A meu saudoso Pai, G. de Vasconcelos
Abreu
DESDE criança que tive sempre certa
predilecção pelo Egipto, aonde nunca fui, mas aonde a fantasia me
transporta muita vez.
Toda a arte egípcia, seja qual for o
modo porque se manifeste, prende-me deveras a atenção, talvez com
maior interesse do que a arte sem especializar nacionalidade, nem
época.
Impõe-se-me sempre o Egipto pela
arquitectura, pelas ideias religiosas e pela antiguidade da sua
extraordinária civilização – o maior mistério da História –
extraordinária no mais remoto passado que lhe podemos sondar.
Nos monumentos egípcios, pirâmides e
outras fórmulas de túmulos, colunas, ruínas arquitectónicas de
qualquer espécie, lêem-se em hieróglifos, documentos de usos,
costumes, práticas civis, práticas religiosas de um povo, que na
mais remota antiguidade foi educador de povos, de cujas crenças
fizemos as nossas crenças e ainda daquele povo de cuja linguagem
fizemos a nossa linguagem: do Egipto nos vieram pelos fenícios e
pelos gregos as letras romanas da nossa escrita, lendas, tradições,
leis religiosas, leis civis, embora indirectamente, e até
iconolatria de assunto exclusivamente egípcio.
De documentos arquitectónicos, dos
túmulos, das inscrições e dos papiros, alguns de milhares de anos
antes da nossa era, e do testemunho de autores clássicos se tira o
conhecimento que temos dos instrumentos musicais do Egipto, nomes e
formas deles, circunstâncias em que se empregavam. Felizmente alguns
exemplares possuímos em museus, pelos quais podemos ratificar e
melhorar sempre a conjectura em que ficaríamos pela imagem que nos
dão os documentos indirectos.
Terá sido o Egipto o berço da arte
musical?
Não se pode nem afirmar, nem negar. Em
absoluto é claro que o não foi: a música é exteriorização do
sentimento humano, e tal sentimento e tal exteriorização é do homem,
qualquer que seja a raça de que provenha, o lugar a que esteja
adstrito, e até em grau inferior de cultura social.
Mas a música, arte cultivada pelos
/
431 / povos que mais convergiram para o litoral mediterrâneo,
naquela parte oriental dele, onde desde remota antiguidade esteve o
foco da civilização do Mundo, quem a trouxe à vida?
Também não o sabemos. A Bíblia diz-nos
que os descendentes de Caim foram os primeiros a praticar a arte
musical, e que Jubal, filho de Adá, foi o pai dos que tocam
instrumentos de corda e instrumentos de foles. Entre os
cartagineses, Jubal filho de Adá (a beleza) é o inventor da
música.
No Egipto a tradição religiosa diz-nos
que a invenção da música e dos instrumentos de música, e a invenção
da dança são obra de três divindades. Tot (a que por vezes à maneira
grega se chama Hermes), Osíris e Maneros. Hoje sabe-se que Maneros
não era divindade nenhuma e que Heródoto(1) e Pausânias(2) tinham
acertado afirmando que era o nome de um canto lúgubre, qual o de
Lino na Grécia.
Além dos dois deuses Tot e Osíris
tinham os Egípcios mais a deusa da música e da beleza, Ator ou Hator,
cujo templo era afamado em Têntira, a cidade do Alto Egipto, hoje
chamada, por nome derivado daquele, Denderah, e Bés, o horrendo
marido de Hator, disforme de beiços e feição e em todo o corpo:
anão, bojudo e cambaio; adorado porém, mais popularmente do que
qualquer outra divindade, no campo, na cidade, de sul a norte, em
toda a parte sem templo, nem lugar exclusivo, mas no interior das
casas, no seio das famílias, em todo o Egipto. Na XII dinastia a
popularidade do deus Bés era absoluta, e continuou a manter-se em
certo grau de grande preferência até à época romana: foi então que a
arquitectura elevou o deus Bés à dignidade de o representar por cima
das colunas do templo de Mameisi em Denderah(3).
