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Reminiscências. Crónicas e outros escritos, Aveiro, 2014, pp. 62-64.


Maratona dos ovos

Por volta das três e meia de um certo sábado de Novembro, resolvemos, eu e o meu habitual companheiro de saídas, o austríaco Carl Collini, ir até um “bush bar” beber uma cerveja. O bar era relativamente perto do acampamento, pois o Renault que tínhamos à disposição só dava para pequenas saídas, no máximo até Edea, pois estava, como soe dizer-se, a “cair aos bocados”.

No “bush bar” encontrámos já abancados mais três “expatriados” e por ali estivemos até por volta das seis, com cerveja e ovos cozidos com piripiri (era o petisco típico destas “tascas”). Começou aqui a minha maratona dos ovos... Aqui foram só dois.

Após a estadia no bar, seguiu-se em direcção a Edea, mas fiquei na “cité” do Allucam, para onde tinha sido convidado para um “grill”, em casa dos Jenner (este austríaco era o administrativo da Cellucam), que partilhava com outro casal, Binder de seu nome. Julgo que foram até estes que tiveram a iniciativa do “grill”. Seríamos mais ou menos uns quinze, e como de hábito o António tinha que ser convidado para estas reuniões gastronómicas. Foi um serão agradável, com o senão do Jenner não estar presente. Não estranhei porque duvidava que havia problemas entre os dois nos últimos tempos. Por volta da meia-noite viemos até ao “disco” do acampamento, onde o Jenner se encontrava. Ela não lhe ligou nenhuma, e ele passados cinco minutos pediu-lhe a chave do carro e raspou-se. Depois ela lá arranjou quem a levasse a casa, mais o outro casal, por volta das três.

O Jenner aliás andava a beber bastante neste fim de semana e acabou mesmo por ter um acidente de carro, que espatifou e por sorte só partiu uma clavícula. Mas isto são outras histórias...

Mas voltemos à minha pessoa. Como atrás disse já passava das três quando me deitei. Às oito e meia de domingo já estava a pé, e fomos (agora com mais dois) de novo a Edea, com o intuito de telefonar (acabámos por não fazer, por não haver comunicações nesse dia!...). Pequeno almoço em Edea, uma “omelette” (mais três ovos), salada de tomate e uma cerveja, pequeno almoço à inglesa. À espera de possível hipótese de ainda telefonar estivemos até ao meio-dia. A ideia era ir depois almoçar a Song Loulou. Um parêntesis para explicar como aparece esta possibilidade de almoço em Song Loulou. Da primeira vez que fui a Portugal em Dezembro, tinha feito a viagem com um português, da Sorefame, que estava na altura (e ainda posteriormente porque o voltei a encontrar em Douala num supermercado, quando ia a caminho de Vitória) a trabalhar aqui numa barragem, e onde havia mais portugueses. No domingo anterior, quando esperava a minha vez para telefonar, vejo chegar dois tipos num jeep, baixinhos, morenos, que inicialmente julguei franceses, que os há muitos por aqui. Não os houve falar com o funcionário dos correios, mas daí a pouco ouço este a dizer: Portugal, e a apontar para uma das cabines para onde um deles se dirigiu. Espera aí, que estes tipos são da “santa terrinha”!. E dirigi-me ao outro, pois que não restavam dúvidas que de portugueses se tratava. Eram então da zona de Penafiel, ou cheganças. Estavam também a trabalhar na barragem de Song Loulou. Ficou ali logo combinado que iríamos, eu e o Collini que me acompanhava, almoçar com eles ao local da barragem (ainda eram uns 80 quilómetros, por estrada pouco convidativa). Prometeram que talvez se arranjasse uma” bacalhoada”. A coisa prometia, mas ficou pelas promessas, primeiro... porque tínhamos que arranjar um outro carro, porque o “nosso” era “impróprio para cardíacos”. Quando conseguimos um melhor, este não tinha gasolina, e como a bomba que a fábrica tinha em Edea encerrava aos domingos, corremos as “capelinhas” todas à procura da dita. Por fim lá arranjámos quem nos cedesse um “jerricam” de vinte litros. Com isto fez-se quase uma hora. Mesmo assim metemo-nos a caminho. Passados uns vinte quilómetros um furo. Com uma roda a menos (a sobresselente, claro), já tarde e com receio de novo percalço, pois a estrada era bastante má, resolvemos pelo seguro voltar para trás. Mas, dada a hora tardia para almoço, ficámo-nos num “bush bar”, aí a uns doze quilómetros, para tentar comer algo. A única coisa arranjámos foram... ovos cozidos, com piripiri. Foram mais cinco (já vai em dez, não é?!). Mais cerveja, menos cerveja, mais piada, menos piada, passou-se o tempo até às cinco e meia, hora a que regressámos. Como tinha dormido pouco a noite anterior, quando cheguei deitei-me um pouco e adormeci profundamente. Quando dei por mim eram oito menos dez. Como a cantina fechava às oito, aí vou a correr a ver se ainda conseguia alguma coisa para comer. O prato normal tinha acabado, então... sai mais uma omeleta (fechava a conta com treze; pensei para comigo, tão depressa não vou comer mais ovos). Ah! Espera aí, na véspera, no restaurante do Allucam, comi um hambúrguer... com um ovo a cavalo!...

Em menos de vinte e quatro horas foram só catorze!... E o fígado, Deus meu!


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