QUANDO
em plena adolescência nos debruçámos sobre a civilização grega,
experimentámos um sentimento de simpatia e admiração por aquele povo
que deu ao mundo uma mensagem de arte e beleza.
Por muito que a nossa imaginação
arquitecte a grandeza do
período áureo, ficamos sempre aquém da realidade. Apesar do peso
dos tempos e a maldade dos homens terem danificado a Acrópole
ateniense, ainda hoje, através das ruínas, como que apalpamos a alma
helénica.
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Há muito que desejava pisar as escadarias que conduzem ao Pártenon.
Foi no mês de Setembro passado que me foi dada essa oportunidade.
Atravessámos Atenas, cidade moderna e alegre, embora sem a
imponência das grandes capitais, debaixo dum sol escaldante.
Dirigimo-nos à colina dos deuses, onde uma multidão heterogénea
contemplava os monumentos da época de Péricles. Logo à entrada, uma
grande coluna despida, que outrora sustentava uma quadriga de bronze
e, mais tarde, a estátua de Agripa. O primeiro monumento – o Propileus
– está bastante danificado. Entretanto a beleza das colunas jónicas dá-nos bem a entender
a imponência e a graciosidade
que este monumento tivera.
É atravessado o Propileus por uma escadaria, por onde passava a
procissão sagrada – a Panateneia – em direcção ao Pártenon.
Com dois pórticos, o oriental e o ocidental,
– o Propileus serve
como que de abertura à colina sagrada. Embora a guia nos explique
com pormenores toda a imponência do Propileus, o que é certo é que todos
tínhamos pressa em chegar ao coração da Acrópole.
Atravessado o pórtico oriental, seguimos o itinerário da
Panataneia. Deste modo, como que fomos vivendo a mesma emoção dos peregrinos de outrora.
Não há dúvida alguma que o Pártenon, morada da
deusa Atena, é o monumento mais belo de toda a Acrópole. Pela harmonia, pela
majestade e perfeição com que foi projectado, pela beleza dos baixos
relevos, por todo um conjunto ímpar, o Pártenon merece um lugar
destacado entre os mais belos monumentos da humanidade.
Os portões estão quase completamente destruídos. Um general
veneziano, querendo levar consigo essa jóia de arte, não tendo o cuidado suficiente permitiu que ele se estilhaçasse
contra o solo.
O interior do templo
mostra-nos toda a crueldade da guerra. Os
turcos, transformando o Pártenon num paiol de pólvora, deram-lhe um
golpe de morte. Num momento se destrói toda a criação dum génio!
Apetecia-me passar, por entre aquelas colunas dóricas, a manhã
inteira. A guia acorda-nos da nossa contemplação informando-nos que
a Acrópole ainda não está percorrida. Na verdade seria imperdoável
não contemplar o Erecteion. É neste templo que está bem vincado o
génio de Fídias. Substituindo as colunas por figuras femininas,
Fídias deixou aos séculos o testemunho do seu poder criador. Vale a
pena demorarmo-nos em frente das Cariátides. Ainda bastante
conservadas, podemos, através delas, fazer um juízo do valor de
Fídias. É um artista que honra sobremaneira a gente helénica.
Do Erecteion contemplamos, em
frente, o Areópago – uma grande rocha
triangular onde os magistrados se reuniam. Para nós
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cristãos, aquela rocha tem um valor sagrado. Naquele local, Paulo,
Apóstolo de Cristo, falou ao mundo ateniense sobre a ressurreição
final. Tinha-se passado a manhã, como que num sonho.
Depois de visitarmos o Cabo Sounion, lugar de repouso, onde o
Lord Bupon descansou das suas enfermidades, voltámos novamente a
Atenas, de noite.
No hotel perguntam-nos se estávamos dispostos a tomar porte no
espectáculo «Som e luz". Apesar dos dois dólares que nos exigiram,
ninguém declinou a sugestão.
O espectáculo era em língua francesa. Fiquei satisfeito ao verificar que a enorme multidão que enchia o recinto era
constituída na quase totalidade por jovens que sabem apreciar a
arte.
Num profundo silêncio os nossos olhos contemplavam as pedras da
Acrópole inundados por um mar de luz, em que as diversas tonalidades
se cruzavam numa beleza de sonho.
Toda a história de Atenas passou diante do nosso espírito. Tivemos
a sensação que retrocedíamos umas dezenas de séculos e que Péricles,
Temístocles, Moraton e muitos outros se nos tornavam contemporâneos.
A certa altura a colina dos deuses pareceu incendiar-se. A música
tornou-se trágica; os acordes estridentes anunciavam uma marcha
estranha que crescia avassaladora. Um grito de terror ecoou por
toda a Acrópole: – «Os persas!». Foi o momento de maior emoção e
beleza.
A dado momento a tempestade desaparece. O exército de Xerxes é
desbaratado. A luz torna-se mais luminosa; a música mais alegre; os
gritos são de vitória! A colina parece ressuscitar. Da parte dos
espectadores, o silêncio era total.
O espectáculo estava no fim. Os últimos acordes vibram; os últimos
projectores acendem-se. O grito final surge esplendoroso: – «Glória a
Atenas!».
Padre Arménio Alves da
Costa |