Perpassam as sombras, mitos e quimeras
Nas tristes ruínas onde geme o vento...
Do velho castelo, de remotas eras,
Esvoaçam lendas pelo pensamento,
Erram soluçantes as mouras zelosas,
Pelo ardente mouro, o formoso Almansor
Enquanto ele sonha, num leito de rosas,
Com meigas donzelas perdidas de amor.
As virgens descansam, nos seus ataúdes,
Num sono profundo de fatais augúrios,
Enquanto suspiram tristes alaúdes,
Lamentos longínquos em vagos murmúrios.
E o sino plangente como que se exalta,
Triste como a noite, num chôro sentido
Vai marcando as horas do tempo que falta,
Para mais um século cair no olvido.
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Dum sonho encantado, num dia desperto,
Numa manhãzinha de leda poesia,
Eu tinha a minha alma como um céu aberto,
E o sino repica nesse alegre dia.
Ternas repercutem no meu coração
As notas festivas do austero sino,
Como vozes santas, na vasta amplidão,
Anunciando, ledas, um feliz destino.
Sino da minha alma, Sino do Mosteiro,
A minha alegria como que a sentiste!
Quando o sol alegra, sabes ser fagueiro;
Quando a gente chora, como tu és triste!...
Sino do Mosteiro, de saudade infinda,
Sino do Mosteiro, de intensa poesia!
Que por mim tu chores, tristemente ainda,
Quando venha a morte buscar-me algum dia.
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Esvaem-se os tempos, mas nunca se esquecem
Esses que trouxeram doces emoções;
Dias enlevados sempre reflorescem
Das tépidas cinzas das recordações.
Nunca mais te esqueço, terra minha amada
Nem às tuas noites de sonho e luar!
Vejo-te em minha alma como uma alvorada,
Porque no meu peito elevo-te um altar.
Abençoada sejas, terrinha querida,
Berço do meu filho, que ali me nasceu,
Adorado berço, que é da minha vida,
Porque a minha vida é a do filho meu!
Luthegarda de Caires.
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