In: Manuel Cintra Ferreira, O Barão Aventureiro, Nº 18, Algueirão, Secretaria de Estado da Reforma Educativa, M. E., SD, 24 pp.

O Barão Aventureiro

Texto de Manuel Cintra Ferreira

Brochura acerca do filme «O Barão Aventureiro» - Dim. 21x14,5 cm - Clicar para ampliar.

   Ficha Técnica
    O Filme

    Sinopse

   Crítica

   Situação do Filme na História do Cinema

   Relações Interdisciplinares - História

   Figuras ilustres e a literatura fantástica

   Casanova

   Cagliostro

   Munchhausen e a Literatura Fantástica

   Opiniões

   O Realizador

   Filmografia e Bibliografia

    Videografia

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O Barão Aventureiro
O filme

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Título português: O Barão Aventureiro. Título original: Munchhausen. Realização: Josef von Baky. Argumento: Berthold Burger (pseudónimo de Erich Kastner), segundo as histórias de Karl Friedrich Hieronymus, Freihern (Barão) von Munchhausen. Fotografia (em Agfacolor): Werner Krien. Direcção Artística: Emil H. Gulsporf. Música: Georg Haentzschel. Efeitos Especiais: Konstantin Irman-Tschet.

Interpretação: Hans Albers (Barão de Munchhausen), Herman Speelmanns (criado Cristiano), Kathe Haak (Baronesa Munchhausen), Brigitte Horney (Catarina da Rússia), Ferdinand Marian (Conde Cagliostro), Gustav Waldau (Casanova), IIse Werner (Princesa Isabella D'Este), Leo Slezak (Abdul Hamid), Andrews Engelmann (Príncipe Potemkine), Michel Bohnen (Príncipe Karl von Brunswick), Hilde Von Stoltz (Luise La Tour), Marina Von Ditmar (Sofia Von Riedesel), W. Leitgeb (Príncipe Grigori Orlow), Herbert Von Meyerinck (Príncipe Anton Ulrich), Jaspar Van Oertzen (Príncipe Lansgoi), Werner Scharf (Príncipe Francesco D'Este), Marianne Simson (a Mulher da Lua), Franz Weber (Príncipe de Ligne), Eduard Von Winterstein (o velho barão Munchhausen). Produção: U.F.A., 1943. Duração Original: 132 minutos. Cópia restaurada pela Fundação Friedrich Wilhelm Murnau em 1978. Versão inglesa: 104 minutos. Estreia Mundial: Berlim, em 3 de Março de 1943. Estreia em Portugal: Lisboa, cinema Ginásio, a 4 de Novembro de 1943, distribuído por "Libsboa Filmes". Reposto no cinema Monumental em 3 de Julho de 1955 (distribuição Momento Filmes), e no cinema Alvalade, a 13 de Janeiro de 1981 (distribuição: Filmes Castello Lopes).

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Sinopse

O filme começa com um baile de gala com os participantes vestidos como no século XVIII. Alguns sinais de anacronismo (luz eléctrica, relógios de pulso) mostram que não estamos naquela época e sim no período contemporâneo (da produção do filme: 1941). Um velho, o barão de Munchhausen, conta aos que o rodeiam que tem 200 anos de idade, conheceu Catarina da Rússia e personagens famosas como o Conde de Cagliostro e Casanova. Em flash-back começa a história das mirabolantes aventuras do barão, agora, sim, no século sugerido.

Encontramo-lo de abalada para a Rússia para ser oficial ao serviço de Catarina II. Pelo caminho tem um encontro insólito, o lendário Conde de Cagliostro, senhor de magia e mestre do ocultismo, que lhe dá a faculdade de não envelhecer e um anel que tem a propriedade de o tornar invisível.

É graças ao anel e à sua galanteria que seduz a Imperatriz, que lhe dá um posto de destaque no exército, partindo para a guerra contra a Turquia. Durante o cerco de Ortchakoff, defendida pelos turcos, consegue entrar na fortaleza por acidente: voando em cima da bala expelida pelo canhão em cima do qual se encontrava. O seu espírito jovial e o saber conquistam os favores do sultão que lhe poupa a vida e o mantém ao seu serviço. Apaixona-se pela princesa Isabella d'Este que se encontra prisioneira no harém do sultão, e liberta-a na sequência de uma aposta que ganha com a ajuda do criado.

Partem para Veneza onde vivem um romance de amor, mas o irmão de Isabella rapta-a durante o Carnaval e encerra-a num convento. Muchhausen desafia-o para um duelo e ridiculariza-o durante o combate. É-lhe dada ordem de prisão pelos esbirros do Doge mas consegue escapar com o seu fiel criado numa Montgolfieira (balão). No balão alcançam a Lua, onde um dia corresponde a um ano terrestre e os habitantes conseguem separar as cabeças dos corpos, e a rainha o procura seduzir. Quando regressa à terra decorre o ano de 1900. Casa com uma rapariga que ama apaixonadamente e renuncia ao privilégio da imortalidade.

O flash-back acaba com Munchhausen envelhecido terminando a narrativa aos amigos. Verdade, ou mais uma das invenções do popular personagem, parece interrogar o seu rosto no plano final.

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Crítica

Quando se fala de cinema alemão dos anos 30 e os primeiros da década de 1940, a imagem que surge é a de uma tenebrosa fonte de transmissão ideológica nazi. Filmes de propaganda sempre os houves, fosse qual fosse o regime em que surgissem, mas é evidente que nalguns casos a "mensagem" surge sobrecarregada. O cinema alemão desta fase não é um caso particular. Na mesma década e da mesma forma manifestava-se um cinema de características idênticas, mesmo que de sinais diferentes: os filmes que celebravam o culto da personalidade de Estaline na URSS, as epopeias fascistas italianas, e manifestava-se nesta antinomia nos regimes democráticos: o cinema "colonialista" americano opondo-se ao da denúncia das injustiças sociais que saíam dos estúdios da Warner Brothers e, em França, os filmes próximos da Action Française de Charles Maurras (Les Croix de Feu) e os que se identificavam com o Front Populaire (La Vie est à Nous e La Marseillaise, de Jean Renoir).

Quando hoje se redescobrem muitos dos títulos menos polémicos desses países sob regime ditatorial, verifica-se que, se "mensagem" existe, há também uma predominante do espectáculo, tendo com função o entretenimento. E aí se encontram, expurgadas de suspeitas ideológicas, as verdadeiras manifestações da arte cinematográfica. Na URSS, as comédias geniais de Boris Barnett, na Alemanha os melodramas e comédias musicais de um Willi Frost (Mascarada) e um Georg Jacoby (A Mulher dos Meus Sonhos, com a popularíssima Marika Rokk).

