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Caminho de ferro do Vale do Vouga

De Espinho a Viseu

Trabalhos iniciados em Dezembro de 1907. Inauguração oficial do segmento Espinho-Oliveira de Azeméis em 11 de Outubro do ano imediato, com a assistência de D. Manuel II; começo da exploração até Sernada em 1911; de Sernada a Vouzela e Bodiosa a Viseu em 1913; de Vouzela a Bodiosa em 1914. Extensão total (incluindo o ramal de Aveiro) 175 km. Via simples e estreita; bitola, 1 metro. Perfil bastante acidentado, com rampas e declives que vão com frequência a 25 mm (por metro) e sinuosidades descritas em curvas e contracurvas com o raio máximo, por vezes, de 90 metros. Algumas trincheiras atingem 12 metros de cota (exemplo, Vila da Feira). Projecto da linha elaborado sob a direcção do eng.º Xavier Cordeiro. O empreiteiro foi o construtor francês Mercier, com os engenheiros Audigier e Chatains. Expropriação de terras de lavradio a 250 réis o metro quadrado. A obra mais notável de engenharia é a ponte-viaduto sobre o Vouga, de Pessegueiro, de alvenaria, com um arco central de 55 metros de vão. * Percurso muito pitoresco de princípio ao fim, mas particularmente empolgante no vale do Antuã, na descida de Albergaria para Sernada, em Ribeiradio, em Vouzela e nas alturas da Bodiosa, sobre o vale de Lafões. Além dos comboios, circulam quatro autocarris rápidos (3 h e 10 m de Espinho a Viseu).

Distâncias: de Espinho a Vila da Feira 20 km, a S. João da Madeira 25 km, a Oliveira de Azeméis 33 km, a Albergaria-a-Velha 55 km, a Sernada 62 km, a Vouzela 106 km, a S. Pedro do Sul 114 km, a Viseu 141 km.

  Espinho-Praia. Modesta instalação de tijolo, quase defronte da estrada da Linha do Norte. A linha segue, por instantes, para o Sul, paralelamente aquela, até…

– 0,6 km. Espinho-Vouga (esquerda), onde se faz a composição dos comboios. Praça de touros, à esquerda; do lado oposto, fábrica de conservas e bairro pobre, da população piscatória. O mar, a dois passos, arqueja ou espreguiça-se no extenso areal. Deixa-se a vizinhança da Linha do Norte e sobe-se, na direcção predominante do SE., cortando a encosta muito limpa, revestida de pastagens e milheirais. As moradias branquejam por todos os lados. Ao fundo, a lagoa de Esmoriz, as primeiras dunas, o aeródromo – e, num último relance, a vastidão do Atlântico. Dois modestos apeadeiros (Paramos e Lapa) entre pinheirais; a seguir.

– 7 km. Oleiros (esquerda). Fabrico de variada doçaria.

A povoação fica a 2 km. Norte. Junto da linha, de passagem, vê-se, num sítio recolhido, o Hospital-Asilo da Senhora da Saúde (1907). A freguesia, muito populosa e industrial, possui diversas fábricas de papel; a mais antiga, a do Candal, fundada em 1811.

Paisagem verde, com curiosas alternativas: ora nos cercam as espessuras lúgubres dos pinhais, que parecem / 586 / definitivas, ora, quando menos se espera, estes se abrem dando lugar a pitorescas várzeas que são verdadeiros oásis de luz. Ao fim de um sem-número de furta-voltas, o comboiozinho, resfolegante e pimpão, transpõe a ribeira de Moselos e pára em…

– 9 km. Paços de Brandão (estação, direita). Fábricas importantes de serração de madeira, de mós de esmeril e sobretudo de preparação de cortiça, com utensilagem moderna.

Algumas bonitas vivendas no meio de massas de arvoredo; plátanos, aveleiras, citríneas, ameixoeiras e, relativamente próximas, ao fundo, as habituais multidões de pinheiros, de grandes caules.

A linha prossegue em incessantes torcicolos subindo as densas bouças do Rio Meão (apeadeiro). Em dado momento, à direita, depois de um prolongado trecho arborizado, surge, como coisa imprevista, uma veiga verdejante, onde aqui e além a água de lima cintila como limalha de aço. As mulheres da lavoura usam sobre o lenço da cabeça chapeletes de aba rígida, como espirituosas caricaturas dos chapéus de coco, de cerimónia urbana.

– 14 km. S. João de Ver (direita). Estamos no coração da histórica terra de Santa Maria. Em breve, ao atingir-se o apeadeiro de Cavaco, se descobre a silhueta singular do * castelo da…

– 19 km. Vila da Feira, estação (direita)  (1).

À saída da estação, profunda trincheira. Subidas e descidas, sempre através de luxuriantes maciços de arvoredo e trechos rústicos.

– 23 km. Arrifana (par.) (218 metros de altitude).

