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            Já decidira 
            voltar, a família adiantara-se no regresso e estava sozinho em 
            Viena. E que mais fazer do que aproveitar o tempo que faltava da 
            melhor maneira convivendo, por exemplo, com amigos à volta de uma 
            boa mesa? 
            
            Nesse dia 
            resolvera convidar um casal amigo, o Carl Collini e a Evelyne para 
            um jantar num restaurante tailandês. A amizade com este casal vinha 
            já do tempo dos Camarões, onde ambos tinham também estado. Ele 
            também é um bom "gourmet", apreciador da boa e exótica 
            comida. 
            
            Havia regressado 
            há pouco da Tailândia onde pudera apreciar mais uma comida à base de 
            especiarias, bem picante, à semelhança das da Índia ou África, por 
            onde anteriormente passara. Havia já tentado dois ou três 
            restaurantes, ditos de cozinha tailandesa mas que efectivamente o 
            não eram na realidade, mais não passando de uma cozinha chinesa de 
            segunda. Até que, ao vagabundear pela baixa vienense, entrara uma 
            vez no Ómega Bar para um whisky e em conversa casual com a 
            empregada, natural da Tailândia, como me tinha parecido ao entrar e 
            depois confirmado pela própria, esta me informara de um verdadeiro 
            restaurante de cozinha tailandesa, mais precisamente, e para quem 
            algum dia queira experimentar, situado no n.º 21 da 
            Hernalserhauptstrasse do 17º distrito de Viena. 
            
            Foi pois a este "Thailand 
            Restaurant" que os três fomos nesse dia. O jantar foi bem 
            apreciado, confirmando a qualidade apregoada. Após o jantar, e por 
            sugestão do Carl, / 
            102 / fomos até à "baixa" beber o chamado "copo para a 
            sossega" no Reise Bar. 
            
            Este bar, situado 
            numa pequena transversal da Kartner Strasse, mais precisamente a 
            segunda à esquerda indo da Ópera para a Stephanplatz, tem a 
            particularidade de nele praticamente se consumir só "sekt" (o 
            champanhe, ou melhor o espumante austríaco) bruto ou misturado com 
            sumo de laranja (sekt-orange) para algumas (que não todas) 
            senhoras. É um típico local de encontro dos apreciadores de copo na 
            mão, onde se fazem conhecimentos de diversa ordem e com diversos 
            intuitos. 
            
            O bar estava como 
            de costume cheio que nem um ovo. O recinto não é muito grande, tem 
            um balcão em "O" onde os primeiros clientes se sentam ou encostam, 
            tem mais duas ou três mesas do lado esquerdo de quem entra e ao 
            longo das paredes laterais um balcão estreito, corrido e encastrado 
            na parede, para aqueles que, chegando mais tarde e tenham que "charlar" 
            em pé, possam pousar os copos. Foi o que nos aconteceu nessa noite. 
            
            Na altura da segunda rodada, e 
            porque a jeito no chão havia uma pequena caixa em madeira que 
            escondia um condicionador de ar (ou aquecedor), coloquei um pé em 
            cima do mesmo para, de mais alto ainda que os meus cento e oitenta e 
            tal centímetros, apreciar a clientela que se distribuía pelo balcão 
            central. Com os olhos percorri os "bebedores e conversadores" 
            existentes, para se assentarem numa senhora, tipicamente austríaca, 
            bonita, elegante e bem vestida (que as há também "mostrengos", 
            graças a Deus!) que, acompanhada de uma amiga, calhou no momento 
            fixar em mim igualmente o seu olhar (talvez desperta pela 
            curiosidade de ver emergir uma cabeça do mar de gente
            / 103 / 
            presente). Aproveitei então para, elevando o copo que tinha na mão, 
            gesticular um brinde saudando, talvez, quem sabe! o estarmos vivos 
            os dois, e ela correspondeu com um sorriso lindo. Fiz segunda 
            saudação logo de seguida, para regressar a prestar atenção aos 
            amigos. 
            
            Embrenhado na 
            escuta destes e quase esquecido do incidente, dei com um vendedor de 
            rosas, dos muitos que pululam pela cidade àquelas horas correndo os 
            bares (ofertando os seus préstimos aos cavalheiros gentis que, por 
            razões variadas, queiram presentear rosas a quem lhes agradar) que 
            me vem entregar uma rosa, da parte da senhora – e apontou para o 
            local onde esta se encontrava — com a qual tinha momentos antes 
            trocado sorrisos de simpatia. 
            
            Fiquei deveras 
            surpreendido, porque não esperava nem estaria habituado a uma coisa 
            dessas. E o mais que consegui como resposta, foi pedir ao vendedor 
            que entregasse, por sua vez, à senhora não uma, mas seis das suas 
            rosas, ao mesmo tempo que agradecia com mais um sorriso por cima do 
            mar de cabeças. 
            
            Não fui logo, logo, a correr ter 
            com a dama que de maneira tão elegante se me tinha "dirigido". Mas, 
            com a aquiescência dos amigos, um pouco divertidos com a situação, 
            logo que acabei o segundo (ou seria o terceiro?!) copo de "sekt", 
            fui travar conhecimento com a senhora. E após apresentações e outras 
            ninharias típicas de introdução de quem não se conhece mas se quer 
            conhecer, perguntei lhe da razão do gesto tão fora do comum, para 
            mim principalmente. Com a maior das naturalidades, ela respondeu que 
            havia sido porque, de toda aquela gente que ali se encontrava (e era 
            bastante), era eu quem tinha a cara
            / 104 / e o 
            sorriso mais interessante e decente... Isto dá para desarmar 
            qualquer pessoa!... 
            
            Conversei com a 
            senhora um pouco mais, trocando olhares cúmplices com os meus 
            amigos, a quem não queria deixar de todo. A conversa estava até a 
            tomar-se interessante, poderia ter insistido para um mais profundo 
            conhecimento, mas não estava realmente interessado. 
            
            E com um "aufwiedersehen" 
            o mais aberto e sorridente possível, saí com os amigos para o ar 
            fresco da noite.  |