O Barão Aventureiro inscreve-se nesta última categoria, mas é bom que não nos deixemos confundir. Quando Munchhausen diz no fim que, 200 anos depois, o espírito do aventureiro vive em si, não se pode (ou não se podia, na altura da estreia) deixar de pensar que é ao espírito da Alemanha que ele se refere, particularmente se considerarmos que o século em referência é o de Frederico o Grande, o unificador do I Reich, que o cinema Nazi transforma num dos seus mitos de referência obrigatória (O Concerto Real de Sans Souci, Os Dois Reis, etc.).
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Mandado produzir por Goebbels para comemorar os 25 anos da casa produtora UFA (que detinha praticamente o monopólio do cinema alemão) houve o cuidado, por parte dos seus autores de evitar qualquer referência ideológica, pelo menos de forma aberta. Isto explicará, em parte, como um argumentista como Erich Kastner (no index devido às suas ligações com a esquerda democrática antes da chegada dos nazis ao poder) seja convidado para o escrever, mesmo que para isso use um pseudónimo, e a importância dos meios postos à sua disposição. Mas reflecte também o sempre frustrado desejo de Goebbels de dar ao cinema alemão o equivalente às obras-primas do cinema estrangeiro. Houve sempre, da sua parte, o desejo que a Alemanha tivesse o "seu" Couraçado Potemkine, mas as suas réplicas, Morgenrot, Gustav Ucicky (em termos de acção) e Hitlerjunge Quex, de Hans Steinholf (em termos de propaganda) nunca de perto chegaram à obra-prima de Eisenstein, apesar da sua reconhecida eficácia. O Barão Aventureiro procurava ser também uma réplica a um filme famoso e recente: O Ladrão de Bagdad, a produção britânica de Alexandre Korda, dirigida por Michael Powell. O que distingue os modelos da imitação é um pormenor fundamental. Os primeiros são produtos de dois homens de génio, para quem o cinema não era apenas uma máquina de reprodução de entretenimento, mas um meio de expressão artística, e as imitações resultaram do trabalho de artesãos experientes mas sem a centelha do génio que transforma um filme, mesmo de propaganda, numa obra-prima. No caso de O Barão Aventureiro, se o filme sobreviveu ao tempo, mas mesmo assim dentro de certos limites (o encanto que transmite não deixa de vir impregnado de um certo tédio), é mais pelas características da personagem e da fantasia que parece correr livremente, do que pelo trabalho de Josef Von Baky.

Por vezes a câmara arrasta-se pesadamente em momentos em que se requeria agilidade e invenção, e a única excepção é a da festa russa, deslocando-se com elegância por entre os bailarinos. A posição de Baky é a de um "registador" de sequências, sem participação activa na sua encenação nem mesmo na escolha dos ângulos de filmagem.

Um dos trunfos maiores de O Barão Aventureiro, na altura da sua estreia, foi a cor. A Alemanha respondia ao processo americano do Technicolor com o que se chamou Agfacolor. Os problemas técnicos que o seu uso levantava tornavam-no um processo moroso e dispendioso. E o Agfacolor e os efeitos especiais levaram a maior da fatia de um orçamento astronómico para o tempo, qualquer coisa como 60 000 contos em moeda portuguesa, que o tornou o filme alemão mais caro até então feito. Apesar de conhecido e usado em curtas metragens há já vários anos, é só em 1942, depois de uma desastrosa tentativa dois anos antes, que o Agfacolor é usado numa longa-metragem: A Cidade Dourada, de Veidt Harlan e, imediatamente a seguir em O Barão Aventureiro. A estranha e fria beleza deste sistema de cor fascinou os espectadores mas revelou-se, com o tempo, um suporte rapidamente degradável. Já na reposição nos anos 50 perdera muitas das qualidades originais e, com o tempo, todos os filmes fotografados neste sistema se / 7 / deterioraram em tons malvas, semelhantes a pétalas secas no meio de livros. Em 1978 a Fundação Friedrich Wilhelm Murnau (nome de um dos maiores realizadores alemães do cinema mudo), de Wiesbaden, lança mãos da restauração da cópia. Os actuais meios técnicos de reconstituição da cópia permitiram que se aproximasse do original, mas todo o fulgor primitivo foi impossível de recapturar. Tanto mais que os técnicos não tinham, para trabalhar, o negativo primitivo, nem sequer a versão integral, tendo de o reconstituir a partir de cópias dispersas pelo mundo e em estados diferentes de conservação.

Dentro do seu género de feérie fantástica, O Barão Aventureiro é o único filme alemão deste período que pode competir com as produções saídas dos estúdios americanos e britânicos (o já referido Ladrão de Bagdad) e aí se encontra muito do encanto que o filme ainda hoje transmite. Mas não só. Há também uma curiosa elegância de movimentos dos personagens (que não têm, infelizmente, correspondência na câmara) que lhe dá um estilo requintado e aristocrático. Estilo que se prolonga pelos diálogos brilhantes de Kastner, sintéticos e marcados pela ironia, um estilo de escrita que por vezes lembra a dos filmes de Lubitsh. E se os efeitos especiais (devidos a Konstantin Irmen-Tschet, especialista do Agfacolor, operador de Hitlerjunge Quei) perdem se cotejados com os dos filmes americanos e ingleses seus contemporâneos, torna-se evidente, hoje, com a patine que o tempo lhe aplicou, que o seu fascínio reside exactamente na sua ingenuidade, que lhe dá a autenticidade dos primitivos. Robert Brasillach e Maurice Bardeche interrogavam-se na sua Histoire du Cinéma se se poderia refazer Mélies em 1943. A resposta parece ser afirmativa. O "charme" de O Barão Aventureiro é o das coisas primitivas. Não tem a intemporalidade das obras-primas mas resiste ao tempo, e surge como uma das mais insólitas obras da sua época, com o seu não-sei-quê de "kitsch".
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Situação do Filme na História do Cinema

Já se disse que O Barão Aventureiro foi produzido para comemoração do 25.º aniversário da UFA, a companhia que detinha o monopólio do cinema alemão. O filme de Josef Von Baky foi também a sua última grande produção. Desta forma, a sua história passa, naturalmente, pela do estúdio.

A U.F.A. (iniciais de Universum Film Aktien Gesellschaft) foi criada em 1917, durante a guerra, inspirada pelo general Ludendorf. Outras tentativas para concentrar os dispersos produtores alemães (em 1917 são cerca de 31), tinham sido feitas desde o ano anterior: a Deulig, ligada ao trust Hugenberg, em 1916, e a B.U.F.A. em 1917, mais ligada ao exército e que procurava doutrinar e mentalizar os soldados alemães atraídos pelas doutrinas extremistas de esquerda, que a Revolução de Outubro na Rússia popularizara.

