Destas partes do edifício pertencem umas à Administração do Palácio (vão
marcadas com a letra P) e as outras estão na posse da Escola Prática de
Infantaria (indicam-nas a letra M).
Para uma visita apropriada, reunimo-las em dois grupos: o 1.º, à
volta do Corredor das Aulas, composto pelo Refeitório (P), Lavabo e
Cozinhas (M), Capela Real (M), Capela do Campo Santo (P), Enfermaria dos
Frades (M), Sala dos Actos e Sala do Capítulo (M); o 2.º, na parte
conventual, dependente da E. P. Infantaria, constituído pela Portaria-mor, Escadaria dupla, Salão das Colunas, Capela dos 7 altares e
Jardim do Buxo.
Pela porta principal direita do palácio,
através do claustro, facilmente
se chega ao
Corredor das Aulas, iluminado por largas janelas e com 186 m
de comprimento. A meio, da parte do nascente, fica a porta da clausura
ou de comunicação com o convento; do poente partem duas largas
escadarias, abertas por arcos plenos, adornados no intradorso com casetões esculpidos.
O comprido
salão do Refeitório mede 48,40
m por 9,20.
Contém 36 mesas de jacarandá; a meio das paredes sobressaem dois
púlpitos, que serviam para as leituras religiosas durante os
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repastos. No topo esquerdo fixa-se uma Ceia de Quillard, emoldurada em
mármore azul, cuja sujidade é deplorável. Vários mármores formam o
pavimento. Serve-lhe de cobertura uma abóbada simples de tijolo. No
salão contíguo, em passeios de vaivém, faziam os frades a digestão das
pitanças. Comunica pela porta ministra com as vastas
Cozinhas, que medem
20,60 por 10,30 m. Apoiam-se as abóbadas de tijolo em dois arcos torais,
assentes em robustos pilares; grossas pilastras aguentam os arcos formalotes.
As paredes são azulejadas de branco. Agora só contêm duas grandes
chaminés e um engenho de levantar os caldeirões.
Limpavam-se os frades no
Lavabo antes das refeições. É uma bonita sala
oitavada, de pavimento marmóreo, com quatro lavatórios abrigados por
arcos, nos cantos. Pilares piramidais sustentam as bacias; urnas
de mármore servem de reservatórios.
A
Capela do Campo Santo fica no claustro do norte, que serviu de
cemitério. Há no seu ambiente a tristeza confrangedora das funções
funerárias, para as quais lhe deram disposição apropriada: altar posto a
meio duma parede lateral, fronteiro à porta, de modo que os frades
rodeassem a eça. Abóbada de tijolos, apoiada em arcos torais; chão de
mármores. No retábulo, com
colunas compósitas de mármore preto, monolíticas, e frontão triangular
denticulado, com serafins no tímpano, figura uma ceia de Quillard, de
belo colorido. Ao lado uma excelente bancada de pau brasileiro(1).
No 3.º andar está a
Capela Real
– quadra vasta, bem iluminada, com
abóbada, sustentada por pilastras, e chão de tijolos. Guarnecem-na
lâminas de mármore. Compõem o retábulo duas
colunas e frontão circular denticulado, de mármore, com o painel
da Conceição. Circunda o altar um balcão balaustrada e ladeiam-no
duas portas com frontões exuberantemente esculpidos nos tímpanos. Por
baixo, no 2.º andar, fica a
Enfermaria dos Frades,
que serve agora de caserna. É um grande salão abobadado e dividido em
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celas azulejadas, tendo cada uma nas paredes dois interessantes quadros
de azulejos (Cristo e a Virgem); no fundo, um altar e duas portas
correspondentes aos da Capela Real.
A
Sala dos Actos está aproveitada para tribunal,
apesar do seu defeito
acústico. Abóbada de tijolo e chão de mármore. Às paredes encostam-se os
doutorais, de pau brasileiro, resguardados por balaustradas de mármore,
sobre os quais avançam duas tribunas da família real. Ocupa a testeira
superior uma inscrição latina, gravada em mármore, e a inferior um
quadro de Sebastião Conca, rematado por frontão triangular e bem
conservado. Embora algo estudado, constitui uma boa obra, de vivo
colorido. Representa a Virgem da Conceição.
Achegada ao claustro do sul encontra-se a
Sala do Capítulo, na qual,
agora, os oficiais executam o tirocínio de esgrima. Mede 26,50 m por 7 e
13,6 de alto, em planta elíptica. Mármores dispostos geometricamente
cobrem-lhe o chão; tijolos, firmados por vários arcos, formam-lhe a
abóbada apainelada. Tem aspecto solene e frio, talvez pela sobriedade
ornamental, e distingue-a a particularidade acústica do eco(2).
Rasgam-na janelas elípticas e rectangulares, a grande altura, separadas
por pilastras de capitéis glifados, que sustentam o entablamento. Sobre
a porta avulta uma tribuna balaustrada, de mármore, na qual o rei
assistia ao Lava-pés de 5.ª feira santa, para cuja função a meio da sala
se armava um altar.
– ● –
Na frontaria do sul abre-se o portal da
portaria-mor do convento(3).
