In: João Lopes, 2001 Uma Odisseia no Espaço, Nº 5, Algueirão, Secretaria de Estado da Reforma Educativa, M. E., SD, 24 pp.

2001 Uma Odisseia no Espaço

Texto de João Lopes

Brochura acerca do filme «2001 Odisseia no Espaço» - Dim. 21x14,5 cm - Clicar para ampliar.

   Ficha Técnica
    O Filme

    Sinopse

   O cinema face ao infinito

    Os actores e os técnicos

    Questões interdisciplinares

   Stanley Kubrick - Biofilmografia

    Filmografia

    Sobre o filme e sobre Stanley Kubrick

   Stanley Kubrick - Bibliografia

    2001 Uma Odisseia no Espaço - Bibliografia

    Videografia

    Filmatologia complementar

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2001 Uma Odisseia no Espaço

O filme


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Titulo original:
2.001: A Space Odyssey. Produção: Metro Goldwyn Mayer. Produtor: Stanley Kubrick. Produtor associado: Victor Lyndon. Argumento: Stanley Kubrick e Arthur C. Clarke, segundo o conto «The Sentinel», de Arthur C. Clarke. Fotografia (Technicolor e Metrocolor): Geoffrey Unsworth. Direcção artística: John Hoesli. Designers: Tony Masters, Harry Lange e Ernest Archer. Montagem: Ray Lovejoy. Música: «Gayane Ballet Suite», de Aram lIich Khatchatourian; «Atmosferas», «Lux Aeterna» e «Requiem», de Gyorgy Ligeti; «Danúbio Azul», de Johann Strauss; «Assim Falava Zaratustra», de Richard Strauss. Som: A. W. Watkins. Guarda-roupa: Hardy Amies. Caracterização: Stuart Freeborn. Efeitos especiais visuais: Stanley Kubrick, Wally Veevers, Douglas Trumbull, Con Pederson, Tom Howard, Colin J. Cantwell, Bryan Loftus, Frederick Martin, Bruce Logan, David Osborne e John Jack Malick. Interpretação: Keir Dullea (David Bowman), Gary Lockwood (Frank Poole), William Sylvester (dr. Heywood Floyd), Leonard Rossiter (Smyslov), Maragaret Tyzack (Elena), Robert Beatty (Halvorsen), Daniel Richter (observador na lua), Sean Sullivan (Michaels), Frank Miller (controlador da missão), Penny Brahms (Hospedeira), Alan Gifford (pai de Frank), Vivian Kubrick (filha do dr. Floyd), Douglas Rain (voz de HAL 9.000). Duração: 141 minutos.
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Sinopse
 


1. O alvor da humanidade. A terra é uma imensidão de paisagens desertas onde alguns animais lutam pela sobrevivência. Um grupo de macacos instala-se junto a uma nascente de água. Face à ameaça de um grupo rival, travam-se combates violentos pela posse do local. Pela primeira vez, surge um objecto estranho: um enorme monolito negro.


2. Passam-se milhões de anos. Nos finais do século XX, o dr. Heywood Floyd, um cientista americano, desloca-se à lua. Motivo da sua viagem: observar e investigar um misterioso monolito negro de origem desconhecida. O monolito emite sinais que parecem dirigir-se para Júpiter.

3. Missão Júpiter, dezoito meses mais tarde. A nave espacial «Discovery» dirige-se a Júpiter. A bordo, vão os astronautas David Bowman e Frank Poole, mais três cosmonautas cujos corpos são conservados em hibernação. No controle da nave está HAL 9.000, o mais avançado computador jamais criado. Quando HAL anuncia ter descoberto uma avaria numa antena exterior, Frank sai da nave para averiguar o que se passa; descobre que a informação é falsa, mas HAL já não lhe permite regressar: abandona-o no espaço, ao mesmo tempo que desliga os circuitos vitais dos cosmonautas em hibernação. David, incapaz de salvar Frank, consegue vencer a oposição de HAL, reentra na nave e toma uma decisão drástica: desligar os circuitos de HAL.

