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«Deus quer, o homem sonha, a
obra nasce.» - Fernando Pessoa
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ORADORES
Dr.ª Maria da Luz Nolasco
[Vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Aveiro]
Dr.ª Maria Filomena Vale Guimarães de Oliveira
[filha do Dr. Orlando de Oliveira]
Prof. Henrique Neto
[Conservatório de Música de Aveiro de Calouste Gulbenkian]
Professor Doutor Jorge Arroteia
[Universidade de Aveiro] |
SESSÃO MUSICAL
Alunos e Professores do
Conservatório de Música de Aveiro de Calouste Gulbenkian
LUÍS BARBOSA: ROMANCE
J. S. BACH: CONCERTO EM MI MAIOR (1º andamento)
Inês Bastos (Violino)
Profª Isabel Santos (Piano)
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ORLANDO DE OLIVEIRA
Elementos Biográficos
Nasceu em Viseu, a 30 de
Dezembro do ano de 1908 e faleceu em Aveiro, a 24 de Fevereiro de 1991.
De origem humilde, Orlando de Oliveira nutriu por Aveiro e suas
vivências uma grande paixão. Este aveirense destacou-se no campo das
letras, da cultura e do ensino.
Foi em 1932 que Orlando de
Oliveira iniciou nesta cidade a sua vida académica. Foi depois,
professor efectivo a partir de 1946, no Liceu Nacional de Aveiro, Reitor
nos anos de 1957 a 1974.
Apoiante da regionalização
nacional e de políticas de descentralização, nomeadamente, no que
concerne ao ensino médio e superior, O. de Oliveira encorajou a criação
do Instituto Comercial de Aveiro, entidade precursora do actual ISCAA –
Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Aveiro; do
Conservatório Regional de Música; do pavilhão gimno-desportivo do
INDESP; da Universidade de Aveiro e ainda de estabelecimentos
vocacionados para o ensino agrícola e pecuário; de enfermagem; de
náutica e ciências. Muitos foram os esforços enveredados por Orlando de
Oliveira, junto de Ministros da Educação Nacional, da Marinha, da Saúde
e Assistência, da Fundação Calouste Gulbenkian, do Governo Civil, da CMA
e da Junta Distrital, para que os mesmos se implantassem na cidade. A
sua perseverança permitiu-lhe, de facto, angariar os apoios almejados e
concretizar alguns dos projectos actualmente existentes.
É de salientar ainda que na
década de sessenta, Orlando de Oliveira exerceu ainda os cargos de
Presidente da Comissão Municipal de Cultura do Concelho de Aveiro; foi
membro representativo do Distrito de Aveiro, na Comissão Regional de
Planeamento da Região Centro (entidade que antecedeu a Comissão de
Coordenação Regional) e Vereador da Câmara Municipal de Aveiro, de 1960
a 1967, durante os mandatos do Dr. Alberto Souto e do Dr. Artur Alves
Moreira.
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A 18 de Dezembro de 1973, a Câmara Municipal de Aveiro deliberou
atribuir ao Dr. Orlando de Oliveira, Reitor do Liceu local, a Medalha de
Prata da Cidade pelos relevantes serviços prestados à cidade, em ordem à
fundação do Conservatório Regional de Aveiro e, pela criação da
Universidade local.
Orlando de Oliveira,
encontra-se sepultado, nesta cidade, que tanto admirava, no talhão n.º
3, do Cemitério Central.
Fontes:
Aveiro e o Seu
Distrito, Publicação Semestral da Junta Distrital de Aveiro, n.º 12,
1971, pp. 21 a 26 e n.º 31, 1983, pág. 12; www.ua.pt/isca; o "Litoral"
de 22.12.1973; "Diário da República" I Série, n.º 168, de 24.07.1985,
Calendário Histórico de Aveiro, por António Christo e João Gonçalves
Gaspar, págs. 342, 402, 418, 509; Em Prol dos Distritos - I Encontro
das Beiras sobre Regionalização, Viseu 12.06.1981; Universidade
de Aveiro – do sonho à realidade, por João Gonçalves Gaspar, Aveiro,
1999, ed. Universidade de Aveiro, pp. 39 a 129.
