Maria Teresa Ramalho
Cruz
(7.º ano)
A representação dramática ou, por outras palavras, o
drama – que, segundo a etimologia grega, significa pôr em acção um assunto de interesse humano
– teve origem
marcadamente religiosa: o teatro clássico – a tragédia e a comédia – derivou, na antiga
Grécia, das celebrações do chamado culto dionisíaco.
Na Idade Média, o teatro está, por assim dizer, ao
serviço da Igreja. Ao princípio, consiste unicamente em figurações plásticas e mímicas, em que o diálogo mal aparece, de
cenas do Evangelho: a Ressurreição, na quadra da Páscoa, e
a visita dos pastores e dos reis magos ao presépio, nas festas do Natal. Mais tarde, sobretudo a partir do século XII,
assiste-se ao gradual desenvolvimento da encenação: um
cenário esquemático sugere, mais do que representa, os lugares em que se desenvolve o drama litúrgico. Por outro
lado, o diálogo passa a ter, num ou noutro caso, uma
função mais significativa, e o âmbito dos motivos dramáticos alarga-se com situações de feição moralizadora e com
temas extraídos das vidas de santos. Estas representações tinham
dois caracteres: o religioso e o profano.
Do primeiro fazem parte dois géneros com
características exclusivamente religiosas: os milagres, peças curtas,
cujo propósito consiste na descrição de um milagre devido à
Virgem ou aos santos, e os mistérios, que são representações
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processionalmente e com vasta figuração.
Os papéis eram desempenhados por religiosos à porta
das igrejas.
Lado a lado com este teatro, um outro surge, de
expressão menos religiosa, embora manifeste intenções de sentido moral e de crítica de costumes. Está representado nas
seguintes modalidades: as farsas, género bastante popular,
que se baseia na observação e na crítica social, e as moralidades,
que põem em cena, devidamente personificados, os
vícios e as virtudes dos homens.
É quase nula a documentação sobre a existência do
teatro litúrgico em Portugal; de carácter profano sabe-se
que já no século XII se representavam, entre nós, os chamados ARREMEDILHOS ou ARREMEDOS, constituídos
essencialmente pela mímica.
Além destes, existiam também os populares
ENTREMESES e os MOMOS jocosos – os «singulares momos» a
que se refere Garcia de Resende, na sua Crónica, quando fala
das representações do tempo de D. João lI.
A todas estas formas dramáticas
– arremedos, momos
e entremeses – falta, como meio de expressão, aquilo que
verdadeiramente constitui a criação de Gil Vicente: o diálogo, ou seja, o predomínio da fala das personagens sobre a
mímica e a simples figuração simbólica.
Assim, Gil Vicente marcou uma etapa na história do
Teatro Português. «Ele foi – diz-nos Garcia de Resende
o que inventou isto por cá e o usou com mais graça e mais
doutrina...»
É bastante significativo, pelo seu valor histórico, na
Literatura Portuguesa, o dia 7 de Junho de 1502, pois nele
se representou a nossa mais antiga composição cénica, «ao
parto da muito esclarecida Rainha D. Maria, e nascimento
do muito alto e excelente Príncipe D. João, o terceiro deste
nome...» Trata-se do Monólogo do Vaqueiro ou Auto da
Visitação, «a primeira coisa que o autor fez – como se diz
expressamente na rubrica da peça – e que em Portugal se
representou». E de tal maneira agradaram na Corte os versos deste monólogo ingenuamente concebido, que esta data
constituiu, para Gil Vicente, o início de uma actividade
dramática particularmente brilhante e fecunda.
Pouco se sabe da vida do criador do teatro português.
As datas do seu nascimento e morte são duvidosas. Teria
nascido por volta de 1465, ignorando-se não só a localidade
do nascimento, mas também tudo o que diz respeito aos
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primeiros anos da sua existência. Entrou, em data ignorada,
para o serviço de D. Leonor, viúva de D. João II, e há quem
o identifique com um Gil Vicente, Mestre da balança da
Casa da Moeda em Lisboa, que foi ourives desta rainha e
autor da conhecida Custódia de Belém, obra-prima de ourivesaria.
Além de dramaturgo, foi músico e actor dos seus
autos, e desempenhou na corte a honrosa função de organizador das festas e celebrações de acontecimentos importantes.
Morreu, ao que se supõe, no ano de 1537.
(Continua no próximo número)
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