4. Júpiter e, mais além, o infinito. David prossegue a viagem, enquanto o monolito reaparece. Está, agora, num outro espaço/tempo. Envelhece rapidamente, renascendo como um feto humano, gravitando em torno da Terra.
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O cinema face ao infinito


Quando surgiu, em 1968, 2.001: Uma Odisseia no Espaço provocou um impacto muito especial. No interior da indústria americana, os tempos eram ainda de readaptação a um contexto cujas principais coordenadas se tinham cimentado a partir de finais da década de 50. Nesse contexto, dois factores tinham desempenhado um papel decisivo: em primeiro lugar, a crescente concorrência da televisão; depois, o fim do cinema de raiz clássica, dos seus géneros tradicionais «western», musical, etc.) e também da sua organização estável em torno dos grandes estúdios (as chamadas «majors»).


2.001 emergiu, assim, num espaço de produção em que o cinema americano procurava, por um lado, garantir a permanência dos grandes valores de espectáculo e, por outro lado, diversificar (internacionalizando) as suas formas de produção. As chamadas «superproduções» – filmes de grande orçamento quase sempre rodados fora dos EUA, nomeadamente na Europa – tinham sido, até então, o símbolo exemplar desse processo. Basta recordar os filmes então rodados por David Lean, um dos maiores especialistas nessa área: A Ponte do Rio Kwai (1957), Lawrence da Arábia (1962) e Doutor Jivago (1965).

Ora, ao produzir e realizar 2.001, Stanley Kubrick terá, antes de mais, prolongado a lógica desse cinema empenhado em não perder a sua posição dominante na frente do grande espectáculo. Este é, na verdade, um filme que começa por se distinguir pelo seu sofisticado trabalho de estúdio, sendo também um filme totalmente rodado na Grã-Bretanha (onde, aliás, Kubrick reside desde 1960, depois de ter terminado Spartacus).

A singularidade dos resultados começa, talvez, no facto de 2.001 se apresentar, de imediato, como um filme filiável no género de ficção científica (recorde-se que o seu ponto de partida é um conto de Arthur C. Clarke, sem dúvida um dos autores mais populares nesse campo). De facto, a ficção científica estava muito longe de corresponder a uma qualquer moda do cinema dos finais dos anos 60 (como viria a acontecer durante grande parte da década de 80). Para se ter uma ideia da solidão do filme na indústria / 6 / americana da altura, bastará recordar que, entre os títulos mais populares de 1968, figuravam, entre outros, um drama musical (Oliver!, de Carol Reed), um filme de terror (A Semente do Diabo / Rosemary's Baby, de Roman Polanski), um espectáculo de reconstituição histórica (O Leão no Inverno / A Lion in Winter, de Anthony Harvey) e o musical que impôs Barbara Streisand (Funny Girl, de William Wyler).

Esta «inadequação» de 2.001 às regras temáticas então dominantes na indústria pode servir de sintoma de um valor central no trabalho de Kubrick, quer no interior dos seus filmes, quer na sua atitude como criador: esse valor é o individualismo.

Não que Kubrick se desinteresse pelos modelos sociais ou pelos acontecimentos da história colectiva. Basta recordar o filme que ele assinara antes de 2.001: Dr. Estranhoamor (1963), o célebre Dr. Strangelove, sem dúvida uma das mais incisivas e perturbantes sátiras que já se fizeram sobre o apocalipse nuclear e, precisamente, sobre os papéis individuais no interior dessa inquietante hipótese.

Mas, para ele, o mais essencial acaba por ser sempre aquilo que, em determinada conjuntura histórica, coloca o indivíduo em posição de crise: qual é a sua identidade? – eis a pergunta que o cinema de Kubrick incessantemente repete. No caso de 2.001, essa pergunta transforma-se numa interrogação de prospectiva científica e também de especulação filosófica: face às espectaculares evoluções tecnológicas previstas pelo filme (e não só) para o final do nosso século, trata-se de saber o que é/será o homem, que é como quem diz, qual a identidade humana num tempo tão marcado por tantas e tão enigmáticas transformações das condições de existência?

