, toda a gente sabe
Qual é a carapuça que lhe cabe.
Todavia,
Quanta sabedoria
Nesses minutos de descontracção
E
amizade!
(Podem mesmo proteger a qualidade
De muita profissão).
E, cá entre nós, quem sabe até
Se o café
Tomado em grupo ou mesmo sozinho,
É
afinal
Um pedacinho
De Natal?
Quando ensaio um sorriso,
Um «faz favor», «boa tarde» ou «obrigado»
(Quase esquecendo como estou cansado),
Quando tenho a palavra que alegra
E
uma atenção para quem quer que seja;
E
quando quem nos veja
Sinta aquela esperança que não quebra
(Mas que sim pode quebrar
A
redoma em que o mal de hoje nos quer fechar);
Quando nada me impede, afinal,
De parecer e ser
Amigo de quem vier...
–
O meu café foi Dia de Natal.
Aveiro, 9 Dezembro 2020 |