Prévia à concentração industrial havia uma vontade nacionalista, de defesa dos seus valores culturais num campo que até 1914 estava praticamente colonizado pelas companhias dinamarquesas.

Em Novembro de 1917 a sua nova companhia é formada com capitais do governo e da indústria privada, num total de 20 milhões de marcos, 8 do primeiro, que queria utilizar o cinema como arma de propaganda ("a guerra mostrou a força da imagem e do filme como meio de educação e de influência nas massas", disse Ludendorff) de que só filmes dos aliados tinham mostrado a eficácia, e 12 da segunda, divididos pelas aciarias Krupp, a I.G. Farben, que controlava a indústria química, a A.E.G., da electricidade e o Deutsche Bank. À partida, pois, a U.F.A. constitui-se como uma forma de desviar a atenção das massas de preocupações "perigosas para a ordem social".

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Rapidamente se segue uma política de anexação e controlo das companhias existentes que, a pouco e pouco, vão sendo integradas dentro do monopólio (primeiro a P.A.G.U., depois a Messter Film), em simultâneo com o controle das salas de exibição, então nas mãos do trust dinamarquês Nordisk. Em pouco tempo a U.F.A. transforma-se na companhia cinematográfica mais poderosa da Europa, ultrapassando em importância a PATHÉ francesa. Em 1919 abre em Berlim uma das maiores e mais luxuosas salas de cinema da Europa, o Ufa Palast Am Zoo, inaugurado com um filme que em si próprio constitui uma espécie de programa: Madame Dubarry, do jovem Ernst Lubitsch, onde a abordagem da Revolução Francesa era um pretexto para atacar as ideias deixadas pelo movimento spartakhista, afogado em sangue, com os seus dirigentes Rosa Luxemburgo e Karl Liebknetch executados. Poucas resistem à anexação, e uma delas é a famosa Decla-Bioskop, dirigida por Eric Pommer, que deixou o seu nome ligado ao período de ouro do que se chamou o "expressionismo alemão".
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Mas a pressão é forte e em 1923 também esta companhia passa a integrar o trust, sendo dado a Pommer o lugar de director de produção. O seu trabalho permite uma certa diversificação, dando uma feição mais eclética à produção da UFA. Surgem as grandes manifestações nacionalistas, que são as obras-primas de Fritz Lang, Os Nibelungos e Metropolis, o Fausto, de Murnau, mas também obras como O Último dos Homens, do mesmo realizador e, no começo do sonoro, O Anjo Azul, de Sternberg.

A crise da depauperada economia alemã, sujeita ao pagamento de indemnizações de guerra, saídas do tratados de Versalhes, ataca também a indústria cinematográfica em 1925, o que leva a UFA a procurar uma injecção de capital americano (já presente através da participação nas companhias que a financiavam do Banco Morgan e da General Electric, entre outras). Desta vez os acordos são feitos com estúdios de cinema, que entravam com 17 milhões de dólares tendo como contrapartida um aumento da quota de exibição dos seus filmes no mercado alemão (que chegou a cerca de 50%). Foram os chamados acordos "Parafumet" (Paramount-U.F.A.-Metro). O homem dos acordos que vêm salvar a indústria de cinema alemã é o Dr. Alfred Hugenberg, pró-nazi e dirigente de um grupo de extrema-direita apoiante de Hitler. Segue-se um período de modernização e construção de novos estúdios, e o controle da Tobis Klangfilm a partir do advento do sonoro.

Com a chegada dos nazis ao poder, em 1933, e o controle do cinema pela "Reichsfilmkammer" criada por Goebbels, a UFA torna-se um ramo da propaganda interna e externa do regime (e, na altura, o mais eficaz), dividindo a sua produção entre os chamados filmes de "evasão" (comédias sentimentais e musicais, melodramas) e os de propaganda, quer através de faustosas reconstituições históricas tendo por personagens grandes figuras nacionais (Frederico o Grande: O Concerto Real de Sans Souci, Os Dois Reis), Bismark, episódios da resistência anti-napoleónica e filmes que, a pretexto de "reconstituição histórica" se destinavam a manter / 10 / vivo e aumentar o sentimento anti-britânico (a Joana d'Arc de Gustav Ucicky e, mais tarde Ohm Kruger, um filme sobre a revolta "boer", de Hans Steinnhofl que, com Veidt Harlan, foi o realizador oficial do regime), quer de filmes destinados a divulgar a ideologia nazi (Morgenrot, de Ucicky, Hitlerjunge Quex, de Steinnholf, Triumph des Willens, sobre o congresso nazi de Nuremberga e Olympia, sobre os Jogos Olímpicos de 1936, ambos de Leni Riefenstahl). Em 1942, a U.F.A. passa a ter, por decisão de Goebbels, o controle de toda a produção do chamado "Grande Reich": a Alemanha e todos os países ocupados. Era porém, o canto do cisne. A produção total, a diminuir progressivamente (118 filmes em 1936, 89 em 1940, 64 em 1942) apenas regista um aumento em 1944 com 75 filmes. No ano seguinte, em vésperas da queda de Berlim, estreava a última produção, Kolberg, de Veidt Harlan, um apelo à resistência até ao fim, uma super-produção com milhares de figurantes que o Guiness Book inclui na sua lista de recordes: terá sido o filme com mais figurantes que espectadores.

O fim da guerra marcou o desmembramento deste "império de cinema". A UFA, mantida em sequestro ou reconvertida, nos outros países, pelos Aliados. Em 1955 nasce uma "nova U.F.A. em Dusseldorff e Berlim, reproduzindo, na sua constituição económica, a forma de 1925 (curiosamente 1955 é também o ano em que se lança no mercado a reposição de O Barão Aventureiro) e, salvos alguns aspectos ideológicos, o seu estilo de produção não era muito diferente (excepto na qualidade). O crescimento da influência da televisão trouxe a crise à "nova" UFA, que declara falência em 1962 com um défice de 5,3 milhões de marcos. No mesmo ano passa a dedicar-se exclusivamente à televisão e a maioria das suas acções ficam do grupo editorial Bertelsmann.
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Relações Interdisciplinares - História

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O Barão Aventureiro decorre, numa boa parte, durante a guerra russo-turca do século XVIII, em particular durante a campanha da Crimeia. A data não é acidental, por parte do filme. A conquista de Ortchakov pelos turcos teve lugar em 1739, e em 1740 sobe ao poder Frederico II na Prússia, e já dissemos da importância que este nome teve no cinema nacionalista da Alemanha dos anos 30.

