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Vale Guimarães

Esquiço para um grande aveirense

 

II

 

Nesse mesmo dia se organizou uma comissão constituída por vinte e cinco aveirenses representativos de todos os estratos sociais e actividades da cidade, para solicitar à Câmara que ao Dr. Vale Guimarães fosse concedida a Medalha de Ouro da Cidade de Aveiro, a adquirir por subscrição pública.

Muitas centenas de Aveirenses assinaram a petição.

Em 11 de Setembro de 1959, o Presidente Dr. Alberto Souto apresentou, em sessão ordinária da Câmara, uma proposta do seguinte teor:

Considerando que o Aveirense Exmo. Sr. Dr. Francisco José Rodrigues do Vale Guimarães ascendeu na sua terra à mais alta magistratura, exercendo de 7 de Abril de 1954 a 29 de Janeiro de 1959 o cargo de Governador Civil do Distrito;

Considerando que no desempenho das suas funções realizou em todo o Distrito obra política, administrativa e assistencial que muito contribuiu para o seu maior prestígio, progresso e bem estar das populações, que não esquecem a sua acção, como o demonstram as repetidas e espontâneas manifestações de simpatia e reconhecimento que por toda a parte lhe foram e continuam a ser tributadas;

Considerando que a favor das aspirações e interesses da cidade e do concelho de Aveiro, para além das suas obrigações de Governador Civil, tomou iniciativas ou desenvolveu diligências junto do Governo da Nação que já se concretizaram ou estão ou vão concretizar-se em realizações de maior projecção, de que, em anexo, se dá nota, embora incompleta, iniciativas e diligências essas que vivamente impressionaram a opinião publica deste concelho, que nunca conheceu um tal estilo de actuação;

Considerando que soube harmonizar os interesses políticos do Regime que, com inteira lealdade representou no Distrito, com a maneira de ser e as mais altas tradições do nosso povo e da nossa terra, o que lhe granjeou a maior simpatia;

Considerando que após a sua saída do Governo Civil foi dirigida a esta Câmara Municipal representação no sentido de ao ex-Governador Civil, Exmo. Sr. Dr. Francisco José Rodrigues do Vale Guimarães, ser concedida a Medalha de Ouro da Cidade, representação essa subscrita pelo Prelado da Diocese, autoridades civis e administrativas, Juntas de Freguesia do Concelho, pelos Clubes, Associações, Colectividades e Agremiações profissionais e culturais, recreativas e artísticas e por muitas centenas de Aveirenses de todas as classes, contando-se entre eles figuras das mais representativas da vida Aveirense;

Considerando que a petição dirigida a esta Câmara Municipal traduz, de facto, o sentir da maioria do povo da cidade e das suas freguesias, como o têm revelado as manifestações de acentuado carácter popular que a Sua Ex.ª têm sido prestadas sempre que para tanto se oferece qualquer ensejo;

Tendo em atenção as circunstâncias referidas, tenho a honra de propor que a Câmara Municipal deste concelho conceda ao Aveirense Sr. Dr. Francisco José Rodrigues do Vale Guimarães, a Medalha de Ouro da Cidade, em sinal de reconhecimento e como justo galardão dos relevantes serviços que prestou à Cidade e ao concelho, como Governador Civil, e ainda, que a uma Praça ou Rua condigna seja dado o seu nome para que assim melhor fique a perpetuar-se, no tempo, o muito que Aveiro está a dever ao Sr. Dr. Francisco José Rodrigues do Vale Guimarães.

Mais tenho a honra de propor:

a) Que a Medalha de Ouro seja entregue a Sua Ex.ª em sessão solene promovida pela Câmara Municipal;

b) Que, para corresponder aos desejos já expressamente manifestados pela Comissão que entregou a esta Câmara a referida exposição, a aquisição da Medalha e seu estojo seja feita por meio de subscrição pública a promover exclusivamente dentro do concelho de Aveiro.

Finalmente, tenho a honra de sugerir que todas estas propostas sejam aprovadas de pé, na presente sessão.

A Câmara, de pé, e por unanimidade de votos, prestando homenagem ao ilustre Aveirense Sr. Dr. Francisco José Rodrigues do vale Guimarães, deliberou aprovar esta proposta .

Por vários impedimentos do Dr. Vale Guimarães, a homenagem só pôde ser realizada no dia 16 de Junho de 1960, tendo a sessão sido promovida pela Câmara Municipal de Aveiro e pela comissão popular restrita a pessoas de Aveiro.

Esta comissão popular era formada pelas seguintes vinte e cinco personalidades: Amadeu Couceiro, Arquitecto Anselmo Teixeira, António Modesto, António da Silva Justiça, Décio Ala Cerqueira, Eduardo Cerqueira, Firmino Naia, Francisco Gonçalves Andias, Francisco Gonzalez de La Pena, Francisco Passos da Cruz, Desembargador Dr. Jaime de Melo Freitas, João Lopes, João Salgueiro, Padre José Manuel Rendeiro, José Ferreira da Costa Mortágua, José da Costa Portugal, Dr. José Couceiro, Dr. José Marques da Graça, José Martins, José de Pinho Nascimento, José Vieira Barbosa, Dr. Luís Regala, Padre Manuel António Fernandes, Manuel dos Reis Baptista e Dr. Mário Gaioso.

