Vale de
Cambra (1),
elevada em 1927 a sede de concelho, do distrito de Aveiro e comarca de
Oliveira de Azeméis, é uma vila de 1054 habitantes, bastante trivial,
mas rodeada de uma * paisagem extraordinariamente verdejante.
Por toda a parte, à sua volta, se sente a frescura e a conversa das
águas. A Beira Litoral tem neste fertilíssimo rincão, de tão repousantes
perspectivas panorâmicas, os seus confins de nordeste: subindo a cumeada
da Serra da Freita, depara-se com a província do Douro Litoral; se se
alcançam as penedias de Arões, tocam-se as ombreiras da Beira Alta. A
pequena vila é quase forçosa estância para estes dois pitorescos
trânsitos.
– Pensões: Pensão
Suíssa,
a 3 km Nordeste, meia altitude, na estrada de Roge, para convalescença e
repouso (rasgadas vistas sobre o vale do Caima); na vila há a Estalagem
do Vale do Caima (aposentos bem mobilados, quarto de banho e terraço) e
a hospedaria Bastos (modesta); Cafés: Avenida; Posto telef.; Automóveis
de aluguer; Mercado aos Domingos; Iluminação. Electricidade (fornecida
pela Central hidroeléctrica do Caima); Água de poços e minas,
particulares; Sede de um posto zootécnico; Desporto: Associação
Desportiva Valecambrense; Feriado Municipal a 24 de Agosto; Carreiras de
camionetas para o Porto (50 km), Aveiro (50 km), S. Pedro do Sul (58
km), Arouca (21 km).
Antes de
1927 a sede do concelho era Macieira de Cambra, situada a 2 km Nordeste
da sede do concelho, a meia encosta, mas igualmente rodeada de terras
frescas e fecundas.
A vila tem como principal linha de
desenvolvimento uma avenida aberta no sentido N.-S. que dá saída para a
estrada de Castelões, destinada a prolongar-se pelo planalto de Arestal
até Sever do Vouga. Contígua à vila, na margem direita do Vigues,
encontra-se a povoação de
Vila Chã e a
igreja matriz da freguesia do mesmo nome. Ao Sul da vila estendem-se os
afamados Campos de Burgães,
que constituem o coração do Vale de Cambra, no ângulo interno da
confluência do Vigues e do Caima. Em abundância de água de regadio e
fertilidade só poderão competir, no nosso País, com este trecho rústico,
alguns dos mais privilegiados torrões do Algarve e do Minho.
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614 /
Para
aumentar ainda mais o rendimento dos Campos de Burgães e intensificar a
indústria local dos lacticínios, pela criação de prados permanentes, o
Estado, por intermédio da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica
Agrícola, construiu recentemente no lugar do Castelo, no Caima,
uma albufeira (com uma barragem de alvenaria de 24 metros de altura e um
dique misto), que permite a armazenagem de 330 mil metros cúbicos de
água de rega, a utilizar na estiagem. A obra importou em cerca de 5000
contos e efectuou-se entre 1936-42. Além da reconstrução de uma levada
antiga, o chamado canal de baixo, abriu-se um canal novo,
em curva de nível superior por onde a água de rega desliza em demorados
rodeios, ao longo da encosta da margem direita do rio, até às vertentes
do Vigues, entre Macieira e Vila Chão. O canal é acompanhado em toda a
sua extensão por um estreito carreiro. Em duas horas de agradável
passeio pode fazer-se esse percurso. Ao aproximar-se do açude derivador,
colhem-se formosas vistas sobre o vale. Advirta-se, porém, que em alguns
sítios a vereda corre, quase a prumo, sobre algumas ribanceiras, que
exigem companhia a quem for tímido ou sujeito a vertigens, se bem que
(diga-se de passagem) tais riscos em nada se aproximam dos das
impressionantes ravinas de algumas das levadas da Ilha da
Madeira. Para se visitar de automóvel a represa, utiliza-se a estrada de
S. Pedro do Sul até um pouco além da Ponte do Salgueiro (5 km).
Na albufeira, barcos de aluguer.
No decorrer das obras encontraram-se no
picoto pedregoso contíguo à barragem alguns objectos de interesse
pré-histórico, guardados pela Junta Autónoma. Relativamente perto
avista-se a igreja e aldeia de
Roge.
Longe, a Nordeste, no alto, a capela da Senhora da Ouvida. Em 5 horas de
caminhada, seguindo por Sandiães, Função, Paço de Mato e Ribeira de
Castanheira, poderia alcançar-se a catarata da Frecha de Misarela
(pág. 616).
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OUTROS
PASSEIOS
1.)
