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"Patrimónios" – n.º 6, Setembro 2007, Ano XXIX, 2ª série, 140 páginas


EDITORIAL

Maria da Luz Nolasco

"Os nossos pais restauravam as estátuas; nós tiramos-lhes os narizes falsos a as próteses que lhes acrescentaram; os nossos filhos farão com certeza outra coisa. O nosso ponto de vista actual representa ao mesmo tempo um ganho e uma perda."

in Marguerite Vourcenar, 1983


ADERAV. Não é só o nome e o significado de cada uma das palavras que forma a identidade desta Associação. Tida como entidade que objectivamente existe para a defesa e para o estudo do património
natural e cultural de uma região do centro do país, a de Aveiro, a ADERAV é, na substância tal como na forma, a expressão de um conjunto de acções que movimentamos (sócios e amigos) para redescobrirmos e valorizarmos o nosso património, a nossa herança cultural, a nossa identidade.

Mas tal como todos sabemos nem sempre as questões de património na sua generalidade são a prioridade das nossas inquietações. Possuidores de uma outra sensibilidade, mais economicista e tabelada pelo que somos, pelo quanto valemos e por quanto tempo, habituamo-nos mais à ruína e aos ferimentos causados nesses testemunhos do passado do que à sua / 10 / valorização, estudo e actualização. E quando falamos de actualização não estamos de todo a aceitar que se refaçam os elementos patrimoniais – as obras significativas da nossa cultura – de modo convencional e pautadas por um gosto grosseiro do arranjo, do restauro, do pastiche mas tão só pela procura de sensações felizes de transformação e de valorização do passado em obras vivas e não etiquetadas. Por isso aceitamos com agrado, pois deixa-nos bem com a nossa consciência, o acto de guardar o passado e as belezas desse passado em Museus, preservando de modo distante e fora das nossas casas, as belezas e os tesouros etiquetados e mortos.

Assim se lhes refere, poética e sabiamente, Marguerite Vourcenar na sua obra "O Tempo, Esse Grande Escultor" (M.V., 1983, pág. 52).

Fazendo jus ao nome, a ADERAV contribuiu de algum modo e à escala das suas possibilidades, para a valorização do nosso património edificado e natural e ainda para aquele espaço da memória que de modo não tangível nos reporta às vivências, às conversas carregadas de potencial emotivo e às imagens de personagens que marcaram o nosso tempo real.

Neste biénio de 2006/07 foi momento alto o ciclo das homenagens nas quais se falou do Eng. Fernando Lavrador e dos seus amigos e cúmplices nas questões da sétima arte – o cinema. Ficou ainda por realizar uma homenagem ao Arquitecto Fernando Távora, falecido a 3 de Setembro de 2005, tido como uma personagem de vincado valor humano e marca significativa no ensino, na concepção e modernização da arquitectura portuguesa. Este arquitecto foi o autor do edifício onde actualmente a ADERAV tem a sua sede social. De acordo com o programa original funcionaram neste edifício vários serviços municipais tais como a Biblioteca Municipal, situada no terceiro piso e iluminada com luz natural obtida a partir da cobertura e guiada através de cones em betão, orientados no sentido dos raios solares; funcionou ainda o Turismo da Região, com os serviços de atendimento situados ao nível da Praça do Município e sectores de apoio instalados na Cave, e ainda um conjunto de gabinetes técnicos situados nos pisos intercalares. Este edifício envolto em grande controvérsia quando da sua construção por ter destruído parte de um conjunto edificado pré existente, de diferente escala e significado no contexto da Praça da República, é hoje um testemunho da arquitectura modernista portuguesa que muito nos apraz conservar e valorizar.
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Mas de uma forma geral, as acções desenvolvidas pela ADERAV ao longo deste último biénio foram polifacetadas e não monódicas. Embora não tenham sido abundantes na sua quantidade, foram-no na adesão das audiências. Destaco as rotas de visita orientadas ao Campus Universitário de Santiago integrada no Congresso Anual da Associação de Professores de História. As Rotas de visita às freguesias urbanas de Esgueira e de Vilar e ao bairro da Beira-Mar na freguesia da Vera Cruz.