Registe-se, também, a constituição da Câmara Municipal em 1959, ano em que foi votada a concessão da Medalha de Ouro; e em 1960, ano em que esta medalha foi entregue em sessão solene.

Câmara de 1959: Presidente, Dr. Alberto Souto; Vice-Presidente, Dr. João Raposo; Vereadores: Amadeu Ala dos Reis, Henrique Ramos, Dr. Humberto Leitão, José Ferreira da Costa Mortágua, Dr. Pedro Ferreira e Severim Duarte.

Câmara de 1960: Presidente, Dr. Alberto Souto; Vice-Presidente, Dr. Humberto Leitão; Vereadores: Eng. Alberto Branco Lopes, Coronel Diamantino do Amaral, Eng. José Ferreira Pinto Basto, Dr. Miguel Varela Rodrigues, Orlando Moreira Trindade e Dr. Orlando de Oliveira.

O que se passou em Aveiro no dia da homenagem a Vale Guimarães constituiu uma das mais expressivas manifestações populares a que eu assisti em toda a minha vida. A imprensa local, regional, nacional e até a desportiva cobriu largamente o acontecimento, verdadeiramente invulgar nos tempos que então corriam.  Socorro-me, como expressivo exemplo, de parte  do relato publicado pelo “Jornal de Notícias”

“/…/ A linda cidade dos canais esteve por isso ontem em festa e movimentou-se extraordinariamente com a presença de milhares de pessoas que de todo o concelho e de muitos outros pontos do distrito ali quiseram levar ao Sr. Dr. Vale Guimarães o seu voto de simpatia e de gratidão pela obra que realizou em beneficio dos povos daquela região.

A concentração dos manifestantes teve lugar na vasta Praça da República e fez-se ao mesmo tempo que os sinos dos Paços do Concelho – onde se viam dezenas de bandeiras com as cores da cidade – repicavam em sinal de regozijo.

O homenageado foi acompanhado até à Praça da República pelos membros da comissão popular. Na Rua de Coimbra, onde se viam lindas e muitas colgaduras às janelas e varandas, estavam, à entrada, duas escadas “Magirus” dos bombeiros da cidade, de cima das quais os soldados da Paz lançaram flores sobre o Dr. Vale Guimarães, que passou por entre alas de povo, que o cobria também de «confetti».

À sua chegada a Praça da República, o ilustre Aveirense foi alvo de grande ovação, logo se tendo adiantado para o cumprimentar o Presidente do Município, Vereadores e todas as autoridades, à frente dos quais o Bispo da Diocese. As bandas de música executaram o hino da cidade, ao mesmo tempo que subiam dezenas de morteiros.

Seguidamente apresentaram-lhe também cumprimentos delegações das colectividades Aveirenses, após o que o homenageado se dirigiu ao salão nobre dos Paços do Concelho, onde já tinha ingressado uma comissão de senhoras que acompanhavam a esposa do Sr. Dr. Vale Guimarães. Aí nova e prolongada ovação lhe foi dispensada.

O Sr. Dr. Vale Guimarães, que, em seguida, foi muito cumprimentado e abraçado, assomou a uma das varandas do edifício municipal, tendo nessa altura recebido nova ovação da multidão que se encontrava na Praça da República./…/

A comissão popular da homenagem a Vale Guimarães veio a publicar, em 1962, um livro, hoje muito raro, em edição da Lello & Irmão, para o qual fui convidado para desenhar a capa, e que contém, para além de um relato objectivo de tudo quanto se passou, o registo de todos os discursos então proferidos, assim como fotografias do que foi a participação do povo aveirense, bem mais elucidativas do que quaisquer palavras.

Nesse livro descreve-se a sessão solene realizada no Salão Nobre dos Paços do Concelho. “/…/Presidiu o Chefe do Distrito, Dr. Jaime Ferreira da Silva, secretariado pelas seguintes individualidades: o homenageado, Presidente da Câmara, Dr. Alberto Souto, Coronéis Rodrigues Ricardo e Gaspar Ferreira, Dr. Carlos Vilas Boas do Vale, Comandante Pires Cabral, Dr. Querubim do Vale Guimarães e Francisco Gonçalves Andias.

O Bispo de Aveiro tomou lugar em cadeirão especial.

O Salão Nobre, salas contíguas, corredores e escadarias de acesso estavam repletas de publico, entre o qual dezenas de senhoras; algumas delas, em comissão, acompanhavam a Esposa do homenageado. Presentes ainda muitas figuras conhecidas da cidade e do concelho, nomeadamente dezenas de sacerdotes, advogados, médicos, engenheiros, oficiais do exercito e da marinha, professores do ensino liceal, técnico e primário, altos funcionários, comerciantes, industriais, armadores, etc..