Aliás, faz coincidir os "duzentos anos de espírito alemão", a que Munchhausen se refere no filme, com a idade do aventureiro. Apesar da forma mais ou menos anedótica da presença do Barão na corte do sultão, há na situação (e na importância que ela adquire) um referência à abertura que Nadir Xá procurou fazer à cultura e às reformas do Ocidente.

Poder-se-á ver no filme uma forma indirecta da Alemanha de 1942 procurar pôr fim à guerra mantendo o "status quo" das ocupações? A hipótese tem a sua viabilidade por outras ilações do filme com o passado: a derrota da Rússia frente aos turcos, Munchhausen na corte de Catarina lI, também ela procurando uma abertura ao Ocidente.


Munchhausen, outras figuras ilustres e a literatura fantástica

Nesta história fantástica encontramos mais de uma personagem real, representantes duma época a que se deu o nome de "Século das Luzes". Muchhausen será o seu lado mais pueril e anedótico. O espírito do tempo deve ser procurado (mas este filme a isso pouco ajuda e as fontes devem ser outras; para tal consulte-se a bio-filmografia) nas figuras de Cagliostro e Casanova, encontros breves do nosso herói respectivamente em Moscovo e no carnaval de Veneza. Comecemos pelo famoso Barão, porque dele é o filme.
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Por detrás da lenda, e das suas fantásticas e imaginativas proezas, está uma personagem real. Karl Friedrich Hieronymus Freiihernn von Munchhausen foi o seu nome real. Nasceu a 11 de Maio de 1720, em Bodenwerder, Hanover, e na mesma terra morreu a 22 de Fevereiro de 1797.

As suas aventuras reais parecem ter-se limitado à participação na guerra russo-turca, como oficial alemão ao serviço do exército de Catarina II, em 1740. Retirou-se depois para a sua terra natal onde criou fama como contador de histórias, inventando, para gáudio dos ouvintes, as mais incríveis façanhas que teria cometido como soldado, caçador e desportista. Este espírito inventivo reflectia a curiosidade do século pelas coisas novas, pois essas "aventuras tanto projectam as ideias modernas e as especulações da ciência do seu tempo (a astronomia, os balões, o aumento de velocidade nas comunicações) como exploram, em novas variações, mitos e tradições mais antigas, como Charles Perrault fazia meio século antes com as histórias populares (e o criado de Munchhausen que corre como o relâmpago parece inspirar-se no "Gato das Botas"). A primeira colectânea de histórias suas apareceu entre 1781 e 1783: "Vademecum fur lustige Leute", mas a personagem só se tornou um modelo a partir de 1785 com a publicação anónima, em Londres, de uma antologia das primeiras histórias por Rudolf Eric Raspe. A edição de 1793, intitulada "The Adventures of Baron Muchhausen" é o texto que serve de base à maioria das edições posteriormente publicadas, traduzidas em Portugal por Luís Quintino Chaves em 1904.

Mas, como todas as histórias deste tipo, cada nova edição acrescenta um ponto. A edição inglesa de 1811 acrescenta a fantástica viagem à Lua, trazendo-o também a Portugal, onde vai ajudar a família real a fugir para o Brasil (!). Eis uma aventura à espera de imaginosos argumentistas portugueses.

Entre 1838 e 1839 o poeta alemão Karl Lebrecht Immermann (1796-1840) publicou um "Munchhausen" em 4 volumes que descrevia as aventuras de um descendente do famoso barão.

Transformado em personagem de folclore, Munchhausen seria, naturalmente, alvo de interesse do cinema desde muito cedo. Em 1911 Geoges Méliès realiza as Hallucinations du Baron de Munchhausen. Dois anos depois, Émile Cohl faz um filme de animação, Le Baron de Crac (outros dos nomes com que é conhecido o aventureiro). Depois da versão de Kastner/Baky, foi a vez da Checoslováquia fazer um filme que misturava personagens reais com cenários animados, dirigido por Karel Zeman em 1961: Baron Prasil (exibido entre nós também com o título O Barão Aventureiro).

É a animação que de novo se apodera da personagem em 1977, desta vez sob a direcção do francês Jean Image: Les Fabuleuses Aventures du Légendaire Baron de Munchhausen.

Finalmente em 1988 o inglês Terry Gilliam realiza a última adaptação, até à data, numa dispendiosa super-produção, The Adventures of Baron Munchhausen, que entre nós recebeu o título de A Fantástica Aventura do Barão.
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Casanova

Giovanni Giacomo Casanova é outra das figuras características do século XVIII. Como Munchhausen e Cagliostro, morre quando triunfa a Revolução Francesa, que vem dar corpo aos ideias dos Iluministas.

Mas a figura de Casanova (1725-1798) é ainda hoje mais confundida com a do sedutor libertino (mas este termo tinha um sentido diferente de hoje, sinónima que era de liberdade e paixão pelas ideias novas).

Como outros "iluminados" foi suspeito ao poder estabelecido, por ateísmo e práticas de magia. A sua prisão em Veneza (onde Munchhausen, nas suas "invenções", o terá conhecido) e a espectacular evasão que praticou serve-lhe para uma crónica. "História da Minha Fuga das Prisões de Veneza"...

Viaja pela Europa entregando-se a diversos trabalhos, principalmente de carácter diplomático, usando também da intriga para fazer face aos problemas económicas, ao mesmo tempo que "coleccionava" as suas lendárias aventuras galantes, embora não tenha alcançado a estrutura mítica de Don Juan.

Possuía, porém, uma alta craveira intelectual, acompanhando o espírito e a cultura da sua época, e para ela contribuindo na literatura. Escreveu um romance de características fantásticas ("Icosameron") e terminou a sua vida como bibliotecário do conde de Waldstein, na Boémia, dedicando parte do seu tempo à redacção das suas "Memórias", que o lançaram na lenda, e que apenas recentemente (1960) foram publicadas na íntegra.

A figura de Casanova, com não podia deixar de ser, interessou também o cinema. A primeira e mais célebre versão data de 1927, com o galante aventureiro interpretado pelo actor russo Ivan Mosjoukine no filme "Casanova" de Alexandre Volkoff. Uma espectacular produção a preto e branco, mas com sequências coloridas, cuja versão restaurada passou na Cinemateca Portuguesa em 1989.

As outras versões mais conhecidas são italianas. Uma, de 1969, realizada por Luigi Comencini tomava como ponto de partida a juventude do libertino: Infanzia, Vocazione e Prime Esperienze di Giacomo Casanova, Veneziano (A Iniciação Sexual de Casanova). A outra traz a assinatura prestigiosa de Frederico Fellini. O seu Casanova data de 1976 e tem como intérprete Donald Sutherland.

