No ano de 1967 é colocado como 2º
Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana o brigadeiro António
de Spínola, corporação que o mesmo conhecia perfeitamente pois nela
passara grande parte da sua carreira militar . Este militar
tornar-se-ia figura de proa na vida do país cerca de sete anos
depois, pois viria a ser o primeiro Presidente da República do
pós-Abril de 1974. Mas tal não é para aqui chamado.
O brigadeiro era um homem de forte
personalidade, perfeccionista, com um temperamento difícil, com
toques de irreverência. Assumia atitudes demasiado ríspidas na sua
relação com alguns oficiais, com quem era ainda mais rigoroso, e que
conduziam por vezes a criar grandes animosidades. Trabalhar de perto
com ele não se tornava tarefa fácil, embora fosse sincero admirador
dos subordinados inteligentes e dedicados à sua profissão.
O seu inseparável monóculo emprestava-lhe um
marcado cunho de distinção.
Distinguia-se também entre os seus pares na
cavalaria, pois era um excelente concursista, figurando entre os
melhores do país.
A sua entrada na GNR veio trazer à corporação
uma nova dinâmica, pois havia algum tempo que se entrara em ritmo de
rotina nas suas actividades. Reflectindo o seu estilo, depressa tudo
entrou num ritmo diferente.
As unidades tiveram que organizar-se e pôr em
execução planos de defesa dos seus aquartelamentos e treinar
sistemas de pronta intervenção se, e quando, necessário. Como os
elementos da GNR viviam não só na área de Lisboa mas também em
povoações da periferia, houve que treinar, ao pormenor, a sua
comparência nos quartéis em casos de urgência.
Também surgia nas unidades às mais diversas
horas do dia ou da noite e ordenava o toque de alarme para ver como
as coisas funcionavam. Pôs tudo, como soe dizer-se, a “toque de
caixa”. Foi um período de constante alerta, que se tornou extensivo
aos militares que trabalhavam nas Repartições do Comando-Geral (que
era o meu caso), onde reinava até aí o que ele designava por uma
certa “paisanice”.
No tempo que Spínola esteve na corporação (ele
deixou a GNR em Maio do ano seguinte - 1968), “inventou” várias
situações de prevenção (quem sabe se não estaria já a prever algo)
que obrigava toda a malta a ficar nos quartéis por longos períodos
para além do habitual. Também a mim este frenesim do brigadeiro me
afectou pois foram dois anos (1967 e 1968) em que não podia fazer
grandes ausências do quartel e assim não consegui completar qualquer
“cadeira” no Técnico.
Toda a gente tinha receio de o enfrentar e
tentavam “fugir”, sempre que possível, às suas “rabecadas”. Nessa
altura desempenhava eu já as funções de adjunto do chefe da 2ª
Repartição. E, quando o chefe (julgo que já o tenente-coronel Varela
Soares) se ausentava por qualquer razão, era eu que tinha que ir “a
despacho” a “sua excelência o nosso brigadeiro”. Como não tinha nada
a temer, não era dos que fugia a enfrentá-lo e ia naturalmente à sua
presença no respectivo gabinete. Mas tinha que ter mais cuidado com
a apresentação dos documentos pois era com rigor e atenção que os
analisava, indo até ao pormenor da existência de letras mal batidas.
Quando qualquer texto não ia com o número de espaços que achava
conveniente, a expressão que utilizava era: - “Isto está muito
empastado!”. Das vezes (não foram muitas) que tive que ir à sua
presença não houve razões para qualquer admoestação.
A sua estadia na GNR “mexeu” um bom bocado com
a vida nos quartéis.
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