David Paiva Martins, Aradas. Um olhar sobre a segunda metade do século XX. 1ª ed., Aradas, Junta de Freguesia de Aradas, 2011, págs. 15 a 18.

A PRESIDÊNCIA DE JOÃO NUNES DA ROCHA

O primeiro Executivo da Junta de Freguesia de Aradas, na segunda metade do Século XX, tomou posse exactamente no primeiro dia desse período: 1 de Janeiro de 1951. Era constituído pelos seguintes três elementos:

● Presidente – João Nunes da Rocha
● Secretário
João Gonçalves Madaíl
● Tesoureiro
António Ferreira Borralho Júnior

Todos eles pessoas muito respeitadas e importantes no meio local.

O Presidente, João Nunes da Rocha, que nasceu no Bonsucesso em 1 de Maio de 1912 e faleceu em 18 de Julho de 1994, era um "self-made man", ou seja, fez-se por si próprio. Era o mais velho dos nove filhos do pequeno construtor civil José Nunes da Rocha, conhecido pela alcunha de Zé Piolho. Partindo do nada, tornou-se no que porventura terá sido o maior empregador de toda a História da nossa Freguesia. Industrial do ramo de madeiras, começou com uma modesta carpintaria junto dos lavadouros do Bonsucesso, em sociedade com António Pereira Caetano, sob a firma Rocha & Pereira. Desfeita a firma, passou a trabalhar como empresário em nome individual. Dando largas à sua veia de visionário sonhador, ultrapassou o ramo inicial da simples carpintaria de madeiras e criou um produto novo, à base de aparas de madeira e cimento, que chamou de "Madel". Talentoso e empreendedor, aproveitou esse produto para construir casas pré-fabricadas, que vendia para múltiplas finalidades. Nomeadamente, terá vendido milhares para Moçambique, onde na região de Tete, no Songo, serviram para montar a cidade estaleiro das obras de construção da gigantesca Barragem de Cabora Bassa, no Rio Zambeze.

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A sua organização empresarial, distribuída pelo Bonsucesso, Lisboa e Moçambique, chegou a ter mais de mil trabalhadores em simultâneo. Numa Freguesia essencialmente rural, como a nossa era então, esse poder empregador na área da indústria foi duma notável importância económica e social.

João Nunes da Rocha, cuja história seria interessantíssimo que alguém escrevesse, era uma figura controversa, de relacionamento pessoal nada fácil. Isso contribuiu para que se visse forçado a abandonar os seus negócios e fugir para o Brasil, na decorrência dos acontecimentos subsequentes à Revolução do 25 de Abril de 1974. Voltou mais tarde e retomou a fábrica. Contudo, os tempos tinham mudado e ela não mais voltou a atingir o esplendor que tivera no passado.

O Secretário, João Gonçalves Madail, além de grande proprietário, era também um importante industrial do ramo das pescas.

O Tesoureiro, António Ferreira Borralho Júnior, mais conhecido pela alcunha de Roleta, agricultor, era igualmente um grande proprietário.

1 - Na primeira reunião, extraordinária, realizada logo após o acto de posse, no próprio dia 01/01/1951, o novo Executivo decidiu:

● Nomear escrivão Armindo Ramos Bartolomeu, do Bonsucesso, que entrou logo em funções.

● Mandar levantar uma planta do cemitério, fazer nova marcação de talhões e sepulturas e reparar as ruas do mesmo e alargá-Ias.

As consequências desta decisão – ou melhor, do modo como ela foi levada à prática – ainda hoje se fazem sentir na quase impossibilidade de as pessoas circularem entre as campas do agora chamado Cemitério Velho. É um problema que ficará para sempre.

Aliás, as questões do cemitério, pela sua delicadeza, e porque têm vindo sempre a ser motivo das maiores preocupações para todos os Executivos, incluindo o actual, irão neste livro ser objecto de capítulo específico.

– Mandar trancar todos os livros da Junta anterior e inutilizar todas as folhas em branco e utilizar livros novos para esta Junta.

– Reparar todo o edifício da Junta e aplicar uma fechadura nova na sala pequena. Fazer um balcão para essa sala, onde vai ser instalada a Secretaria, "para segurar o público, facilitando mais o exercício nas funções da mesma Junta assim",

João Nunes da Rocha - Clicar para ampliar.
João Nunes da Rocha. Nasceu no Bonsucesso em 1 de Maio de 1912.
Faleceu em 18 de Julho de 1994

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– Elaborar o cadastro dos pobres e indigentes desta Freguesia.

– Inventariar todos os móveis e aplicar-lhes uma etiqueta numerada.

2 - A primeira sessão ordinária da Junta realizou-se no dia 28 de Janeiro de 1951. Reunião em que foi tomada a controversa decisão de vender por cinquenta mil escudos, aos Serviços Municipalizados da Câmara Municipal de Aveiro, a rede de distribuição de energia eléctrica, venda em que a Junta anterior exigia o pagamento de cem mil escudos. Não vou aqui repetir o assunto porque já foi tratado com todo o detalhe em livro anterior (1).

3 - Lendo as actas de todo o mandato, verifica-se que o essencial da actividade da Junta foi o habitual: arranjo dos caminhos, das fontes e dos lavadouros. Obviamente que não vou deter-me em pormenores sobre essa matéria – embora não deva deixar de enfatizar um hábito saudável, que então se verificava e se prolongou ainda pelos mandatos das Juntas seguintes, até ao final do Século XX: quando comissões de habitantes se dirigiam à Junta a pedir o arranjo de algum caminho, era normal oferecerem os terrenos que fosse necessário ocupar nos alargamentos e ainda darem uma comparticipação financeira. As actas estão cheias de situações desse tipo. De há uma década para cá, no entanto, esse hábito perdeu-se de todo. Agora todos exigem tudo! Mas ninguém é capaz de retribuir com o quer que seja!

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(1) MARTINS. David Paiva, "Aradas - Um Olhar Sobre a Primeira Metade do Século XX". 2008, J. F. Aradas, páginas 245 a 253.
 

 

 
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