Estão
longe de acertar as opiniões relativas à origem destas palavras. Segundo
alguns, a designação beirão viria, possivelmente do nome por que
eram conhecidos os remotos habitantes do norte hispânico, os berones,
aos quais, vagamente, se refere, na sua relação geográfica, Estrabão.
Porventura
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deslocados do Ocidente, da vizinhança dos lusitanos, a raiz do nome
dessa tribo teria ficado ligada à terra herminiense, Para outros,
barões seria simplesmente a corrupção da palavra medieval barones,
derivada do germânico ber, bar, var (= senhor,
guerreiro, homem esforçado e cioso da vida livre), epíteto, no caso
presente – argumentam – justificado pelas virtudes de intrepidez e gosto
da independência, peculiares tanto dos habitantes primitivos desta
região (no dizer de Políbio e Diodoro), como dos invasores bárbaros,
como dos homens rudes da reconquista cristã.
Relativamente à palavra Beira, os
que não acedem em explicá-la pelas duas hipóteses anteriores, divergem
ainda. Alguns intentam fundamentar a sua origem na circunstância desta
região ter sido durante cerca de dois séculos (sécs. X e Xl) a faixa
confinante, na vertente atlântica peninsular, entre as duas
inconciliáveis forças: a cristã e a islamita. Beira seria assim
chamada como significando zona fronteiriça ou estremenha. [Em
consequência da deslocação para o sul, para a linha do Tejo, dos campos
de combate, a Beira teria cedido o seu papel e o sentido do seu
nome à Estremadura]. Mas, já para outros, tal explicação militar
e política não persuade. A palavra Beira viria essencialmente de
uma simples Intuição geográfica popular. A expressão – «Somos das
beiras» – não seria, no fundo, senão uma referência oculta à serra
da Estrela, sendo o equivalente elíptico da expressão: – «Somos das
proximidades e pendores da grande Serra» ou «Somos das abas ou beiras
da Serra». Finalmente, tem-se sustentado a presunção de que a palavra
Beira nasceu possivelmente na época do domínio agareno, sob a forma
arábica de Berryah ou Berriah, nome por que era designado
uma região particularmente inóspita da Arábia. O aspecto, tornado
escalvado pelas guerras, desta região peninsular teria sugerido, por
analogia, ao invasor a aplicação desse nome. De facto, como Herculano
acentua, na fase crítica da formação do pequeno reino de Oviedo, o
expediente digamos táctico a que os reis asturianos recorreram, a partir
de D. Afonso I, para se defenderem do poderoso moiro, foi o de criar em
torno dos seus precários limites, uma zona desabitada e hostil.
Propositadamente destruíam, incendiavam o que tinha valor, levando a bem
ou a mal, diante de si, para fora das regiões calcadas pelo invasor
africano, as populações resignadas ao seu domínio. As províncias que são
hoje o Minho, Trás-os-Montes e Beira sofreram particularmente a acção
destruidora dessa necessidade defensiva. A desoladora fisionomia que
tomariam as terras tornadas ermas pelo arrebanhamento das populações
godas levadas para as montanhas do Norte, e por virtude ainda das razias
periódicas que exterminavam a pouca população persistente, teria, no
parecer de alguns, justificado a similitude que o maometano descobria
entre esta feição desértica e a da sua oriental Berryah,
Por corrupção verosímil, desta palavra viriam as formas medievais
Bera, Beyra, Berya (designativas do Julgado, e depois
Comarca da Beira), inscritas em forais e outros documentos. Dessa mesma
palavra, vinda do Oriente, teria resultado, além do nome próprio da
província, o substantivo comum de significação afim, breia,
composto precisamente (acentua jubilosamente um proponente) das mesmas
letras que constituem o discutido toponímico.
A opção entre as debatidas soluções é
notoriamente embaraçante, podendo bem dizer-se que esta pequena
vexata quaestio é, no seu género, um assunto adequado a alimentar,
até à fadiga, os vagares da erudição. Dentre os nomes tradicionais das
províncias portuguesas, o nome Beira é o único que se tem de
considerar um dado irredutível a uma satisfatória justificação de
origem. Ainda nisso, por assim dizer, a autoctonia do beirão se traduz.
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(1)
– Por SANT'ANNA DIONÍSIO.
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