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Reminiscências. Crónicas e outros escritos, Aveiro, 2014, pp. 231-233.


Marjukka

Nas viagens que tive que efectuar a quando da implementação do projecto Siaf, para o qual havia sido desviado a convite da Sonae, várias vezes tive que “aterrar” na cidade finlandesa de Lahti, já que uma das empresas a quem se adjudicou equipamento para a fábrica de Mdf, a que o citado projecto dizia respeito, aí se encontrava instalada, mais propriamente a Raumatic.

Por norma a equipa técnica, de que fazia parte, quando ali se deslocava para reuniões do projecto em questão, ficava instalada no hotel “Lahden Seurahuone”, implantado na Aleksanterinkatu 14. Uma dessas permanências neste hotel de Lahti foi em 26 e 27 de Abril de 1988. No dia 27, depois de uma reunião estafante (como quase todas nesta fase), com os responsáveis da Raumatic, regressámos ao hotel para o devido repouso. No dia seguinte seguiríamos para a Alemanha para outra “maratona”, com outro dos fornecedores de equipamento.

Só que de repouso nesse fim de dia pouco houve!... O hotel tinha em anexo várias “solicitações”, para entreter os clientes. Uma delas era o Alfa Night Club onde em 26, dia de chegada, alguns do grupo haviam estado a “beber um copo”. Outro atractivo era o “Amoroso dancing restaurant”, onde nesse dia 27 resolvemos jantar. Como o próprio nome indica, o restaurante tinha um conjunto musical que animava os hóspedes enquanto degustavam o nórdico menu. Era uma quarta-feira, que coincidia com o “ladies night”, habitual neste dia da semana nestas frias paragens. Para quem desconheça este hábito deste país (e dos outros escandinavos), diga-se que se trata de um dia especial para as finlandesas, no qual têm autorização dos respectivos companheiros para uma saída nocturna a fim de se distraírem como lhes der na gana. A tão apregoada “abertura” desta gente.

Estava eu com os três “J’s” da equipa, o João José, o Jorge e o Joaquim. Só já no restaurante nos apercebemos no que estávamos metidos. A sala, com uma pista de dança como se impunha, regurgitava de presenças femininas, de todas as idades, credos e feitios. Ainda não havíamos acabado de jantar já estávamos a ser convidados a ir para a pista “dar à perna”. Dado o estatuto de visitantes, e para mais estrangeiros, não podíamos recusar, ainda que a algumas das interessadas bem apetecesse “dar uma nega”. Os mais solicitados para a dança foram os cinquentões, eu e o Jorge, não tendo os da casa dos trinta (ou talvez nem isso), tanta saída, não me perguntem porquê.

Após meia dúzia de voltinhas com umas tantas matronas acabei por “acertar” com a Marjukka, assim se chamava a senhora que acabou engraçando com a minha pessoa. De tal maneira que já não me largou o resto da noite. Não vou negar que me agradou a companhia, senão tinha arranjado desculpa para me safar, o que acabaram por fazer os meus colegas ao fim de certo tempo, ou porque não “acertaram” como eu, ou porque não eram tão solicitados, ou porque preferiram ir dormir. Também simpatizei com a senhora pois era agradável a sua conversa e o aspecto físico bastante interessante. Dançámos animadamente até às tantas, intervalado com uns “drinques” nas pausas das musicatas. Não demos pela passagem do tempo. Ao anunciarem o fim da “performance” musical, e já passava um pouco da meia-noite, sugeri à Marjukka um último “copo” no meu quarto do hotel. Porque estivesse “esquentada”, pela bebida ou pela companhia, acedeu ao convite e aí vamos nós até ao “room 622”. Do minibar do quarto retirei duas bebidas que foram alimentando a conversa. A Marjukka sentada numa cadeira, eu na borda da cama, não porque estivesse tentado a pender para a mesma, mas porque simplesmente não havia mais assentos no aposento. A convergência de gostos e de simpatias indiciava que daria para “mergulhar”, mas ao fim de quase duas horas de “vai, não vai” acabámos por chegar à conclusão, como pessoas civilizadas que éramos, que seria preferível não chegar a vias de facto. Era improvável, senão mesmo impossível, um reencontro, dado as circunstâncias. Embora com muita pena de ambos resolvemos não prosseguir com o “aquecimento”, porque só traria problemas futuros de consciência (possivelmente haverá quem nos ache tolos!). Seria cerca das duas horas quando a Marjukka telefona ao marido para a ir buscar ao hotel. E por aqui ficaria este breve “afaire”.

Semanas mais tarde recebo uma missiva da Marjukka, afirmando o quanto tinha apreciado a minha companhia e lamentando (palavras suas) não ter ido mais além. À distância continuo a pensar que foi melhor assim...


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