– A Castelões (3 km Sul). Ao fim de uma longa recta ondulada,
traçada através das várzeas regadas pelo antigo canal de Burgães,
atravessa-se o Caima (2 km Sul) pela estreita ponte (medieval) de
Coronados, de dois arcos desiguais, próxima da confluência do
Vigues. Em frente, no rebordo do planalto de Arestal, avista-se o
santuário da Senhora da Saúde. Em Castelões, igreja matriz, de três
naves. Perto, a casa solarenga de Areias de Cambra, que pertenceu ao
barão do mesmo título.
2.) –
A Carregosa (5 km Norte). Como muitas outras terras das redondezas,
pertenceu aos condes da Feira. Em 1700, por extinção do ramo directo
dessa estirpe, passou à Casa do Infantado. O bispo-conde D. Manuel de
Bastos Pina, fundador do museu de ourivesaria religiosa de Coimbra (pág.
258), fez aí edificar uma rica residência, a Quinta da Costeira,
«esplêndida propriedade rústica, cortada de extensas avenidas povoadas
de variado arvoredo, com belos jardins, estufas, lagos, cascatas e, ao
centro, um elegante Palacete» (Marques Gomes) e, entre 1899 e
1902, acrescentou a edificação dum santuário, delineado por ele próprio,
votado à Virgem de Lourdes, com singelos trabalhos de cantaria,
azulejos, frescos, talhas e outras decorações.
3.) – A Macieira de Cambra (2 km
Nordeste). Antiga sede de concelho. Teve foral manuelino em 1514.
Povoação muito airosa, rodeada de vinhedos e milharais em socalcos. Ares
saudáveis, de meia altitude. (Pensão Suíssa, a 0,5 km, para
convalescentes). Da freguesia de Macieira de Cambra era natural D.ª
Constança Afonso, irmã de D. Martinho Gomes Gil de Soverosa. Os seus
amores com D. Rodrigo Sanches, filho bastardo de D. Sancho I e da
decantada D.ª Maria Pais (a Ribeirinha) deram causa a que o irmão
matasse o infante em duelo, em 2 de Julho de 1245, nas proximidades do
mosteiro de Grijó, onde foi sepultado num formoso
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túmulo,
com estátua jacente (cfr. “Distrito de Aveiro”, Marques Gomes,
pág. 237).
4.) –
A Roge (5 km Nordeste, por Estrada Municipal). Dentro do adro,
eleva-se um * cruzeiro setecentista, de granito, alto,
equilibrado, coluna muito bem lavrada e assente em quatro esculturas. A
dois passos, a igreja matriz. Fachada setecentista não menos
elegante. No campanário notam-se, como curiosos pormenores de cantaria
lavrada, quatro gárgulas (figurando quatro grandes rãs
debruçadas, esculpidas em granito, na esquadria) e como remate da torre,
duas esferas, uma maciça, de granito, e outra superior, armilar.
O
portal, flanqueado por duas colunas torcidas, de capitéis decorados
com motivos vegetais, ostenta, na padieira, um friso de figuras
igualmente esculpidas em pedra, no qual assenta uma sobreporta de
vidraças coloridas. Ao centro do remate e ao longo da cornija
salientam-se outros lavores de cantaria e escultura (torcidos, sereias,
um brasão real, duas figuras), de relativo interesse, que denunciam o
desenho de um arquitecto não vulgar ao cinzel de bons artífices. No
interior do pequeno templo, é de notar, no berço da nave, um curioso
conjunto de caixotões de madeira pintados com ramagens e figurações
evangélicas. (A trave do portal, fendida, ameaça ruína).
Tanto o
cruzeiro como a igreja poderiam, sem favor, ser qualificadas obras de
arte religiosa turística e como tais apontadas no rol dos monumentos
nacionais.
Nesta
localidade teve um paço uma dama castelhana de nome Catarina Rojas,
trazida pela mulher de D. João III; desse apelido derivaria, no supor de
alguns, o nome da própria freguesia.
Do adro
da igreja avista-se a barragem do Castelo e grande largueza de
horizontes sobre o vale do Caima e as alturas de Arestal. A estrada que
conduz a S. Pedro do Sul contorce-se, em demorados lacetes, pelos
flancos da serra.
5.) –
A Arouca (20 km pela E.N. n.º 27-2.ª). Percurso de surpreendentes
panoramas montanhosos (ver voI. IV). De um dos seus pontos de passagem,
o lugar da Farrapa, pode fazer-se a ascensão às nascentes do Caima e à
impressionante queda da Frecha de Mizarela.
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(1)
– Por SANTANNA DIONÍSIO.
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