Escola Secundária José Estêvão, n.º 18, Fevereiro de 1997

ÁREA-ESCOLA

Uma Opinião

 

Cristina Borges,
aluna do 12.º ano e membro do Conselho Directivo

 

Área-Escola?!

Ninguém me pediu para escrever o texto que se segue. Mas penso que, como estudante que sou, devo transmitir a minha opinião, que é também a de muitos colegas, à restante comunidade escolar acerca de um problema que a todos diz respeito: a área-escola. Dizer o que pensamos, mais do que um direito, é um dever, Se a nossa escola é, de facto, uma comunidade, é da maior importância que as diversas partes dela constantes comuniquem entre si, tentando resolver os problemas com que nos confrontamos.

Desde o inicio da reforma educativa que a área-escola tem sido alvo de polémica e discussão. As opiniões, de professores e alunos, divergem. Se é verdade que encontramos os extremos – aqueles que defendem a sua aplicação a todos os graus de ensino e aqueles que afirmam que deveria ser totalmente abatida – há também pessoas que pensam que a área-escola deveria ser entendida de modos diferentes consoante o grau de ensino em questão.

Encontro-me agora a frequentar o 1.º° ano de escolaridade. Quer no 10.º, quer no 11.º ano, a minha turma desenvolveu projectos de área-esco!a. Quando, no 10.º ano, surgiu a ideia de tratarmos o tema «Geminação entre as cidades de Aveiro e Arcachon – razões da sua existência», todos pareceram bastante interessados, aliciados sobretudo pelo facto de no projecto constar uma visita de estudo à cidade francesa em questão. Como delegada de turma que era, coube-me a mim a elaboração do projecto. Devo dizer que, apesar de muitas pessoas pensarem que nós só queríamos ir passear, o projecto tinha objectivos legítimos e lógicos. Só que os obstáculos cedo surgiram. Embora a legislação preveja a ocupação de 20% da carga horária de cada disciplina com actividades da área-escola, a maioria dos professores não se mostrou disponível para ceder aulas da sua disciplina, alegando programas demasiado extensos. E, de facto, assim é. Não podemos acusar os professores de falta de interesse ou cooperação; os programas são, de facto, longos e raramente os cumprimos. Por outro lado, da parte de muitos alunos havia a ideia de que a área-escola era só a viagem e de que tudo o resto – trabalho de pesquisa, contacto com entidades envolvidas no processo – (talvez os objectivos que mais diziam respeito à ligação entre a escola e o meio envolvente – não será esse o principal objectivo da área-escola?) – não era importante e era deixado para "alguém fazer". Como é conhecido e já habitual em processos do género, esses "alguéns" acabam por ser um grupo restrito de 3 ou 4 pessoas que querem, de facto, viver o espírito da área-escola. Eu fui um desses "alguéns". Na minha opinião, quando um projecto é / 11 / elaborado, é para ser realizado em todas as suas vertentes e até ao fim. Bem, elaborou-se um relatório apressado, após a viagem, colámos umas fotografias para a comunidade ver e ficámos muito felizes, porque não tivemos aulas durante uma semana, pois fomos passear. No fim do ano, todos tínhamos já concluído que a área-escola era apenas teoricamente uma boa ideia; na prática, no nosso caso, tratou-se de, permitam-me a expressão, "palhaçada". Um dos objectivos do projecto era levar a que as pessoas tomassem contacto directo com as diversas burocracias do dia-a-dia: enviar um fax, fazer um telefonema para o estrangeiro, ir a uma câmara, escrever uma carta de pedido de patrocínio, ir a um banco e efectuar as transacções mais básicas. Devo dizer que estas tarefas ficaram a cargo das pessoas que já o sabiam fazer. Sem comentários.