Das quatro divindades da música, Tot,
Osíris, Hator, Bés, devemos por certo excluir Osíris. Os egiptólogos
em geral assim o fazem, porque Osíris era uma divindade do reino dos
mortos e nunca o seu nome foi encontrado como deus da música, antes
pelo contrário, sabemos que no culto de Osíris não se admitia
música. O motivo de se dizer que Osíris era padroeiro da música
estava em que os gregos confundiam Osíris com Baco, o deus, na
mitologia grega, da alegria, da gárrula ebriedade, da graça faceta e
da dança que não observa compasso, nem decoro. Talvez devamos ainda
excluir, se não em absoluto, de certo modo porém o deus Bés. Este
era, como o deus Marte, marido de Vénus, mais deus da guerra do que
deus propriamente da música. Teve este atributo por motivo da música
guerreira e por ser o marido de Hator.
Ficam pois as divindades da música, no
Egipto, propriamente Tot e Hator, e Tot considerado como inventor da
música, da fala e da escrita, era grande sabedor, matemático,
astrónomo e médico.
A principal localidade em que se
estudava a arte musical era Têntira (Denderah). Dali saíam para
outras partes os melhores músicos e as mais graciosas bailadeiras
(dançarinas e cantoras).
*
Da música no Egipto pouco se pode
afirmar em consciência, porque os Egípcios não nos legaram música
escrita, se alguma vez a escreveram.
Em tantos milhares de representações
feitas nos túmulos nota-se que nenhum músico tem exemplar por que se
guie, em que esteja escrita a parte que ele executa; e por essas
mesmas representações se vê que a música ocupou lugar importante no
culto religioso, nas cerimónias fúnebres, em festas reais, em festas
particulares, em íntimas reuniões e em festas públicas.
Teriam eles por certo manifestado
vocação musical, que poderíamos hoje apreciar, se as conveniências
sociais e muito principalmente os preceitos religiosos não
imperassem contra as expansões artístico-musicais; não era a
religião que impedia o culto da música, mas sim os sacerdotes, que a
queriam como propriedade exclusiva; foram eles os maiores cultores
da música no Egipto: todos os templos tinham orquestra.
A música aprendia-se de ouvido; nem
mesmo os melhores intérpretes tinham ideia de harmonia; aprendiam
pela prática da execução, transmitiam a composição musical pela
passagem desta ou daquela inspiração ouvida e de ouvido executada;
transformavam-se lentamente as músicas, porque o ouvido do egípcio
devia ter sido muito apurado e seguro a calcularmos pelo que se
conhece dos indígenas
/ 432 / actuais. Dava-se muito merecimento ao artista-compositor; se a sua inspiração encontrava bom acolhimento,
era chamado a diferentes lugares onde se celebravam festas; com ele
ia o bando que dirigia; a obra era apreciada e a execução, para
melhor o artista, era remunerada com largueza.
Podemos concluir das representações
que existem, que as músicas eram apropriadas ao fim a que se
destinavam; era vocal e instrumental a música religiosa; a
calcularmos pelos cantos actuais e pelas relações indirectas que
possuímos, o carácter devia ter sido acentuadamente triste: a música
era executada por sacerdotes.
Em enterros, quer de pessoas reais,
quer de pessoas gradas, eram as músicas plangentes e doloridas
acompanhadas pelo som monótono do tamboril, vozes clamorosas de
carpideiras, que ao mesmo tempo que elogiavam o morto o pranteavam
em altos gritos, e se iam cobrindo com a poeira do caminho.
Outro género de música havia
completamente diferente; não tinha a tristeza, a unção, o lamento
acentuado; era alegre e animado para a dança, ou sereno e amoroso na
poesia lírica, de sentimento e paixão para desafogo de alma.
Os egípcios ricos davam grandes
festas, e um dos principais atractivos nestas festas era a música e
a dança; tinham audições de solos de teorba ou mandura,
espécie de guitarra, acompanhados de canto; tinham quartetos,
quintetos de diversos instrumentos; coros de homens acompanhados de
harpas; organizavam verdadeiros concertos. Durante as
refeições também tinham música e dança, em que empregavam harpas,
tamboris, flautas e duplas flautas; nos actos mais
íntimos também havia música, pois que o tempo que uma dama egípcia
levava a vestir-se e a toucar-se era preenchido com melodias; há uma
pintura em que ao lado da figura de mulher amamentando uma criança
se vê outra a tocar guitarra, e mais uma que parece cantar e bater o
ritmo com as mãos; leva isto a concluir-se que a música entrava nas
mais íntimas ocupações.