Quer esta fachada quer a do norte, com a extensão de 205 metros, a
partir dos torreões, são, na verdade, monótonas e
pesadas. Ambas à distância de 45 m dos torreões, quando começam
a pertencer ao convento(4), reentram uns 7,80 m. Abrangem quatro
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andares e mezzaninos, rematados por áticos, podendo considerar-se em
cada uma três corpos separados por pilastras, dos quais os centrais
sobressaem um tanto. Todos são cortados simetricamente por janelas, mas
destas só as do meio e do 3.º andar ostentam frontões.
De 203 m é o comprimento da frontaria do nascente ou da
retaguarda, com
uma disposição igual à das outras, aparte ligeiras diferenças: 5
andares, cornijas sobre o 3.º e 5.º andares, ornatos em janelas e
varandas balaustradas.
Três portas, separadas por pilastras, a meio com frontão triangular,
facultam ingresso na portaria-mor, através dum vestíbulo e corredor;
neste ergue-se um portal ornado com belo medalhão de jaspe esculpido em
relevo com as figuras da Virgem, o Menino
e Santo António. Ampla quadra rectangular forma a portaria, com
abóbada de tijolo e pavimento de mármores; telas religiosas, emolduradas
em mármore azul, de pouco valor artístico guarnecem-lhe as paredes, às
quais se encostam bancos de espaldar, feitos de angelim. Tem as portas
emolduradas em mármore e sobrepujadas por frontões triangulares(5).
Iluminam-na excelentes lampiões de latão, que abundam nos corredores e
salas do convento. Chamavam-se clementinas por se acenderem às
Ave-Marias, na 2.ª Prima, por ordem de Clemente VIII(6).
Em qualquer parte seria notável a
Escadaria
Dupla, a principal do convento, anexa à portaria-mor, pelo engenho e primor da construção.
Ergue-se numa secção quadrada e apoiada em pilastras com nove degraus
em cada lanço, tudo de mármore, inclusas as balaustradas. Como os lanços
são opostos e comuns os patamares, nestes sempre se encontram duas pessoas que os subam,
embora partindo de dois pontos fronteiros. Foi seu construtor o
engenheiro Custódio Vieira.(7)
Serve de refeitório dos soldados a
Capela dos 7 altares, quadra singela,
com abóbada de tijolo firmada por arcos torais, no
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centro erguida em cúpula. O coro alto, aberto em três arcos de balcões
balaustrados, apoia-se em pilastras.
Sob a Biblioteca fica a
Sala das Colunas, onde funciona a aula de
artilharia. É quase quadrada. Arcos aviajados ou carpaneis, assentes em
quatro colunas toscanas, monolíticas, dividem-lhe a abóbada de tijolo.
O Jardim de Buxo ocupa o centro da parte conventual, numa área de
3.630m2, pois tem 60,5 m por cada lado. Constituem-no, à volta duma taça-lago
de mármore com repuxo, quatro grandes maciços de buxo, divididos em
labirinto e cortados por quatro ruas em cruz e outras quatro em
diagonal; a meio destas assentam taças de mármore em
concha(8). Eis pois, o
tipo dos jardins de Le Nôtre. De rocha era este local,
o que obrigou a destruí-lo em profundidade de muitos palmos e a
preenchê-lo, depois, com terra lavradia(9).
Na horta dispunham os frades dum sadio recreio
– o jogo da bóia, lugar
solitário e agradável, rodeado de bancos. A horta incorporava-se na
cerca – terreno todo murado, com ruas de buxo e copiosas árvores
florestais e frutíferas, actualmente ajardinado em parte.
Para recreio venatório do rei e da corte servia a Tapada, um vastíssimo
terreno de vinte kms de perímetro, em forma de polígono irregular,
vedado por altos muros, com abundância de águas e sítios encantadores,
de aprazível amenidade, tais os ditos do Barracão, do Casal do Abade,
das Águas Férreas, da Bica do Espaldão, das Lagoas(10) e do Celebredo(11).
Constava de três partes – a de dentro, a do meio e a de fora, separadas
por muros baixos. Largos e bons caminhos cortavam-na em todos os
sentidos; taças de água espalhadas profusamente
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– veados, corças, javalis e raposas. Seis
largas portas lhe davam saída – a de Mafra(12), da Paz, do Codeçal, do
Gradil, da Murgueira e da Vermelha. No ponto mais alto, de belo
panorama, fica a Carreira de Tiro da Escola Prática de Infantaria. Hoje está
lamentavelmente abandonada e danificada.
Em 1840 nela estabeleceu D. Fernando uma granja-modelo, monumento
modesto da ideia progressiva da actualidade, como ajuizou Herculano.
Moveu o rei o empenho de aproveitar esses maninhos, que o dito escritor
fartamente louvou(13). Parte da cultura era feita pela Casa Real, por
lavradores a outra, com terrenos cedidos. Afinal, malograram-se todos os
esforços gastos nessa obra, com grossas culpas do Depósito de Remonta. E
a tapada que podia ser uma excelente escola de agricultura voltou à
primitiva forma de terra maninha. Até quando?
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