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N.º 4

MAIO 1990 Ano II


ESCOLA SECUNDÁRIA HOMEM CRISTO - AVEIRO
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CALOR OU FRIO? 
QUE FUTURO PARA A TERRA? 

OS CIENTISTAS FAZEM CONTAS...

O oceano e a floresta absorvem uma boa parte do gás carbónico que nós libertamos. O seu teor na atmosfera eleva-se gradualmente. A previsão do aquecimento da Terra depende da contabilidade, ainda imprecisa, do carbono.

«Vende-se, planeta em primeira mão, ambiente a rever, aquecimento a gás carbónico». É assim que se deverá redigir o anúncio para nos desembaraçarmos da Terra no decurso do próximo século. Porque se nessa altura fizer bastante calor, a culpa será do dióxido de carbono. A indústria, o aquecimento urbano e o automóvel e também a desflorestação tropical projectam em cada ano 20 biliões de toneladas de CO2 na atmosfera. Como a melhor vidraça, ele impede as calorias que o atravessam de voltar noutro sentido, para o cosmos gelado. É o efeito de estufa.

Até 1860, o ar só continha 275 ppm (partes por milhão ou gramas por tonelada) de CO2. Hoje já foram ultrapassadas as 350 ppm, representando um acréscimo de 25% em pouco mais de um século. Se continuarmos ao ritmo actual, estes teores terão duplicado antes do fim do próximo século. No entanto, às inquietações que se manifestam quanto às consequências de um tal aumento junta-se um enigma. Em cada ano emitimos 5,5 biliões de toneladas de carbono proveniente dos combustíveis fósseis, aos quais se acrescentam 1,5 a 2 biliões de toneladas originadas pela desflorestação tropical. Isto perfaz um total superior a 7 toneladas. Ora, as 45 estações de registo da Organização Meteorológica Mundial não encontram senão 3,2 na atmosfera. Para onde foram os 4 biliões de toneladas que faltam?

Desde há muito que se crê que o carbono desaparecido no balanço das emissões humanas se transfere para o oceano. Espécie de reservatório sem fundo, contendo 60 vezes mais carbono que a atmosfera, parece ter uma capacidade de absorção ilimitada.

Contudo, modelos computadorizados mostram que nas condições actuais a penetração do carbono atmosférico na água do mar é muito limitada. Patrick Monfray, investigador do CNRS, explica que quando o teor em carbono do ar aumenta, a camada superior do oceano reage imediatamente, resultando uma acidificação das águas que impede a entrada de mais carbono. Assim, no total, o fluxo de carbono de origem “humana” que entraria no oceano seria cerca de 2 biliões de toneladas. Com o carbono do ar (3,2 biliões), isso perfaz 5,2 biliões que ainda estão longe dos 7 que constituem a totalidade entrada na atmosfera.

Também a biosfera constituiria um receptáculo bem cómodo. Afinal, os 155 biliões de toneladas de carbono lançadas desde o início da era industrial não representam senão a quantidade fixada pela fotossíntese em dois anos e meio! Mas atenção, estes cálculos só se aplicam a uma massa vegetal em crescimento contínuo. Assim, este mecanismo só pode absorver o excedente de CO2 do ar na condição de se aumentarem as superfícies plantadas. Em princípio, a quantidade de carbono que as plantas metabolizam é constante, mas sob o efeito da perturbação causada pelas emissões humanas, ela pode aumentar. É o que demonstram experiências feitas no laboratório de ecologia vegetal, em Orsay, em que castanheiros submetidos a uma atmosfera contendo o dobro de CO2 desenvolveram uma massa vegetal 20 a 30% superior à normal (neste caso a nível das raízes). Isto significa que sob a influência desta quantidade anormal de CO2 a planta, metabolizando-o, provoca um forte aumento da produção vegetal, para além de ter florido em apenas 3 anos contra os 5 dos castanheiros “normais”. É este efeito fertilizante que poderá ser responsável pela absorção de cerca de 1,5 biliões de toneladas de carbono.

Façamos as contas de novo. Teoricamente, oceano (2 biliões), mais biomassa (1,5), mais atmosfera (3,2), igualam as emissões humanas (7) => (2+1,5+3,2=6,7). Mas na realidade a soma está longe de estar certa. As incertezas actuais são incompatíveis com a contabilidade do carbono. Daí as dúvidas que se levantam sobre a taxa de aquecimento provocado pelo “efeito de estufa” e as aturadas pesquisas internacionais através de modelação em supercomputadores. E, se não estão de acordo relativamente aos números, todos eles nos anunciam, em contrapartida, um reaquecimento para o próximo século — 1,9 a 5,2º C são as previsões.