Nas habitações reais os Faraós tinham
música vocal e instrumental, para entretenimento próprio e para o
culto religioso, e um funcionário do Estado, especialmente,
encarregado de superintender neste serviço, a quem conferiam o
título de intendente do canto e recreio do rei, como diz
Chabas, e ao qual podemos comparar o fonasco grego e o
preceptor romano.
Havia escravos expressamente educados
na música vocal e instrumental, e alguns em tão grande conta eram
tidos, que só por altos preços se compravam.
Em todo o género de música, quer
religiosa, quer profana, está provado que se marcava o ritmo
batendo-o com as mãos, e é isto tão constante que por certo devia de
ser rigoroso.
A primeira ideia que há quando se
pensa na música do antigo Egipto é que naquele país tão guerreiro
devia existir a banda militar e música exclusiva, a música Bés. A
banda militar parece ter existido; em muitos monumentos vêem-se
cenas militares, grupos de músicos militares, tocando trombetas,
tamboris e crótalos.
Quando o Egipto estava sob o domínio
grego, Ptolomeu Filadelfo deu uma festa, na qual figuravam dois
grupos de músicos extremamente numerosos; compunha-se um de 600
sátiros cantando ao som de flautas canções báquicas; o outro era
formado por 300 coristas, 600 músicos, 300 guitarristas, ao todo
1.800 figuras!
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
.
Apesar da acentuada predilecção que os
egípcios tinham pela música, é para admirar a pouca importância que
socialmente davam aos músicos; mas tinham um motivo: atribuindo-se a
música a divindades, os sacerdotes não a queriam vulgarizada, mas
sim exclusivo seu, como se fora um dom que só eles possuíssem e por
tal motivo eram contra toda a música profana, de forma que muito
dificilmente a aristocracia egípcia se dava ao estudo da música, só
os menos crentes, menos submissos, passavam por cima destes
preconceitos.
A classe que se dava ao cultivo da
música profana era posta a par da dos trabalhadores mecânicos; aos
músicos de profissão era-lhes interdito ocuparem lugares públicos e
os seus descendentes só podiam exercer o mister dos antepassados; de
forma que muitos deles não era por gosto, nem intuição musical que
aprendiam este ou aquele instrumento; se o pai era cantor tinha o
filho de o ser, embora fosse afónico; se era flautista tinha de
tocar flauta, embora os pulmões não lhe dessem ar suficiente para
isso; teria que ser harpista mesmo que fosse aleijado das mãos!…
Alguns autores há que não aceitam este parecer, mas não apresentam
factos que o contradigam.
/ 433 /
A par disto havia músicos talentosos,
que tinham inspirações e boas disposições físicas para exercerem a
profissão de artista-músico.
Só depois da conquista do Egipto por
Alexandre Magno é que a música ali se começou a expandir. Os gregos
espalharam um novo género de música, e os egípcios extasiados deram
largas às suas expansões e ao talento musical, que em nada era
inferior ao dos gregos. Só a partir de então para cá houve no Egipto
o que em linguagem de hoje chamamos «músicos-curiosos».
*
* *
OS INSTRUMENTOS
Os instrumentos atestam que os
progressos da música nesta época eram consideráveis; pois só ao cabo
de muito trabalho, de muita prática e à força de muita inteligência
se podia chegar a construção tão perfeita dos instrumentos, que eram
bastantes e de várias formas.
Não me alongarei nesta descrição, como
já o não fiz no que disse da música, porque se escrevesse como
merece tal assunto, não podia ser num breve artigo.
São Tot e Osíris os principais
inventores da música e dos instrumentos no Egipto, segundo a
tradição.
Os instrumentos são: de corda;
de sopro, de pancada.
Instrumentos de corda
LIRA
Tot inventou a lira de 3 cordas,
relacionadas mitologicamente com as 3 estações do ano, cada corda de
som diferente: som médio referido à primavera, som agudo ao
estio, som grave ao inverno.