Na Praça da República ficou concentrada a massa de manifestantes, que acompanhou o desenrolar da sessão por meio de retransmissão sonora, assegurada igualmente para o interior do edifício camarário. Entre os manifestantes encontravam-se as corporações de bombeiros da cidade, bandas de música, ranchos folclóricos e deputações de todas as colectividades e agremiações citadinas e concelhias.

Impossível neste contexto transcrever na íntegra os discursos então proferidos. Mas há afirmações feitas que será bom respigar.

O primeiro a usar da palavra foi o Presidente da Câmara, Dr. Alberto Souto./…/

Depois de palavras introdutórias disse a certo passo:

/…/ “Bem analisado o panorama social de Aveiro, do seu concelho e do seu Distrito; bem auscultada a opinião, não só aquela que se forma pelo civismo raciocinado, mas também aquela que se evola do coração e de espontânea gratidão dos povos, chegou-se a concluir que o Sr. Dr. Francisco do Vale Guimarães reunia os gerais sufrágios de bom quilate da consciência pública e dispunha de todos os predicados necessários para bem receber a nossa elevada mercê honorífica, e por isso lhe foi conferida. /…/

/…/ Quis, antes, sujeitar a minha simpatia pela ideia e pela sua figura moral e pela sua maneira de exercer a alta magistratura do Governo Civil do Distrito, e pela sua longa lista dos seus serviços públicos, a uma dura prova de debate interno com o escrúpulo da minha própria consciência de cidadão e de responsável pela superior direcção dos assuntos municipais.

Mas nesse íntimo e silencioso debate que foi longo, isento, justo e sincero, quem venceu afinal, foi a sua candidatura, candidatura posta não por ele mas pelos seus conterrâneos, pelos seus amigos, pelos seus admiradores; pelo espírito, pela alma e pela consciência do povo Aveirense de que ele dimana e de cuja ascendência, amizade e convivência tanto se orgulha, sem cair no plebeísmo deselegante e sem se empertigar no snobismo antipático das olímpicas atitudes. Quem venceu, foi a sua personalidade! Quem triunfou no nosso conceito, foi a sua invulgar soma de meritórios serviços ao bem geral.

Aveirense cem por cento, como hoje sói dizer-se, ele é verdadeiramente daqueles que, se lhe abrissem as arcas do peito, nos patenteariam a bateira de D. João de Lima Vidal, que trazem lá dentro!

Razoável e compreensivo, bondoso e tolerante, incansável e activíssimo, ele é um dos nossos mais distintos, pela sua ilustração e seus talentos e pelo exemplar, indefectível e acrisolado amor que tem a isto, a isto em que estamos, a isto que nos cerca, a isto em que nós vivemos e que em nós vive e que há-de viver nos nossos filhos e reviver nas gerações, no decorrer dos séculos, dos milénios, do infinito da Humanidade e da Nacionalidade, e que há-de ser sempre belo e amado, e isto – é Aveiro e os seus confins – é a nossa terra!

E servir aquilo mais que não é só a cidade, nosso querido berço, mas que, mais além, é areia e fímbria do mar, laguna de água salgada, agras em planura, pinheirais e ribeira e rio e monte e vale e rocha e alcantil e fraguedo e serrania, e vegetação e casario, anfiteatro magnifico sobre o Atlântico, iluminado e verdejante, e sempre beleza, riqueza e encantamento, e que é, ao mesmo tempo, povo activo e gentil, e que realiza a simbiose admirável do elemento físico e do elemento étnico e constitui aquilo a que chamamos, enternecida e ufanosamente, a nossa Beira-Mar, a terra Aveirense, o Distrito de Aveiro, que ele soube servir exuberantemente bem, com visão e acerto, erguendo muito alto o prestígio da capital perante o mesmo distrito e provando que Aveiro, com um Aveirense no seu Governo Civil, era, para todos os povos da sua grande região, uma verdadeira e digna capital e não um apático acervo de indiferenças e egoísmos administrativo./…/

/…/ É com um grande sentido da alta dignidade do cargo que, em nome da Municipalidade, entrego hoje ao Sr. Dr. Francisco do Vale Guimarães, o áureo símbolo da nossa admiração e da nossa gratidão colectivas! /…/

Quero, no entanto, que seja o Pai do Sr. Dr. Francisco do Vale Guimarães, quem receba das nossas mãos e lhe coloque ao peito, a nossa medalha de ouro.

É que seu Pai, o muito ilustre e venerando Aveirense Sr. Dr. Querubim do Vale Guimarães – é, também, merecedor da nossa homenagem /…/

Aqui lho testemunhamos, com a nossa grata admiração e os nossos parabéns, nestes Paços do Concelho da sua terra, associando seu nome prestigioso e venerando à gloria presente de seu Filho, hoje declarado cidadão benemérito da Cidade e do Município de Aveiro!

Interveio depois o Dr. Luís Regala em nome da Comissão Popular que, logo de inicio, procedeu à entrega do escrínio da medalha aposta pouco antes ao peito de Vale Guimarães, da plaqueta onde se encontrava incisa a nota da gratidão colectiva, ambos de prata, bem como o remanescente da importância angariada pelo povo de Aveiro. Foram palavras simples mas muito sentidas como sempre fora apanágio do causídico poeta.