2.001 não é, no entanto, um tradicional filme de ficção científica, quer dizer, não se trata apenas de uma história mais ou menos insólita projectada num futuro desconhecido, eventualmente exótico. Basta recordar que 2.001 se encontra claramente dividido em quatro capítulos, decorrendo o primeiro nos tempos mais remotos da humanidade. Trata-se mesmo de um segmento da narrativa cuja acção é anterior à definição do ser humano: chama-se «O alvor da humanidade» e tem como principais protagonistas um grupo de gigantescos macacos.

Não que Kubrick se limite a chamar a atenção para a linha evolutiva da própria humanidade. Se ele vai buscar personagens de símios, é também – é mesmo sobretudo – para sublinhar uma decisiva continuidade. Assim, para além das óbvias diferenças entre o comportamento dos macacos, o início, e, depois, o dos astronautas que, às portas do século XXI, viajam em direcção a Júpiter, o que o interessa é a persistência de determinados temas: a luta pela sobrevivência, a formação de grupos, a instalação de certas formas de poder e, finalmente, a capacidade (revelada por símios e humanos) de inventar e utilizar instrumentos, isto é, utensílios que, de uma forma ou de outra, actuam sobre o mundo, transferindo-o.
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E destaca-se um momento admirável que resume a energia do trabalho de Kubrick: é a tantas vezes citada ligação entre o primeiro e o segundo capítulo do filme, entre o mundo pré-histórico dos macacos e o universo futurista da viagem a Júpiter. Do primeiro cenário, temos a imagem do osso que o macaco brame, osso que já deixou de ser um simples resto da alimentação, para se transformar numa arma e também num símbolo de poder; imediatamente a seguir, surge a longa nave que atravessa a imensidão do cosmos, em direcção ao planeta dos anéis.

Há um espantoso efeito nessa ligação, que é um efeito de semelhança: a forma pontiaguda do osso parece duplicar-se na linha recta da nave espacial, como se o cineasta nos quisesse dizer que as mesmas formas se repetem incessantemente, mesmo nos contextos históricos mais estranhos e distantes. Mais ainda: o efeito de aproximação dos dois momentos, separados por qualquer coisa como quatro milhões de anos, é completado pela presença de um mesmo objecto. Esse objecto é o misterioso monolito negro que aparece várias vezes ao longo do filme e que tantas especulações levantou sobre o seu verdadeiro significado. O mais importante talvez seja, afinal, o seu carácter indecifrável. Podendo suscitar as mais variadas interpretações (a bem dizer, tantas quantas os espectadores do filme) o monolito acaba por permanecer ao longo de 2.001 como expressão do próprio carácter infinito de qualquer processo de conhecimento – sejam quais forem os instrumentos e os objectivos desse conhecimento, há sempre uma margem de desconhecimento que persiste para além de todos os esforços da mente e do corpo humano. Talvez que uma das mensagens mais fortes de 2.001 seja essa: a certeza de que, para além de qualquer fronteira vencida (desde o domínio da natureza à exploração dos outros planetas), o homem encontrará sempre uma nova fronteira para explorar e, ao mesmo tempo, para repensar a sua identidade.

Nesta perspectiva, o trabalho de Kubrick reencontra um dos valores mais típicos do universo da ficção científica: é a ideia de que, através das narrativas (e, neste caso, através dos meios do cinema), o homem se pode confrontar com os enigmas do futuro. Não estamos, no entanto, perante uma ficção científica que represente o futuro recorrendo à combinação fantástica e fantasiosa de elementos cenográficos (como aconteceu, por exemplo, num dos filmes mais populares dos anos 80 nessa área: Blade Runner, de Ridley Scott). Um pouco ao contrário, Kubrick insistiu em utilizar, para a concepção das naves espaciais e dos ambientes do futuro, previsões tão rigorosas quanto possível sobre a evolução das técnicas e dos objectos. O cineasta chegou ao ponto de recorrer à NASA (o organismo americano directamente responsável pelas viagens espaciais), tendo assegurado a colaboração de vários dos seus cientistas como conselheiros para os cenários do futuro.



