Oficina de Teatro - Escola Secundária José Estêvão

2ª PARTE - A DISCIPLINA

 

NATUREZA DA DISCIPLINA

SUA INTEGRAÇÃO NO CURRÍCULO DESTA ESCOLA

A disciplina que vou desenhar é, no meu entender, um contributo forte para o aluno se tornar um bom cidadão. Constata-se que as novas gerações, são possuidoras de características predestinadas à necessidade desta formação como fundamental para a sua educação e desenvolvimento global.

Qualquer Sistema de Ensino tem os seus princípios de classificação. Os princípios políticos que definem a linha genérica ideológica, que pela sua razão histórica determina os valores dos conteúdos e seus modelos, os princípios morais e culturais que definem a linha comportamental nas atitudes a funcionar na aprendizagem, e os princípios intelectuais que definem as consequentes competências cognitivas desses modelos. Destes princípios de classificação irão surgir:

            - o modelo administrativo;
            - a recorrência financeira;
            - a estrutura de organização;
            - os programas de estudos;
            - o perfil dos professores.

Como a sociedade está em constante mutação nos seus valores, nas suas atitudes e nos seus conhecimentos, acontece que, quando todas as estruturas começam a funcionar em engrenagem, as lógicas reformativas aparecem com as suas próprias "lógicas":

            - O passado interfere directamente no presente e no futuro;
            - A Educação não é uma actividade só e meramente intelectual;
            - A Educação nunca está isolada de envolvimentos sociais, políticos, morais, culturais e geográficos;
            - Para fundamentar o "saber" é necessária a "transmissão".

 

DURAÇÕES ORDINÁRIAS

Ao constatar com o que, nesta Escola, se tem feito sobre "O Teatro na Educação", é deveras importante, não só "jogar" verbalmente com todos os dados que irei apresentar, mas também dar a conhecer que as preocupações de hoje também já foram as de ontem, e que não é tão inovadoramente revolucionário qualquer tipo de aparato em querer-se legitimar O Teatro na Educação. Ou os tempos não mudaram assim tanto, ou os conceitos não evoluiram, ou os tempos mudaram mesmo ao evoluirem conceitos.

Tal como já foi descrito no capítulo anterior, depois de todo o meu trajecto como professor anterior a 1989, caio, repentinamente e por força de circunstâncias várias, na Escola Secundária José Estêvão. Com algumas intenções de inovar uma postura docente, executei um Projecto, que foi elaborado em consonância com todos os organismos envolventes à docência. Consistia, essencialmente, em abrir a Escola à Comunidade, e abrir na Escola um espaço dinamizador de contactos e conhecimentos com o Teatro.

Para esse Projecto, tive os apoios já nomeados. Em 1989, onde se via, colocar um professor contratado ( ao abrigo do Decreto Lei 178/89 de 27 de Maio que assim o exigia, mas importava a concordância da escola), sem possuir formalmente as condições necessárias para o Ensino Secundário, para exercer funções docentes extra-curriculares com horário completo? E o apoio que chegava de todos os lados, não foi, no mínimo, estranho? Sem dúvida que, colado à coragem de muita gente, houve consciência da importância e pertinência pedagógica da área contemplada, até porque mais tarde, em 1992, se verificava a sua contemplação no Complemento de Formação Técnica do Ensino Secundário. Afinal, a nossa Escola não estava equivocada.

 

ANÁLISE DE CONCEITOS

FILOSOFIAS DA EDUCAÇÃO

Não podemos esquecer que a Lei de Bases do Sistema Educativo foi aprovada por todas as forças políticas do nosso país. As preocupações da referida Lei começam com a definição do Sistema Educativo no disposto do seu Artigo 1º; os princípios gerais, no Artigo 2º, mais propriamente no ponto 3 em que é explícito o que deve ser a prática da Educação; o Artigo 3º  diz-nos como deve ser a Organização do Sistema; o Artigo 9º indica os objectivos no Ensino Secundário; o Artigo 30º define os princípios gerais na Formação de Professores; o Artigo 31º confere e define a Formação Inicial e Própria dos Professores do Ensino Secundário; o Artigo 33º define a Qualificação para Funções Educativas; o Artigo 36º explicita os princípios gerais da Carreira Docente e o Artigo 47º define o contexto do Desenvolvimento Curricular.