Em nome das freguesias rurais do Concelho discursou o Dr. José Marques da Graça que a certo passo afirmou:

/…/ Na verdade, V. Ex.ª, Sr. Dr. Francisco Vale Guimarães, foi o maior governador em todos os tempos: realizador talentoso e clarividente; compreensivo e indulgente. A providência dotou-o de ampla bondade, bondade essa que V. Ex.ª soube facetar, acomodar para aceitar e respeitar critérios díspares, para atender a todos e por todos repartir com igual justiça. /…/

Seguiu-se no uso da palavra o Desembargador Dr. Jaime de Melo Freitas que, em nome dos amigos e admiradores do homenageado, logo quase no princípio, citou o poeta do século XVI António Ferreira, garantindo a tónica da sua intervenção:

“A medo vivo, a medo escrevo e falo,

hei medo do que falo só comigo,

mas indo a medo cuido, a medo falo...”

E mais à frente:

/…/ “Outro não será, por certo, o amor do Sr. Dr. Vale Guimarães à sua e nossa Pátria, à sua e nossa muito querida terra natal!

De Aveiro recebeu inspiração, em Aveiro se moldou segundo o nosso estilo.

Sem o ar que tem respirado e lhe deu vida, sem as águas da ria, sem a maravilhosa luz do nosso céu, sem todo este ambiente, com suas tradições e altos exemplos de civismo, o Dr. Vale Guimarães não seria, não poderia ser, creio eu, a mesma pessoa!” /…/

E a propósito de Liberdade:

/…/ “Difícil problema, esse da liberdade? Sem dúvida, mas entre nós, Aveirenses, um pouco menos difícil, penso eu, porque não alimentamos conflitos profundos, sabemos compreender-nos e reciprocamente nos respeitamos e estimamos.

Assim nos educaram, assim se educou o Sr. Dr. Vale Guimarães.

Alguns, vindos de fora, nada haverão aprendido connosco? Deixo a esses outros a resposta...

Em sessão solene de homenagem à memória do Senhor D. João Evangelista de Lima Vidal, V. Ex.ª, Sr. Dr. Vale Guimarães, reconheceu que José Estêvão foi um grande Aveirense; e o ilustre Pai de V. Ex.ª, Sr. Dr. Querubim do Vale Guimarães, no Litoral, tem sustentado que Aveiro não esquece o que deve a Homem Cristo.

Singular terra! – Esta em que nascemos. Há outras onde alguns nomes não podem, sequer, ser pronunciados sem que certos senhores muito se aborreçam...

Aqui é diferente, e aqueles insuspeitos testemunhos, modelo de isenção, muito nobilitam quem os deu!

Casa de pais, escola de filhos...”/…/

E depois:

/…/ “Se alguém condenasse, como defeitos, certos atributos que em Aveiro nos habituamos a considerar virtudes cívicas, é provável que, impenitentemente, nos mantivéssemos no erro, sem regatearmos louvores e aplausos ao Sr. Dr. Vale Guimarães, porque tem, em alto grau, conforme demonstrou esses supostos defeitos!

/…/ “Que é que eu estou a ver neste momento? Sombras, apenas algumas sombras: José Estêvão, Mendes Leite, Homem Cristo...E também D. João Evangelista de Lima Vidal e Jaime Lima...

Mais longe há outras sombras, muitas sombras...mas fiquemos por aqui! Que nem eu quero dizer o que tenho no meu coração...

Senhor Dr. Francisco José do Vale Guimarães, a suavizar agruras, nunca lhe faltarão em Aveiro os carinhosos sorrisos da alegria com que o recebam, e abraços amigos que se estendam para si. /…/

E a terminar:

/…/ “Sr. Dr. Vale Guimarães, pode fazer suas as conhecidas palavras do já citado Dr. António Ferreira:

“Eu desta glória, só, fico contente,

Que a minha terra amei, e a minha gente!”.

Seguiu-se o novo Governador Civil, Dr. Jaime Ferreira da Silva, em curta intervenção para expressar gratidão e amizade. 

A fechar os discursos, Vale Guimarães.

Valeria a pena ler toda a sua intervenção, mas tal tornar-se-ia incomportável num trabalho desta natureza.  Respiguemos a sua profissão de fé no “aveirismo”.

/…/ “Sou de Aveiro e aqui me eduquei. Conheci assim perfeitamente a terra e o seu povo, bem como as terras e as populações do distrito. Ninguém ignora ser ele permeável a todas as correntes de opinião, dada a sua evolução e o seu elevado nível social. Mas há uma ideia que predomina, sobretudo na zona ribeirinha : o ideal de liberdade. Para a maioria dos Aveirenses, depois da saúde, que agradecem a Deus, a liberdade é o maior bem de que podem usufruir. Sabendo ser assim, era questão de consciência integrar a actuação politica ao gosto local, tanto mais aceitando, como aceito, que só dessa maneira o Regime pode alargar-se e consolidar-se.

