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Júlio dos Santos Batel, Resumo Histórico do Distrito de Recrutamento e Mobilização de Aveiro, 1979, pp. 15-21

DAS MODALIDADES PRIMITIVAS À CRIAÇÃO DE ÓRGÃOS PRÓPRIOS

1. RELANCE DO SÉC. XIII AO SÉC. XIX

Nos forais que concedeu às várias terras, D. Sancho II estabeleceu as milícias dos concelhos, que compreendiam tropas de pé e de cavalo. Os cavaleiros vilões constituíam a parte mais importante delas, e tinham por dever estar preparados para a guerra, com armas e cavalos.

Nesta altura, a guerra fazia-se sem regimentos ou leis militares, e eram os próprios reis que comandavam os exércitos.

A força militar de então, a hoste, era constituída pelas mesnadas ou lanças, forneci das pelos ricos homens e dignatários, e pela hoste real, em que se incorporavam as tropas reais e municipais de cavalo (cavaleiros-vilões) e de pé (peonagem) .

Supõe-se que date da época de D. Dinis a criação da milícia municipal (besteiros deconto), onde eram alistados os homens de ofício ou mester (mesteirais), por concelho. Eram chamados de besteiros por combaterem com besta (arma portátil de arremesso) e deconto (ou número), por serem fornecidos por concelho em número certo, fixado para o concelho.

D. Fernando, nas Ordens Gerais de 1373, determinou que se fizessem novas listas de gente capaz de servir na guerra.

Em 1408, D. João I fixou em 3200 o número certo de lanças que os grandes fidalgos deviam fornecer.

D. Duarte estabeleceu o regimento dos coudéis que fixava as funções destes e os deveres militares de cada indivíduo.

D. Afonso V mandou compilar tudo o que na sua época existia sobre a arte da guerra.

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Reguladas as obrigações militares de toda a população do reino, pela lei de 9 de Dezembro de 1569, D. Sebastião organizou a primeira lei de Defesa Nacional - regimento de 10 de Dezembro de 1570. Segundo este regimento, os capitães-mores e os sargentos-mores eram eleitos pelas câmaras que tratavam do alistamento dos homens válidos dos 20 aos 60 anos, com os quais se constituíam as companhias de ordenanças, de 250 homens cada; a companhia, por sua vez, compreendia 10 esquadras de 25 homens, cada.

Com um número de companhias variável entre 6 e 12 (2000 a 3000 homens), organizavam-se os terços de ordenanças.

Após a batalha de Alcácer-Quibir, as ordenanças faziam a guarnição das terras. Aveiro dispunha na altura de um terço de ordenanças.

Com o domínio dos Filipes foram extintas todas as ordenanças, pois não convinha aos reis de Castela que no reino de Portugal houvesse gente armada que pudesse sustentar alguns partidos contra a usurpação.

Em 1641, D. João IV cria as tropas auxiliares, restaura as antigas ordenanças de D. Sebastião e manda alistar em todas as comarcas os homens válidos dos 15 aos 60 anos, constituindo, assim, o primeiro Exército Nacional.

Este exército era formado por três tipos de tropa: exército de linha; tropas auxiliares ou milícias e ordenanças.

Os antigos fronteiras-mores foram substituídos ao nível das províncias por Governadores das Armas que, além da instrução e disciplina das tropas, tinham a missão de assegurar o recrutamento.

No ano de 1708, o terço de infantaria e a tropa de cavalaria foram substituídos definitivamente pelo regimento.

Foi criada a brigada, assim designada por ser de comando de um brigadeiro, constituída normalmente por 2 ou 3 regimentos.

Na altura, Aveiro possuía quatro companhias de ordenanças que faziam serviço em cada uma das quatro paróquias em que a vila se achava dividida.

Em 25 de Julho de 1759, D. José assinou a Carta Régia que elevou a Vila de Aveiro a Cidade.

Há notícia de, por esta altura, ter existido uma força militar com o nome de Dragões de Aveiro.

Aspecto de Aveiro em meados do séc. XVIII.

Aspecto de Aveiro em meados do séc. XVIII. De notar as muralhas do Infante D. Pedro, assim designadas por ter sido este infante que, em 1424, ordenou a sua construção. (Gravura publicada pela revista "O Panorama" em 1843.

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Por Decreto de 19 de Maio de 1806 é dada nova organização ao exército, que passou a ser formado por três divisões: Norte, Centro e Sul, cada uma composta de 8 regimentos de infantaria (agrupados em 4 brigadas), 4 regimentos de cavalaria e 1 regimento de artilharia, excepto a divisão Sul, que tão-só compreendia 2 regimentos de infantaria.

