Existem na bibliografia do Distrito de Aveiro, que de há
muito vimos coleccionando e estudando com o maior
carinho e entusiasmo, espécies particularmente raras a
que ainda hoje, não obstante, forçoso se torna reconhecer acentuado
valor doutrinário e interesse prático incontestável para a própria vida
local de todos os dias.
Colocamos neste número, em primeiro lugar, muitos dos opúsculos,
representações, relatórios, projectos, etc., tendo por objecto a
economia da Ria, pois, com efeito, a Ria de Aveiro preside,
sobrelevando qualquer outro factor económico, à vida e à riqueza duma
vastíssima
região distribuída, de Norte a Sul, pelos concelhos de Ovar, Albergaria
a Velha, Estarreja, Murtosa, Aveiro, Ílhavo, Vagos, e Mira, bastando,
para de tal nos convencermos, considerar a soma de 27.660 totalizada
pelos prédios inscritos no Cadastro da Junta Autónoma em 1927, último
ano em que se procedeu a esse levantamento(1).
Comando directo, imediato; pois reflexamente, estende-se à economia de
todo o Distrito a influência da Ria, como é sabido.
São múltiplos e variados, evidentemente, os problemas
que à Ria se encontram ligados, e mais ou menos todos eles se podem
ilustrar com bibliografia própria, iniciada, sempre, no último quartel
do século passado e prosseguido até nossos dias; de todos o mais
premente, porém, é sem dúvida o problema da chamada propriedade alagada,
colidindo com a difícil definição circunstanciada das zonas de
Domínio Público Marítimo.
Muito se tem escrito a propósito; e alguma coisa legislado, também;
mais, talvez, do que seria necessário, e sem a objectividade requerida pelo
fenómeno natural, em si próprio
considerado; desde o nosso Código Civil, que no seu artigo 380.º
classifica de coisa pública os leitos das
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águas salgadas, estabelecendo assim o Domínio Público Marítimo, até à
publicação que em 1936 o vice-Almirante JAIME AFREIXO fez de vários
dos seus Relatórios, Informações e Pareceres, como Capitão de Porto
que foi, durante largos anos, as dúvidas acumulam-se e a actuação do
fisco contradiz-se, prejudicando o desenvolvimento das propriedades e
vexando os povos.
Urge definir e demarcar a propriedade alagada com absoluta justiça e
respeito pelos direitos legitimamente
adquiridos através de séculos de existência e de operosidade criadora
de riqueza; exige-o o interesse público e o particular também.
O Arquivo do Distrito de Aveiro, chamando, de novo,
a atenção para o momentoso problema, entende que a todos prestará óptimo
serviço reimprimindo as mais representativas peças dessa rara
bibliografia ribeirinha.
É assim que, principiando não pela
mais recuada em data, circunscrita a um pleito judicial
(2),
mas pela que apresenta o problema no seu
conjunto, e o debate com mais largueza, traz a público, nas páginas
imediatas, a 2.ª edição do raro opúsculo:
A legitimidade da Propriedade Particular em terrenos alagados pela Ria
de Aveiro
−
Representação dirigida a Sua Majestade em Fevereiro de 1897
pelos
proprietários ribeirinhos
(3).
Subscrevem a representação 462 proprietários, ao primeiro dos quais,
o Conselheiro ANTÓNIO JOSÉ DA ROCHA, de Ílhavo, e ao Dr. ANTÓNIO EMÍLIO
DE ALMEIDA AZEVEDO, de Aveiro,
se deve atribuir a redacção do articulado, que foi publicado sem nome expresso de autor.
É peça ainda hoje
invocada, a cada passo, mas que dificilmente se encontra.
Iniciando com ela uma colecção de reimpressões distritais, o Arquivo do
Distrito de Aveiro lança de novo em
circulação não só verdadeiros tesouros bibliográficos que muitos dos
leitores de hoje desejariam, sem dúvida, possuir, mas ideias e doutrinas
que importa difundir e esclarecer em favor de legítimos interesses
criados e transmitidos
até nós por centenas de gerações que nos precederam.
ANTÓNIO GOMES DA ROCHA
MADAHIL |