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A. Carretas, Para a História do Atletismo, Inédito.

Subsídios para a História do Atletismo em Aveiro - 37


Enfim... pista em Oliveirinha

Vamos andar um pouco para trás e desenvolver resumidamente o “processo” da construção de uma pista para Aveiro, até chegarmos à sua concretização em Oliveirinha.

Ao longo destes capítulos várias vezes fizemos referência à falta de condições para a prática da modalidade, nomeadamente a não existência de uma pista em Aveiro, onde a Associação pudesse realizar a propósito todos os seus campeonatos e provas de preparação, e onde os atletas pudessem treinar a fim de melhorar as suas qualidades e aptidões. Acrescia o facto que a única pista nesta altura no distrito se situar em S. João da Madeira, o que obrigava todo o “staff” associativo a fazer deslocações quase todas as semanas, para além de esta pista se encontrar em péssimas condições de utilização por deficiente ou, por vezes nula, manutenção. Com a agravante ainda de a Associação estar sujeita a, muitas vezes, anular campeonatos, porque a Sanjoanense, proprietária da pista, dava prioridade a outros eventos desportivos a realizar no mesmo local, particularmente o futebol. E isto aconteceu, por vezes, já com toda a “máquina”,  necessária para as provas, no local, obrigando a “regressar a penates” sem a realização das mesmas provas, com os custos inerentes à deslocação efectuada em vão.

 A existência de uma pista na cidade capital do distrito levaria igualmente a que mais jovens e clubes da cidade aderissem por certo à prática da modalidade.

E porque não se construía a tão necessária pista?! Apenas, por falta de vontade das entidades oficiais que tal poderiam despoletar. Não se julgue que os dirigentes que geriam a modalidade não “lutavam” insistentemente pela sua criação!

Começamos por referir um ofício de 1970 (nº 2025/E/69-70 de 20.4.70) da Comissão Instaladora da Associação de Desportos de Aveiro, dirigido à Federação Portuguesa de Atletismo, onde se dizia:

«Encontramo-nos quase impossibilitados em organizar as restantes provas do calendário federativo, por falta de pista, visto que a existente no nosso distrito, pertence a um clube filiado na Associação Portuense de Atletismo, a Associação Desportiva Sanjoanense, a qual nos informou telefonicamente que só a poderiam ceder, desde que não esteja ocupada por competições organizadas pela FNAT ou Mocidade Portuguesa.»

Esta informação era de difícil percepção, mas era o que havia...

Em Novembro de 1971 realizou-se na cidade de Aveiro o “Colóquio Aveiro--Rumo ao futuro” (in “Fomento da Educação Física e do Desporto em Aveiro). Do respectivo relatório, datado de 29 de Novembro, retirámos:

A páginas 8 do cap. III – Infra estruturas

A – Instalações

3. – Principais necessidades

        3.2.2 – Não existe uma pista de atletismo, nem caixas de saltos, nem locais para lançamentos.

Modalidade básica como é, o atletismo não pode progredir em Aveiro, sem esta falha ser preenchida; e é pena, porque (...) há entusiasmo e apreciável número de praticantes.

A páginas 18 do cap. III – Fomento Desportivo

F – Instalações

 ... Para a prática do atletismo urge criar-se uma pista com um mínimo de  condições.

A páginas 30 e 31 do cap. V – O desporto em Aveiro

2 – Na actualidade, em Aveiro

        2.3 – o desporto federado

c) no atletismo (...) o número de praticantes vai aumentando mas, para já, e em parte por carência de instalações (...) e de material (...), o nível técnico é baixo.

3 – Instalações : dá-se aqui como reproduzido o mencionado no cap. II,

      ...recorda-se que as necessidades mais prementes são a pista de atletismo (...)  cuja construção é imperiosa.

4 – Apetrechamento : o material mais instante, (...) é o do atletismo (...)

