Ano Mundial da Matemática Para Todos!
2000 foi considerado Ano Mundial da Matemática.
Um grande número de iniciativas relacionadas com a Matemática e
com a educação matemática em todo o mundo proporcionam uma
grande visibilidade à Matemática, ao mesmo tempo que denunciam
as fragilidades e as dificuldades por que passa o ensino da
Matemática em todo o mundo.
Portugal é um país da Europa em que a Matemática
é consensualmente considerada uma parte integrante da cultura
integral dos cidadãos. É, por isso, definida uma formação básica
em Matemática para ser apropriada por todos sem excepção. E são
também escolhidos conceitos e competências matemáticas mais
elaboradas necessárias a todos os cidadãos com formação
secundária. E acontece que há dificuldades na aprendizagem que
são espelhadas nas fracas prestações e classificações
correspondentes. Por essa via de análise, há quem retire a
conclusão de que no ensino básico e secundário se aprende muito
pouca matemática. Há mesmo quem diga que a maioria dos cidadãos
não realiza quaisquer apropriações de conhecimentos matemáticos.
Mas não é assim.
Mesmo sem ter obtido aprovação no referencial do
saber escolar, a maior parte dos cidadãos utiliza conhecimentos
matemáticos, sem disso ter consciência. Esta matemática básica é
património universal para os cidadãos europeus. Basta ler uma
informação jornalística (ainda que desportiva) para perceber
como a matemática é parte integrante da cultura geral ou que sem
matemática não há alfabetização real a começar pela apropriação
de um vocabulário com sentido para a comunicação. Estas
apropriações básicas não dependem de qualquer "inclinação' e
sobre elas não pode haver qualquer dúvida a respeito da sua
utilidade para a vida da generalidade das pessoas que vivem de
forma independente e devem intervir na vida social. Podem
levantar-se dúvidas metodológicas e sobre o pormenor da
matemática escolhida para ser a matemática básica, mas há
consenso sobre grandes assuntos e sobre capacidades a pôr em
acção ao longo da vida escolar. Seguramente que a matemática
básica não se pode reduzir a saber alguma coisa de números e de
operações elementares. Ela considera estudo das formas, para
interpretar e representar a realidade usando modelos simples e
descortinando padrões, estabelecendo decomposições e
recomposições para, entre outras coisas, realizar comparações de
comprimentos, áreas e volumes. Quem pode dispensar o uso da
proporcionalidade, as percentagens, as medidas que substituem na
descrição económica listas de dados recolhidos da realidade? Já
no terceiro ciclo do ensino básico, é introduzido o conceito de
variável e de função que, de diversos pontos de vista, é
utilizada em muitas actividades humanas e que dá uma nova
potência ao uso da matemática.
A Matemática de que falamos é uma parte
absolutamente necessária à cultura de todos os cidadãos e não só
para
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aqueles que prosseguem estudos e vão ser utilizadores a um nível
superior dos conhecimentos matemáticos. Deve promover-se a sua
aprendizagem por todos os meios, sendo que a maior parte deles
deve ser induzido pela própria essência da Matemática:
referenciando sistematicamente as fontes do saber matemático –
número, forma, movimento, acaso, etc. –; dando predomínio às
ideias que são seu objecto; resolvendo problemas que são o seu (pro)motor;
apresentando situações realistas que dão potência e coerência à
matemática e servem de prova à utilidade do seu estudo. Além de
tudo, é preciso criar situações de aprendizagem em que seja
visível e palpável a beleza da matemática e apreciável o lugar
do espírito que a matemática ocupa e é. Esta matemática pode e
deve ser acessível a todos e só, em pequena medida, é ensinada
com o objectivo de formar matemáticos. São estes os caminhos
para a elaboração de programas e não imagino sequer qualquer
"facilidade', mas antes uma adequação ao tempo (ao nível das
tecnologias, por exemplo) e às novas realidades contemporâneas
das gerações em formação.
Temos
muitos problemas com a Matemática, como temos problemas com a
cultura geral dos portugueses. Não sabemos se o problema da
matemática escolar é resolúvel. Mas não devemos deixar de
procurar. em cada momento, qual é a matemática que conta e como
podemos passar esse património para as futuras gerações. Não
assumimos as frases feitas do desamor em relação à Matemática
que se ensina. E não aceitamos o senso comum a respeito da
matemática que tem servido para desculpabilizar o abandono de
cada um e o insucesso geral. Muitas dessas ideias vivem do
desconhecimento ou da recusa do conhecimento. Temos de insistir
como insistimos com a sopa de que não gostávamos antes de a ter
provado. A Matemática é saborosa para quem a prova. A Matemática
é bela e provoca paixões em todos quantos dela se aproximam. A
Matemática é compatível com a timi-dez; aprender Matemática
exige esforço e trabalho persistente. Mas não é assim com tudo?
Nenhum preconceito nos vai expulsar do paraíso que a Matemática
é. Esta é a ideia de futuro
–
Matemática para todos
–
que importa reter para o que quer que seja a matemática escolar.
As receitas de que falam alguns curandeiros da Matemática (de
facilidade, de inutilidade, de elitismo, etc.) não vão ser
aviadas num país democrático da Europa.
Arsélio Martins
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