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farol n.º 22 - mil novecentos e sessenta e seis ♦ sessenta e sete, págs. 9 a 11.

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Impressões duma Peregrinação

Nota da Redacção – Com este primeiro artigo inicia-se a publicação duma série de outros sob a mesma epigrafe, da autoria do Ex.mo Sr. Padre Arménio Alves da Costa Júnior.

Este distinto professor de Religião e Moral do nosso Liceu efectuou, nas últimas férias grandes, uma peregrinação aos Lugares Santos, donde trouxe as mais vivas impressões. Pois serão estas mesmas impressões que o Sr. Padre Arménio irá confiar ao nosso jornal e, por intermédio dele, aos seus leitores.

Que estes irão seguir com grande interesse essas narrativas não nos restam dúvidas. Bastar-nos-á para o afirmar, além da amostra que hoje damos a público, o conhecimento da imensa estima de que desfruta o Sr. Padre Arménio entre todos os Professores e estudantes, quer pelos dotes de coração que possui, quer pela sua grande cultura e irradiante simpatia.

Todos quantos trabalham no «Farol» têm a maior satisfação em agradecer ao ilustre sacerdote, a quem dedicam profunda amizade, a colaboração com que se digna honrar o nosso jornal.

A Acrópole de Atenas

QUANDO em plena adolescência nos debruçámos sobre a civilização grega, experimentámos um sentimento de simpatia e admiração por aquele povo que deu ao mundo uma mensagem de arte e beleza.

Por muito que a nossa imaginação arquitecte a grandeza do período áureo, ficamos sempre aquém da realidade. Apesar do peso dos tempos e a maldade dos homens terem danificado a Acrópole ateniense, ainda hoje, através das ruínas, como que apalpamos a alma helénica.

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Há muito que desejava pisar as escadarias que conduzem ao Pártenon. Foi no mês de Setembro passado que me foi dada essa oportunidade.

Atravessámos Atenas, cidade moderna e alegre, embora sem a imponência das grandes capitais, debaixo dum sol escaldante.

Dirigimo-nos à colina dos deuses, onde uma multidão heterogénea contemplava os monumentos da época de Péricles. Logo à entrada, uma grande coluna despida, que outrora sustentava uma quadriga de bronze e, mais tarde, a estátua de Agripa. O primeiro monumento – o Propileus – está bastante danificado. Entretanto a beleza das colunas jónicas dá-nos bem a entender a imponência e a graciosidade que este monumento tivera.

É atravessado o Propileus por uma escadaria, por onde passava a procissão sagrada –  a Panateneia – em direcção ao Pártenon.

Com dois pórticos, o oriental e o ocidental, – o Propileus serve como que de abertura à colina sagrada. Embora a guia nos explique com pormenores toda a imponência do Propileus, o que é certo é que todos tínhamos pressa em chegar ao coração da Acrópole.

Atravessado o pórtico oriental, seguimos o itinerário da Panataneia. Deste modo, como que fomos vivendo a mesma emoção dos peregrinos de outrora.

Não há dúvida alguma que o Pártenon, morada da deusa Atena, é o monumento mais belo de toda a Acrópole. Pela harmonia, pela majestade e perfeição com que foi projectado, pela beleza dos baixos relevos, por todo um conjunto ímpar, o Pártenon merece um lugar destacado entre os mais belos monumentos da humanidade.

Os portões estão quase completamente destruídos. Um general veneziano, querendo levar consigo essa jóia de arte, não tendo o cuidado suficiente permitiu que ele se estilhaçasse contra o solo.

O interior do templo mostra-nos toda a crueldade da guerra. Os turcos, transformando o Pártenon num paiol de pólvora, deram-lhe um golpe de morte. Num momento se destrói toda a criação dum génio!

Apetecia-me passar, por entre aquelas colunas dóricas, a manhã inteira. A guia acorda-nos da nossa contemplação informando-nos que a Acrópole ainda não está percorrida. Na verdade seria imperdoável não contemplar o Erecteion. É neste templo que está bem vincado o génio de Fídias. Substituindo as colunas por figuras femininas, Fídias deixou aos séculos o testemunho do seu poder criador. Vale a pena demorarmo-nos em frente das Cariátides. Ainda bastante conservadas, podemos, através delas, fazer um juízo do valor de Fídias. É um artista que honra sobremaneira a gente helénica.

Do Erecteion contemplamos, em frente, o Areópago – uma grande rocha triangular onde os magistrados se reuniam. Para nós / 11 / cristãos, aquela rocha tem um valor sagrado. Naquele local, Paulo, Apóstolo de Cristo, falou ao mundo ateniense sobre a ressurreição final. Tinha-se passado a manhã, como que num sonho.

Depois de visitarmos o Cabo Sounion, lugar de repouso, onde o Lord Bupon descansou das suas enfermidades, voltámos novamente a Atenas, de noite.

No hotel perguntam-nos se estávamos dispostos a tomar porte no espectáculo «Som e luz". Apesar dos dois dólares que nos exigiram, ninguém declinou a sugestão.

O espectáculo era em língua francesa. Fiquei satisfeito ao verificar que a enorme multidão que enchia o recinto era constituída na quase totalidade por jovens que sabem apreciar a arte.

Num profundo silêncio os nossos olhos contemplavam as pedras da Acrópole inundados por um mar de luz, em que as diversas tonalidades se cruzavam numa beleza de sonho.

Toda a história de Atenas passou diante do nosso espírito. Tivemos a sensação que retrocedíamos umas dezenas de séculos e que Péricles, Temístocles, Moraton e muitos outros se nos tornavam contemporâneos. A certa altura a colina dos deuses pareceu incendiar-se. A música tornou-se trágica; os acordes estridentes anunciavam uma marcha estranha que crescia avassaladora. Um grito de terror ecoou por toda a Acrópole: – «Os persas!». Foi o momento de maior emoção e beleza.

A dado momento a tempestade desaparece. O exército de Xerxes é desbaratado. A luz torna-se mais luminosa; a música mais alegre; os gritos são de vitória! A colina parece ressuscitar. Da parte dos espectadores, o silêncio era total.

O espectáculo estava no fim. Os últimos acordes vibram; os últimos projectores acendem-se. O grito final surge esplendoroso: – «Glória a Atenas!».

 

Padre Arménio Alves da Costa

 

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08-06-2018