Em Agosto de 1972, alertava-se, uma vez mais, a Federação (ofício 1317/71/72 de 2.8.72) para as dificuldades da utilização da pista de S. João da Madeira, pelas razões atrás apontadas, e solicitando “os melhores ofícios no sentido de que seja o distrito de Aveiro olhado com o respeito que o seu potencial desportivo justifica, e que a modalidade impar que é o atletismo possa aqui dispor de pistas que o entusiasmo duma juventude, seduzida pela prática, justifica plenamente”. A resposta da Federação seria a de que estariam cientes do problema mas que “até à data ainda nada se conseguiu resolver, o que não impede que continuemos tentando a solução para o problema”.

Em Novembro de 1973, por ofício 659/73-74 de 19.11.973, a Associação de Desportos de Aveiro dava conta à Federação das actividades da época de 1972/73, manifestando “fomos impedidos de ir mais além... como ainda, ponto fundamental, (desnecessário talvez por demais repetido) pela falta de uma pista apropriada na cidade de Aveiro”. E mais adiante salientava: ... infelizmente, e contra nossa vontade, fomos obrigados a realizar ali mais algumas (provas), como certamente já tiveram ocasião de observar, pela impossibilidade de utilização da pista de S. João da Madeira”. O “ali” referia-se a uma “improvisada pista que o Grupo Desportivo da Gafanha arranjou à volta do seu campo de futebol em 1972”.

Salientava-se ainda que havia clubes que cresciam em actividade porque tinham possibilidade de improvisar pista rudimentar à volta dos seus campos de futebol (Ovarense, Gafanha, Estarreja), enquanto os clubes de Aveiro (Beira-Mar, Galitos) se “afundavam” lentamente, porque o mesmo não era possível na cidade.

Dos relatórios anuais da Federação Portuguesa de Atletismo respigámos:

«1973 – Conjugando esforços com as respectivas Câmaras Municipais a Federação pugnou pela construção de pistas em Aveiro... e na altura em que foi consultada sobre a localização preferencial de cinco novas pistas a construir, indicou as seguintes cidades: Aveiro,...

1974 – Em compensação não se conseguiu que a Direcção Geral (de Desportos) concretizasse a construção de qualquer das cinco pistas previstas (Aveiro,...)

...Caiu tudo pela base.»

Por aqui se vê que o organismo máximo da modalidade estava de igual modo atento e também lutava pela causa, mas se manifestava impotente para uma resolução breve e adequada do problema.

Entretanto, nos finais de 1973, aparece a hipótese “pista em Oliveirinha”. Sempre ficava a mais curta distância do que S. João da Madeira. E, pelo que adiante se pode verificar, as condições de utilização seriam bem diferentes e mais adequadas às realidades e interesses da Associação de Desportos.

Depois de conversas iniciais com a presidência da Junta de Freguesia de Oliveirinha, em inícios do ano de 1974 tem lugar uma reunião na Câmara Municipal de Aveiro, conjunta com a Junta de Freguesia e a Associação de Desportos, em que ficaram definidos os parâmetros de utilização de uma futura pista a construir à volta do campo de futebol da referida freguesia.

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Fac-símile da primeira página do memorando da acta da reunião.

Da acta desta reunião destacamos:

A Junta de Freguesia de Oliveirinha consente na construção de uma pista de atletismo, em terrenos que lhe pertencem

 Admite que a administração da pista fique a cargo da Associação de Desportos

A Junta admite que, durante a época da realização dos campeonatos de atletismo, e para a realização desses campeonatos, não só a pista, como o campo de futebol e os balneários sejam utilizados unicamente pela Associação de Desportos aos sábados de tarde e aos domingos de manhã

A conservação do estado da pista ficará a cargo da Associação...

Todas as despesas a efectuar com a realização dos campeonatos de atletismo ficarão a cargo da Associação de Desportos

Pela utilização do campo e dos balneários, quer para treinos, quer para realização dos campeonatos, deseja a Junta de Freguesia vir a receber uma taxa mensal ou anual...

A Junta de Freguesia admite que as condições a estabelecer quanto à utilização de todo o recinto desportivo, por parte da Associação de Desportos, se reportem a um período de vários anos, prorrogável nas mesmas condições...

Como se verifica por este memorando, as condições seriam bem diferentes, para melhor, das que vigoravam até então para a pista de S. João da Madeira. Assim a pista se viesse a construir com prontidão...

