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farol n.º 23 - mil novecentos e sessenta e seis ♦ sessenta e sete, págs. 14 e 15.

INTERVALO POÉTICO

PARTIDA

Ana Maria da Silva Valente

Lá vão os dois,
unidos
numa só vida,
unidos
numa só tristeza.
EIe
parte p'ró mar,
sabe Deus se voltará...
Ela
fica chorando,
sozinha, triste,
pedindo às ondas salgadas
que embalem docemente
o barco que vê partir.
Quanta amargura nos olhos...
Quantas lágrimas no peito...
Momentos de felicidade...
onde estão?
Parecem tão longe,
tã0 distantes
na hora da partida...
Lá vão os dois...
EIe,
garboso,
sufocando no peito
lágrimas mais salgadas
que o mar
que uma o odeia.
Ela,
mais sincera,
menos forte,
olhos cansados de chorar,
lábios crispados de dor.
Mas, quando ele voltar...
Voltará a felicidade
e então...
ela
sorrirá às ondas salgadas
belas, bravias.
Lá vão os dois;
eles e Deus,
Esse Deus,
Esse Deus
que ouve a sua dor,
que consola;
que dá felicidade,
que os une.
 


Mundo ideal, radioso...

Donnie

Vamos formar um mundo radioso
Um mundo ideal por não pensado
Um mundo são, dócil e generoso.
P'ra refúgio do nosso mundo passado.


Onde a vida é livre de tortura
E vivida no ideal já traçado
Onde é sorrir e olhar com doçura
O nosso belo mundo sem pecado


Mas, se, enfim, deste mundo a maldade
Provar vier que este outro não existe
E sonharmos assim, é enganar,

Fugiremos nós para a eternidade
Onde a vitória do ideal subsista
E a Pureza assim vive sem murchar.
 


AGUARELA

Celeste Almeida

Novo alento!
A vida renasce!
Brota uma flor
Em cada rebento...
Em cada sorriso de criança
Hás sol no amanhã...
A campina cobre-se
De esperança.
Bailam no ar
Acordes de melodia...
Andorinhas de paz voam ligeiras,
Cruzando o céu azul!
De um claro dia,
O regato, no seu longo
E contínuo deslizar,
Areias e pedrinhas vai lambendo,
Tão feliz de as poder
Novamente beijar...
Nos corações há mais paz
E mais amor.
Há poesia a cantar
Dentro de nós.
Há uma chama nova,
Há mais calor...
Voltou a Primavera!
 


CORREM VELOZES AS ÁGUAS

Ana Maria da Silva Valente

Correm velozes as águas,
Como que fogem de mim,
talvez porque as olho
tristemente...
Odeio essas águas
azuis, ondulantes, fugidias,
traidoras.
Traidoras sim...
Trouxeram felicidade,
espalharam pelas margens
dias de sol, de alegria,
de Amor.
Nasceram flores,
as terras que as viram passar
ficaram mais belas.
Lembro-me bem
dessas águas límpidas
e serenas.
E agora, o que vejo?
Águas escuras, ondulantes,
agitadas, revoltadas,
numa luta atroz
com o vento selvagem.
Sentem-se vencidas,
tornam-se cruéis
e lavam as margens,
arrastando flores,
deixando lembrança,
recebendo lágrimas,
deixando tristeza...
Sinto o coração doer,
vendo passar essas águas
traidoras, cruéis
que tantas flores me deram,
tantas lembranças me deixam
e tantas lágrimas me pedem.

 

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08-06-2018