Há duas fábulas relativas à invenção
da lira; uma diz que «Tot tirou os nervos a Tifão para fazer as
cordas», outra que «o Nilo ao recolher ao leito, depois da cheia,
deixara as margens juncadas de cadáveres de diversos animais. Tot
(que os gregos compararam a Hermes) ao passar por aquelas planícies
ia examinando os esqueletos; apanhou uma tartaruga que o sol já
havia secado, pelo que ficara apenas com três fibras intestinais
presas a um e outro lado da caixa. Tot apanhou-a e começou a
querertirar as fibras, quando ao puxar sentiu um som melodioso que
lhe agradou; repetiu o movimento e sempre o mesmo som; experimentou
as outras fibras resultou-lhe som diferente. Levou a concha,
estudou-a e fez a lira de 3 cordas.»
Variava este instrumento muito de
feitio e número de cordas.
As liras eram geralmente de madeira,
ornados os topos de cada braço por cabeças de animais, como cavalos,
gazelas, íbis e outros, conforme o gosto e fantasia do fabricante,
ou de quem encomendava o instrumento; as cordas fixavam-se no topo e
vinham prender-se a um cavalete no fim da caixa, ou a meio.
Da mesma época da lira primitiva de 3
cordas, 3.000 anos antes da nossa era, havia liras de 7, 8, 9
cordas. Houve depois liras de 10, 11 e 18 cordas. No museu de Berlim
e no de Leda existem liras egípcias perfeitamente conservadas.
A maneira como os tocadores traziam a
lira era metendo-lhe a base debaixo do braço
/ 434 / esquerdo, de
forma a segurá-la com o antebraço aconchegado ao corpo; assim tinham
eles as mãos livres; também encostavam a base da lira ao peito,
ficando o instrumento sempre perpendicular: de ambas as maneiras
tinha a lira uma correia que passava por cima do ombro e pelas
costas e assim impedia a queda do instrumento, e servia para trazer
a lira a tiracolo quando não era preciso tocar o instrumento.
A maneira que parece ter sido mais
usual de tocar a lira era com ambas as mãos, quer com os dedos
desajudados de palheta, quer com palheta na mão direita e sem
palheta na mão esquerda.
Na escrita hieroglífica dizem ter sido
a lira a imagem da harmonia dos corpos celestes.
HARPA
Os instrumentos semi-circulares do
género das harpas são os que mais se encontram nos baixos relevos e
pinturas dos monumentos e túmulos.
As harpas diferiam muito de feitio:
umas eram muito simples, outras ornamentadas ricamente e com
pinturas a cores vivíssimas; o número de cordas variava de 3 até 22.
As harpas mais antigas que se conhecem
acham-se nas esculturas de um túmulo perto das pirâmides de Gizé; a
forma destas harpas não é nem tão bonita, nem tão enfeitada, como
geralmente o é nas outras; tinham 7 e 8 cordas.
Já havia harpas de 18 cordas no tempo
de Amássis, primeiro rei da 18.ª dinastia, 1570 anos antes de
Cristo.
Julga-se que a madeira de que se
fabricavam as harpas era da Índia, ou do Senegal; são da madeira
chamada mohogano swietenia as harpas existentes nos museus
egípcios de Florença e Paris. Cobriam algumas vezes a madeira com
cabedal, com marroquim verde, com marroquim escarlate, e
adornavam-nas de divisas e de emblemas; assim são as da colecção
Salt (cônsul inglês) achadas em Tebas.
Todas as harpas egípcias têm uma
particularidade muito importante, a falta da «barra-consolo» das
harpas modernas. Custa a compreender como é que as duas extremidades
ofereciam resistência suficiente e as cordas conservavam a afinação;
não é tanto para admirar nos instrumentos de curva pouco
pronunciada, mas muito admira nos que são muito curvos e nos
triangulares.
As cordas eram de tripas de gato, e
bem o atestam as harpas encontradas em Tebas, que em 1823 (da nossa
era) tinham ainda as cordas esticadas e susceptíveis de dar som,
tirado pelos dedos europeus, como o deram tantos séculos antes
tocadas pelos egípcios.
As cravelhas eram alternadamente de
ébano amarelo e ébano preto, ornadas de pinturas ou flores de lódão.
As harpas egípcias nada tinham que se
parecesse com o mecanismo dos pedais das nossas harpas.
Para tocar harpa não se serviam de
palheta, mas só dos dedos e das mãos espalmadas.