A pretensão para a construção da pista, de acordo com o estabelecido entre a Associação de Desportos e a Junta de Freguesia de Oliveirinha, com intervenção da Câmara Municipal de Aveiro, foi objecto do ofício 1256/73-74 de 22 de Fevereiro de 1974, enviado à Direcção-Geral de Educação Física e Desportos.

A Federação naturalmente via com bons olhos esta “abertura” e comunicava em ofício de 14 de Março de 1974 que  “... podemos informar de que o assunto da construção da pista em Oliveirinha está a ser tratado com muito interesse pela Direcção-Geral de Desportos”.

E assim foi efectivamente. A resposta da Direcção-Geral de Desportos não demorou desta feita ( e se calhar só porque havia a oferta de terreno para a construção),  e depois de o professor António Vilela, na sua informação nº 17/74/DEFE, de 8 de Março, propor:

« – Que se aceite como definitiva a construção de uma pista em Oliveirinha para servir o distrito de Aveiro.

   Que seja atribuída a verba projectada para as pistas programadas.»

E o arquitecto Serra e Moura, com a sua informação nº 332/74, de 20 de Março, também afirmar que:

«Assim, julga-se portanto de aproveitar a oportunidade apresentada pela Junta de Freguesia de Oliveirinha que oferece o terreno necessário para a construção de uma pista de atletismo.»

Viria enfim o despacho favorável em 6 de Junho de 1974.

Mas até à construção se realizar...

Em 1979, cinco anos depois, quando fui “obrigado” a deixar a Associação, ainda estava nas ideias...

A pista de Oliveirinha viria enfim a ser inaugurada em 28 de Junho de 1981. O presidente da Câmara de Aveiro, Dr. Girão Pereira, secundado pelo presidente da Junta de Oliveirinha, deu “tiro de partida” à tão desejada pista. Das suas palavras de ocasião sublinhou o esforço de todos quantos colaboraram na realização, ao longo de alguns anos, para que se pudesse assistir a esse acto.

Vista aérea da pista de Oliveirinha, em 1981

Houve naturalmente atletismo neste dia de inauguração, com cerca de 250 atletas na pista, de clubes como Benfica, Belenenses, Porto, CAP, ACM, Académica, Santa Clara, alguns clubes da Guarda e dos clubes representativos de Aveiro. Pretendeu a Associação de Atletismo trazer alguns atletas do país vizinho, tendo para tal convidado o Celta de Vigo e a Federação Salamantina de Atletismo, mas, pelos vistos, os atletas espanhóis não estariam disponíveis para estar presentes.

Dois factos negativos desde logo a assinalar: a primeira, ter a pista ficado defeituosa, pois em vez de ter 400 metros no seu perímetro à corda, ter apenas 399, o que impossibilitava a obtenção de recordes oficiais e, a segunda, o início prematuro de uma deficiente manutenção, pois passados seis meses , mais precisamente em 19 de Dezembro desse ano, em entrevista ao Jornal de Notícias, os dirigentes da Associação alertarem para o facto de «haver notícias da realização de corridas de motorizadas e que até já se tinham visto animais a pastar à volta da pista».

E, enquanto a construção não teve lugar, a Associação foi obrigada a utilizar o que havia, mesmo deficiente. Para agravar ainda mais os custos de campeonatos e outras provas em S. João da Madeira, a Sanjoanense, proprietária do estádio onde a pista estava instalada, entendeu, no início da época de pista de 1975, aumentar a verba que cobrava por cada sessão de atletismo em 54% (?!), passando de 650 da época anterior para 1000 escudos.

Embora bastante rudimentar, mas muito mais perto e com verba de utilização mais ligeira, o que trazia vantagens para o equilíbrio do orçamento da Associação, esta viu-se obrigada a utilizar para algumas sessões a que o Grupo Desportivo da Gafanha “atamancara” à volta do seu campo de futebol em 1972 e com 4 corredores apenas. Claro que os resultados aqui obtidos não eram famosos... Os clubes ansiavam naturalmente por uma pista “decente”.


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