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farol n.º 29 - mil novecentos e sessenta e oito ♦ sessenta e nove, págs. 12 e 13.

INTERVALO POÉTICO

A menina e o Menino Jesus

Ema Manuela da Silva

Já deitada a menina não dormia:
Pensava no presépio em que Jesus,
Filho da tão doce Virgem Maria,
Em simples palhas deitado, sorria,
Com os olhitos pregados na Cruz.

Tão lindo, tão pequeno e rosadinho,
Como podia as prendas trazer?
Com um saco muito grande, cheiinho,
Não podia o Menino, coitadinho,
Pela chaminé tão alta descer!

Talvez que o viessem ajudar
Anjinhos com vestidos cor de luz...
O melhor, pois, seria ir espreitar
Se estrelinhas estavam a poisar
E traziam o Menino Jesus!...

A menina não queria dormir.
Mas os olhos teimaram em fechar...
Lindos sonhos faziam-na sorrir.
Pensando em Jesus, que havia de rir
Muitas prendas no sapato poisar!...


TRISTE

N. J.

Estou triste...
Nem sei porquê.
Estou à janela, olhando não sei o quê...
Ninguém passa na rua,
Nem no céu alumiam as límpidas estrelas,
Nem o belo luar...
Tudo é triste comigo, hoje...
Penso, penso...
Penso na minha tristeza,
Penso nas crianças, nos pobres,
Nos nus, nos infelizes...
Penso na guerra...
Oh, essa atrocidade, que massacra tantos homens...
Penso no dor, na desgraça...
Quero estar alegre, mas não sei.
Vislumbro apenas, da minha janela,
Uma criança só, como eu.
Brinca, só, sozinha, com as pedras...
Oh ingénua criança!
Mas invejo-a...
Ela, pobre criança, embora suja,
Não pensa em mais senão nas pedras,
Só vê as pedras, e que feliz que ela é...
Queria ser como ela, alegre, indiferente...
Mas estou triste...
Tudo é triste também...


A Hora da Despedida

Alves Moreira

Na hora da despedida, chorei!

Chorei a hora em que pisei aquele caminho
Pela primeira vez na vida.

Chorei os meus colegas de infância,
Os meus melhores amigos!

Chorei os Professores, mestres dos primeiros passos
Da minha vida de estudante.

Chorei a vida que levava, serena, despreocupada,
Estudando para saber menos!

Chorei a namorada do liceu,
A quem devotei o amor mais puro,
O meu primeiro amor...

Na hora da despedida, chorei!!!


LUZ DA FÉ

Olinto Ravara

Uma vela... outra vela... Silêncio!...
Em andor de fé se vão acendendo
As mirras, espargindo suave incenso...
Purificando a chama que vai ardendo.

                 Agora... pelas abóbadas imensas,
                 Reboam em luz cantos celestiais,
                 Inunda-se o templo, com preces tensas,
                 Roja-se o órgão desfeito em ais...

Apagam-se as velas! − Mas uma luz
Mais forte da nua pedra irradia,
Suspensa do facho que a alma conduz;

                 Dissipam-se as trevas... Nasce o mor dia!
                 Pecador, espojo-me aos pés da Cruz...
                 Ergo-me! − Na fé... outra vela ardia!...

 

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11-06-2018