Portanto:

            A- Define preocupações que ultrapassam qualquer Subjugação a Opções Políticas;

            B- Prevê a Leccionação de Disciplinas como a de Oficina de Expressão Dramática/Oficina de Artes Performativas/Oficina de Teatro, com toda a legitimidade;

            C- Justifica a Categoria de Leccionação para a Docência e o direito à Progressão na Carreira Docente;

            D- Justifica a criação da Disciplina como Oferta de Escola, e a sua leccionação a Docentes com Habilitações Próprias.

 

Dado que na Reforma Curricular o Decreto Lei nº 286/89 de 29 de Agosto afirma, em conformidade com o Artigo nº 5 da L.B.S.E., que podem existir, no Ensino Secundário, Disciplinas de Oferta de Escola como a de Oficina de Expressão Dramática. Para tal, deverão existir Docentes Qualificados. O Decreto-Lei nº 43/89 de 3 de Fevereiro dá às Escolas autonomia responsável em propostas e anseios próprios e locais sobre as suas actividades educativas. Para o exercício da autonomia, as Escolas foram interpeladas pelo M.E. sobre as estruturas de apoio educativo que possuíam para a abertura da Disciplina de Oficina de Expressão Dramática. O M.E. analisou as propostas de cada Escola e, dado que em algumas o M.E. achou exemplares todas as estruturas envolventes à disciplina, deu autorização da sua abertura, respondendo em conformidade com o mesmo Decreto-Lei. Este conjunto de apoios legais corroboram a minha posição, em conformidade com a Comissão da Reforma do Sistema Educativo, no campo do fomento da criatividade e da inovação, ao delinear o modelo de Escola para a vida de qualidade cultural em termos de recursos humanos. Acha-se necessário um Professor/Agente de Cultura, se for homem de cultura como o Professor Científico, Prático, Técnico, Artífice e Artista  - condições sine qua non -  Professor Agente Cultural/Professor Animador, sem descorar uma Formação de Nível Superior, para garantir um conjunto de competências mínimas gerais que procurem assegurar o rigor inter-pessoal do Processo Pedagógico, com prática Profissional reconhecida na Área Artística do Teatro na Educação e com Formação Pedagógica. Portanto, não é de admirar que, na Reforma em vigor, verifiquemos uma clara tentativa de autonomia pedagógica local, quando, nas Opções da Componente de Formação Específica, a Escola pode criar a sua própria disciplina. Antes, com a Disciplina de Oficina de Expressão Dramática, para responder às exigências claras do Ministério da Educação, foram recrutados alguns Professores tanto com experiência no terreno, como na especialidade ( sempre Professores Provisórios com contrato anual ), e também Docentes que devido à sua integração no Sistema Educativo não estavam sujeitos a qualquer concurso, e cujos critérios de selecção dependiam exclusivamente da responsabilidade dos Conselhos Directivos/Executivos  das Escolas onde a Disciplina é ministrada. Verificou-se que a Docência desta Disciplina foi sistematicamente atribuída a profissionais de Teatro e a Professores de outras Disciplinas que, embora simpatizantes das Actividades Teatrais na Escola, não possuiam a devida Formação Pedagógica-Didáctica Curricular específica, na Área Disciplinar em causa. A Expressão Dramática e Teatro na Educação no Ensino Secundário é, na opinião da Comissão da Reforma do Sistema Educativo, uma trave-mestra do processo curricular na promoção do sucesso escolar e educativo. A sua existência tem sentido integrador da aquisição educativa, tem dimensão participativa nas actividades educativas e é formação ideal para a educação permanente. A sua selecção criterial de matéria curricular esteve, desde o começo da sua leccionação, de acordo com toda a legislação vigente, mas sem a adequada atenção aos Professores que leccionavam a Disciplina de O.E.D., mesmo quando a referida Comissão se pronunciava a favor do rigor na orientação e na formação de Docentes Especializados.  Não há razão legal, para que a Disciplina de OFICINA DE TEATRO não se crie como OFERTA DA NOSSA ESCOLA no Ensino Secundário porque, se há Habilitações criadas e definidas para o devido efeito, como o diz o Despacho 243/ME/96 o qual contempla oficialmente o C.E.S.E. de Expressão Dramática E Criação Teatral na Educação da Escola Superior de Educação do Porto, com "razão de ser e função válida", e eu ser portador dessas habilitações, será lógico que se aceite  a sua abertura.