 

Quer isto dizer que 2.001 se joga num duplo plano: por um lado, uma sensação de intimidade em relação aos mais diversos aspectos da acção (recorde-se, por exemplo, a tradicional mensagem / 8 / de parabéns que um dos astronautas recebe através de sofisticados meios de comunicação); por outro lado, um efeito de constante estranheza – das máquinas, dos comportamentos, das formas de decisão – que nos garante que mesmo as mais ousadas especulações que nos permitem antever todos os desafios que o futuro encerra.

O símbolo perfeito dessa dualidade que marca todo o filme acaba por ser aquela que é a personagem mais intrigante de 2.001: o HAL 9.000, ou apenas HAL para os amigos, o espantoso computador de bordo que coordena a trajectória da nave e, mais do que isso, acompanha os astronautas nas mais diversas actividades (desde a discussão dos problemas da viagem até uma boa partida de xadrez). HAL é, no filme, muito mais do que uma curiosidade electrónica. Através da sua presença, Kubrick consegue encenar de forma fascinante uma questão que, nas últimas décadas, não tem deixado de marcar todos os aspectos da vida humana: o poder da máquina face ao poder do homem, ou ainda, a possibilidade de, em determinadas situações, a sofisticação da máquina chegar ao ponto de superar a vontade do homem.

Não admira que, no seu capítulo final – «Júpiter e, mais além, o infinito» – 2.001 se abra totalmente para o desconhecido. Através da experiência quase psicadélica de luzes e sons do seu astronauta, Kubrick filma um mundo em que as referências históricas se baralham (um dos cenários desse capítulo é uma sala decorada à maneira do século XVIII). Ao mesmo tempo, é como se tudo voltasse ao princípio: o bebé que voga no espaço é uma imagem que nos devolve à origem das nossas próprias interrogações. No desenvolvimento da conquista do espaço, Stanley Kubrick redescobria, afinal, o princípio de uma nova idade do homem e, de alguma maneira, o seu renascimento. Fê-lo, devolvendo ao cinema a sua mais funda e mais primitiva magia.
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Os actores e os técnicos


 

Um dos aspectos mais curiosos e talvez mesmo mais desconcertantes de 2.001: Uma Odisseia no Espaço é a ausência de grandes vedetas na sua ficha artística. Keir Dullea e Gary Lockwood, os intérpretes das personagens mais marcantes (os dois astronautas da nave «Discovery»), apesar de profissionais como evidentes qualidades, não eram na altura, nem foram depois, nomes muito conhecidos do grande público. Entre os filmes mais significativos em que participaram destacam-se: para o primeiro, David e Lisa (1963), de Frank Perry, drama com algum poder de inovação temática, e, para o segundo, Model Shop (1969), produção americana dirigida pelo francês Jacques Demy.

Desde Spartacus (1960), Kubrick não tinha, obviamente, dificuldades em garantir a participação nos seus filmes de actores de grande prestígio. Acontecera no filme anterior a 2.001, Dr. Estranhoamor (1963), onde Peter Sellers surge a interpretar três personagens, e aconteceria em filmes posteriores, com destaque para a composição de Jack Nicholson, em Shining (1980). Se Kubrick não tem vedetas em 2.001 é porque, claramente, não as quis. A presença de figuras não imediatamente reconhecíveis pelo espectador podia ajudá-lo, afinal, a provocar um efeito dramático importante: os acontecimentos narrados, mesmo os mais espectaculares ou indecifráveis, são acontecimentos vividos por homens como quaisquer outros num futuro que pode ser o de qualquer um de nós.

