Um animador da natação aveirense - Homenagem efectuada em Novembro de 1992.


ATITA

Todos os oceanos a seus pés!

À mesa do café disse-me que o pensamento é livre. Aprendeu essa máxima do pensamento modernista quando um dia na sua juventude soube que homens que admirava profundamente, como Mário Sacramento, Álvaro Neves, Costa e Melo, João Sarabando, entre outros, tinham sido garroteados num dos mais fáusticos dos direitos de personalidade que a Revolução Francesa tinha trazido á humanidade e que era o direito de ser livre e de ser diferente.

Emigrou para se fazer economicamente homem. Soube ser gente, num país onde cada um é ninguém.

Ouviu falar do Bob Kennedy porque John era já apenas a memória dos americanos sérios, repousando lá, onde a posteridade começa, varado pelo fuzil do imperialismo mais retrógrado. Lá, na sede social do patrão do mundo, onde todas as forças policiais não encontraram ainda um culpado convincente para a morte de um Presidente.

Um dia este pequeno Homem de olhos abertos para o futuro reparou que numa piscina havia outros homens menos felizes que respondiam à hilariedade geral com a mesma incerteza de Galileu perante a inquisição: a terra não seria seguramente redonda, mas movia-se.

Dedicou-se então ao ensino de invisuais porque, como escreveu Brecht "é um crime cantar as flores quando há crianças que morrem de fome". A nossa surdez mental calou esse gesto. Prosseguiu, não para ganhar a História mas para ganhar o companheirismo de todos. Mário Sacramento poderia ter pensado nele quando apostolou "Deus não nos perguntará se fomos pios, mas se fomos fraternos".

Muitas gerações lhe devem esse acto de sobrevivência que é saber nadar. Soube moldar campeões. Mas, mais do que isso, soube criar Homens. Poço de Santiago, Piscina do Beira-Mar, Biarritz, Piscina do Liceu de Aveiro, têm constituído oficinas de atletas, templos de adoração e redenção ao trabalho dedicado, caboucos de orgulho futuro de Aveiro.

E se este homem, já avô, mereceria outra implementação da natação em Aveiro, merece com certeza a homenagem de muitas gerações de jovens que aprenderam a flutuar sobre a sua virilidade de menino.

Caramba: nem sempre se deve esperar pelos mortos para os perturbar no seu silêncio sepulcral. Temos tempo demasiado para estar mortos. Ganhemos por enquanto os nossos vivos.

Até porque para ti, Eduardo Raposo Rodrigues de Sousa — ATITA — todas as crianças do mundo terão direito a enxugar as suas lágrimas de pedintes perante as montras mudas de todas as pastelarias do Universo.

Ora viva ATITA! Cambio para usted!

João Seiça Neves


 

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