Porém, menos conhecidos, existem outros dois filmes. Em 1946 o francês Jean Boyer dirigiu Georges Guetary numa série de aventuras galantes em Les Aventures de Casanova (As Aventuras de Casanova). Dois anos depois, nos EUA, o realizador mexicano Roberto Gavaldon deu o papel ao galã latino da época, Arturo de Córdova, num puro "swashbuckler", que leva o nosso herói a Nápoles para derrubar o seu despótico rei: The Adventures of Casanova (Casanova, o Patriota).
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Cagliostro

Como Casanova, também Cagliostro é uma personagem real cuja lenda superou os factos.

O conde Alexandre Cagliostro é muitas vezes identificado com um aventureiro italiano, Giuseppe Bálsamo, tese que Alexandre Dumas, Pai, assume como autêntica nos seus romances-folhetins "Joseph Balsamo" e "O Colar da Rainha", reunidos com o titulo comum de "Memórias de um Médico".

O personagem assim conhecido teria nascido em 1743 e falecido em 1795. Com Casanova e Munchhausen, o fim da sua vida coincide com o fim da velha sociedade. Eles são, pelo seu comportamento e cosmopolitismo, símbolos das novas ideias. Mas a actividade de Cagliostro (que em O Barão Aventureiro encontramos na corte de Catarina ll) está mais ligada, em termos concretos, à luta contra as instituições aristocráticas, do que a dos outros. Ligado a associações maçónicas, participou em associações secretas que prepararam a criação dos Estados Confederados na América e prepararam a Revolução Francesa. A ficção de Dumas coloca-o no centro de uma intriga destinada a desacreditar a monarquia, que ficou conhecida como o "caso do colar da rainha", um dos muitos incidentes que levaram à convocação dos Estados Gerais em 1789, alvorada da Revolução. Verdade ou não, a lenda, como já se disse, tomou o lugar da realidade. Certo é que Cagliostro, devido às suas actividades seria preso, julgado e condenado pela justiça papal.

A sua figura inspirou vários escritores, para além de Dumas. Schiller e Goethe dão-lhe uma faceta mais ou menos simpática. Thomas Carlyle, por sua vez, publicou um ensaio muito crítico acerca dele, destacando a influência que ele teria exercido na franco-maçonaria europeia. É por este lado, mas transformado numa espécie de neo-paganismo, que Gérard de Nerval aborda a personagem de Cagliostro em "Les lIIuminés".

Naturalmente que o cinema não podia ficar indiferente a tão estranho e fantástico personagem. O que é estranho é que o tenha feito tão poucas vezes. Pois para além das suas aparições como "convidado" nas aventuras de Munchhausen, apenas o encontramos, também de forma secundária, mas várias adaptações do Affaire du Collier de Ia Reine, em 1929 por Gaston Ravel e em 1945 por Marcel L'Herbier. Nesta última, era interpretado por Pierre Dux.

A única vez que aparece como "cabeça de cartaz" é num filme que explora a sua atribuída faceta de alquimista, utilizando o seu saber numa conspiração contra Maria Antonieta, mais ou menos uma variação do famigerado caso do colar. Trata-se de Black Magic, que em Portugal recebeu como titulo o nome do seu herói, Cagliostro. Foi realizado em 1949 por Gregory Ratoff e na pele de Cagliostro encontramos alguém à altura da sua lenda: Orson Welles.
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Munchhausen e a literatura fantástica

As aventuras "inventadas" por Muchhause são, na sua maioria variações e adaptações das histórias tradicionais, condimentadas com os elementos das "Luzes" e as referências a personagens históricas reais que cativavam a imaginação popular.

Para além disso encontra-se nela uma "actualização" às ideias do tempo, em particular nas que as investigações e as especulações científicas suscitavam. Num ponto extremo poder-se-ia ver também na mesma linhagem, mas de uma forma mais culta, o "Frankenstein, ou o Moderno Prometeu", que poucas décadas depois escreveria Mary Shelley.

Mas o episódio mais conhecido de O Barão Aventureiro é o da viagem à Lua, e o "passeio" de Munchhausen em cima da bala de canhão, "concretiza" o velho sonho do homem de voar, manifestado desde a Antiguidade Clássica no mito de Ícaro.

O da viagem à Lua já tinha hipóteses vagamente "científicas". Por aquela altura já as "montgolfieiras" eram conhecidas, tendo-se já realizado muitas experiências ao longo desse século, o XVIII, desde que Bartolomeu de Gusmão, nos primeiros anos, fizera as suas experiências com a "Passarola" diante do rei D. João V. Porém, no campo da literatura, as experiências "bem sucedidas" vinham já de trás. No século anterior, Hector Savinien Cyrano de Bergerac (1619-1655) (mais tarde imortalizado por Edmond Rostand numa peça que tem servido de inspiração aos vários filmes sobre a figura de Cyrano), que além do famoso nariz (que apesar de tudo não era assim tão extravagante como o que Rostand lhe atribuiu) tinha uma esplêndida imaginação, escreveu um livro que, para além de ser a defesa das ideias novas sobre a Terra e os planetas apresentadas por Galileu e condenadas pela Igreja, se pode considerar como o antepassado da literatura de ficção científica: "Histoire Comique des États et Empires de Ia Lune et des États et Empires du Soleil".

A sua ideia é, decerto, a de criticar através da alegoria, a sociedade do seu tempo, defender as "Luzes" contra o obscurantismo, mais do que seguir o conceito que hoje se tem da "ficção científica" (mas à excepção do "space opera", a maioria dos grandes escritores do género, de Ursula K. Le Guin a Stanislaw Lem, projectam nos seus mundos futuros as inquietações e os problemas de hoje). Deste pondo de vista, para além das opiniões diversas sobre o seu valor literário, podemos aproximar as histórias de Munchhausen da literatura crítica à organização social do século, de um "Viagens de Gulliver" de Jonathan Swif1 ao próprio "Candide" de Voltaire. De Charles Perrault e da sua reconversão das histórias tradicionais à moral burguesa que começava a impor-se, e que conquistaria o poder político com a Revolução Francesa, já falámos. O século XIX irá desenvolver o tema, de forma mais "científica"; Edgar Alan Poe escreverá uma das suas melhores histórias inspirado numa "Viagem de Balão".
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Júlio Verne, levará os seus heróis à Lua, de uma forma que, para além do rigor científico que para a altura demonstrava, toma como ponto de partida para a viagem dos novos Munchhausens, outro meio de deslocação do lendário barão: o disparo de um poderoso canhão lança os personagens para a Lua, como a bala levara Munchhausen para a cidade sitiada.

H. J. Wells retoma o tema da viagem à Lua, no seu romance "First Men in the Moon" e, a partir de então, é rara a década, e depois o ano, que não tem a sua nova história a concretizar o velho sonho do homem. Primeiro a Lua, Marte virá depois. Mais tarde o Universo. Primeiro na ficção, depois na realidade.