Daí a importância da técnica. E isto em dois planos. Desde logo, no plano estritamente narrativo: 2.001 é um filme sobre um mundo fortemente marcado pela evolução tecnológica e, mais do que isso, pela contaminação de todos os níveis da existência pela aplicação dos utensílios técnicos mais inovadores e inesperados. Depois, no plano da própria fabricação do filme: 2.001 é, ainda hoje, uma das maiores proezas técnicas de toda a história do cinema.
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Kubrick soube rodear-se de uma equipa de notáveis criadores que trabalharam ao longo de três anos para conseguir emprestar a 2.001 todo o seu impacto. Para se ter uma ideia da complexidade dos processos envolvidos, recorde-se apenas um pormenor: demoraram cerca de um ano os testes de película fotográfica que permitiriam filmar as cenas lunares sem que a sobreposição da paisagem de fundo ao céu fosse sensível (até aí, o estado das técnicas nesse campo implicava sempre que, através dos contornos dessa paisagem, se percebesse aquele efeito de sobreposição).

Entre os técnicos que trabalharam com Kubrick, é forçoso destacar o nome de Douglas Trumbull, sem dúvida um dos símbolos máximos no campo dos modernos efeitos especiais. Foi ele, por exemplo, quem teve uma influência decisiva na concepção global de um dos títulos mais populares da ficção científica dos anos 80: Blade Runner (1983), de Ridley Scott. E como a dimensão visual do cinema de Kubrick constitui sempre um factor importantíssimo, importa recordar, finalmente, a contribuição do director de fotografia Geoffrey Unsworth (1014-1978), mestre britânico com uma filmografia absolutamente excepcional; entre os filmes que fotografou nos derradeiros anos da sua vida, lembremos apenas dois dos mais conhecidos: Cabaret (1972), de Bob Fosse, e Um Crime no Expresso do Oriente (1974), de Sidney Lumet.
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Questões interdisciplinares


Para além das suas qualidades específicas, 2.001 é um filme com imensas potencialidades para um aproveitamento interdisciplinar. Em primeiro lugar, através das referências literárias que pode convocar, desde Arthur C. Clarke (autor da obra em que se inspira o seu argumento), até ao próprio género da ficção científica e, de um modo geral, à literatura fantástica.

Mas 2.001 é também uma história que reflecte um dos grandes temas do mundo contemporâneo, quer no campo prático, quer no domínio teórico ou mesmo na especulação filosófica: é o conflito homem/máquina, exemplarmente cristalizado nas relações que se estabelecem entre os astronautas e HAL, o computador da sua nave.


Poderá ser útil, nessa medida, confrontar 2.001 com outros filmes americanos que, de modo explícito ou não, sejam devedores das regras da ficção científica (ver videografia). Para além de 2.010: O Ano do Contacto, titulo de novo inspirado em Arthur C. Clarke que prossegue a história de 2.001, vale a pena destacar Jogos de Guerra, de novo um filme muito marcado pelos desafios do computador aos poderes do homem, embora com uma diferença importante: trata-se, neste caso, não de uma história projectada num futuro mais ou menos inventado, mas sim de uma aventura passada num contexto obviamente contemporâneo, nessa medida favorecendo uma identificação muito mais directa.

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Stanley Kubrick - Biofilmografia


Quando realizou 2.001: Uma Odisseia no Espaço (1968), Stanley Kubrick já tinha ultrapassado há muito a condição de desconhecido. Desde o seu trabalho na direcção de Spartacus (1960) – para o qual fora convidado por Kirk Douglas, actor e produtor do filme – Kubrick ganhou fama de bom director de grandes produções. É bem certo que essa imagem está longe de esgotar as suas qualidades. Seja como for, é um facto que ele é reconhecido no interior da indústria cinematográfica como alguém que não recua perante nenhuma dificuldade para, garantir a todos os aspectos dos seus filmes a máxima perfeição técnica de execução. Como é óbvio, esse objectivo é inseparável de um controle rigoroso da fabricação de cada filme, pelo que, desde Dr. Estranhoamor (1963), Kubrick passou a desempenhar também as funções de produtor dos seus próprios filmes.


