Jorge Abreu
(7.º ano)
– S' os antigos
viessem a este mundo, morriam de susto!
Isto é frase corrente na boca daqueles que se espantam cada
vez mais com o rumo que a vida tomou, e têm ainda na mente muito
dum passado longínquo. E acho que sabem qual o significado oculto da
expressão.
Bem, meus amigos, escusam de ficar já de pé atrás. Não sou
refractário às inovações, nunca o serei. Eu explico: não sei se já
ouviram falar duma certa teoria de evolução; é qualquer coisa que
afirma que, sem uma evolução constante, se morre.
Pois o que hoje se passa é essa evoluçãozinha, mas em ritmo
acelerado, aceleradíssimo.
Ora, ao lado dessa mutação constante, existe um conjunto de
factores, chamemos-lhe assim, que se mantêm, ou devem manter, quase
inalteráveis. É aquilo a que vulgarmente se chama boa-educação.
Há uma canção, hoje muito em voga, que ousa afirmar: «ser
malcriado é moderno, é moderno....».
E esta, hein? Querem atingir num ápice a modernidade,
amigos?
Vêem aquele ridículo senhor? Chamem-lhe de frente bota de elástico.
Oh, mas que fazem? Não usem a faca, comam à mão. E, se quiserem,
digam grosserias a essa velhinha que segue aí ao vosso lado. Mas,
se os admoestarem, respondam com ar enfatuado e bocejando, como
costumam fazer:
– Bah! Tou farto d'esta espelunca!
No autocarro o jornal é um óptimo meio, para não ceder o
lugar a uma senhora ou a um velho Eles que se aguentem, não é,
amigos? E os professores? Mas que raça! Que necessidade há em
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gastar saliva a cumprimentar os colegas? É muita mais fácil fingir
que se não vêem; se não, são do «grupo», só existem para servir as nossos
interesses. Nós não precisamos mais desta gentinha toda,
não é verdade? E, sobretudo, é moderno ser-se mal-educado.
Com franqueza, amigos, com franqueza, isto. de farsas era na tempo
de mestre Gil. Sim, querem crer que, por vezes, fico verdadeiramente
aterrado com o que faz e pensa determinada camada de jovens? Levam
tudo pelo «quero» e «não quero» e os outros que se arranjem.
Isto está mal. Não se convençam que
o mundo é o ambiente
familiar em que, se o papá ou a mamã não concordam com o menino,
ele faz beicinho e bate o pé.
Deixemos de ser crianças. Ia a dizer que de contrário
levavam
tau-tau, mas arrependi-me. Com certeza nunca souberam o que isso
era e longe de mim ser abstracto e filosófico nestas conversas.
Contudo, se se interrogar um dos citados meninos, ele
justificará.
– Ora, nós queremos ser independentes, queremos
realizar-nos!
Sabem, já vai longe o tempo em que ter personalidade era dizer uns
tantos termos arrebicados, que no dia anterior se haviam copiado do Dicionário. Hoje, para se ter essa personalidade, recorre-se à
gíria, fazem-se uns tantos trejeitos de boca, diz-se mal do que está
bem, e pronto.
Já é tempo de acabarmos com isto. Já experimentaram, num dia de
sol, reparar no trajecto da vossa sombra? Ela bebe o pó do chão,
beija a lama, espoja-se autenticamente na imundice. Acho que não
gostariam de confundir-se com ela. Então, amigos, façamos um esforçozinho para nos elevarmos. E sobretudo nunca se esqueçam
disto: «por cima do pântano mora o céu azul!»
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