OS OUTROS GASES COM EFEITO ESTUFA

Neste processo de reaquecimento, metano (CH4), óxidos de azoto (NOx), clorofluorocarbonos (CFC) e ozono contribuirão com 50%.

O metano, cuja molécula tem uma duração média de vida entre 7 e 10 anos, provém sobretudo da actividade microbiana em condições anaeróbias (solos e intestino de herbívoros); mas 30% do metano atmosférico origina-se na queima dos combustíveis fósseis. Calcula-se que contribua com 19% para a elevação mundial da temperatura.

Os óxidos de azoto, 150 vezes mais eficazes que o CO2 na captação do calor, provêm grosso modo das mesmas fontes que o metano, mas as suas moléculas têm uma vida mais longa (cerca de 150 anos). A sua participaç5o no efeito de estufa está avaliado em 3 a 4 %.

Os CFC, aparecidos desde 1931, têm uma progressão anual de 5 a 10%. De molécula muito estável, podem permanecer na atmosfera de 75 a 110 anos (conforme o tipo). Acusadas principalmente de destruírem o ozono estratosférico, estas moléculas são também terrivelmente eficazes no efeito de estufa: 14000 e 17000 vezes mais que o CO2. Teor de participação no aquecimento: 17%.

O ozono troposférico, de baixa altitude, é um poluente, contrariamente ao bendito ozono estratosférico, que nos livra dos mortíferos ultravioletas. A indústria e os veículos a motor são a principal fonte. Este ozono é 2000 vezes mais eficaz que o CO2 na captação da radiação solar e pensa-se que poderá contribuir com 8 a 15% no aquecimento das baixas camadas da atmosfera.

A EUROPA MAIS QUENTE

A síntese dos modelos climáticos sugere modificações sensíveis do clima europeu com a duplicação do teor de CO2 do ar. No inverno assiste-se a um reaquecimento de 8 a 10º C nos países escandinavos e na Sibéria. No verão, as subidas são por sua vez mais moderadas e uniformes, de 4 a 5º C na generalidade da Europa. Estas variações são acompanhadas de modificações do regime das chuvas, com uma tendência mais seca no sul da Europa e mais húmida na Escandinávia.

INCERTO O NÍVEL DO MAR

Três vertentes jogam em favor desta variável: os glaciares de montanha, as calotes polares e os oceanos.

Para os próximos 100 anos, a fusão de parte dos glaciares de montanha poderá contribuir com uma elevação mínima de 20 cm. As calotes polares do norte deverão fundir em parte, mas isso será compensado pela queda de neve, no Sul; daí que este factor não tenha influência significativa. A dilatação térmica do oceano deverá proporcionar uma subida de 10 cm nos próximos 50 anos e de 50 cm dentro de um século. Difícil de prever o resultado deste jogo...

E  A NOVA ERA GLACIAR COMEÇADA EM 1976?

As incertezas continuam. Em 1974/75, quando se tremia de horror perante a perspectiva de uma nova era glaciar, surge-nos um inverno dos mais cálidos. Agora que o pânico se instala perante um cataclismo de calor (efeito estufa) tivemos um dos invernos mais frios dos últimos anos — o de 1984/85. Contraditório, difícil de prever a evolução da temperatura neste nosso planeta. Calor ou frio?

A actividade solar estabelece uma estreita relação com o clima da Terra. Segundo a intensidade dessa actividade (mais ou menos manchas solares), a Terra aquece ou esfria. Assim, cerca de 200 manchas solares originam uma grande actividade da nossa estrela; 20 ou 30 provocam pouca actividade solar. Calcula-se que até 1995 se terá extinguido a “exagerada” actividade do sol, deduzindo-se pois a previsão de um tempo mais frio. Segundo Milankovitch, os períodos glaciários seriam provocados por invernos rigorosos seguidos de verões pouco quentes que não proporcionariam o degelo da neve.

Como se combinará o efeito estufa com o novo período glaciar?

Enfim, os melhores cálculos são ainda incapazes de nos fornecerem certezas. Todos estes efeitos e contra-efeitos em cadeia têm sido introduzidos nos melhores modeladores. Mas a integração de todos os dados ainda vai requerer muitos anos de trabalho. Até lá, resta-nos uma sólida incerteza: o valor real do reaquecimento.

Adaptado de “SCIENCES & AVENIR” e “NATURA”, 1990  


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