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Opiniões

"Munchhausen faz do estúdio uma gigantesca bola de cristal, o objecto de todas as viagens, enquanto o barão a toma por um brinquedo (bola de bilhar, bola de canhão, balão), por um globo, como em O Grande Ditador". – C. T.. in Cahiers du Cinema. nº 320

Cada uma das suas aventuras revela a sua "imagerie" infantil que se anima com encanto disneyano, mas por vezes afirma também uma paródia tipicamente germânica". – Renaud Bezombes. in Cinematographe n.º 64

"O resultado é um grande momento do cinema alemão em comédia, acção e diálogo ligeiro". – Variety


"Sendo uma aventura fantástica, Munchhausen assemelha-se às fábulas clássicas, às narrativas de Rabelais, às proezas de Peter Pan ou mesmo D. Quixote e Sancho Pança". – Luís de Pina

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O Realizador

Se o nome de Josef Von Baky desperta uma certa curiosidade no cinema deve-se exclusivamente a O Barão Aventureiro. Mesmo que a sua carreira comporte cerca. de 30 filmes, entre 1936 e 1961, os restantes não justificam atenção de maior. Será, pois, o cineasta de um único filme, apesar dos êxitos comerciais que foram Uma Boca Sonhadora e Diário de Uma Mulher Apaixonada, dois melodramas muito populares nos anos 50 em particular graças à sua intérprete, Maria Schell, ou da sua sofrível nova versão do excelente melodrama de Gustav Ucicky, Dúnia, a Noiva Eterna.

Josef Von Baky, de nacionalidade alemã, nasceu em Zombar (Áustria-Hungria) a 23 de Março de 1902 e faleceu em Munique a 31 de Julho de 1966.

Depois de frequentar a Escola Técnica de Budapeste torna-se distribuidor de filmes e a seguir assistente de realização de Geza Von Bolvary em 1928 no filme Champagner. Com Bolvary vai trabalhar ininterruptamente até 1936, ano do seu primeiro filme como realizador, Intermezzo. Até 1941 trabalha quer na Hungria quer na Alemanha, mas nesse ano chama a atenção com o filme Annelie, graças, em particular, à interpretação de Luise Ullrich que ganha o prémio da melhor actriz na Bienal de Veneza. Dois anos depois é convidado por Goebbels para dirigir Munchhausen, super-produção a cores destinada a comemorar os 25 anos da criação da UFA. Via Mala feito logo a seguir será o seu último filme sob o regime nazi.

Os seus filmes nunca foram abertamente comprometidos, como se deu com Hans Steinhofl, Veidt Harlan ou mesmo Gustav Ucicky, daí que tenha sobrevivido sem sustos à queda do nazismo e voltado à direcção logo em 1947. Mas os filmes que dirige até ao fim da sua carreira não ultrapassam a mediocridade, sendo, muitas vezes, meros veículos para os intérpretes, como é o caso dos dois melodramas com Maria Schell, e um dos primeiros filmes com Romy Schneider: A Ilha Encantada de Robison.

Representante de um cinema estéril, cheio de concessões comerciais do pior gosto a sua carreira termina exactamente quando se ouve o toque a finados por este cinema, vindo de Oberhausen onde a nova geração se prepara para assinar o manifesto que marca o nascimento do "novo cinema alemão".
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Filmografia

1936 – Intermezzo;
1938 – Die Kleine und doe Grosse Liebe;

          – Asszony a Válaszúton (na Hungria)/versão alemã: Die Frau am Scheidewege;

          – A Varieté Csillagai (na Hungria)/versão alemã: Menschen von Varieté;

1939 – lhr Erstes Erlebnis;
1940 – Der HKleinnstadtpoet;
1941 – Annelie;
1942/3O Barão Aventureiro (Munchhausen);

1943/4 – Via Mala;
1947 – Und Uber Uns der Himmel;
1949 – Der Ruf;
          – Die Selltsame Geschichte des Brandner;
          – Das Tor zum Paradies;
1950 – Das Doppelte Lottchen;
1952Uma Boca Sonhadora (Der Traumende Mund);
1953 – Diário de Uma Mulher Apaixonada (Tagebusch einer Verliebten);
1954 – Du Bist die Richtige (Realizado por Erich Engel. Von Baky termina o filme.);
1955Dunia, a Noiva Eterna (Dunja) - 2ª versão de Der Posmeister, de Gustav Ucicky;

Bibliografia

Não é muito abundante a bibliografia referente ao filme O Barão Aventureiro ou aos seus responsáveis. De Josef von Baky, o seu realizador, as informações são escassas e nada acrescentam às que deixámos no início.

 

Os leitores interessados encontrarão alguns elementos (embora de carácter sucinto) nas várias enciclopédias e dicionários de cinema que se encontram no mercado, todas elas em língua estrangeira. Destacamos, entre as obras de fácil consulta na CINEMATECA PORTUGUESA, para monografias sobre o realizador, intérpretes e os estúdios da UFA.:


Dictionnaire du Cinéma, sob a direcção de Jean Loup Passek (Librairie Larousse -1986);
L 'Encyclopédie du Cinéma, de Roger Boussinot (Bordas - 1989);


Sobre o filme O Barão Aventureiro encontram-se algumas notas críticas feitas aquando da sua reposição em: Variety, de 21 de Junho de 1978;
Cinematographe nº 64, de Janeiro de 1981;
Cahiers du Cinéma nº 320, Fevereiro de 1981;
Celulóide nº 322, de Agosto de1981;
"Textos da Cinemateca Porluguesa"; Texto de Luís de Pina, aquando da exibição do filme no ciclo "Aníbal Contreiras"


(Todas as publicações são de fácil consulta na Cinemateca Portuguesa).

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O leitor interessado na história da UFA., do cinema alemão dos seus começos até 1945, em geral, ou sobre o período 1933-1945, poderá ler com proveito os seguintes livros:
O Ecrã Demoníaco, de Lolte Eisner (Edições Aster);
De Caligari a Hitler, de Siegfried Kracauer (existem várias traduções em inglês e francês);
Capital and Culture, (German Cinema 33-45), de Julian Petley (British Film Instítute, Londres, 1979);
Nazi Cinema, de Erwin Leiser (Seckelt & Warburg, Londres, 1974);
Le Cinéma Nazi, de Pierre Cadars e Francis Courtade (Eríc Losfeld - 1972);
Souvenirs, ou le Cinema selon Goebbels, de Veidt Harlan (trad. Ir.: France-Empire, 1974);
Films of the 3th Reich, a Study of the German Cinema, de David Tewart Hull (Uníversity 01 California Press -1969).
 

