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AVIFAUNA
O GROU (Grus grus)

 

Carlos Ferraz da Conceição

I. Nas últimas décadas, o estudo e preservação da natureza tem vindo a suscitar um crescente e saudável interesse, em especial nos estratos mais jovens.

Neste singelo contributo no âmbito da temática em título, debruçamo-nos desta vez sobre uma curiosa ave, porventura pouco familiar à maioria da população, mas presente, muito em particular, no Alentejo – o grou.

Referimo-nos aqui ao grou-comum, a espécie pertencente à avifauna portuguesa.


II.
Os grous são aves de tamanho considerável, com dimensões semelhantes às da cegonha-branca (aproximadamente 1 m / 1,20 m de comprimento e 1,90 m / 2,20 de envergadura). Altos e de porte majestoso, têm pernas e pescoço compridos, plumagem de tom cinzento-prateado em quase todo o corpo, destacando-se um grande tufo de penas escuras sobre a cauda. De bico comprido e direito, a cabeça é a preto e branco, coroada por uma pequena mancha avermelhada (já os juvenis têm a cabeça e pescoço acastanhados).

O seu habitat de base é no norte da Europa e Ásia ocidental, nidificando na Primavera, em regra longe da presença humana, em terrenos baixos de zonas húmidas e pantanosas (florestas com lodaçais, junto a lagos, pântanos com canaviais, etc.). No período de namoro exibem-se numa dança muito peculiar, com vénias, saltos esvoaçantes e asas erguidas, soltando sons agudos.

Os ninhos são construídos pelo macho e fêmea, no chão ou em águas pouco profundas, com lama e vegetação, podendo ser utilizados em anos sucessivos. Neles são depositados 2 ovos, incubados pelo casal durante cerca de 30 dias.

No Verão ambos vivem escondidos com as crias, levando-as por vezes para terrenos com matas. Aos 2 anos de idade os juvenis atingem a maturidade.

Alimentam-se sobretudo de matéria vegetal (ervas, rebentos, folhas), grãos de cereais e sementes, mas também de insectos, vermes e alguns vertebrados (rãs, lagartos, etc.).

Exceptuando o período reprodutor, são aves fortemente gregárias, vivendo em bandos por vezes de grande dimensão.

No fim do Verão migram para o sul da Europa e norte de África, percorrendo em grupo distâncias consideráveis, voando numa espectacular formação em V ou em linha oblíqua. Descansam em campo aberto e passam a noite em pântanos.

São característicos os sons agudos emitidos, semelhantes aos de uma corneta ou trompete ("Krrau", "Krrau"…), numa comunicação entre si que ocorre tanto em voo como no solo. 

/ 24 / Estimam-se em mais de 40 mil os grous que invernam na Península Ibérica, dos quais 2 a 3 mil em Portugal, basicamente no Alentejo (onde também utilizam a bolota como alimento), podendo ser observados sobretudo entre Novembro e Fevereiro. Uma possível presença mais a norte do País será meramente acidental, uma vez que, no essencial, se concentram em 4 zonas: Moura-Mourão (a principal), nos campos a sul de Évora, nos montados em torno de Campo Maior e nas planícies de Castro Verde.

Para segurança do bando, pernoitam em dormitórios comuns, sempre junto a linhas de água e com boa visibilidade, espalhando-se durante o dia pelos campos, em grupos diversos, na procura de alimento. O voo de regresso aos dormitórios, ao fim da tarde, constitui igualmente um espectáculo digno de registo.
 

III. É uma ave antiquíssima – do grou do Canadá (grus canadensis), p. ex., foram encontrados fósseis de ovos idênticos aos de hoje, a que os cientistas atribuíram mais de 4 milhões de anos.

Esta presença tão remota, aliada às suas peculiaridades, tornaram o grou objecto de lendas e mitos ao longo dos tempos, sendo em alguns países associado à longevidade e à felicidade. Como curiosidade, refira-se ainda que é o pássaro símbolo da Arménia.

Não se tratando propriamente de uma espécie em perigo, está contudo em declínio nos últimos séculos – drenagens nas zonas de nidificação, alterações e redução do habitat nas zonas de invernada, etc., são ameaças que a vão tornando vulnerável, tendo-lhe sido conferido o estatuto de protecção especial, incluído em diversas convenções internacionais e directivas da UE.

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