 

2. AS BRIGADAS E OS DISTRITOS DE ORDENANÇAS

Com as necessidades militares decorrentes da nova organização do exército, os serviços de recrutamento, nos moldes rudimentares até aqui praticados, tornaram-se inadequados, pelo que, dada a sua primordial importância na formação das forças militares, houve de conceber e implantar estruturas apropriadas.

Nesta perspectiva, por Alvará de 21 de Outubro de 1807, são alteradas na sua organização as milícias e as ordenanças e o reino é dividido em 24 brigadas de ordenanças destinadas a fornecer, cada uma, o recrutamento para um regimento de infantaria de linha.

Cada uma destas brigadas, que compreendia ainda mais dois regimentos de milícias, passou a funcionar, no que concerne a recrutamento, segundo as normas em que se viriam a enraizar, anos depois, os distritos de recrutamento. As suas operações de recrutamento repetiam-se cada três meses, para que os regimentos estivessem sempre completos.

Terminada a Guerra Peninsular, o Batalhão de Caçadores n.º 10, organizado em 1811, para tomar parte nesta guerra, foi mandado para Aveiro, onde chegou a 10 de Agosto de 1814. (Manteve-se nesta cidade até 1828.)

Beresford, elevado ao posto de marechal-general por D João VI, por ordem do dia de 1816, fez publicar o Regulamento do Exército e o Regulamento das Ordenanças. Estabeleceu uma divisão territorial em 24 Distritos de Ordenanças, cada um subdividido em oito capitanias-mores, e, cada uma destas, em oito companhias de ordenanças.

Em cada um dos distritos de ordenanças recrutava-se um regimento de infantaria, outro de cavalaria e outro de caçadores; em cada seis distritos recrutava-se um regimento de artilharia. / 19 /

Igreja do antigo convento de S. Domingos, actual Sé de Aveiro.

Igreja do antigo convento de S. Domingos, actual Sé de Aveiro.

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Em 1821, as ordenanças são extintas e substituídas por batalhões da guarda nacional, que se transformaram na nova reserva territorial.

Os miguelistas, porém, restabeleceram-nas pouco depois.

As ordenanças e as milícias são definitivamente extintas em 1832, e, em sua vez, criaram-se novos batalhões de voluntários e da guarda nacional, com tropas de segunda linha.

Em Janeiro de 1837, "foi organizado em Aveiro, no antigo Convento de S. Domingos, o Batalhão de Caçadores n.º 28. (Este Batalhão, em Dezembro de 1842, passou a ter o n.º 7 e, em Agosto de 1850, foi transferido para Guimarães.)

Pela reorganização de 1869/70, foi instituído um exército de 30000 homens em tempo de paz e 50 000 em tempo de guerra.

Os mancebos seleccionados para a inspecção médica em cada ano passaram a ser apurados por sorteio – sortes –, nos quantitativos requeridos para o respectivo contingente anual.

O sorteio era feito em sessão pública e no dia anunciado com a antecipação de pelo menos 8 dias, por editais afixados nos lugares mais públicos do concelho, nos jornais, quando os houvesse na localidade, e por avisos do pároco por ocasião da missa conventual, no domingo ou em outro dia de festa que mais aproximadamente precedesse o sorteio.

Em 18 de Janeiro de 1885, é instalado em Aveiro, no Convento de Santo António, o R. Cav.ª n.º 10.

Neste ano, foi extinto o Convento da Madre de Deus, em Sá, e demolido o edifício. Posteriormente, começou ali a construção de um aquartelamento para onde se transferiu definitivamente o R. Cav.ª n.º 10.

 

A necessidade de um sistema de recrutamento eficiente e compatível com o esforço militar do reino em ordem a satisfazer metódica e regularmente à conservação dos ramos da força pública, de terra e mar, à substituição periódica dos seus elementos e à ampliação e reforço dos seus quadros no caso de guerra, considerada no Decreto com força de lei de 30 de Outubro de 1884, foi finalmente enfrentada em 1887, com a apresentação, pela comissão encarregada, dos resultados do seu trabalho, consubstanciados na criação dos distritos de reserva.

Será destes órgãos e da sua evolução no contexto histórico-militar aveirense que nos ocuparemos a seguir.

Igreja do antigo Convento de Santo António.

Igreja do antigo Convento de Santo António.

 

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