Artur Jorge Almeida, Casas Nobres de Aveiro: Casa do Conselheiro Queirós, In: "Boletim da ADERAV", n.º 6,  Nov. 1981-Maio 1982, pp. 2-4.

Casas Nobres de Aveiro
IV - Casa do Conselheiro Queirós

 

Primitiva fachada da Casa do Conselheiro Queirós, em Verdemilho.

 

Situada na Rua do Conselheiro Queirós, em Verdemilho, é uma casa que indubitavelmente está ligada à História de Aveiro, dado o facto de o Conselheiro Joaquim José de Queirós ter sido o chefe do levantamento de 16 de Maio de 1828 contra o governo de El-Rei D. Miguel I.

Nesta casa viveu também, durante parte da sua infância, o grande escritor Eça de Queirós, neto do referido Conselheiro.

Na sua primitiva traça, era uma casa de rés-do-chão, pintada de amarelo, tendo ao centro um portal de granito ao qual dava acesso uma pequena escadaria do mesmo material. De cada lado rasgavam-se três janelas. Sobre o portal, numa platibanda de alvenaria que acompanhava a casa em todo o seu comprimento, erguia-se uma pedra de armas (1).

Após ter sido vendida sofreu grandes alterações motivadas pela adaptação a uma unidade industrial, tendo-lhe sido acrescentado um andar.

O brasão foi retirado por iniciativa do poeta Acácio Rosa, encontrando-se exposto no Museu Regional de Aveiro (2).

Trata-se de um brasão com escudo partido em duas palas, a primeira esquartelada, tendo no I e IV quartéis seis crescentes e no II e III um leão, por Queirós; a segunda, com uma cruz doble, bordadura e seis besantes, por Almeidas. Como diferença uma brica com um farpão. Sobre o escudo elmo e paquife.

Casa nas Quintãs, onde nasceu o Conselheiro Queirós (já demolida).

O Conselheiro Queirós nasceu nas Quintãs a 9-1-1774 e foi baptizado em Eixo a 17-1-1774. Era filho de José Marcelino Próspero, natural da freguesia de S. Salvador, do Arcebispado de Braga, e de Dona Joana Leonor, natural das Quintãs, os quais se casaram em Eixo a 10-2-1771. Eram seus avós paternos Custódio de Queirós da freguesia de S. Salvador, e Luísa Maria Teixeira de Vila Meão. E maternos Gabriel de Sousa, da Ilha de S. Miguel e Dona Josefa Bernarda, da cidade de Aveiro(3).

Da actividade política do Conselheiro Queirós não damos notícia detalhada. Bastará dizer que foi deputado da nação, desembargador da Baía e depois da Relação do Porto, ministro com o Marechal Saldanha, mentor como já atrás foi referido da revolta de 16 de Maio de 1828, organizada pelos conspiradores da loja maçónica dos Santos Mártires, da qual Queirós era membro (irmão Rosa-Cruz) (4).

No Brasil casou com Dona Teodora Joaquina de Almeida, natural de Fornos de Algodres (5). No Rio de Janeiro nasceram os seis filhos do casal: o primogénito, Dr. Joaquim Augusto de Almeida Teixeira de Queirós, sucessor de seu pai no foro de Fidalgo-Cavaleiro (6); o Conselheiro José Maria de Almeida Teixeira de Queirós, nascido a 17-7-1820; e mais dois rapazes e duas raparigas.

O Conselheiro José Maria de Almeida Teixeira de Queirós casou em Viana do Castelo, a 3-9-1849, com Dona Carolina Augusta Pereira de Eça (7), filha do Coronel José António Pereira de Eça que morreu por ferimentos recebidos nas linhas do Porto, em 1833.

Desta senhora tivera já um filho nascido na Póvoa de Varzim, em 25-11-1845, e baptizado na Matriz Colegiada de Vila do Conde, no 1.º de Dezembro do mesmo ano. Esse filho foi o célebre escritor José Maria de Eça de Queirós.

Eça de Queirós veio viver para Verdemilho já depois da morte do seu avô, ocorrida a 16-4-1850, e aí se manteve até ao falecimento de Dona Teodora Joaquina, a 3-11-1855.

