SAÇÁ MUTAMA
Os alunos andam excitados, confusos. Talvez das
férias, do frenesim de esgotarem de um trago toda a ânsia de
liberdade que as férias lhes proporcionarão. E vêem tudo, e falam de
tudo, dizem tudo o que, – malgré tout – normalmente não
diriam nas nossas tão abertas aulas, umas aulas que não são já as do
antigamente.
Que tinham lido num jornal que não havia mais
acentos. Que cada um poderia escrever como pronunciava. Meu Deus!
Uma confusão.
– Então a gente agora pode escrever, por exemplo,
Sassá com cê cedilhado e Mutema, se for
da Murtosa, com um a?
– Como?
Explicou que Saçá Mutama. E
Abeiro. Tal como excecional.
Ri para dentro e para fora. Lembrei-me do Dr. António
Capão e de uma conversa que tivemos, há semanas, sobre o "Acordo
Ortográfico" e a sua falta de unidade, e percebi. Percebi que as
pessoas não poderiam chegar ao que cérebros como o do Professor
Costa Ramalho, – que frequentou Oxford, – como o do Professor Pinto
de Castro, e etc., haviam congeminado, lá com um brasileiro que tem
nome árabe e com outros assim. Percebi tudo.
Respondi, evasivo, que dessem tempo ao tempo. Fiquei
a pensar na amargura dos Professores Óscar Lopes ou Vítor Manuel de
Aguiar e Silva, e fiquei amargo também. E também confuso.
Mas o Dr. António Capão está de volta à escola,
escreverá neste número, irá escrever mais de espaço, – e
sempre bene, como dizem os italianos, – resolvi poupar-me,
ficar-me por aqui. Nesta crónica que apenas o pretende ser.
Apenas, sem comentários.
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UM HOMEM,
UM PROFESSOR
Quando então o conhecemos pessoalmente, como orientador de
Estágio na disciplina de Português, no Liceu D. Manuel II, no Porto, o
Doutor Salgado Júnior era um Homem, um Professor, que se impunha pela
natureza requintada das suas relações humanas, pela delicadeza do seu trato
e pelo seu grande saber.
O Liceu de Aveiro teve a honra de o sentir passar por aqui e
a revista liceal «Labor» o privilégio de publicar alguns dos seus mais
notáveis trabalhos histórico-literários, como é o caso de "A Menina e
Moça e o Romance Sentimental no Renascimento", que apresentou novas
ideias sobre a obra de Bernardim Ribeiro e a evolução da novelística
portuguesa.
Professor, conhecedor profundo do seu ofício, estudioso
invulgar só de temas originais da nossa literatura, crítico arguto a quem
não foram alheias as vicissitudes relacionadas com a ideologia política do
seu tempo, António Salgado Júnior, o único professor do ensino secundário de
então doutorado em Filologia Românica, preterido em concurso para professor
da Universidade, veio também a frequentar a Escola Normal Superior para se
habilitar ao magistério do ensino secundário a que se dedicou com grande
proficiência.
Para além da obra que já citámos, Salgado Júnior publicou
outros trabalhos de inegável valor: "História das Conferências do Casino"
e o "Verdadeiro Método de Estudar" de Verney, em cinco volumes, com
prefácios, comentários e notas de grande interesse informativo e cultural.
A sua bibliografia, porém, é muito mais vasta e revela sempre
o toque peculiar da originalidade e uma visão científica do problema
histórico-literário que o coloca a par dos maiores vultos da crítica
literária nacional.
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