 

ESCOLA SECUNDÁRIA JOSÉ ESTÊVÃO

DO ONTEM AO HOJE

De 1926 a 1973, esta Escola publicou a revista "LABOR"- (inicialmente "Revista de Educação, Ensino e Extensão Cultural", e depois "Revista do Ensino Liceal"). A "LABOR" foi, sem dúvida, um espaço de intervenção dos docentes, um espaço de afirmação de cultura pedagógica e profissional. O seu reacordar, pela mão do Dr. Arsélio Martins, deu espaço a que se fizessem estudos à "LABOR", nos quais se encontram inquietações actualizadíssimas na sua essência. A Dra. Alice Pinho fez um brilhante trabalho em que nos apresenta alguns pensamentos de "outros tempos?"- pág. 96. Afinal, em 1952, ao mesmo tempo que a NATO reunia em Lisboa, em que os conservadores dominavam a política inglesa, em que houve algumas alterações de alguns aspectos no Estatuto do Ensino Liceal (Dec. 38.812 - Julho 1952), em que a Fundação Calouste Gulbenkian estava nos seus primeiros anos de Intervenção Cultural, discutia-se e reflectia-se sobre o valor social e pedagógico do Teatro no Ensino como nos escreve Maria do Céu Novais Faria, Professora do Liceu D. Manuel II em Janeiro de 1952 na "LABOR" nº 118. Em Fevereiro do mesmo ano, "LABOR" nº 119, José Pereira Tavares deixa transparecer a marginalidade que o Teatro na Educação vivia, mas assumindo categoricamente a sua importância social, lembrando-nos o Teatro que se fazia desde 1920, ao mesmo tempo das ditaduras portuguesas com as suas censuras e confusões, com extinções e reaberturas de Escolas Normais. É interessantíssimo como, novamente Maria do Céu Novais Faria na "LABOR" 120 - Março de 1952, nas entrelinhas do que escreveu, se percebe a grande preocupação no querer primeiro fazer o "Homem", depois o "Sábio", atribuições educacionais dadas exclusivamente ao Teatro. Também levanta questões sobre a grande importância dos Dramaturgos e Dramaturgistas, da existência de Técnicos Especializados nos assuntos do Teatro efectivados às Escolas, e do ridículo embaraço que era a separação dos sexos nas Escolas.

Felizmente, muito trabalho se fez ao longo destes anos, muita história foi feita desde então. Refiro, novamente, o meu trabalho nesta Escola desde 1989. O Projecto Riscos & Ecos, ao promover valores relacionados com os conhecimentos que cada um tem sobre si, desenvolve capacidades e atitudes para um saber ser e estar como cidadão construtivo. Já realizou 35 trabalhos apresentados em 22 localidades diferentes. Participou em 8 E.N.T.E.s e contou, ao longo destes anos, com a frequência de 294 alunos, até hoje. "Estar" na escola obriga-nos a não ficarmos sós no seu espaço, obriga-nos a criar ligações de acção recíproca entre a escola e a comunidade. O teatro é um meio expressivo/artístico excelente para que uma diversidade de valores e realidades entrem na escola. Falo de um espaço laboratorial onde se experimenta o controle de emoções, onde a confiança anda de mãos dadas com a coragem, onde a imaginação implode e explode, onde a interpretação dos mundos de cada um tomam forma e se realizam. É compreensível a "apreensão" que se tem ao constatarmos as práticas do teatro na escola. Experimentar, descobrir e inovar, são intervenções que, neste caso, levam à comunhão do jovem consigo e com os outros, com a oportunidade de viver totalmente, e isto pode ser incomodativo para uma concepção de escola que normalmente se centra num ensino de conhecimentos certos e imutáveis. Mas nesta escola sempre se abriram espaços, de alguma maneira motores de reformulação e que logo implicaram a responsabilização de toda a escola.  O teatro sempre pretendeu ser mais um espaço, ajudar nesse sentido como forma privilegiada, como escola dentro de outra escola sem esquecer as suas ligações entre si, onde seja processo de descoberta do eu e do outro, onde seja processo de crescimento.

Desde 1992, a Disciplina de Componente de Formação Técnica - Oficina de Expressão Dramática, com todas as turmas que se foram formando, até hoje, o programa foi sempre cumprido, tendo resultado 38 apresentações de trabalhos, tanto na Escola como noutros espaços, tanto isoladamente como em parceria com outras disciplinas.


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