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António Carretas, Sawadi Krap! - Crónicas de Viagens, 1ª ed., Aveiro, 1994, págs. 101 a 104.

"Sekt"... com rosas


Já decidira voltar, a família adiantara-se no regresso e estava sozinho em Viena. E que mais fazer do que aproveitar o tempo que faltava da melhor maneira convivendo, por exemplo, com amigos à volta de uma boa mesa?

Nesse dia resolvera convidar um casal amigo, o Carl Collini e a Evelyne para um jantar num restaurante tailandês. A amizade com este casal vinha já do tempo dos Camarões, onde ambos tinham também estado. Ele também é um bom "gourmet", apreciador da boa e exótica comida.

Havia regressado há pouco da Tailândia onde pudera apreciar mais uma comida à base de especiarias, bem picante, à semelhança das da Índia ou África, por onde anteriormente passara. Havia já tentado dois ou três restaurantes, ditos de cozinha tailandesa mas que efectivamente o não eram na realidade, mais não passando de uma cozinha chinesa de segunda. Até que, ao vagabundear pela baixa vienense, entrara uma vez no Ómega Bar para um whisky e em conversa casual com a empregada, natural da Tailândia, como me tinha parecido ao entrar e depois confirmado pela própria, esta me informara de um verdadeiro restaurante de cozinha tailandesa, mais precisamente, e para quem algum dia queira experimentar, situado no n.º 21 da Hernalserhauptstrasse do 17º distrito de Viena.

Foi pois a este "Thailand Restaurant" que os três fomos nesse dia. O jantar foi bem apreciado, confirmando a qualidade apregoada. Após o jantar, e por sugestão do Carl, / 102 / fomos até à "baixa" beber o chamado "copo para a sossega" no Reise Bar.

Este bar, situado numa pequena transversal da Kartner Strasse, mais precisamente a segunda à esquerda indo da Ópera para a Stephanplatz, tem a particularidade de nele praticamente se consumir só "sekt" (o champanhe, ou melhor o espumante austríaco) bruto ou misturado com sumo de laranja (sekt-orange) para algumas (que não todas) senhoras. É um típico local de encontro dos apreciadores de copo na mão, onde se fazem conhecimentos de diversa ordem e com diversos intuitos.

O bar estava como de costume cheio que nem um ovo. O recinto não é muito grande, tem um balcão em "O" onde os primeiros clientes se sentam ou encostam, tem mais duas ou três mesas do lado esquerdo de quem entra e ao longo das paredes laterais um balcão estreito, corrido e encastrado na parede, para aqueles que, chegando mais tarde e tenham que "charlar" em pé, possam pousar os copos. Foi o que nos aconteceu nessa noite.

Na altura da segunda rodada, e porque a jeito no chão havia uma pequena caixa em madeira que escondia um condicionador de ar (ou aquecedor), coloquei um pé em cima do mesmo para, de mais alto ainda que os meus cento e oitenta e tal centímetros, apreciar a clientela que se distribuía pelo balcão central. Com os olhos percorri os "bebedores e conversadores" existentes, para se assentarem numa senhora, tipicamente austríaca, bonita, elegante e bem vestida (que as há também "mostrengos", graças a Deus!) que, acompanhada de uma amiga, calhou no momento fixar em mim igualmente o seu olhar (talvez desperta pela curiosidade de ver emergir uma cabeça do mar de gente / 103 / presente). Aproveitei então para, elevando o copo que tinha na mão, gesticular um brinde saudando, talvez, quem sabe! o estarmos vivos os dois, e ela correspondeu com um sorriso lindo. Fiz segunda saudação logo de seguida, para regressar a prestar atenção aos amigos.

Embrenhado na escuta destes e quase esquecido do incidente, dei com um vendedor de rosas, dos muitos que pululam pela cidade àquelas horas correndo os bares (ofertando os seus préstimos aos cavalheiros gentis que, por razões variadas, queiram presentear rosas a quem lhes agradar) que me vem entregar uma rosa, da parte da senhora – e apontou para o local onde esta se encontrava — com a qual tinha momentos antes trocado sorrisos de simpatia.

Fiquei deveras surpreendido, porque não esperava nem estaria habituado a uma coisa dessas. E o mais que consegui como resposta, foi pedir ao vendedor que entregasse, por sua vez, à senhora não uma, mas seis das suas rosas, ao mesmo tempo que agradecia com mais um sorriso por cima do mar de cabeças.

Não fui logo, logo, a correr ter com a dama que de maneira tão elegante se me tinha "dirigido". Mas, com a aquiescência dos amigos, um pouco divertidos com a situação, logo que acabei o segundo (ou seria o terceiro?!) copo de "sekt", fui travar conhecimento com a senhora. E após apresentações e outras ninharias típicas de introdução de quem não se conhece mas se quer conhecer, perguntei­ lhe da razão do gesto tão fora do comum, para mim principalmente. Com a maior das naturalidades, ela respondeu que havia sido porque, de toda aquela gente que ali se encontrava (e era bastante), era eu quem tinha a cara / 104 / e o sorriso mais interessante e decente... Isto dá para desarmar qualquer pessoa!...

Conversei com a senhora um pouco mais, trocando olhares cúmplices com os meus amigos, a quem não queria deixar de todo. A conversa estava até a tomar-se interessante, poderia ter insistido para um mais profundo conhecimento, mas não estava realmente interessado.

E com um "aufwiedersehen" o mais aberto e sorridente possível, saí com os amigos para o ar fresco da noite.


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