No 11.º ano, a ideia era ir a Londres. Embora um pouco na brincadeira e com a maior parte das pessoas a pensarem que estávamos todos a gozar com a área-escola, foi elaborado um projecto que consistia na elaboração e desenvolvimento de um projecto de uma visita de estudo de 8 dias à cidade de Londres. Pode parecer estranho, mas, e falo por experiência própria, levar um projecto destes para a frente é bastante trabalhoso e exige bastante empenho, podendo desta actividade retirarem-se ensinamentos importantes no que respeita à relação entre a escola e o meio envolvente. Mais uma vez, quem sabia como redigir uma carta formal em inglês escreveu todas as que foram necessárias e as pessoas que não sabiam não aprenderam, pois ninguém parecia interessado nem a ensinar nem a aprender este tipo de coisas. Mais uma vez, uma grupo restrito viveu a área-escola a "sério" – por "coincidência", o mesmo que no ano anterior – e a todos os outros a área-escola passou ao lado. No fim do ano, elaborou-se um relatório das actividades que serviram de base ao projecto da área-escola e, mais uma vez, ficámos todos sem saber, professores e alunos, para que é que servia a área-escola. E mais um ano de "palhaçada" passou.

Este ano, há um tema geral para toda a escola: "Comunicação"…

Foram dadas sugestões, surgiram algumas ideias, mas nada de concreto ficou decidido (refiro-me, é claro, às turmas de 12.º ano com quem tenho mais contacto). Decerto não vamos inventar uma outra visita de estudo no suposto âmbito da área-escola. Gostávamos de, finalmente, perceber o espírito de área-escola e decidir se é ou não possível vivê-lo.

Na minha opinião, não devemos encarar o 12.º ano como um ano tão diferente dos outros que não nos deixe tempo para pensar em mais nada. Quem já tem vindo a trabalhar, decerto que continuará; quem não tem.., em relação a esses, tenho as minhas dúvidas se conseguirão obter a tão desejada média para a entrada na Universidade, com um estudo feito à pressão (porque sem saber o básico é difícil perceber o complexo). Penso, portanto, que o problema não reside no facto de sermos estudantes do 12.º ano e de termos exames nacionais no fim do ano. O problema, na minha opinião, é um problema de definição. Há que, antes de mais, ver o que queremos fazer, o que podemos fazer e se, de facto, estaremos assim a projectar a área-escola ou não. Porque fazer projectos em nome de 30 alunos para 2 ou 3 terem o trabalho todo não vale a pena. É mais inteligente não haver projecto à partida. Por outro lado, a área-escola deve ser um esforço conjunto de professores e alunos. Se não há tempo para realizar actividades da área-escola não vale a pena perder tempo a projectá-las.

Como optimista e defensora de uma ligação mais forte entre a escola e o meio que a rodeia que sou, penso que a área-escola é possível em todos os graus de ensino. Há é que adequá-la a cada ano, não nos esquecendo de que o básico e o secundário têm, de raiz, objectivos diferentes. Há que pensar e que agir. Ficar à espera que alguém tenha ideias e que as realize não é, de forma alguma, uma atitude a adoptar. A nossa participação, – a de todos nós, professores e alunos – deve ser activa e não, como tem sido na maior parte das vezes, passiva. A vida só se vive uma vez; os anos que passamos nesta escola são únicos e não se repetirão (tal é ainda mais flagrante no que respeita aos alunos); há que vivê-los activamente para que possamos chegar aos fim da nossa passagem por esta escola e dizer: «Fizemos alguma coisa de positivo. Não nos limitámos a ser ovelhas de um rebanho sem rumo. Tomámos decisões. Assumimos posições. Tomámos atitudes e responsabilizámo-nos por elas».

Este texto não pretende ser uma repreensão a ninguém; apenas uma chamada de atenção. Reflictamos, discutamos, tiremos conclusões. O Mundo não é daqueles que se deixam ir na corrente; nem é desses que reza a história. Neste momento, a área-escola parece, pelo menos para alguns, um problema sem solução. E somos nós que o temos que solucionar. Ir passando a «batata quente» não resolve nada....

Cristina Borges – 12.º A
 

 

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