Ensinaram-me as coisas importantes,
Que afinal não o eram.
Acumularam-me de conhecimentos,
De que ainda me liberto.
Ditaram-me nos cadernos de duas linhas,
Os exemplos que procuro não seguir,
Fizeram-me ler histórias de santos, sábios e heróis
Que eu não quero ser nem imitar.
Aprendi a geografia dos comboios,
Para viver na era dos aviões.
Soube de cor todas as constelações,
Que hoje se escondem no fumo das cidades.
Ensinaram-me a pescar nos rios e nos regatos,
Em que bóiam as garrafas de plástico.
Quando sabia tudo,
Atiraram-me para a vida de que eu nada sabia
E onde era tudo ao contrário do que aprendera.
Habituei-me a raciocinar pelo contrário.
Não era infeliz, era desarmado
E tive de aprender de novo
Tudo o que não me haviam ensinado
E que eu quereria não ter aprendido.
(Jacinto Magalhães,
in "Entre mim e o Outro")
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