Curiosamente, foi Spartacus que contribuiu para que Kubrick procurasse controlar a produção dos seus filmes. Insatisfeito com as alterações impostas pelo estúdio produtor (a Universal), Kubrick deixou mesmo os EUA, passando a viver na Grã-Bretanha. Aí veio a desenvolver a parte mais importante da sua obra.


Esta sua situação tem contribuído, por vezes, para que se julgue que Kubrick é um cineasta britânico. Na verdade, nasceu em Nova Iorque, em 1928. Os seus primeiros filmes foram feitos quase em regime amador, embora revelassem, desde logo, uma personalidade criativa original, de início muito marcada pela tradição do filme negro americano.


Se The Killing (1956) é graças ao apoio do produtor James B. Harris, um momento decisivo na sua revelação, seria com Spartatus que Kubrick ganharia o seu reconhecimento no interior da grande produção. Isto não sem ter dirigido antes aquele que é, ainda hoje, um dos mais enérgicos libelos contra a guerra que o cinema já produziu: Paths of Glory (1958), um filme que foi interdito em diversos países (a censura salazarista proibiu-o em Portugal, onde só viria a ser mostrado depois do 25 de Abril de 1974).
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Se é verdade que o cinema de Kubrick se distingue por uma espantosa invenção visual, não é menos verdade que ele se tornou famoso também pela minúcia dos argumentos dos seus filmes. Acompanha sempre a sua fase de preparação e, por vezes – como nos casos de Laranja Mecânica (1971) e Barry Lyndon (1975) –, assume por inteiro a respectiva escrita.


Pela obra de Kubrick passam as grandes interrogações do homem contemporâneo. 2.001 e Laranja Mecânica, para além das suas diferenças de tom e de estilo, são mesmo dois casos exemplares de um cinema que, ao projectar-se no futuro, recoloca a nossa actualidade perante as suas dúvidas e os seus medos mais profundos. Os títulos mais recentes da sua filmografia – Shining (1980) e Nascido Para Matar (1987) – são mesmo narrativas centradas sobre as manifestações do medo, tomando como ponto de partida duas referências com forte peso simbólico: a desagregação da família tradicional, no primeiro caso, e o envolvimento americano na guerra do Vietname, no segundo.


Michel Ciment, crítico francês e um dos mais importantes estudiosos da obra de Kubrick, terá resumido de forma exemplar a conjuntura sobre a qual o cineasta trabalha. Escrevendo a propósito de Shining, definiu assim a contradição que ele explora: «admitir a importância e a legitimidade dos instintos e do inconsciente e, no mesmo movimento, ver na razão a única saída para o homem e a humanidade.» Trata-se, segundo Ciment, de uma contradição «a que não é possível escapar.» Como ultrapassá-Ia? «Kubrick não conhece a resposta, mesmo se o artista que há nela parece tê-la encontrado: ele coloca a questão pelo exercício soberano de uma invenção de formas sempre renovada.» (in Kubrick. Calmann-Levy, Paris, 1980).


Como definir, então, o cinema do ponto de vista do próprio Kubrick? Talvez adoptando as suas próprias palavras, isto é, como «uma arte militar». Recordemos o seu ponto de vista: «Se Napoleão não tivesse atribuído suficiente importância aos mais pequenos detalhes das suas deslocações, de modo que as suas tropas fossem conduzidas à cidade prevista na data exacta, nunca teria tido ocasião de ser um génio no campo de batalha. Se não as tivesse conduzido todas as esse local, pouco teria importado que tivesse boas ideias ou não. É esse aspecto do cinema que pode ser uma limitação drástica quando não se controla a logística. Penso que, para Napoleão, as batalhas eram como a rodagem de um filme e que ele se cansou do lado administrativo! Deve-se ter dado conta de que era um dos maiores génios militares de todos os tempos e deve ter sempre sentido uma atracção irresistível pela guerra: isso era a rodagem. Mas, além disso, havia a pré-produção, a pós-produção, e isso cansou-o!


