Liturgia Pagã

 

«Longo caminho para a liberbdade»

3º Domingo da Páscoa (ano A)

1ª leitura: Actos dos Apóstolos, 2, 22-33

2ª leitura: 1ª Carta de S. Pedro, 1, 17-21

Evangelho: S. Lucas, 24, 13-35

  

É o título da célebre obra autobiográfica de um grande homem que soube caminhar na vida. Só se afoita a um caminho «longo» quem tem força para ser paciente, sem desistir perante perigos, insucessos e desilusões.

Os escritos de S. Lucas (evangelho e Actos dos Apóstolos) dão lugar de relevo às ideias de «caminho», de «abrir os olhos» e de fazer bem aos outros – sobretudo para quem atravessa dificuldades (as boas relações humanas).      

Disso é bom exemplo o relato de hoje, que retrata na perfeição um dia «bem longo»… 

Dois discípulos de Jesus (entre outros!) não viram mais do que tragédia na sua paixão e morte. Não aguentaram ficar em Jerusalém e partiram para a terra, Emaús. Fugiram perante a dor, como também se foge às contrariedades. É uma táctica de defesa, por vezes necessária, mas que revela fragilidade. (Em contraste, as mulheres discípulas de Jesus permaneceram em Jerusalém para os rituais do luto. E porque aguentaram a caminhada desses «dias longos», também foram elas as primeiras a «abrir os olhos» para a «nova forma de vida» de Jesus crucificado).          

Esperava-se tanto daquele homem que morreu tão novo e tão tragicamente! Como acontece quando nos morre um companheiro, um amigo, um filho… Ou quando se desfaz um projecto em que todos punham a confiança.

Contudo, eram dois homens bons, que apesar de tudo se atiraram a uma «longa caminhada» e não se enfiaram na solidão. Pelo contrário, continuaram a discutir sobre o acontecido e apreciaram a companhia de um forasteiro que seguia o mesmo caminho. Conversaram com ele, contando os sonhos e mágoas e prestando atenção à opinião desse desconhecido.

E não se ficaram por uma boa conversa. Como anoitecia ao chegarem ao destino, convidaram o forasteiro, que ainda seguia viagem, a passar a noite com eles. Durante a caminhada, já tinham admirado a maneira como ele iluminava o sentido do que acontecera a Jesus de Nazaré. À refeição, porém, aconteceu uma coisa estranha: foi o desconhecido quem partiu o pão e o distribuiu. Nessa altura, «abriram os olhos» e reconheceram esse gesto de Jesus na última ceia, que ainda hoje é a parte central do culto cristão. E «viram» que era Jesus quem tinha caminhado com eles. Não fora destruído pela morte e partilhava da plenitude da Liberdade própria de Deus.         

Mas não foi «a liturgia da palavra» ao longo do caminho, nem sequer a «bênção e partilha do pão», central na «eucaristia», que os fizeram «ver Jesus». Faltava o compromisso humano em cumprir o grande mandamento: mostrar amor, fazer o bem, acolher.

Sem o exercício da hospitalidade, os dois discípulos continuariam sem «ver». É verdade que o coração deles «ardia» com as palavras que ouviram no caminho. Mas eles próprios sabiam contar na perfeição o que se passara com Jesus (S. Lucas põe na boca deles a mais antiga forma do credo cristão, que se encontra na 1ª leitura, sobre «Jesus de Nazaré»…). Faltava dar testemunho desse «credo», para se «libertarem» do pessimismo e do sentimento da vida como prisão. Como S. Paulo escreveu, «foi para a liberdade que Cristo nos libertou» (Gálatas,5,1).

O radical de «liberdade» significa «crescimento» constante da pessoa – o lema que devia estar presente em todo o tipo de relações humanas e particularmente quando pretendemos desempenhar o papel de educadores. Só quando passamos das palavras aos actos é que os outros acreditam em nós e descobrimos que Deus nos acompanha e alenta a não fugir perante as dificuldades do «longo caminho para a Liberdade».

04-05-2014


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