Manuel de Oliveira Marques Mateus nasceu em Aveiro (1928). Tem
70 anos e começou por jogar no Futebol Clube de Aveiro, aos 18. Com 21
anos foi chamado a integrar a equipa principal aveirense. Acode
sempre pelo Beira Mar e simpatiza com o Sporting. Gosta de ir ver jogar
a equipa aurinegra, de que é sócio, e sofre muito nos jogos. Esta é a
história de um grande profissional, tanto que nunca teve nenhum castigo.
É um homem muito feliz, que só lamenta ainda não ter
tido nenhum neto que se dedicasse ao futebol... Eis a sua história.
Desde sempre adorou o futebol, «tinha o vício da bola».
O primeiro clube que defendeu foi o Futebol Clube de Aveiro (FCA)
−
uma
equipa particular. Para integrar o plantel do Beira Mar era preciso ser
muito bom jogador. «Na altura eram quarenta e tais jogadores... Tínhamos
que trabalhar muito para chegar a titular.» Foi chamado três vezes ao
Beira Mar, mas nunca chegou a jogar. Entretanto, o FCA acabou e houve
alguém que o levou definitivamente para o Beira Mar. «Comecei a treinar
e fiz três jogos em reserva. Depois, subi à categoria de principal, onde
fiquei até deixar o futebol em 1959, tinha 30 anos.» Deixou o futebol,
«não porque ainda não
estivesse em forma, mas porque exigiram a 4ª classe. Eu não tinha a 4ª classe. Mas continuei a
treinar, porque eles precisavam de 22 jogadores para os treinos.»
Manuel Mateus jogou durante 10 anos, mas «não ganhei
muito dinheiro. Ganhava 200 escudos pelos treinos e tínhamos os prémios
de jogo; dava para as minhas despesas.» Mas os treinos eram duros. «Treinava às sete da manhã e
tomava banho em
água fria! Depois, ia para o emprego e, no dia seguinte, era a mesma
coisa.» Todo este sacrifício porque gostava muito de jogar. Mas os sacrifícios não se ficavam
por aqui, e, mesmo em termos de alimentação... «Todo o atleta tem que
ter muito cuidado com o que come e com as horas a que se deita. Neste aspecto tive muita sorte, porque a minha mulher tratou-me, sempre, muito bem.»
Tem muitas e boas recordações do tempo de jogador, mas há
um momento especial que lhe causa grande emoção: «Houve um jogo em Vila do Conde
em que precisávamos de
ganhar, para subirmos à terceira divisão. Estivemos a ganhar por três
bolas a zero, até que ficámos empatados. Faltava um minuto, um minuto e
meio, para acabar e eu marquei o golo da vitória! Foi um momento muito
bonito. Quando chegámos até tínhamos música à nossa espera. Andei às
cavalitas de algumas das pessoas que nos esperaram. Ficou no meu coração
e no coração de toda a gente.»
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Manuel Mateus − em baixo, o segundo a contar da direita. |
Confessa que se entristece com o facto de os jogadores,
hoje, ganharem tanto dinheiro, principalmente quando tantos deles não
merecem. «Ficam muito longe da categoria dos jogadores do meu tempo.
Parece que eles não se esforçam o necessário ou então não há camaradagem
entre os colegas de equipa.»
Jogou numa época em que havia muita camaradagem, muita amizade e respeito entre os
jogadores. «Nós dávamos tudo por tudo. Éramos uma equipa e trabalhávamos
em conjunto. Agora, parece-me que os jogadores são muitos
individualistas. Querem fazer tudo sozinhos e, depois, não fazem nada...
Perdem muitos golos, assim.» O egoísmo não compensava e, por isso, dava muitos golos a marcar.
«O que interessa é que a equipa ganhe».
Do Beira Mar recebeu um emblema em prata, quando
completou 25 anos de sócio e, ainda hoje, «sou muito acarinhado pelos
outros sócios. Passam-me a vida a dizer: "agora é que tu devias estar a
jogar!"» Elogiado pelos que ainda se lembram do jogador, diz sentir-se muito feliz.»
Um homem que defendeu
− e, muito bem, as cores do Beira
Mar
− lamenta que nenhum dos netos se tenha dedicado ao futebol. "Gostava
de lhes poder ensinar umas coisitas e vê-los serem melhores do que eu.»
Homem alegre, fica muito triste quando o Beira Mar perde em casa. Simpatiza com o Sporting, mas «primeiro, o Beira Mar, porque
precisa muito mais. Os mais pequenos têm que ser mais acarinhados.»
O conselho que deixa aos mais novos é que façam da equipa
de futebol uma família. «Viver no campo e em casa é igual. É preciso
muito respeito, muita amizade, muito companheirismo.»
Ora, bolas!
Manuel Mateus conta:
«Antigamente, as nossas mulheres iam ver os nossos jogos
e podiam entrar à vontade.»
"Não ganhávamos nada, mas esforçávamo-nos muito. Eu ia de
bicicleta às 7 horas da manhã para poder treinar...»
«No início era conhecido por "Ninguém". E uma vez
apareceu num jornal: "Ninguém marcou três golos.»
«Nunca levei nenhum cartão amarelo e nunca fui expulso.»
«A nossa equipa era muito unida. Brincávamos muito... Uma
vez, fecharam-me na mala do carro sem eu me aperceber de nada...»
«Num jogo em Ovar quase me arrancaram o artelho! Mesmo
assim, todo ligado, voltei ao jogo.»
«O melhor jogador de todos os tempos foi o Eusébio. O
Figo é, hoje em dia, o melhor jogador português.» |