Sobre os pinhais avista-se, ao fundo, o mar. A povoação fica no alto, com a sua igreja de rosto joanino, revestida de azulejos. Muito perto, quase contígua e com fisionomia aparentada, alastra…

– 25 km. S. João da Madeira (esquerda). (pág. 603).

Numerosas fábricas. A linha férrea contorna o sopé do outeiro em que assenta o casario. Da estação vêem-se as grandes instalações de uma fundição e as chaminés de outras empresas. À direita, a duas centenas de passos, o campo de jogos e a estrada que conduz a Casaldelo, pequena estância de veraneio, com bons ares e vistas desafogadas para os lados do mar e da serra. / 587 /

O comboio desce, em declive rápido, pelo apertado e sombrio valeiro, verdejante, de…

– 27 km. Faria (apeadeiro).

Uma velha ponte, desmantelada, de um arco, dá passagem, a meio do vale, de um para outro lado. A subida ao chamado Castro de Recarei poderia efectuar-se        por este caminho velho. Desce-se ainda até…

– 29 km. Couto de Cucujães (direita), estação.

A povoação está à esquerda empoleirada num pequeno cabeço. À direita, até junto da estação, descem os muros da cerca do extinto convento beneditino (pág. 603).

Transposto o rio Ul, que espuma e sussurra em sucessivos saltos, sobre grandes lajes puídas, sobe-se de novo. A fresca e a abundante vegetação atinge o máximo de pujança neste trecho ribeirinho. Fecundidade calma e vegetativa: é a sensação dada pelas massas compactas de arvoredo ao longo do monte de Rebordões e pelos casais meio ocultos. Ao Sul, a meia encosta, a igreja e a povoação de Madail; à direita, os pinhais do Troncal (pág. 602).

– 31 km. S. Tiago de Riba de Ul (apeadeiro).

Culturas em patamares. O rio Ul desaparece no fundo, sob a espessa folhagem dos amieiros.

– 33 km. Oliveira de Azeméis (esquerda), estação (pág. 599).

A vila, situada a dois passos, ao cimo de uma pequena ladeira, está voltada ao Sul e a nascente. Da estação mal se apercebe a sua presença. Mas descobre-se adiante, depois de alguns apertados ziguezagues, com duas passagens de nível sobre a estrada de Porto-Lisboa e uma ponte-viaduto sobre as águas frescas e profundas do Antuã. Salienta-se no curioso quadro o sobranceiro parque de La Salette, coroado pela agulha-mirante do santuário (pág. 601).

[Antes da ponte sobre o Antuã pequena paragem, para serventia da povoação próxima de Ul, que, pelo achado de um marco miliário, se presume ter sido ponto de passagem da via militar romana; pág. 600].

– 38 km. Travanca (apeadeiro).

Os rodeios, os declives, os aparentes caprichos da linha são constantes, dando por vezes a sugestão de que são resumos de geografia para instrução lúdica Infantil: aqui um viaduto, ali um bosque, acolá o rio e o seu vale, mais além o oceano...

– 44 km. Pinheiro de Bemposta, estação (esquerda) (pág. 599).

E o mar aparece aqui efectivamente, – se a neblina que se ergue com frequência dos pinhais, das / 588 / águas do Antuã e dos braços invisíveis da ria de Aveiro, não oculta esta fímbria longínqua de azul. A partir deste ponto o traçado da linha é mais simples.

– 46 km. Branca, estação (esquerda), (pág. 598). Fábrica de cerâmica.

Desaparece o pequeno tributário da ria, afogado na verdura da Minhoteira. Percorre-se agora uma chã relativamente extensa e uniforme. Ao lado corre a estrada de Porto-Lisboa. Passagem de nível.

– 49 km. Albergaria-a-Nova (pág. 598), estação (direita). Indústria de pasta de papel. Prolongadas rectas. Pinhais.

– 55 km. Albergaria-a-Velha, estação (esquerda) (pág. 595).

A linha contorna a vila pelo lado do poente, transpõe a estrada nacional e deixa o pequeno planalto. Principia uma movimentada descida, em sucessivos lacetes, para atingir a margem direita do Vouga. * Vista surpreendente. Quadro de grandes proporções em que a figura dominadora é o Caramulo. Breves túneis. O desnível é de 100 metros (com planos inclinados de 23 mm por metro) até…

– 62 km. Sernada, entroncamento com o ramal de Aveiro (pág. 581), junto da extensa ponte-viaduto, de Jafafe, sobre o Vouga.

Há apenas meia dúzia de casas do pessoal da linha, ao lado da estação e das oficinas de reparação. A cantina fornece aos viajantes refeições, telefonando-se previamente por intermédio do condutor do trem. O entroncamento está feito em reversão.

(Para continuação da linha, ver Beira Alta).

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(1) – A notícia histórica e descrição do castelo e, de um modo geral, do concelho de Feira, já compreendido na província do Douro Litoral, pertencem ao vol. IV desta obra.
 

 

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