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Luís Jordão. Pintura de António Galvão. Clicar para ampliar.
Luís Jordão. Pintura de António Galvão

■  Editorial

O défice

 

Tem sido dito vezes sem conta, a tempo e o seu contrário, com nuances várias e com diversos graus de agressividade / intensidade, ao longo dos anos, que em todos os tempos houve gente rasca, gente à rasca e gente que se desenrasca, bem como os inevitáveis duplos ou triplos cruzamentos. Afirmação com que, genericamente e sem banalizações, concordo.

É claro que ambos os núcleos se podem acentuar, mais um ou mais o(s) outro(s), consoante o tipo de valores que enformem o perfil de quem nos dirige / governa / manobra e mais ainda de quem os dirige / governa / manobra a eles. Mas, para nossa desgraça, quem dirige os destinos deste rectangulosinho, até parece fadário, a maior parte das vezes enquadra-se no primeiro grupo. E isso (por nobres honremos bem as excepções) desde o tempo dos tempos.

Antigamente ainda se ia escondendo, ou pelo menos disfarçando/camuflando a silhueta a este indiscutível e incontornável facto, coisa que hoje, por desbragado, não é mais possível.

Só que, hoje também, com o evento desta absurda e incontrolável globalização, estamos sendo, simples e permanentemente, formatados segundo o gosto e interesse(s) da gente rasca, cada vez mais rasca, que se desenrasca e nos vai (des)governando. Isto é, se não nos pusermos a pau tendemos a ser todos gente rasca e, cada vez mais, muito à rasca.
Contudo, a gente rasca que se desenrasca passando por cima de tudo e de todos, às vezes ainda me consegue espantar com a hábil criação de casinhos em sucessão vertiginosa para camuflarem casos verdadeiramente importantes e até escabrosos, ou pelo menos para desviarem a nossa atenção da sua existência e importância. Mas deixa-me ainda mais banzado o facto de isto ser feito absolutamente às escancaras e o povo deixar-se, simplesmente, ir.

Por vezes assustam-me os pensamentos que me assaltam: será que é a gajada rasca que nos (des)governa que é mais inteligentemente perigosa do que eu pensava?... ou será que é o povo, à rasca, que é mais bronco, manso e acarneirado do que eu quero acreditar que sejamos?...

E assim se conturbam os meus dias. Cada vez mais com a convicção de que o grande défice deste país é de valores, simples e básicos valores, como por exemplo: o carácter, a honradez, a dignidade, a vergonha, o respeito pelos outros, etc., etc. ....

Como consequência da nova formatação / desformatação / formatação que vamos sucessiva e permanentemente sofrendo, com receio e sem querer saber a resposta, pergunto-me: como serão os filhos dos nossos filhos e depois os filhos deles?...

Luís Jordão

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