Aida Viegas, Pensar Alto (Poesia), Aveiro, 1992, p. 84.

Esperança

Ai se eu tivesse quem me ouvisse!
Ai seu eu tivesse quem me lesse!
Ai seu tivesse quem me sentisse!
Alguém sensível que compreendesse!

Do deserto, um oásis eu faria.
Podia transformar o pobre em rico.
Com palavras simples comporia,
Perfumes de jasmim, ou manjerico.

Faria brilhar a luz, na escuridão.
Levava ternura, a cada coração.
Faria soar em bela sintonia,
Notas dispersas que clamam harmonia.

Correria em cada vale, um rio abundante,
E a terra seria o Céu em cada instante.
Faria brotar água pura do rochedo.
Acabaria já, com todo o medo.
Abriria agora todas as cadeias.
Tornava lindas as donzelas feias.
Partir-se-iam as grossas correntes.
À superfície chegariam as nascentes.
Haveria muito mel, em todas as colmeias
E, todas as arcas estariam cheias.
A tristeza transformava em alegria,
Brilharia sempre, o sol em cada dia.

Ai seu tivesse quem me lesse... 
Quanto milagre, não acontecia!

Esse alguém preciso procurar.
Vou hoje, essa busca iniciar.
Será que a minha voz deva elevar
P’ra lá longe, eco, eu encontrar?
Ou no silêncio, só falar baixinho,
E escutar os outros com carinho?

Terei de combater guerras e males?
Terei de percorrer montes e vales?
Ou será que esse ser não se acha assim,
E eu deva procurar dentro de mim,
Aquilo que ainda não encontrei,
Para poder fazer, do servo um rei? 

Ai se esse alguém, essa força, eu encontrar...

Até de um humilde trovador
Que goste de viver com ilusões,
Desse, eu farei, mas sem favor,
Poeta famoso, qual Camões.


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