Helena Silva, Queimadas e incêndios - A natureza em perigo. Março de 2005

<<<

Capítulo 3 – O fogo e o impacto ambiental que provoca

           

O porquê de muitos dos problemas enunciados no capítulo anterior surge relacionado com as queimadas – que podem começar por ser inofensivas – e facilmente se transformam em incêndios que vão interferir na qualidade do ar, na química e biologia dos solos, na mancha vegetal que o fogo atingiu, nos animais afugentados do seu habitat ou destruídos. De uma forma indirecta podem afectar os recursos hídricos subterrâneos ou a descoberto. As queimadas artificiais – por norma feitas pelo Homem – ou naturais (produto de reacções interactivas) podem ser de vários tipos e envolver flora diferenciada. Uma pastagem adubada pode produzir gases, sobretudo ácidos nítricos, em quantidade muito superior à de uma outra que não recebeu fertilizantes. As condições metereológicas – vento, quentura ambiente – a extensão e hora da queimada, condicionam a temperatura atingida pelo fogo que poderá vir a ser uma consequência do tempo necessário para fazer arder totalmente o material vegetal disponível.

Não podemos precisar quem foi que afirmou ser hoje a Natureza um organismo doente que urge salvar. E uma situação de “stress”, como a queimada, apresenta sintomas alarmantes. Com efeito, os gases produzidos podem ter origens muito diferentes se mais ou menos oxidados. Em função da hora a que foi produzida – de dia ou de noite, ao meio-dia ou ao entardecer – as reacções fotoquímicas serão também diferenciadas. A maioria das queimadas, sendo de natureza agrícola, dá indicação de emissões de dióxido de carbono para a atmosfera que contribuem em peso percentual mais ou menos significativo para a problemática do já tão vulgarizado efeito de estufa. A maioria do carbono emitido pelas queimadas no Inverno é retirada da atmosfera no Verão, quando a vegetação se encontra em fase de crescimento, e há maior abundância de oxigénio no ar. (Simonnet, 1981).

Qual o custo/benefício para o ambiente dado o carácter sobremaneira agrícola da queimada – uma tecnologia da era neolítica – em face da complexidade do tema? Não conhecemos estudos aprofundados sobre o assunto que nos proponham uma resposta cabal talvez porque, na maioria dos casos, estes fogos acontecem em zonas de mato, perto de florestas e, pelo menos, entre nós não se limitam a ser inocentes, ainda que displicentes, queimadas, mas tenebrosos incêndios florestais perpetrados por mão criminosa e ajudados por uma política de abandono dos bosques a si mesmos. O tecido vegetal rasteiro e seco, facilmente inflamável, fruto de irresponsabilidade, senão da lei e de serviços inspectivos atempados aos detentores dessas pequenas parcelas de mata ou de mais extensas manchas florestais.

Há também que considerar o tipo vulgarizado da floresta actual. Não é a autóctone, constituída por carvalhos, castanheiros, azinheiras e pinheiros bravos ou mansos, consoante a região geográfica do país, mas uma outra, mais rentável a curto e médio prazo, fruto do plantio do pinheiro bravo e das muitas variedades de eucaliptos. Atingem rapidamente o estado adulto para poderem ser abatidos e vendidos e darem azo a que, muito em breve, um novo bosque se forme num intervalo sazonal bastante curto. Este tipo de árvores, altamente resinosas, arde com uma rapidez dificilmente controlável, além de que o eucalipto contribui para a desertificação dos solos pela quantidade de água e de nutrientes que absorve para poder desenvolver-se em tão poucos anos. E não tem havido a sensibilização conveniente junto dos nossos agricultores: a verdade é que um eucalipto rapidamente se torna adulto e, em consequência rentável e é esse o aspecto que os atrai.

A crise no ambiente surgida sobretudo a partir de meados do séc. XIX com a Revolução Industrial, ou seja, há uns duzentos anos, despoletada pelo lucro a curto prazo e a crença na máxima de Lavoisier de que na Terra “ nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”, tornou o Homem o mais perigoso predador da Natureza, sobretudo no que respeita às leis da oferta e da procura, leis de mercado que não admite discutir. (Elegido, 1977).

Queimadas e fogos florestais são, por vezes, confundidos, mas as primeiras surgem também associadas ao desmatamento que destrói o bosque para criar zonas agricultáveis. Vende-se a madeira ardida e fica-se com terreno livre de árvores e mato para criar pastos ou cultivar produtos muito procurados nas grandes urbes e constituem uma mais valia para o agricultor numa sociedade onde a sobrevivência não se pode processar sem os consumir. Feitas em áreas já desmatadas, as queimadas servem aos agricultores para se libertarem frequentemente de resíduos de colheitas anteriores, no combate a pragas como populações indesejáveis de carrapatos ou renovarem terrenos de pastagem, limpando lavouras ou facilitando colheitas. Assim nem sempre uma parte das queimadas não terem como finalidade imediata o comércio, mas a limpeza de áreas. (Correia.s. d.). Se, porém, não houver cuidado o perigo espreita e o ambiente torna-se vítima. E como o ambiente, na sua tripla perspectiva de biosfera, geosfera e atmosfera integradas, constitui o habitat por excelência do Homem que precisa da fauna e da flora, omnívoro que é, para se alimentar, passou a tornar-se vítima de si próprio e o predador-mor do seu semelhante com as alterações provocadas nos ecossistemas onde actua. É esta realidade que designamos por impacto ambiental.

         
     
 

Fotografia 10 – Rosmaninho em flor. Covelas, Junho 2005

 

Fotografia 11 – Trecho do rio Vouga, na freg. de Ribafeita.  Junho 2005

 
         
     
 

Fotografia 12 – recho do rio Vouga, na freg. de Ribafeita.  Junho 2005

 

Fotografia 13 – Mata cerrada sem limpeza.

 

 >>>
 

 

Página anteriorÍndicePágina seguinte