Maria Teresa Silva
(4.º Ano)
A
noite tinha descido e envolvia a cidade no seu manto de trevas. No
céu as nuvens revoltas assemelhavam-se a vagas alterosas em dias de
tempestade.
O vento uivava sinistro, arrancando longos gemidos aos braços descarnados das árvores que tremiam na
escuridão.
A cidade havia mergulhado no inconsciente, esquecendo,
por curto espaço de tempo, as preocupações e as canseiras
da vida. Assim adormecida, atraía de certo modo aqueles que,
à margem da lei, a aceitam unicamente na teoria. E ele também fora atraído decerto. Ninguém veria. A tentação era
grande e a ambição desmedida.
– «Ninguém veria» – não cessava de repetir, como se
nestas palavras encontrasse coragem. E aproximava-se cada
vez mais, a passos cautelosos, embuçada no sobretudo, confundindo-se nas sombras da noite, indiferente ao vento gélido que
lhe fustigava as faces. No entanto, à medida que o seu
objectivo mais se aproximava, mais incertos se tornavam os seus
passos. E, agora, cada vez mais perto, hesitava.
«Ninguém veria» – Repetia continuamente. Oh! Como
se enganava! O Autor de todo o dom perfeito, que perscruta
todas as consciências, Esse não veria? E a voz da consciência? Cairia ela para sempre numa mudez inquebrável? Não!
Lembrar-lhe-ia ao longo dos tempos, que numa noite, envolto
nas sombras, havia transgredido a lei.
Hesitava! No seu cérebro chocavam-se mil
pensamentos opostos. De repente os sentimentos mesquinhos, falam,
protestam! Como poderia ele, um homem forte, estar assim
amachucado, indeciso? E caminhava cauteloso, no intento de
realizar o seu miserável plano.
No relógio duma torre soam doze badaladas sonolentas.
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Instintivamente olha: uma Igreja. Não! seria horrível! Ali, mesmo em
frente, num Sacrário, estava Jesus escondido, por amor da
Humanidade. Nunca! E foge, escapa-se à tentação. Atravessa a rua e,
em frente da Igreja detém-se. Os joelhos curvam-se debaixo dele e
tocam a pedra fria. Os lábios ressequidos murmuravam simplesmente:
–«Obrigado bom Jesus» – Dos olhos brotam duas lágrimas,
lágrimas de arrependimento e de promessa.
Eleva os olhos ao céu: além, muito além, uma estrela
espreitava por entre as nuvens. E ele continuava de joelhos, mãos
erguidas, indiferente ao vento que soprava gelado, brincando com as
sombras da noite. |