O Argumentista - Erich Kastner


Sob o pseudónimo de Berthold Burger que aparece no genérico da versão original de O Barão Aventureiro, esconde-se o nome de Erich Kastner, um popular escritor e poeta alemão, bem conhecido dos leitores adolescentes pelas suas histórias de Emílio: Emílio e os Detectives e Emílio e os 3 Gémeos.

 

Escritor e jornalista, nascido em Dresden a 14 de Fevereiro de 1899, participa na guerra de 14-18, retomando a seguir os estudos de literatura, história e filosofia, ao mesmo tempo que trabalha como jornalista e escreve argumentos para filmes, entre eles 3 em colaboração de Emeric Pressburger (que se tornaria conhecido em Inglaterra como colaborador de Michael Powell): Das Ekel, Dann Schon Lieber Lebertran (dirigido por Max Ophula) e a adaptação do seu popular romance Emílio e os Detectives por Gerhard Lamprecht, todos em 1931.


Identificando-se com a esquerda democrática vê os seus livros queimados pelos nazis quando chegam ao poder, que o mantêm sob vigilância, mas permitem-lhe continuar a trabalhar como argumentista.


Com o psedónimo de Eberhard Foerster escreve vários argumentos, entre eles Frau Nach Mass, de Helmut Kautner (1939-40) e utiliza de novo o de Berthold Burger para um filme de Hans Depe, de 1943: Der Kleine Grensverkher.


Depois da guerra instala-se em Munique em 1945 e prossegue a actividade de argumentista, voltando a trabalhar com Pressburger no filme que este dirigiu em 1953, Twice Upon a Time, e com Robert Staemmle na nova versão de Emílio e os Detectives, em 1956.


Em 1957 recebeu o prémio Georg Buchner. Faleceu em Munique a 29 de Julho de 1974. No ano seguinte foi criado um prémio de literatura juvenil com o seu nome.

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Os intérpretes
 

Hans Albers
 

Sendo uma produção de pres1ígio da UFA, Munchhausen junta alguns dos mais importantes actores alemães da época, a começar pelo intérprete do lendário Barão, Hans Albers. De seu nome completo Hans Philipp August Albers, nasceu em Hamburgo a 22 de Setembro de 1891 e faleceu em Munique a 24 de Julho de 1960.


Em jovem, ainda, abandona a actividade comercial para integrar uma companhia ambulante de teatro, e ao palco regressa depois da guerra de 14-18 onde foi gravemente ferido, trabalhando em simultâneo no cinema em papéis secundários. Torna-se notado no palco, em particular com os personagens de "Lilliom" e de "Peer Gynt". Mas se retomou esta criação de Ibsen na versão filmada em 1934 por Fritz Wennnndhausen, o mesmo não aconteceu com a de Ferenc Molnar (por 3 vezes adaptada ao cinema: por Frank Borzage, Fritz Lang e Henry King) apesar do dramaturgo ter considerado Albers como o melhor "Liliom".


É o cinema sonoro que vai estabelecer a popularidade que usufruiu durante muitos anos, a partir de 1930 com O Anjo Azul, em que faz o papel do amante de Lola-Lola, imerpretada por Marlene Dietrich (com quem já trabalhara duas vezes durante o mudo: fine Dubarry Von Heute, de Alexander Korda e Princezinha O Lá Lá, de Robert Land. Nos anos 30 interpreta uma série de filmes que vão da comédia musical ao 1ilme de aventuras, em especial Refugiados, que tem por tema a fuga de um grupo de europeus de Xangai durante a guerra civil, e o melodrama Variedades de Nikolas Farkas (segunda versão do famoso filme homónimo que E. A. Dupond realizou em 1925).
Actor de prestígio durante o nazismo, embora não se tenha comprome1ido aoortamen1e com o regime é escolhido para interpretar o lendário Barão para a super-produção da UFA, que culmina uJ1la série de personagens heróicos que desde 1938 criou sob as ordens de Herbert Selpin (seu amigo, caído em desgraça e preso por propaganda "anti-nacional" em 1942, tendo-se suicidado na prisão neSSe mesmo ano), entre os quais se destaca O Afajor TrenIc.


Depois do êxito de Munchhlusen interpreta um dos mais populares melodramas alemães do final da guerra: O Meu Destino é o Mar, de Helmut Kautner (19449.


Depois da guerra volta ao cinema em 1947 mas a sua hora já tinha passado. E ainda um excelente Barba-Azul na versão alemã de BatbebIeu de Christian-Jaque (1951) e é, com Romy Schneider, a única coisa digna de nota na medíocre versão de Harald Braun sobre o clássico de Mumau, O Último dos HoIfIens (1955), mas o resto dos seus trabalhos não ultrapassa a vulgaridade.

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Brigitte Horney


Brigitte Horney, que em O Barão Aventureiro interpreta a figura de Catarina da Rússia é um caso de vocação descoberta à força. Nascida em Berlim em 1911 inscreveu-se na Escola de Arte Dramática de Berlim por insistência da mãe, uma conhecida psicanalista, e acabou por se revelar a melhor aluna do curso, passando para o Deutsches Theater e o Volkkkkabuhne, e estreando-se no cinema em 1930 no filme de Robert Siodmak, Abschied. Entre 1938 e e 1943 foi conhecida como uma das melhores actrizes do cinema alemão, ao lado de Paula Wassely, Luise Ulrich e Hilde Krahl, em particular graças aos seus trabalhos em Befreite Hande, de Hans Schweikart (1939), lIIusion, de Viktor Tourjanski (1941) e Munchhausen.


Depois da guerra, entre os seus primeiros papéis detaca-se Enquanto Estiveres a Meu Lado, o melodrama de Harald Braun com Maria Schell, em 1953, ano em que casa com Hans Schwarzenski, arqueólogo e Conservador do Museum of Fine Arts de Boston, adquirindo a cidadania americana. A partir dos anos 60 aparece com frequência no cinema e na televisão, em telefilmes como Haus der Frauen, de Krzisztoff Zanussi (1978) e a série Das Erbe der Guldenburgs, de Gero Erhardt (1988).
Leo Slezak


Leo Slezak que interpreta o papel do sultão Abdul Hamid iniciou a sua carreira cinematográfica aos 50 anos, em 1932, distinguindo numa série de papéis secundários que o tornaram um dos mais solicitados "actores de composição" dos estúdios da Alemanha. Nos 11 anos de carreira cinematográfica fez cerca de meia centena de filmes, destacando-se em particular nas reconstituiçães históricas. Fez, entre outros, A Loira Carmen, Madame Pompadour, Páginas Imortais e Opereta, trabalhando com actrizes famosas como Martha Eggerth, Kate Von Nagy e Magda Schneider (mãe de Romy Schneider), e ao lado de Zarah Laender no famoso Heimat.