Em 10-2-1886, casou-se Eça de Queirós, no oratório particular da Quinta de Santo Ovídio, propriedade da família da nubente, com Dona Emília de Castro Pamplona, nascida a 9-6-1857, filha de Dom António Benedito de Castro, 4.º Conde de Resende (13.º Senhor de Penela, 15.º Sr. de Reriz e Bemviver, Par do Reino, 18.º Almirante (de juro e herdade) de Portugal, Porteiro-mor da Casa Real, 8.º Capitão Honorário da Guarda Real dos Archeiros, Capitão graduado de Infantaria, Sr. do Morgado de Resende e Comendador da Ordem de Cristo), o qual nasceu a 30-11-1821 e faleceu a 24-4-1865, e de sua esposa Dona Maria Pamplona Carneiro Rangel Veloso Barreto de Figueiredo, nascida a 20-8-1819, filha dos 1.ºs  Viscondes de Beire.  



    Estado actual da casa de Verdemilho.

Dona Emília de Castro Pamplona era irmã do 5.º Conde de Resende, Dom Luís Manuel Benedito da Natividade de Castro Pamplona (nascido a 30-8-1844 e falecido a 23-5-1876, companheiro de Eça de Queirós na viagem ao Suez) e do 6.º Conde, Dom Manuel Benedito de Castro Pamplona, sucessor por morte de seu irmão nos títulos da Casa de Resende (8).

Do casamento nasceram quatro filhos: Dona Maria de Eça de Queirós, em Janeiro de 1887, autora do livro “Eça de Queirós Entre os Seus”; José Maria, a 26-2-1888; António, nascido em Paris a 28-12-1889, diplomata, escritor, galardoado com diversas condecorações nacionais e estrangeiras e que, conjuntamente com seu irmão José, participou nas Incursões Monárquicas de Paiva Couceiro; e ainda Alberto, nascido a 16-4-1891.

Eça de Queirós faleceu a 17-8-1900 na sua residência perto do Havre. Seu pai faleceu a 30-1-1901, em Lisboa, depois de haver sofrido a morte de todos os filhos. Foi esta a causa da ruína da casa de Verdemilho.

O Conselheiro José Maria de Almeida Teixeira de Queirós, desgostoso com a morte dos seus irmãos e de, na altura, alguns dos seus filhos, motivada pela tuberculose, tinha-se refugiado em Lisboa deixando a casa ao abandono.

É confrangedor o estado actual do edifício. Encontra-se em ruínas e muito provavelmente seguirá o mesmo caminho que a casa, nas Quintãs, onde nasceu o Conselheiro Queirós — a destruição.

É a todos os títulos lamentável que a memória das gentes seja curta. Em breve apenas restará da passagem de tão ilustres varões por esta zona o jazigo armoriado do Conselheiro Queirós, e este, mesmo assim, se resistir à sanha destruidora daqueles que querem negar a História (9).

Numa freguesia tão carenciada de instalações sociais, seria extremamente útil a recuperação deste imóvel.

ARTUR JORGE ALMEIDA

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NOTAS:  

(1) - A. NOGUEIRA GONÇALVES, “Inventário Artístico de Portugal — Distrito de Aveiro — Zona Sul”, Lisboa, 1959, p. 160.

(2) “Arquivo do Distrito de Aveiro’, Aveiro, 1942, Vol. VIII, p. 87.

(3) - Livros de assentos parocyiais da freguesia de Eixo.

(4) - MARQUES GOMES, “A Revolução de 16 de Maio de 1828”, Aveiro, 1928, p. 10.

(5) - JOÃO GASPAR SIMÕES, “Eça de Queirós”, Arcádia, col. A Obra e o Homem, n.º 4, 2.ª edição, s.d., p. 14.

(6) - ANTÓNIO LEBRE, “Eça em Verdemilho e a sua Vida”, ed. do autor, Aveiro, 1962, p. 303. A carta de sucessão dá-o como natural da freguesia de Ilhavo.

(7) - JOÃO GASPAR SIMÕES, ob. cit. p. 195.

(8) - ALBANO DA SILVEIRA PINTO e VISCONDE DE SANCHES DE BAENA, “Resenha das Famílias Titulares e Grandes de Portugal”, Lisboa, 1890, VoI. lI, pp. 394 a 397.

(9) - O primitivo jazigo da família Queirós encontrava-se no antigo cemitério paroquial, situado próximo do esteiro de S. Pedro. Com a construção do novo cemitério procedeu-se à trasladação dos restos mortais para o Outeirinho.

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