Assim, segui essa orientação, embora enfrentando incompreensões /…/

Graças ao clima político gradualmente criado dentro daquela orientação foi possível manter Aveiro, no período conturbado da eleição presidencial de 1958, em perfeita normalidade, o que foi causa de espanto em todo o País. Concedeu-se, então, liberdade plena; fez-se questão de manter a força armada alheia à vicissitude política, como convém e o exige o seu prestígio. Era um ensaio, feito no momento mais difícil da vida do Regime. Tudo correu, apesar disso, em impressionante ordem, respeito, compostura. Nem para um dito mais contundente houve ambiente. Deu o nosso povo magnifica lição de civismo. Demonstrou que sabe usar da liberdade sem dela abusar.” /…/

/…/ “Ter podido exercer o cargo de Governador Civil sem desrespeitar a grande tradição Aveirense representou para mim o maior prémio.” /…/

E terminou com um vibrante “VIVA AVEIRO!”

 

 

Tendo deixado o cargo de Governador Civil em 29 de Janeiro de 1959, Vale Guimarães regressa a Lisboa para reocupar as suas funções nos CTT.

O seu prestígio saíra acrescido pela forma como conduzira o seu Distrito de Aveiro.

 E logo nesse mesmo ano, uma plêiade de sócios de “Os Belenenses”, que sempre contara em Aveiro com muitos adeptos, principalmente na nossa Beira-Mar, consegue aliciá-lo para presidente da direcção do prestigiado clube, lugar que desempenhou durante três anos: 1959,1960 e 1961. E de tal forma o fez que, no cessar de funções, lhe foi atribuída a Medalha de Bons Serviços e Valor Clubistas, passando a integrar a Galeria dos Notáveis do Clube “Os Belenenses”. Foram os anos áureos do inesquecível Matateu, de Otto Glória a fazer com que “Os Belenenses” ganhasse a taça de Portugal e lidasse de igual para igual com os grandes do futebol português.

Retomou a presidência do clube em 1964, num período de crise. Acácio Rosa, belenense empedernido e historiador do clube, de Vale Guimarães deixou escrito: “Nunca regateou sacrifícios de toda a ordem; as suas relações com os sectores desportivos processaram-se como um “gentleman”; foi um belenense que honrou e serviu em plenitude “Os Belenenses”.

Até nas andanças desportivas Vale Guimarães deixou marca. Aliás, em tudo em que se envolvia, nunca deixou de ser uma pessoa empenhada e construtiva, respeitando os outros e merecendo de todos um enorme respeito pela sua vontade, persistência e determinação em bem servir.

 

 

O apego à sua cidade de Aveiro nunca se desvaneceu. Sempre que podia visitava a cidade e quedava-se, ainda que por pouco tempo, pela sua querida praia de São Jacinto.

Na noite de  12 de Dezembro de 1959, o Teatro Aveirense ficou a abarrotar. O seu palco tinha como pano de fundo a efígie de D. João Evangelista de Lima Vidal que eu pintara a meias com o meu amigo, o barrista e pintor Zé Augusto. Esse trabalho, feito em precário papel de cenário, ainda anda por aí aos cuidados de Monsenhor João Gaspar…

O povo de Aveiro  juntou-se em peso para relembrar o primeiro bispo da diocese restaurada, em homenagem única, verdadeiramente inesquecível, sob a presidência de S. Ex.ª Rev.mª, o Senhor D. Domingos da Apresentação Fernandes e com a presença de todas as autoridades locais.

O orador de fundo: Vale Guimarães, cujo discurso emocionou todos os circunstantes.

É que D. João tinha sido um Homem, um Bispo mas, para além de tudo isso, um Aveirense.

Um Aveirense /…/ “enamorado das belezas desta região, da irradiação de luz que tudo ilumina profusamente e parece mesmo adoçar o convívio da gente ribeirinha, da variedade da paisagem, do pitoresco dos costumes, do característico das actividades, do pendor democrata da vida social e, acima de tudo, desta Ria de suavidade e encantos tantos, a Ria que alonga os bravos em gesto de tocar a extensão fímbria, salgada do mar, tudo isso, o fez meditar nos mistérios do Infinito, o levou da verdade humana e pragmática a Eterna Verdade, borbotou palpitante de lirismo na palavra e na pena ; tudo isso abrangeu nos olhos míopes de visão exterior, mas abertos ao misticismo poético que une a realidade de Deus ao irrealismo do sonho. Tudo isso era a vida de D. João; tudo isso, depois do amor a Deus, ao próximo e a Pátria.

Ele próprio tem a consciência de que assim é. Ele o confessa no poema sem rima – formoso hino a Terra Mãe – que muitos sabem de cor mas que quanto mais se ouve mais harmonioso e rico de imagens entra em nós.

«Eu nasci em Aveiro, ao que suponho na proa de alguma bateira. Fui baptizado a mesma hora, nas águas da nossa Ria. Abriram-se-me os ouvidos ao som cadencioso dos remos no mar, ao pio estrídulo das famintas gaivotas, ao praguedo inocente dos pescadores. Encheu-se-me o peito à nascença do ar salgado da maresia. S. Francisco de Assis chamava a estas coisas irmãs: o irmão Vouga, o irmão luar que a noite o prateia, os irmãos peixes, as irmãs espumas, areias, estrelas.