Leo Slezak nasceu na Morávia a 18 de Agosto de 1872 e faleceu na Baviera a 1 de Junho de 1946. Era filho de um oficial do exército austro-húngaro e tornou-se um conhecido cantor lírico. Estudou canto em Brno e nesta cidade se estreou, como tenor, no papel de Lohengrin, em 1896, entrando para a ópera de Berlim em 1898 e fazendo parte da ópera de Viena de 1901 a 1934, tendo-se notabilizado nas óperas Os Huguenotes e Aida. A sua carreira cinematográfica começa quando abandona o canto. Foi o pai de Walter Slezak, um actor também de composição muito popular nos EUA a partir de 1942 com Lua Sem Mel, de Leo McCarey.


Kate Haak


Kate Haak, que interpreta a figura da baronesa de Munchhausen, nasceu a 11 de Agosto de 1897 em Berlim, e nesta cidade faleceu a 5 de Maio de 1986.
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Casada com o actor Henrich Schrot, dividiu a sua carreira entre o palco e a tela, mas a partir do meio a década de 50 dedica a maior parte do seu tempo à televisão onde trabalhou praticamente até ao fim da sua vida.


O seu período de maior popularidade foi durante os anos 20 e 30, trabalhando com realizadores como Karl Freund, Lothar Mendes, Gerhard Lamprecht, Leopold Lindtberg, Veidt Harlan e Paul Verohaven. Para além de O Barão Aventureiro os seus filmes mais importantes são Annelie, também de Josef Von Baky (1941), Emílio e os Detectives, de Lamprecht (1931), Bal Paré, de Karl Ritter e Bismark de Wolfgang Liebneiner, ambos de 1940.


Ferdinand Marian


Ferdinand Marian é o lendário Conde Cagliostro em O Barão Aventureiro. Filho de um cantor lírico, nasceu em Viena a 14 de Agosto de 1901, e foi um dos grandes actores do teatro e cinema da Alemanha nos anos 20 e 30. Interpretou, entre outros, a versão alemã de O Túnel, de Kurt Bernhardt (1933), uma história de anticipação científica que descreve a construção de um túnel sob a Mancha ligando a França à Grã-Bretanha, ficção que hoje se tornou praticamente realidade, A Voz do Coração, um musical ao lado do tenor Beniamino Gigli, em 1936, o mesmo ano em que aparece em O Veneno dos Trópicos, de Detlef Sierk (que nos EUA anglicizou o nome para Douglas Sirk) com Zarah leander, e Madame Bovary, de Gerhard Lamprecht, ao lado da lendária Pola Negri.


Mas o seu papel mais famoso foi o de O Judeu Suss, no violento filme anti-semita realizado por Veidt Harlan em 1940, papel com que ficaria identificado. Às ordens de outro realizador do regime, Hans Steiinhoff, interpreta outro filme de propaganda antl¬britânica, O Presidente Krugger (1941), dando uma faceta particularmente odiosa a Cecil Rhodes na sua luta contra o boer que dá o título ao filme, interpretado por Emil Jannings.


Para além destes papéis de compromisso aparece também um melodrama de Helmut Kautner que dizem excelente, Romanze in MoU (1943) e mostra-se um excelente actor de comédia em In Flagranti, de Hans Schwikert (1944), o seu penúltimo filme. Os seus papéis nos filmes de propaganda colocaram-no na lista negra no final da guerra. A 7 de Agosto de 1946 suicida-se ao volante do automóvel numa corrida (outras fontes dizem que terá sido abatido, por engano, pelas forças de ocupaçâo).


IIse Werner


É a princesa Isabella D'Este em O Barão Aventureiro. Nasceu na Batávia em 1918 e trabalhou nos palcos da Áustria e da Alemanha. Estreou-se no cinema em 1938 mas o seu primeiro grande papel foi o de Suzanne, no ano seguinte, no filme Bel Ami

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de WiIIi Forst, segundo o romance de Maupassant. Bal Paré, de Karl Ritter (1940), confirma a sua popularidade e depois de O Barão Aventureiro interpreta, de novo ao lado de Hans Albert, O Meu Destino é o Mar, de Helmut Kautner (1944). Depois da guerra retoma a carreira no palco em digressões pela Europa e EUA, mas a carreira cinematográfica ficou sempre aquém do breve período de fama dos anos da guerra.


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Filmografia Complementar

Les Hallucinations du Baron Munchhausen, de Georges Mélies (1911).
O Barão Aventureiro, (Baron Prasil), de Karel Zeman (1961).
A Fantástica Aventura do Barão (Munchhausen), de Terry Gillian (1988). Cyrano de Bergerac (Cyrano de Bergerac), de Michael Gordon (1950). Cyrano de Bergerac (Cyrano), de Jean Paul! Rappeneau (1990).
As Viagens de Gulliver (Gulliver's Travels), de Max e Dave Fleisher (1939). Viagem à Lua (Le Voyage dans Ia Lune), de Georges Mélies (1902).
Os Primeiros Homens na Lua (First Men in the Moon), de Nathan Juran (1964).


Videografia
Até à data (Junho 1991), encontra em vídeo alguns dos filmes atrás referidos:
- A Fantástica Aventura do Barão (Munchhausen), de Terry Gilliam (Publivídeo).

- As Viagens de Gulliver (Gulliver's Travels), de Max e Dave Fleisher (Diger Vídeo).


Na ausência da edição videográfica de O Ladrão de Bagdad (mas o filme de Michael Powell passou
recentemente duas vezes na RTP, pelo que não será difícil arranjar gravação), pode ver-se:
- As Novas Aventuras do Ladrão de Bagdad (The Thief of Bagdad), de Clive Donner (Publivídeo).
Para a cuidada reconstituição de época e os efeitos de iluminação, a melhor comparação a fazer será com esse modelo de perfeição que é:
- Barry Lindon, de Sanley Kubrick (Kodak-Warner).

 

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Ficha técnica

Manuel Cintra Ferreira

Colaborador da Cinemateca Portuguesa

Crítico do Jornal "Público".
 

Paginação e Grafismo

Cândida Teresa

Gabinete de Meios Técnicos e Materiais

da Direcção Geral de Extensão Educativa
Dim. 21x14,5 cm


Edição

Secretaria de Estado da Reforma Educativa

 

Composto e impresso
 na Editorial do Ministério da Educação

Algueirão


Reconversão para HTML
Henrique J. C. de Oliveira
Espaço Aveiro e Cultura
Secundária J. Estêvão
Projecto Prof2000
Aveiro - 2012

 


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Actualizado em
20-04-2018