Antes do seu primeiro exílio, teve numerosas ocasiões para fazer compromissos, ocasiões que não utilizou. Ia ganhando as pequenas batalhas, não podia acreditar que as coisas não continuariam dessa maneira, e acabou por se exceder. Veio toda a campanha da Rússia e foi a sua grande loucura, o filme de / 16 / sessenta milhões de dólares que não era possível caber no seu orçamento!» (entrevista com M. Ciment, idem).


Kubrick: um Napoleão moderno? Mesmo sem esquecer que nenhuma campanha, ou melhor, nenhum filme foi a sua "Rússia», uma coisa é certa: filmar a vida de Napoleão foi, durante alguns anos, um projecto adiado de Kubrick. Podemos admitir que ainda é.


Filmografia
 


Curtas-metragens:
1951 – Day of The Fight;
1951 – Flying Padre;
 

Longas- metragens_
1953 – Fear And Desire;
1955 – Killer's Kiss;
1956 – The Killing;
1958 – Paths of Glory;
1960  – Spartacus / Spartacus;
1962 – Lolita / Lolita;
1962 – Dr. Strangelove: Or, How I Learned To Stop Worrying And Love The Bomb / Dr Estranhoamor;

1968 – 2.001: A Space Odyssey / 2.001: Uma Odisseia No Espaço;
1971 – A Clockwork Orange / Laranja Mecânica;
1975 – Barry Lyndon / Barry Lyndon;
1980 – The Shining / Shining;
1987 – Full Metal Jacket / Nascido Para Matar;

1999 – De Olhos Bem Fechados;
(Os filmes com Indicação de título português foram estreados, entre nós, no circuito comercial)
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Sobre o filme e sobre Stanley Kubrick


«Em 2.001, Kubrick contempla a desumanização do homem no interior de um universo esplendor visual – exprime-o tão claramente quanto o seu desenvolvimento temático (...) Parece não haver acordo sobre aquilo que o fim de 2.001 realmente significa, mas as suas componentes principais são suficientemente claras: o homem, guiado pelo misterioso monolito (...) alcança uma certa forma de renascimento (como espírito universal?»
Robin Wood – (In: Cinema – A CríticaI Dictionary, Secker & Warburg, Londres, 1980)


«Cada homem vivo transporta o peso de trinta fantasmas, pois é nesta proporção que o número de mortos excede o dos vivos, Desde o início dos tempos, cerca de cem biliões de seres humanos caminharam sobre o planeta Terra. Ora, este é um número interessante, pois, por coincidência, há aproximadamente cem biliões de estrelas no nosso universo, a Via Láctea, Portanto, por cada homem que alguma vez viveu, brilha uma estrela neste Universo.»
Arthur C. Clarke – (prólogo a 2001, Odisseia no Espaço. Publicações Europa-América, Lisboa)


«A estratégia formal de Kubrick – que compreende todos os elementos da sua concepção do cinema (...) – consiste em criar momentos de uma estranheza absoluta, que produzem o choque de uma percepção sem precedentes.»
Bill Krohn – (da critica a "FuIl Metal Jacket", in "Cahiers du Clnéma, nº 400, Outubro 1987)


«O que é apaixonante é que Kubrick está sempre a evoluir, com ele nunca nos repetimos. Ele transmite uma tal energia interior que não sentimos o tempo passar, Durante as rodagens, são oito da noite sem darmos conta disso. Esta intensa actividade no seu próprio trabalho explica que ele tenha pouco tempo para encontros exteriores. Mas quando os tem, é muito aberto e muito rigoroso, muito disponível, consagrando-se a sua visita, Depois, rapidamente regressa às suas ocupações. Na verdade, para ele, trabalhar é como ir à escola e, ainda por cima, ter ordenado!»
John Alcott – operador de 2.001 e director de fotografia de vários filmes de Kubrlck (in Kubrick, de Michel Ciment – ver bibliografia)

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Stanley Kubrick Bibliografia


É enorme o volume de comentários, análises e ensaios que a obra de Stanley Kubrick tem suscitado. Entre nós, o principal modo de acesso a tal bibliografia é o sector de documentação da Cinemateca Portuguesa (Rua Barata Salgueiro, 39 – Lisboa); para além da quantidade de livros e revistas arquivados, na Cinemateca possui um sistema de indexação que permite uma pesquisa eficaz e uma consulta rápida.