Mas aqui há mais do que uma simples fraternidade, há mais do que a suave harmonia da natureza e da alma de Aveiro: chego a crer que há uma verdadeira encarnação, o encontro de duas coisas no mesmo ser.

Nós, os de Aveiro, somos feitos, dos pés à cabeça, de Ria, de barcos, de remos, de redes, de velas, de montinhos de sal e areia, até de naufrágios.

Se nos abrissem o peito, encontrariam lá dentro um barquinho à vela, ou então uma bóia, ou uma fateixa, ou então a Senhora dos Navegantes.

Assim plasmado de Aveiro, com os beiços a saber a salgado, a pingar gotas da Ria por todo o corpo, por toda a alma...

Eu sou uma nesga, embora minúscula, desta deliciosa aguarela de Aveiro; eu sou um pedaço da nossa terra...” /…/.

E a propósito de D. João, Vale Guimarães não perdeu a oportunidade de invocar outro grande de Aveiro: José Estêvão. E fê-lo assim:

“/…/ No século passado teve Aveiro alguém cujo talento a prestigiou, cuja acção política enérgica, isenta e persistente a cumulou de benefícios: José Estêvão. /…/

«/…/ Numa mão sempre a espada, na outra a pena...» disse-se do grande Épico. Em paralelo, podemos dizer de José Estêvão: Por uma grande e nobre causa terçou palavras e terçou armas. Causa tão nobre que um século transcurso o Mundo Cristão lhe ia sacrificar vidas, haveres, preciosidades, e ainda agora se mantém em penoso e dispendiosíssimo alerta contra os perigos – maiores e até dissimulados – que de novo ameaçaram a liberdade.

Mas nem o ardor da luta por um ideal, nem o deslumbramento – aliás legítimo – de constantes triunfos, nem a consciência de méritos próprios – que tanto o distanciam dos seus contemporâneos – nada disso o desviou da sua Aveiro, dos anseios e das necessidades do povo a que tanto queria e admirava em suas virtudes. /…/

Aveiro, rendida ao seu poder tribunício, ensopada nas suas ideias, comovida dos seus serviços, votou-lhe precioso monumento, estátua de expressividade rara, unindo o movimento à pujança viril, que a cidade colocaria na sua praça primeira, frente aos Paços do Concelho. Salda assim uma dívida. Eterniza na arte o perpassar efémero da existência. /…/

Mas Vale Guimarães regressa a D. João, constrói com palavras sentidas o retrato do Homem, do Bispo e do Aveirense, e termina assim o seu discurso:

/…/ Recordo o que foi o seu funeral, o que foi a sua morte na dor de uma cidade. No silêncio do luto, cerradas as portas a tudo o que era distracção ou vida, paralisado o trânsito, a cidade, sufocando lágrimas, apercebeu-se de que quem ia a enterrar não era apenas um Homem e um Bispo. Era um Santo. Era o Santo de Aveiro.

O preito da saudade ganha a culminância de um acto cívico — único talvez nos funerais de um Bispo.

Frente aos Paços do Concelho o cortejo detém-se. No alto da Torre Municipal o sino plange badaladas fúnebres. Acercam-se da urna vereadores em luto. Mãos trémulas do grande momento desdobram sobre o féretro a Bandeira da Cidade. No simbolismo do gesto vai a gratidão de Aveiro, vai também a entrega do seu destino a quem por ela valerás no Céu.

Momento patético que mistura lágrimas e soluços aos acordes da marcha fúnebre da secular Musica Velha, tão querida de D. João.

Pois bem! Tanta saudade e gratidão há que perpetuá-las no bronze. Tal como se fez a José Estêvão, que a cidade lhe erga, também, uma estátua.

Aos Aveirenses deste século toca, em dever, a magna empresa.

A sugestão aqui fica.

A inscrição poderá ser quase assim em parte inspirada em conhecida poesia:

“Não morreu. Tão-somente volveu à terra o que a terra era, e foi, só luz, derramar lá de cima um mistério de amor. Nós, os da Diocese de Aveiro, especiais devedores, lhe rendemos, na arte, a nossa homenagem mais duradoura. 

Posteriormente, o Dr. Vale Guimarães publicou em livro o seu discurso de homenagem ao D. João Lima Vidal. A seu convite, tive a honra de lhe desenhar a capa. 

A sugestão de Vale Guimarães veio a converter-se em realidade. Em frente da Igreja da Vera Cruz e quase que no início da rua de D. Jorge de Lencastre, onde nascera, está hoje uma bela estátua de D. João saída das mãos do ílhavo escultor Euclides Vaz.

Foi em frente de outra estátua, a de José Estêvão, que Vale Guimarães viria a usar da palavra no dia 3 de Novembro de 1962,  no início das comemorações do centenário da morte do grande tribuno. E fê-lo começando assim:

“Se é verdade aquilo em que acredito, José Estêvão está a ouvir-me.” E mais para a frente…

/…/ Cidadãos Aveirenses:

O património espiritual de um povo integra, a par dos feitos notáveis, das tradições, da ascensão civilizadora ou cultural, os homens que pela acção ou pelo talento foram obreiros ou mentores da sua fisionomia histórica.

