No mercado surgem
dispositivos que permitem acoplar as duas máquinas. Custam dinheiro.
Mas juntando-se esforços, os obstáculos económicos
podem ser ultrapassados. E foi isto o que sucedeu. Em breve, os
ingredientes necessários para a confecção de um filme sonoro
estão reunidos. É só ocupar alguns serões fazendo a montagem e a
locução das cenas.
Durante vários
dias, acompanhei a preparação da primeira sessão de cinema em
local público. Curiosamente, entrei facilmente nos aspectos
técnicos e fílmicos e, a certa altura, era um crítico feroz. Um
fedelho de oito anos não deixava passar nenhum deslize! E quando as
coisas não batiam certo, o miúdo dava logo a solução, perante a
surpresa dos mais velhos, que começam a verificar que as bocas do
fedelho batem sempre certas. E, a partir de então, não fazem nada
sem o ter na equipa.
Vi-me,
subitamente, perfeita e agradavelmente enquadrado numa equipa de
adultos. Em todos os momentos, quer para trabalhar, quer para dar
umas escapadelas, aos fins de semana à noite, ao restaurante e bar
da Fábrica de Cerveja, no Porto, as uns duzentos metros do Palácio
de Cristal, o miúdo acompanhava os graúdos. E parece que o catraio
tinha faro! Naquelas noites de convívio, aos sábados, no «Nosso
Café», o miúdo pressentia quando os adultos estavam para sair
para o Porto. Largava os companheiros de brincadeira e juntava-se aos
mais velhos,
para não perder o passeio e os agradáveis momentos de
convívio na Fábrica da Cerveja.
Pois é verdade! Pouco tempo depois,
a longa metragem estava montada e a locução feita.
Uma das cenas
mostrava uma partida amigável de ténis em Espinho, no campo em
frente à escola e à nossa casa. Eram pessoas conhecidas. Entre elas,
um engenheiro ligado às obras de defesa de Espinho, que tinha
o ténis como principal desporto. Na cena seguinte, umas brasas
tomavam banhos de sol na praia. Uma delas tinha umas pernas
magníficas, dignas de fazer inveja às Marlenes Dietriches do
cinema. Na locução, creio que feita pelo meu pai, fazia-se a
apresentação do jogo e, logo a seguir, no momento da entrada da
cena seguinte, chamava-se a atenção para os encantos femininos:
«Depois de uma renhida disputa de ténis, admirem agora as pernas
desta magnífica brasa a veranear em Espinho...»
Na noite
combinada, obtida a autorização do dono do café, os nossos
amadores de cinema montam as máquinas no meio da ampla sala. A
enorme parede branca do fundo serve perfeitamente de tela de
projecção. O café está a abarrotar de clientes. Não há uma
única mesa livre. As pessoas amontoam-se à volta, em pé, cheias
de curiosidade.
Às dez horas em
ponto, apagam-se as luzes. Inicia-se a projecção
colectiva. Durante mais de meia hora, sucedem-se as cenas sem
qualquer imprevisto. As exclamações e os comentários abafam por vezes a locução, quando surgem caras conhecidas e
vários locais de Espinho. Nem a legenda «FIM» falta no fim da
projecção.
Os aplausos são
muitos e o desejo de repetir a sessão é manifestado por todos.
Perante tamanha insistência, a solução é rebobinar tudo: a
película e a fita magnética das duas máquinas que se encontram
acopladas por uma correia a um dispositivo de sincronização.
Cerca de um quarto
de hora depois, voltam a apagar-se as luzes. Reinicia-se a segunda
projecção, não havendo sequer tempo de efectuar um teste prévio,
para verificar se as duas bobinas, de imagem e de som, estão nos sítios
correctos.
A certa altura da
projecção, lá volta a surgir a cena de ténis. E volta-se a ver o
conhecido engenheiro, de calções curtos e pernas peludas a fazer
frente ao adversário. A sincronização não bate rigorosamente nas
mesmas cenas. Nas anteriores, o desfasamento passa quase
despercebido. A grande maioria das pessoas nem dá pelo sucedido.
Mas nesta, o erro é flagrante. Quando surge o engenheiro, no
preciso momento em que é mostrado num grande plano, com aquelas
pernas cheias de pelos, ouve-se nos altifalantes a voz do meu pai:
«Depois de uma renhida disputa de ténis, admirem agora as pernas
desta magnífica brasa a veranear em Espinho...»
Gargalhada geral!
O riso é tal que as cenas seguintes nem são devidamente
apreciadas. E o caricato episódio tornou-se o tema das conversas durante as horas e os dias seguintes.
Nas semanas
posteriores, na impossibilidade de se efectuarem filmagens, as
sessões públicas, de acesso livre e gratuito naquele café da
Avenida 8, decorrem com filmes de animação alugados no Porto, em
casas da especialidade. As sessões sucedem-se sempre com grande sucesso,
sempre com grandes enchentes do café, até ao dia em que,
subitamente, tudo finda abruptamente. E porquê abruptamente
se as sessões eram gratuitas e sem qualquer interesse
comercial? Muito simplesmente porque as noites em que havia sessões
coincidiam com o dia em que havia cinema no S. Pedro. Este
ficava completamente às moscas, dando à empresa um enorme
prejuízo. E como os donos eram amigos dos amadores de cinema e,
além disso, estes apenas queriam o prazer da magia do cinema sem
prejuízo para ninguém, tudo findou.
Findaram as
sessões e findou o cinema de 8 milímetros, o super 8, que depois
lhe sucedeu, e também o de 16 milímetros, no dia em que surgiram
formas mais económicas de registar as imagens em movimento.
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diversos tipos de informação sobre o cinema, bem como endereços
da Internet, para aumentares os teus conhecimentos, não deixes de
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