Aveiro como porto de pesca costeira
Dos portos de segunda classe, ocupa Aveiro o 2.º lugar, quanto ao valor
de pescado.
A "Estatística das Pescas Marítimas", de 1933, diz-nos que aquele valor
é, em média, de 8.935 contos. Extraído deste valor o valor médio da
pesca do bacalhau, dado também por aquela Estatística, teremos que o
valor médio, anual, da pesca costeira é de 5.160 contos.
Dentro deste valor, a sardinha ocupa o primeiro lugar, e o sistema de
pesca empregado é a arte de xávega que, como se sabe, é um sistema de
arrasto adoptado no cordão litoral da laguna entre Espinho e Mira. Este
sistema de pesca emprega muitos milhares de braços que labutam com a
rudeza do mar desde Março a Novembro. É um sistema de pesca decadente,
e, mercê da concorrência que lhe faz a traineira, tende mesmo a
desaparecer, como se demonstra pelo mapa n.º 4.
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Mapa n.º
4
Imposto cobrado pelos postos de pescado nos anos económicos de 1929 a
1933
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Anos económicos |
Receitas do Estado |
Impostos Municipais |
Valor do pescado |
1929-1930
1930-1931
1931-1932
1932-1933 |
525.833$91
671.190$75
405.909$73
374.317$00 |
90.094$69
115.604$65
71.690$27
64.030$30 |
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Média geral...... |
494.312$85 |
85.354$95 |
5.160.000$00 |
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O desaparecimento deste sistema de pesca lança alguns milhares de braços
na miséria.
Ora o Estado não deve permitir:
1.º − Que desapareça uma indústria que extrai, actualmente, do mar 5.160
contos, em média, por ano, e que já extraiu 11.000 contos;
2.º − Que se lancem na miséria alguns milhares de braços;
3.º − Que deixe de existir uma importante fonte de receita para o
Estado.
A única forma de obviar a estes três inconvenientes é caminhar também
com o progresso e fazer substituir aquele sistema por modernos sistemas
de pesca. Isso só se consegue com um porto onde entre com facilidade e
segurança a navegação adequada a esse fim. Esse porto deve ser situado
no centro da região onde a actividade da pesca está decadente.
O centro dessa região é, indubitavelmente, Aveiro.
Sob o ponto de vista de pesca costeira, além dos números agora
apresentados, extraídos de elementos oficiais, um novo horizonte se
rasga para Aveiro e sua região, desde que seja conseguido o franco
acesso à navegação. Entre o Douro e Lisboa pode dizer-se que não existem
centros de pesca importantes. O peixe para o centro do país vem, trazido
pela camioneta, daqueles dois centros de pesca, que distam um do outro
360 quilómetros. Daqui resulta que a distribuição de peixe no centro do
país é insuficiente, inconstante e por vezes até atrabiliária. Essa
distribuição faz-se de preferência ao longo da Estrada Nacional, isto é,
na zona litoral, onde a população é mais densa e onde a arte da xávega
criou, nos seus tempos áureos, o hábito do consumo do peixe. Para o
interior do país, isto é, nas Beiras, a distribuição é manifestamente
insuficiente, e o peixe que lá chega não pode deixar de sofrer um
aumento de custo, por virtude do seu longo trajecto.
Ora Aveiro está magnificamente situada para servir o centro do país,
tanto pela sua rede de estradas, como pelas vias férreas de V. V., C. P.
e B. A.. Sendo grande, debaixo deste ponto de vista, o seu campo de
acção, não resta dúvida de que, uma vez completadas as obras em questão,
Aveiro figurará como centro de pesca de certa importância, e não custa
admitir que, em breve espaço de tempo, o valor da pesca costeira
triplique, aproximando-se de 15.000 contos.
Este cômputo de 15.000 contos pode ser estabelecido da seguinte maneira:
Pela "Estatística da Pesca Marítima” de 1912, vê-se que o valor da pesca
da Capitania do Porto de Aveiro (sem contar o bacalhau) é, em média, de
500 contos, números redondos (média geral de 1896 a 1912). Actualizado
aquele valor, teremos que as artes de xávega, no seu período áureo,
arrastavam, em média,
500 X 22 = 11.000 contos.
Ora nesse tempo o transporte do peixe era moroso, porque era feito em
barcos pela laguna e Rio Vouga acima, ao dorso de muares, à cabeça das
peixeiras e em carroças.
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Tendo o porto de Aveiro, uma vez o seu acesso garantido, a função de
fazer substituir as xávegas, hoje decadentes, pela traineira, e
usando-se para o transporte de peixe a via férrea e a camioneta, com um
poder de penetração muito maior do que o existente de 1896 a 1912, não
exageramos, evidentemente, computando para o porto de Aveiro um
aparecimento rápido de pescado, no valor aproximado de 15.000 contos
anuais. Isto é, garantido o acesso ao porto de Aveiro e facilmente
atingidos os 1.5.000 contos de valor de pescado, terá o Estado um
rendimento anual de mais de 1.500 contos, a avaliar pelo que actualmente
cobra.
Os 15.000 contos referem-se apenas ao incremento rápido, resultante
apenas da construção dos molhes e são o correspondente, aproximadamente,
ao valor que a pesca da xávega tinha em 1899.
Como se sabe, a laguna de Aveiro tem óptimas condições naturais para
porto interior, e, com as dragagens interiores actualmente em execução
pela Junta Autónoma, desde que haja fácil acesso na barra, as traineiras
têm vários locais onde podem fazer o comércio de peixe que pescam e onde
podem ser abastecidas com água e carvão.
Se se construísse um porto interior de pesca, evidentemente que, graças
ao «interland» do porto de Aveiro, que só nos concelhos limítrofes da
Ria tem um mercado de mais de 100.000 consumidores, população semelhante
à da cidade do Porto, e graças ao campo marítimo de pesca abundante e
extenso, situado ao Norte e ao Sul da Barra de Aveiro, aqueles 15.000
contos seriam rapidamente ultrapassados. Este campo marítimo de pesca
constitui uma das grandes vantagens do porto de Aveiro, porque, sendo
abundante em espécies piscatórias, e estando situado em frente à barra
de Aveiro, facilita imenso o exercício da pesca. É precisamente neste
campo marítimo de pesca que as traineiras do Douro e Leixões vêm
ordinariamente pescar.
Não nos resta absolutamente dúvida alguma de que, sob o ponto de vista
de pesca, é indispensável criar um porto em Aveiro, já para bem servir a
zona da Beira Alta, e talvez parte da Beira Baixa, quando mais tarde se
aperfeiçoar o porto interior, já para fazer substituir a pesca da xávega,
que criou um mercado que, de forma alguma, portos situados a 80 e 280
quilómetros podem servir convenientemente. Só o porto de Aveiro, situado
no centro do país, pode servir também a zona do centro do país.
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