José Estêvão foi obreiro e mentor – o mais eficiente e rasgado, o mais avisado e clarividente. Ficou na história como orador. A oratória em todos os tempos representou a suma dignidade da expressão falada. Arte complexa, implicando virtudes de eleição - do poder dialéctico a cultura, da capacidade imaginativa a força convincente, da prontidão do raciocínio a sua imediata elocução. Do saber dizer a ênfase oratória, da dicção vibrante e máscula e majestosa a não menos viril e imponente presença física. A convergência de tantos atributos e graça de que só raros participam. A história o comprova.

José Estêvão ocupou lugar entre os maiores do mundo.

Outro Aveirense ilustre e com soma de meritórios serviços à terra, Homem Cristo, cujo centenário de nascimento ocorreu há dois anos sem que, infelizmente e injustificadamente, os seus conterrâneos pudessem prestar-lhe a consagração a que tem jus, esse extraordinário polemista, com a imensa autoridade da sua erudição histórica, apelidou-o do maior orador do mundo após a Revolução Francesa.

 

Muitos chamaram-lhe o Demóstenes Português. E, quando, prematura e subitamente se fina, a Câmara dos Deputados unanimemente deliberou que a sua cadeira ficasse revestida de crepes por oito dias - caso único na história /…/

No seu estilo empolgante, depois de dissertar largamente sobre o seu ídolo, concluiu:

/…/ Cidadãos:

De quanto disse é legítimo concluir que não é um Centenário de morte que estamos a comemorar.

Ao contrário, festeja-se alguém que, agigantando-se, transcendeu a própria “bios”, a vida no seu sentido biológico.

Cremo-lo vivo, vivo na lição patriótica, cívica e humana que a todos deu. Vivo na pureza dos seus ideais e das suas acções. Vivo na sua coerência e na sua subordinação ao direito e a justiça. Vivo a ensinar-nos a amar mais ainda a nossa Aveiro e por seu intermédio a Pátria, que desejamos una, íntegra e perene. A pedir-nos a todo o momento que amemos mais ainda a tolerância, a generosidade, a paz, a ordem e a liberdade.”

 

 

Quase cinco anos volvidos sobra a sua destituição de Governador Civil de Aveiro, e sem, entretanto, ter desempenhado qualquer cargo político, pela passagem do seu quinquagésimo aniversário, Vale Guimarães, para sua surpresa, viu-se objecto de uma enorme homenagem promovida pelo povo de São Jacinto, freguesia de Aveiro onde tinha casa e onde se refugiava, sempre que podia, fugindo aos seus afazeres em Lisboa. Na cidade de Aveiro, na nossa região, Vale Guimarães continuava a merecer geral estima e excepcional consideração. Mas foi em São Jacinto, num movimento que o povo desencadeou que se veio a concretizar a homenagem. Ao princípio, os seus promotores, liderados pelo Sr. Gilberto da Fonseca Nunes, homem simples e bom e muito amigo de Vale Guimarães, conceberam uma homenagem à escala da sua freguesia de São Jacinto. Mas logo que  a iniciativa ultrapassou a língua de areia da praia de Aveiro, foi povo de todo o Distrito que se quis associar à manifestação de gratidão por quanto o ex-Governador tinha feito pelas gentes e pelas terras. Soe dizer-se que a palavra gratidão não existe em política. Mas neste caso tal não se verificou.

No dia 22 de Setembro de 1963, uma verdadeira multidão, vinda de todo o Distrito de Aveiro, juntou-se em São Jacinto em preito de homenagem a Vale Guimarães. E o “Lelinho das camionetas”, como é ainda hoje, felizmente, conhecido o Sr. Gilberto Nunes, botou palavra, palavra simples de homem simples. É que, dizia ele:

/…/ “Sempre que alguma infelicidade bate à porta de algum de nós, o que logo nos sai dos lábios e vem muito do coração é: VAMOS AO SENHOR DOUTOR; O SENHOR DOUTOR TALVEZ NOS POSSA VALER, e a verdade é que constantemente se bate a porta de V. Ex.ª e ela se abre de par em par e com V. Exa. conversamos e pomos os nossos problemas como se fosse da família, como se fosse o chefe da família grande, formada por todo o povo de São Jacinto.” /…/

E foi com vivas a Vale Guimarães entoados por toda a gente que terminou a maior festa de homenagem alguma vez realizada em São Jacinto.

 

 

Como Administrador dos CTT, Vale Guimarães lança uma revista de índole cultural destinada aos largos milhares de colaboradores da Instituição. No texto introdutório, a certo passo, escreve:

/…/ “De acordo com a natureza de tais objectivos, será uma revista aberta. A limitação que, porventura, surja ao colaborador será decorrente do propósito construtivo que lhe assinala e que a subordina, como é forçoso, a oportunidade e também o merecimento da colaboração.

