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farol n.º 21 - mil novecentos e sessenta e cinco ♦ sessenta e
seis,
págs. 12 e 13. |
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INTERVALO POÉTICO |
«MUNDO» |
Celeste Almeida
Acreditei, sim,
por entre o mundo,
Doces sonhos, indiferentes à realidade.
Amei-te, sorri, construí;
Por fim nada ficou, na verdade...
Olhos que a tudo e a todos riam,
Coração ingénuo, doce, puro,
Coração que não descria,
Olhos que viam no escuro.
Abriram-se, por fim, p'rá realidade:
Em redor, miséria, hipocrisia, dor...
O mundo é então uma luta sem fim?
O mundo é algo que enoja e causa horror?
O mundo é uma farsa constante,
Com leves tons de comédia,
O mundo é drama duro e cruel,
É ensaio de tragédia!
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Absurdo
Nos braços fantásticos
Das trevas,
Mergulho
Meu ser insatisfeito.
Nas sombras macabras
Do silêncio,
Escondo
Meu rosto suado.
Nas ruínas confusas
Dos ideais desfeitos,
Grito sozinho,
Choro sem lágrimas,
Rio de medo. . .
E a mão terrível
Da escuridão
Aperta, esmaga
Um coração proceloso...
E a voz disforme
Do nada
Abafa
Os ais,
Saídos do túmulo inerte
Da desilusão. . .
E a luz etérea
Da substancia morta
Cega
Os olhos turvos e parados. . .
Não vivo!
Encontro-me
No mundo dos irreais,
Do caos, do incognoscível
Produto da imaginação.. .
Agostinho Vidal
de Pinho
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Apoteose |
José Albino Pires
Silêncios
dispersos nos ares...
Concentrai-vos! . . .
Formai um conjunto de sons negativos!
Pairai nas alturas,
Pairai! –
Libertai-vos
Da lama da terra, do mundo dos vivos!...
Fazei uma teia da cor
Do carvão,
De malha pesada, com sombras tecida!...
Não deixeis barraca,
choupana
Ou clarão,
Com ânsias de alento,
Com sopros de vida!
Cingi de muralhas, formadas
De assombros,
As auras pairantes nos altos do céu!...
– Limpai este lodo,
Varrei os escombros,
Cercai tudo isto
De excêntrico véu!
Nas vagas ingentes do vulgo,
Que passa,
Há ondas enormes de tons,
Torrentes sonoras,
A alastrar... –
Orientando a desgraça
Por todos os cantos, sem nunca parar!...
– Silêncios pairantes...
Exultai de alegria
E, em tom dominante,
Soturno, profundo,
Afogai no espaço
A densa melodia,
Triste e sonora, dos ecos do mundo!... |
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CAMINHANDO
Agora, que vivo,
Sou um cadáver!
Antes, o vento,
Agarrado
A cada tronco,
Fazia-me vibrar.
Hoje, cospe na rama
E diz-me adeus
Ao passar!
Vento com Fé
Pode casar bem;
O meu corpo,
Limo da maré,
Contigo
Já nem rima tem!
Jorge Abreu |
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