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farol n.º 32 - mil novecentos e sessenta e nove ♦ setenta, pág. 3.

E O MENINO CHOROU

Fátima Barrote
(5.º ano)
 

SOBRE aquela linda paisagem a angústia tinha estendido o seu manto. Algo acabava de se passar. Um drama? Talvez.

O rio tinha deixado de murmurar e suspirava mansinho, como se algo o entristecesse. O vento parara. Os passaritos tinham-se calado. Tudo estava triste, taciturno. Ali, algo nos dava vontade de chorar... E eu chorei...

Porém, eis que surge um petiz de uns 4 ou 5 anos. Vinha saltitante, pela margem do riozito; e cantava. Nos seus olhitos azuis havia alegria.

E o pequenito ria. Porque riria ele? Vinha feliz.

Numa das mãos segurava um ramito de flores silvestres. Eram lindas margaridas selvagens. Ao passar por mim parou e, arregalando os olhos, disse:

– Olá! Como te chamas?

– Eu? Fátima e tu?

– Tens o nome da Senhora de que eu mais gosto, sabes? Tu tens os olhos iguais aos da Mamã, só o que é os dela são mais bonitos. Ah! eu chamo-me Miguel.

Eu agora tinha o pequenino entre os meus braços: E o nosso diálogo continuou.

– «São? E como se chama a tua Mamã?» perguntei-lhe.

– Margarida. É lindo, não é? É por isso que eu lhe levo estas flores. Como ela gosta muito delas! Tu também tens Mamã não tens?

– Tenho, pois.

– É linda?

– É. Todas as Mamãs são lindas.

– Pois são. E também são muito boas. A minha costuma dar-me muitos beijos e fica muito triste quando eu tenho fome ou frio e ela não tem pão para me dar ou roupa para me vestir. Às vezes até chora.

Aqui o menino calou-se um pouco e uma sombra de tristeza passou-lhe pelos lindos olhos. Depois continuou:

– Mas ela agora está doente. O senhor Doutor diz que ela vai morrer, eu bem ouvi. Mas eu sei que ela não morre, porque eu peço muito ao Jesus para não ma levar; e eu sei que o Jesus não vai levá-la, porque eu sou pequenino. Bem, agora tenho que ir. Adeus.

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E lá se foi direito a um casebre. Aproximei-me.

O menino entrara.

– Mamã, sabes? Hoje trago-te daquelas flores que tu gostas.

De dentro não houve resposta.

O menino entrou para o quarto e perguntou:

– Mamã, tu não falas porquê? Tu não me dás um beijinho?

E então aquela cabecita compreendeu o que se passava e aqueles olhitos azuis, antes tão alegres encheram-se de lágrimas, e o menino disse:

– Mãe!...

Neste monossílabo o petiz expressou toda a angústia do seu coraçãozito, e continuou.

– Porque não me levaste contigo? Tu dizias que me levavas sempre e não levaste.

E então o menino chorou e eu chorei.

E a noite desceu com o seu manto negro para proteger aquela criança que ficara só no Mundo, e que continuava a chorar baixinho, porque a «Mamã» não o levara consigo.

As flores que ele levara tão carinhosamente foram as que duraram mais, junto da «Mamã», que se chamava Margarida e era boa e linda e tinha uns olhos mais bonitos que os meus.

Porquê? meu Deus, Porque continuam a morrer as mamãs destas crianças amorosas e simples que têm tanta fé em Ti, e que não têm mais nenhuma riqueza além delas, nem a material.

Eu não consigo fazer chorar um pequenino, porque acho que o não devo fazer. É um ente tão inocente e querido!

Não deixes morrer tantas Mamãs!...

 

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11-06-2018