Em
mil novecentos e setenta e quatro, Angola encontrava-se em
enorme desenvolvimento agrícola, industrial e comercial. As
explorações mineiras haviam sido alvo de grandes investimentos.
As fazendas de algodão, de café e a criação de gado nunca
haviam estado tão prósperas.
Após
o vinte e cinco de Abril os movimentos grevistas fizeram descer a
produção até à paralisação quase total e a guerra civil
acabou com a economia, com a produção agrícola, bloqueou o
ensino, a construção civil, as pescas e todo o sistema económico
e financeiro.
A
desastrosa descolonização e a maneira apressada como o governo
português concedeu a independência constituíram esse processo
acabado de como se destrói um país com todas as condições para
ser próspero, processo a que o mundo assistiu e continua a
assistir com indiferença revoltante e confrangedora, essa
fogueira onde é queimada a vida de um povo; fogo que quando
parece começar a extinguir-se, é ateado por ventos funestos que
sopram dos mais inesperados quadrantes.
Pode
dizer-se que Angola no ano de mil novecentos e setenta e quatro
estava pacificada e Portugal tinha boas
condições para com
o povo Angolano, planear uma independência onde todos ficassem a
ganhar, no entanto assim o não quiseram os mandantes sem escrúpulos
decretando, desse modo, a uma condenação, sine
die aquele martirizado povo. Preocuparam-se em dar-lhe a independência,
mas não se preocupam entretanto que um povo seja dizimado por uma
guerra que foi fruto da sua inconsciência e das suas decisões,
enquanto senhores do poder, guerra da qual não se vislumbra o fim
porque, agora como sempre, outros valores mais altos se levantam.
A
grandeza deste imenso território, catorze vezes e meia maior que
Portugal continental, a sua enorme riqueza em solo e subsolo
possuidor de enormes jazidas de petróleo, ouro, diamantes,
ferro... um dos maiores produtores de café do mundo, além do
algodão, açúcar, sisal, banana e um infindável número de
outras riquezas a explorar, associadas à ambição de outros
povos, ditam o seu fatal destino.
Os
acordos do Alvor e Mombaça nunca foram cumpridos.
Dado
o contexto, nada nem ninguém poderia ter assegurado a permanência
dos Portugueses em solo Angolano. Certo é que o bom
relacionamento não nos deixava a salvo, embora os Portugueses que
ali viviam nada tivessem contra o povo Angolano, antes pelo contrário,
estimavam-no e gostariam de o ver crescer e prosperar com sua
terra, a grande Angola.
Estava
porém provado que não eram motivos pessoais que levavam os
naturais de raça negra a insurgirem-se contra
os brancos mas sim um conjunto de situações que haviam sido
criadas, alheias ao comum dos cidadãos.
Era
pois urgente abandonar Angola, não havia o mínimo de condições
para ali continuar, no entanto, já nessa altura constatávamos
que as maiores vítimas eram e continuariam a ser no futuro os
próprios Angolanos que iriam degladiar-se em lutas fratricidas,
fomentadas do exterior, não de uma forma inocente, como é óbvio.
Acredita Angola, fomos forçados a abandonar-te!
A
revolta que os Retornados hoje ainda carregam dentro de si,
situa-se muito para além de terem regressado despojados de todos
os seus bens, problema que a maioria há muito superou, consiste
sim no facto de todo esse despojo ter sido em vão. O povo que
supostamente passaria a usufruir de toda a riqueza inerente à sua
terra, acrescida daquela que os colonos tinham criado, em lugar de
viver na abundância, vive na miséria porque lhe falta a paz que
tanto tarda em chegar.
Angola
é agora o país com a maior densidade de minas anti-pessoal por
metro quadrado.
Os
magníficos prédios que proliferavam por toda a parte estão na
sua maioria sentenciados a serem implodidos tal o estado de
degradação a que chegaram num curtíssimo espaço de tempo. Os
campos foram abandonados, a rede viária descurada, os caminhos de
ferro destruídos... Os jovens crescem na guerra e, pouco mais
aprendem que a guerrear.
Dizia-se
por graça que após a descolonização faltava sal em Angola
porque os colonos haviam trazido consigo a semente. Hoje morrem à
fome os habitantes duma terra tão rica e farta. Cremos que nos últimos
tempos os recursos mais preciosos de Angola foram gastos em armas
com as quais seus filhos foram alvejados, sua vida é destroçada
de tal forma que não só o sal, mas até o peixe parece ter
fugido do seu mar, o pão de suas bocas e a esperança do seu
horizonte.
A
riqueza foi transformada em fome, amputações, morte e destruição.
Oh!
Terra bendita, que a natureza ornou de ouro e diamantes,
revestindo-te as entranhas de lavas ardentes que no âmago do teu
seio fecundam teu ventre de riquezas; envolve-te o sol num amplexo
abraço de paixão abrasadora e a chuva apaga teu fogo intenso
revigorando tua alma, a floresta, na imensidão das tuas
planuras...
Quisera
alegrar-me com teu povo na alvorada dum provir de ressurgimento e
progresso, onde soprassem ventos de mudança e de ventura,
mesclados na alegria dos teus batuques e nas máscaras de teus
lendários feiticeiros.
Quisera,
Angola! Ver-te crescer e eclodir, brilhar em novos horizontes de
esperança onde a paz fosse uma constante da vida e, um risonho
futuro uma forte e segura certeza. Que a fome não corroesse tuas
entranhas nem a guerra asfixiasse teus sonhos, sufocando-os à
nascença. Choro-te Angola! No sofrimento das tuas crianças, na
tristeza de teus jovens amputados por minas traiçoeiras, no
desespero de tuas mães, na morte à mingua de tuas gentes, nessa
terra bendita onde correm leite e mel.
Choro-te,
ao lembrar tuas belas cidades devastadas, teus vastos campos que
se tornaram improdutivos, semeados que estão de minas de morte,
em lugar do pão.
Tu
não merecias.., o teu povo não merecia...
Que
a semente da paz renasça em teu seio, que cresça, se fortaleça
e prospere para que os meninos voltem a sorrir, os homens a criar
riqueza e os velhos a abençoar os vindouros.
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