Aqui ficam apenas alguns destaques:


Kubrick, de Michel Ciment (Calmann-Levy, Paris, 1980): entrevistas, análises e excelentes ilustrações.


The Films of Stanley Kubrick, de Daniel De Vries (William B. Eerdmans Publishings Company, Grand Rapids, Michigan, 1973): estudo datado, mas importante pelas pistas de leitura que fornece.


Directors and Directions, de John Russell Taylor (Methuen Lld., Londres, 1975): obra parcialmente consagrada a Kubrick; esclarecedora para comparar a sua trajectória com a de outros autores contemporâneos.


Stanley Kubrick, de Pierre Giuliani (Ed. Rivages, Col. Cinéma, Paris, 1990): uma das mais recentes, e também mais interessantes, monografias sobre o cineasta.
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2001 Uma Odisseia no Espaço - Bibliografia


Imensa também é a bibliografia especificamente dedicada a 2.001: Uma Odisseia no Espaço. Algumas referências significativas:


The Making of Kubrick's 2.001, de Jérôme Agel (Signet Classics, The New American Library, Nova lorque, 1970): um trabalho fascinante sobre a complexa produção do filme e, em particular, as técnicas de efeitos especiais aplicadas.


2.001, l'Oddysée de I'Espace, Scénario, de Arthur C. Clarke e Stanley Kubrick (I'Avant-Scène du Cinéma, nº 231/2, Paris, 1/15 Julho 1979): a planificação e os diálogos do filme, com preciosas informações sobre a sua gestação.


Existe em disco a banda sonora do filme; código da edição original: MGM 665 096.
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Videografia


No mercado português, encontram-se disponíveis em cassete os seguintes filmes de Stanley Kubrick:

Spartacus (Edivideo);

Lolita (Legal Vídeo);

Dr. Estranhoamor (Casablanca Video);

2.001: Uma Odisseia no Espaço (Legal Video);

Laranja Mecânica (Kodak/Warner);

Barry Lyndon (Kodak/Warner);

Shining (Kodak/Warner).
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Filmatologia Complementar


Outros filmes também em cassete que podem permitir paralelismos interessantes e motivadores com 2.001:
2.010: O Ano do Contacto, de Peter Hyams (Legal Video);
Dune, de David Lynch (lmavideo);
Encontros Imediatos do Terceiro Grau, de Steven Spielberg (Publivideo);

Os Exploradores, de Joe Dante (Edivideo);
A Guerra das Estrelas, de George Lutas (Publivideo);
O Homem que Veio do Futuro, de Franklin J. Schaffner (Publivideo);

Jogos de Guerra, de John Bradham (Kodak/Warmer);
Blade Runner, de Ridley Scott (Kodak/Warner);
Starman, de John Carpenter (Publivideo);
THX-1138, de George Lutas (Kodak/Warner);
Tron, de Steve Lisberger (Filmayer-Alfa);

Ficha técnica

João Lopes

Colaborou na Cinemateca Portuguesa

e na RTP 2, como programador. Crítico do

Jornal "Expresso».
 

Paginação e Grafismo

Cândida Teresa

Gabinete de Meios Técnicos e Materiais

da Direcção Geral de Extensão Educativa
Dim. 21x14,5 cm


Edição

Secretaria de Estado da Reforma Educativa

 

Composto e impresso
 na Editorial do Ministério da Educação

Algueirão


Reconversão para HTML
Henrique J. C. de Oliveira
Espaço Aveiro e Cultura
Secundária J. Estêvão
Projecto Prof2000
Aveiro - 2012

 


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20-04-2018