A harpa de 3 e 4 cordas é menos
arqueada e traziam-na ao ombro, passando a cabeça por entre a
madeira e as cordas; esta maneira de trazer as harpas só era usada
quando tocavam andando, porque em geral assentavam
/ 435 / as harpas
no chão, ou num escanho; o executante estava de pé, ou sentado numa
espécie de tamborete, ou com um joelho em terra, ou assentado no
chão com as pernas cruzadas, ou sentado nos calcanhares; tanto
homens como mulheres tocavam harpa.
No túmulo de Ramsés lII há numa das
mais belas pinturas relativas a harpas: são dois sacerdotes que
perante uma divindade fúnebre tocam harpa; uma harpa representa o
Alto Egipto (tem 13 cordas); já é admirável a expressão diferente
dos dois sacerdotes, mas ainda mais belo o lançado e a ornamentação
das harpas, elegantes, de perfeita magnificência, ricamente
desenhadas; mostram bem a inteligência, o talento produtivo na
execução dos instrumentos; a de 13 cordas é a mais linda.
Não se pode dizer que a harpa fosse o
instrumento mais antigo, visto dar-se a primazia à lira de Tot (ou
Hermes), mas foi sem dúvida o mais usado e o mais generalizado.
GUlTARRAS
A guitarra egípcia, teorba ou mandora,
não tinha variedade nenhuma na forma, nem tão pouco a riqueza e
elegância da harpa e mesmo da lira.
Por me parecer interessante direi
aqui, segundo a autoridade de H. Brugsch(4), que na guitarra egípcia
tinha o nome de nfr, muito provavelmente origem do hebreu
nbl, e do grego nabla, que deu o latino nablium.»
Compunha-se a guitarra de um braço
chato, quase sempre bastante comprido, curto algumas vezes, e de uma
caixa acústica oval, feita de um só bocado de madeira escavada e
coberta com uma tábua fininha de madeira, ou então coberta de couro,
com aberturas para dar mais som; o braço quase sempre terminava a um
terço do tampo, porém algumas vezes saía um pouco para fora do
tampo; o cavalete, posto na parte inferior, levantava bastante as
cordas para que não assentassem nem no braço, nem no tampo; era
quase sempre de forma triangular este cavalete, feito de madeira
dura, ou de marfim; nas guitarras não se encontram cravelhas; o
braço da guitarra tinha por vezes o dobro e o triplo do tampo, e
terminava em algumas por uma cabeça esculpida; a guitarra ao todo
media um pouco mais de 1,25 m.
Tocava-se a guitarra com palheta, que
andava presa por um cordão ao instrumento; tocavam-na homens ou
mulheres, quase sempre de pé, outras vezes sentados sobre os
calcanhares, e tendo o instrumento seguro por um cordão em volta do
pescoço; por vezes também tocavam e dançavam ao mesmo tempo; as
cordas eram metálicas, quase sempre 3, poucos instrumentos de 2.
Parece ter sido pouco usada a guitarra
monocorda e só ter servido para segurar o tom da voz no canto dos
poetas.
Há uns instrumentos que Salt levou
para o Museu Britânico e que se depreende terem sido os que serviram
de passagem da harpa para a guitarra. Um deles parece-se muito com a
harpa, mas é de muito menor tamanho: compõe-se de dois ramos unidos
em anglo recto; o ramo (ou braço) inferior é terminado por um
pescoço e cabeça de pato, as cordas são 9 e vêm horizontalmente dum
braço ao outro.
Há outros que se parecem com a
guitarra, feios e desairosos; o braço é extremamente curvo e mede 38
centímetros; a base é formada por um corpo redondo que mede 117
milímetros, em alguns coberto por uma tábua muito delgada, noutros
por couro, e ainda noutros por pergaminho; as cordas são postas
paralelamente em plano vertical, e vêm do cimo do braço ao tampo.
(Conclui no próximo número
– ►►)
JOSEFINA DE VASCONCELOS ABREU
SERÕES N.º 24 – FOL. 3
______________________________
(1) – I, 79 trad. de Rawlinson.
(2) – IX, 29 trad. de Frazer.
(3) – Flinders Petrie, Egp. Decor. Art. pag.,116.
(4) – Die Aegypthologie 433.
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