Ainda acerca do percurso de visita a Esgueira, destaco a passagem pelos seguintes espaços: "Casa da Cruz", Pelourinho, Câmara de Esgueira, "Casa da Carvoeira", fontes da vila, casario de Setecentos e de Oitocentos situado no caminho da Igreja Matriz e a visita à Igreja de Santo André, ao respectivo adro e à envolvente.

Desses passeios participados em conversas acesas sobre as memórias dos lugares e sobre as pessoas que nestes habitaram e que por eles se expuseram ideológica e socialmente, tecemos novos olhares e novos saberes sobre o território onde habitamos.

O corpus das iniciativas da Associação enquadrou-se em ciclos, tais como os referentes às Rotas de Visita com a dinamização de percursos no concelho de Aveiro, o Ciclo de Homenagens com uma exposição ontológica a Fernando Lavrador, o Ciclo da Escrita com a redacção de alguns artigos de opinião publicados em jornais e revistas e ainda o referente à emissão de pareceres sobre o património edificado no contexto da nossa participação na Comissão Consultiva do Património do Município de Aveiro. Procurámos que as iniciativas se enquadrassem no tempo e no espaço e em factos actuais por forma a mais facilmente suscitarem a participação dos Associados.

Procedemos ao lançamento do Livro "História do Retábulo português" e à apresentação do Site da ADERAV. O Prof. Doutor Francisco Lameira, da Universidade do Algarve, acedeu amavelmente a apresentar o seu livro "História do Retábulo Português" acompanhado de uma lição sobre a evolução da escultura retabular nacional, na sala do despacho da Santa Casa da Misericórdia de Aveiro.

Ao Eng. Oliveira Cardoso vai o meu enorme pedido de desculpas pelo facto de lhe ficarmos a dever o cumprimento e execução de um projecto de todo interessante sobre as Rotas da Engenharia em Aveiro.

Esta acção visava redescobrir espaços e equipamentos industriais do concelho de Aveiro, tais como unidades fabris em laboração ou já desactivadas mas com / 012 / equipamentos e vestígios da sua produção "in loco". Locais inscritos na área do "Porto de Aveiro", entre outros. Esta acção seria uma actividade conjunta com a Ordem dos Engenheiros (Delegação Distrital de Aveiro), e com outras entidades a contactar.

Finalmente, o lançamento da revista "Patrimónios", na sua sexta edição com uma concepção interna renovada e um novo conselho redactorial. Trata-se, no entanto, de uma iniciativa que se tornou já uma tradição no seio da ADERAV e a que nos cumpre dar continuidade.

Ficou na calha, para dar continuidade na sua gestão e posterior edição, a obra acerca do Cluster das Telecomunicações em Aveiro. Este projecto editorial pretende estudar o impacto na Região de Aveiro das telecomunicações. A obra, da autoria do Prof. Manuel Rodrigues, regista de modo factual e documentado o conjunto de circunstâncias que estiveram na base para a coexistência de instituições de grande qualidade neste domínio e nesta região.

Demos início à actualização e informatização dos dados dos Associados a par com o estudo e introdução de um cartão de identificação de Associado. É permanente a necessidade de formas de comunicação eficazes entre os Associados, os Corpos Sociais, as Comissões e os Grupos de Trabalho da ADERAV, algo que não conseguimos ainda implementar mas que muito desejo que a nova Direcção consiga deveras realizar.

Por fim quero manifestar os meus mais sinceros agradecimentos aos elementos que constituíram os órgãos gerentes da ADERAV nestes dois últimos anos e sem os quais não teria sido possível realizar quaisquer das acções supra enunciadas. A todos eles dirijo com franco carinho e amizade os meus agradecimentos e estima pessoal.

O processo comunicativo estabelecido dentro e fora da Associação foi certamente aquém do que todos esperávamos, mas a ADERAV cumpriu, disto estamos cientes, com a sua função de transmissor de conhecimentos, de formador, de forum para o debate de ideias, de catalisador de experiências múltiplas a par com as funções de recreio e de lazer. Desejo um futuro ainda melhor para a nova Direcção que agora assumiu os desígnios da Associação, bem como para todos quantos se mantêm activos nas acções e objectivos desta singular e tão significativa Associação – a ADERAV.


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