Antigos escritórios centrais em Aveiro – 1955

Passam-se os dias, e quantas noites, os meses correm e começa a nascer a saudade. O amanhã virá, mas quando? As notícias são muito raras. E a pesca, perguntam: terá sido boa? Mas o amanhã chegou no dia em que o cabo do mar vislumbra um ponto negro no horizonte e aguarda com paciência que ele se transforme no primeiro veleiro a chegar da viagem: o «Santa Isabel». Reina a confusão, correm os boatos do é e do não é, gritos de alegria e nervosismo, alvoroço, tudo se mistura no desejo de ver de perto, de agarrar, ainda ao longe, os entes queridos. Mas a barra não dá entrada e toda a alegria do momento se esvai. A esperança daquele dia morre nos corações dos que esperam. E lá vai, velas desfraldadas a perder-se de vista na neblina da tarde rumo ao Douro. Aí deixa a sua carga e volta à Gafanha meio envergonhado.

Isto da pesca do bacalhau tinha muito que se lhe diga!

Em pleno século XX a arte da pesca pouco se adiantava em técnica. Quantos veleiros doutras empresas, amarravam e apodreciam nos portos. O desalento era geral, quando, devido a um golpe de audácia, foram os navios da EPA mandados seguir mais para Norte no rasto dos estrangeiros, rasgando esperançosamente caminho nos mares da Gronelândia. Mas nem tudo que reluz é oiro. A falta de ventos nessas paragens prejudicava o andamento dos veleiros. Redobram-se esforços e então os navios são apetrechados com motores auxiliares.

Quantas críticas então surgiram; mas os veleiros seguiram o seu rumo e a calmaria jamais os deixou parados. Livres, corriam os mares e teimando, venceram!

Correm os anos trinta, altura em que o Estado toma medidas para defesa desta arte. Estão abertos novos horizontes à indústria bacalhoeira.

Foi então que Egas Salgueiro, gerente da EPA, submete à apreciação da assembleia geral a proposta de construção dum navio de arrasto destinado à pesca do bacalhau. Ideia magnífica, que, entretanto, causou críticas e falatórios. Mesmo a instâncias oficiais foi o pedido de construção recebido com certa reserva. Lutou-se desesperadamente / 25 / e transpostas todas as dificuldades burocráticas foi o navio «Santa Joana» mandado construir na Dinamarca. E a seu tempo lá partiu em viagem experimental, não famosa, mas as seguintes tiveram assinalado êxito.

Vista aérea do complexo industrial e cais privativo – Gafanha da Nazaré

Degrau a degrau, a EPA foi vencendo, pese fortemente contrariada em seus intentos. Nesta nova modalidade de pesca foi pioneira em Portugal.

Segue-se de imediato a construção do «Santa Princesa»; depois o «Santa Mafalda», «Santo André» e «S. Gonçalinho» que iniciaram a pesca em 1948. Em 1958 constrói-se o «Rio Alfusqueiro», posteriormente transformado em arrastão.

A vida da Empresa prossegue: em 1965 é lançado à água, em S. Jacinto, um arrastão pela popa de seu nome «Santa Isabel»; em 1966 nasce o seu irmão gémeo o «Santa Cristina». Em 1968 foi encomendado ao Estaleiro da Lisnave o novo arrastão pela popa, o «Santa Mafalda», que iniciou a pesca em 1969.

Mais recentemente procede-se à construção de três navios polivalentes para a pesca longínqua, o «Murtosa», o «Pardelhas» e o «Calvão», destinados à pesca no Sudoeste Africano e Namíbia, iniciando a sua faina em 1976 e 1977. Os investimentos destes três navios polivalentes excedem os 350 mil contos.

Em 1977 a EPA adquire em França o navio atuneiro cercador «Rio Águeda» ex-«Cap Saint Paul». É o primeiro barco deste género no país. O atum pescado é destinado ao abastecimento da fábrica de conservas da EPA.

A dado tempo a EPA tentou outras modalidades de pesca, a saber: a pesca por arrastões costeiros; a pesca da sardinha, por traineiras; e a pesca do atum com 2 atuneiros que, posteriormente, foram cedidos para Angola.

Como complemento das suas actividades pesqueiras, dispõe a EPA de amplas instalações em terra, como: secagem artificial para bacalhau; 15 câmaras de conservação de bacalhau com capacidade para 6000 toneladas; 5 câmaras frigoríficas e o complexo frigorífico com 4 câmaras com uma capacidade total de 4000 toneladas de peixe congelado devidamente preparado para filetagem e outro processamento de peixe; fábrica de conservas; oficinas metalúrgicas e eléctricas; carpintaria; oficinas de redes, armazéns diversos, etc.

Numa vida tão longa, já sexagenária, eis tanto quanto, numa pequena resenha, nos é dado referir sobre a Empresa de Pesca de Aveiro.

Os vindouros se encarregarão de completá-la no longo futuro de esperança que se adivinha.

Maria Armanda Grangeon
 

Escritórios da EPA – Aveiro, 1979

 

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