No âmbito do fim formativo que atrás assinalámos caberão na revista, além de temas profissionais, todos os que, na época em que vivemos, mais interessam ou apaixonam, por transcendentes que sejam. Dispensar-se-á, porém, à defesa do Homem, na sua dimensão espiritual, cuidada atenção.

O mundo actual vive sob a grave ameaça da técnica que se infiltra, como uma vez já escrevi, em todos os campos e todos vai dominando – indústria, profissão, mesmo as letras e as artes.

A máquina gerou demasiada confiança até naqueles que defendem uma concepção espiritual da vida. Fácil é, assim, deixarem-se encadear pelo seu poder e magia, fomentando, sem o saber, o crepúsculo do espírito.”/…/

Também aqui se descobre quanto lhe desagradavam restrições à liberdade de expressão e quão grande era o seu empenho no fomento de uma cultura humanista.

 

 

Chegamos a 1968. Motivos de saúde forçam Salazar a abandonar o Poder. E o Presidente da República, Américo Tomás, cumprindo os formalismos constitucionais, depois de uma escolha que lhe não terá sido fácil, convida Marcelo Caetano para liderar e formar novo Governo, em 27 de Setembro de 1968.

Pensou-se, eu pensei, que com Marcelo seria possível uma evolução para um regime democrático de tipo ocidental. Era a esperança de uma transição tranquila. Para mim foi.

Vale Guimarães é convidado por Marcelo, seu professor na faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e que o conhecia bem, para uma pasta ministerial. Mas escusa-se. No fundo, por razões que só ele conhecia, a única coisa que ele verdadeiramente almejava era voltar a ser Governador Civil de Aveiro. E o convite foi feito e ele aceitou-o. Com Marcelo as coisas seriam diferentes, o futuro poderia vir a ser desenhado de uma forma mais consentânea com as suas convicções mais profundas.

No dia 7 de Novembro de 1968 toma posse face a uma multidão de gente de Aveiro e seu Distrito que lhe quis mostrar quanto era desejado.

E Vale Guimarães começou assim o seu improviso:

"Estou de novo perante vós na posição de Governador Civil. Nunca admiti ser possível um regresso – até porque é praticamente inédito repetir-se o exercício do cargo no mesmo distrito – e, naturalmente, nenhum de vós terá, por seu lado, posto essa hipótese. A realidade respondeu, porém, com formal desmentido ao que se supunha definitivamente impossível.

Por que voltei?” /…/

E de várias justificações, recolho esta:

 

/…/ “Voltei, para poder servir a minha cidade e o meu distrito, uma vez mais, dentro daquele espírito de tolerância e de respeito de todos para todos, que é tanto do meu agrado, como é do agrado de todos vós.

Voltei, para ajudar, dentro das minhas possibilidades, à solução de problemas que fundamentalmente interessam ao progresso das nossas terras.

Voltei, pois voltei, numa palavra, para, em ambiente de perfeita camaradagem com todos vós, sem reservas seja para quem for, esquecido como estou de qualquer mágoa recebida, porventura esquecidos os outros também de alguma queixa contra mim, tomado do espírito de convivência pessoal e politica que o nosso imortal patrono cívico – o maior dom da nossa terra – nos ensinou e fez ter como o bem mais precioso da vida local e até da vida nacional” /.../

/…/ “Dessa forma, ser-me-á possível, com a vossa ajuda e apoio, por um lado, criar no distrito uma frente politica imbatível e, por outro, promover – assim o desejo – um maior desenvolvimento da cidade e de todos os concelhos, fazendo que tal se processe com ajustado equilíbrio entre todos os interesses e entre todas as camadas sociais.

É este o lema. É esta a palavra de ordem.

Só mais uma nota: todos sabem do meu amor à liberdade. Mas a todos lembro que, como vós, igual amor tenho à autoridade, à ordem, à tranquilidade. /…/

/…/ Para vós que aqui estais, da cidade e de todo o distrito, para vós todos meus amigos, amigos de todas as horas, amigos que devotadamente me acompanhastes no meu afastamento da vida pública distrital, a vós todos, o meu obrigado e a certeza de que, como da outra vez, sou apenas um de vós, despido de ambições, de preconceitos, sempre convicto participante da maneira democrata de fazer e de agir da nossa terra, pronto a dar-me a todos, sempre do vosso lado, ajudando cada qual conforme puder… /…/

E terminou com um “Viva Aveiro”, “Viva o Distrito de Aveiro”.

Recomeçadas as suas lides governativas, Vale Guimarães viu-se objecto de nova homenagem, desta feita em Lisboa, com um jantar na Casa do Leão do Castelo de São Jorge, promovido por cerca de duzentos dos seus amigos, muitos deles aveirenses radicados na Capital.

De recordar, de todos os discursos então proferidos, as seguintes palavras do Conselheiro Dr. Albino dos Reis. /…/ “O Dr. Vale Guimarães encarna a figura do político mais das preferências do povo português, pois ele não suporta aqueles que pretendem governar pela força do poder /…/”
 

 

04-05-2018