Um
estudo sobre o teatro de Jaime Gralheiro, e especificamente sobre a
fase realista da sua obra, é o objecto desta dissertação.
Concebêmo-la
primeiramente e em traços largos, como um registo de uma sistematização
que visa a divulgação de um dramaturgo vivo, autor de uma extensa
obra que se estende dos anos 60 aos nossos dias e que, nos seus
diversos períodos, reflecte o movimento histórico-social e cultural
das últimas épocas. Em segundo lugar, o nosso trabalho integra uma
componente de comentário, de perspectiva crítica, uma mais
persistente tarefa de reconhecimento das linhas mestras definidoras de
um cânone de peças da segunda fase que elegemos entre a amplitude de
uma produção, fazendo-se o levantamento de temas, de modelos, de
processos técnico-formais, enfim, das características mais
relevantes dessa escrita, comprovativas de múltiplas heranças, de
que se destaca particularmente a da estética neo-realista “après
la lettre”.
A
abrir, damos a conhecer no I capítulo um esboço do percurso biográfico
de Jaime Gralheiro, autor que ao teatro tem dedicado uma grande
actividade como dramaturgo e como encenador; apresenta-se também uma
tábua cronológica que constitui um primeiro contacto, em tom
enumerativo, com o conjunto da sua obra escrita.
No
II capítulo pretende-se recordar, partindo de estudos já feitos,
alguns momentos da História do Teatro português antes e depois do 25
de Abril de 1974, com todas as vicissitudes que a censura lhe impôs e
a descompressão que a liberdade implicou; destaca-se a par da evolução
dos tempos, uma via da evolução estética e ideológica marcante no
panorama teatral (a brechtiana) e que enquadra o teatro do particular
autor que aqui estudamos.
Retoma-se
no capítulo III a incidência sobre a dramaturgia de Jaime Gralheiro,
estabelecendo-se uma possível divisão em fases (diferentes mas
complementares), fazendo-se uma breve caracterização de cada uma
delas, com destaque para aquilo que melhor as define.
Os
dois capítulos seguintes expandem e aprofundam esta linha descritiva,
agora centrada na análise e na interpretação particular de peças
mais representativas da fase realista de Jaime Gralheiro em que
evidenciamos claramente dois princípios norteadores: por um lado,
aquele que ocupa o IV capítulo, o texto construído como uma
encruzilhada de influências, o teatro-documento, a intenção de denúncia
crítica e pedagógica subjacente à parábola histórica; por outro
lado, o pressuposto do teatro-divertimento (ao serviço daquela
primeira intenção), aspectos que constituem a matéria do V capítulo,
onde abordamos as diversas componentes que concretizam o cómico e o
risível.
Não
terminamos sem apresentar na Conclusão outros pormenores que fomos
detectando mas que, por ora, não couberam no âmbito do nosso propósito.
Das
motivações primeiras que inspiraram a escolha do assunto e do autor
diremos que elas se inscreveram em esferas muito pessoais:
encontram-se arquivadas em 75/76 na memória de uma jovem que fazia o
primeiro ano do seu curso na então nascente Universidade de Aveiro e
que, com o pós-revolução, despontava para as novidades e construía
a consciência da literatura, da arte, do teatro, com outra
intencionalidade que não a da mera finalidade estética. Das
primeiras representações de peças que então vimos, constam textos
de Jaime Gralheiro e ficou-nos algum fascínio da sua figura de
encenador acompanhando espectáculos que por esses tempos andavam
percorrendo o país.
À
distância, e sem termos dado conta, fomos sempre sabendo da
actividade de Jaime Gralheiro de cujo modo de expressão retivemos a
imagem de uma certa determinação, talvez exuberância, de uma
persistência optimista e interventiva.
De
modo que, ao termos de decidir, num curto prazo, sobre o tema de
dissertação de Mestrado, ele se nos impôs como um
caso pertinente a ser estudado e, talvez, divulgado. E porque não, se
isso nos levaria a enveredar por áreas que não conhecíamos em
profundidade e daí poderíamos colher algum enriquecimento pessoal e
profissional?....
Queremos,
entretanto, vincar dois condicionamentos que muito afectaram a realização
do trabalho: as precárias condições de tempo (um ano, ainda que com
mais seis meses de adiantamento) são indubitavelmente um forte factor
de limitação, sobretudo quando, simultaneamente, se cumpre um horário
de docência no Ensino Secundário a tempo inteiro, que por exemplo
nos impõe impedimentos de deslocações a espaços possuidores de
material bibliográfico que tem que ser consultado. Dificuldades e
obstáculos de outra natureza condicionaram igualmente nossa tarefa:
nem sempre se nos abriram espólios particulares e/ou de meios jornalísticos
e teatrais – alguns já extintos, outros sem acervo organizado.
Assim, da pesquisa bibliográfica feita, ressalta a consciência de
que ela não é exaustiva; e de que se afigura ainda mais relativa se
considerarmos, por um lado, que não pudemos aceder a textos de que tínhamos
referências; e, por outro, que alguns acasos puseram sob os nossos
olhos pistas que nos levaram a determinado material a que não víramos
ainda alusão.
Tratando-se
de um dramaturgo com vasta produção escrita e representada, algumas
das suas peças continuam inéditas em livro; outras têm edições há
muito esgotadas, pelo que foi necessário recorrer ao autor, com vista
à cedência de textos e/ou informação mais circunstanciada a que,
de outra forma, se não pôde/pode ter acesso.
Finalmente,
cumpre ainda anotar um certo desconforto por sabermos existir alguma
desproporção (incontornável nas circunstâncias de trabalho acima
mencionadas) entre a vastidão de um campo tão rico de estudo (que em
grande parte foi novidade para nós), a amplitude de uma obra e a
pequenez deste nosso olhar crítico.
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