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DR. ORLANDO DE OLIVEIRA,
FUNDADOR DO CONSERVATÓRIO DE MÚSICA DE AVEIRO DE CALOUSTE GULBENKIAN
Professor Henrique Neto
O Conservatório de Música de
Aveiro de Calouste Gulbenkian nasceu há cinquenta anos, e brotou do
entusiasmo e dinamismo de alguém que lhe dedicou todo o seu carinho e
saber. Efectivamente já decorreram cinco décadas, desde que o Dr.
Orlando de Oliveira pensou e idealizou para Aveiro a existência de um
Conservatório. Na realidade deve considerar-se mais um ano, uma vez que
foi em Agosto de 1959 que esta ideia começou a «conquistar» a atenção do
Dr. Orlando de Oliveira, à época, reitor do Liceu Nacional de Aveiro.
Era assim chegada a altura desta cidade, enquanto capital de distrito,
ter a sua própria escola de música. Em Outubro desse mesmo ano, a
criação de uma Academia era já considerada uma possibilidade. E foi como
tal, que no final da sessão solene de abertura do ano lectivo de
1959-1960, realizada no Liceu Nacional de Aveiro, a existência desta
iniciativa foi publicamente anunciada pelo seu reitor. O auxílio
prontamente prestado pela Fundação Calouste Gulbenkian, foi de
terminante para a concretização deste projecto. Assim, foi no dia 8 de
Outubro de 1960 que a cidade «assistiu» à inauguração oficial do seu
Conservatório Regional, constituindo esta realização a primeira
conquista do Dr. Orlando de Oliveira em benefício de Aveiro, terra de
alguns dos seus filhos como gostava e era habitual referir. Desde o
primeiro ano da existência deste estabelecimento de ensino, ficou
determinado que o cargo de presidente do Conselho Administrativo, cujos
mandatos tinham a duração de três anos, seria atribuído ao seu fundador.
Cumprindo o estipulado, o Dr. Orlando de Oliveira desempenhou estas
funções durante os três primeiros triénios. No ano de 1969, prestes a
iniciar mais um triénio, viu-se forçado, por falta de saúde, a pedir a
não recondução no cargo e, consequentemente, a sua substituição no
desempenho destas funções. Este facto, causou grande consternação entre
os colegas dos trabalhos de tantos anos, que movidos pela forte amizade
ao presidente
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cessante, insistentemente procuraram levá-lo a reconsiderar esta sua
decisão. Ao ser informado pelo próprio Dr. Orlando de Oliveira, deste
seu pedido de resignação ao cargo de Presidente do Conselho
Administrativo do Conservatório, também o Dr. José de Azeredo Perdigão;
administrador da Fundação Calouste Gulbenkian, diligenciou no sentido de
procurar alterar o sentido desta decisão. Contudo, a perspectiva de mais
três anos de trabalho intenso era incompatível com o fragilizado estado
de saúde do Dr. Orlando de Oliveira. Foi ainda por sua sugestão e
cuidados que a Assembleia Geral pôde eleger o seu sucessor no cargo. As
felicitações pela criação do Conservatório e as manifestações de carinho
e apreço pela acção do seu fundador foram uma constante, surgidas de
múltiplas origens e nos mais variados contextos. Dos numerosos exemplos
que podem ser encontrados, apresentam-se em seguida alguns:
«(...). É hoje um dia de
grande júbilo para os músicos portugueses e para os aveirenses.
Inaugura-se mais uma Escola de Música no País – O Conservatório Regional
de Aveiro. Iniciativa altamente honrosa do ilustre Reitor do Liceu
Nacional de Aveiro, Sr. Dr. Orlando de Oliveira, que a esta obra tem
dedicado o seu melhor esforço e entusiasmo, ela irá decerto exercer uma
benéfica acção educativa na juventude de Aveiro. (...»>
(Excerto do discurso da
Ex.ma Directora, Profa Gilberta Xavier de Paiva, na sessão solene da
inauguração oficial do Conservatório Regional de Aveiro; 8-10-1960)
«O Senhor Presidente propôs
e foi deliberado, por unanimidade, agradecer ao Senhor Doutor Orlando de
Oliveira os sentimentos de gratidão dirigidos a esta Câmara Municipal,
os quais são retribuídos, informando, ainda, que este Corpo
Administrativo sempre apreciou a sua acção no Conservatório Regional de
Aveiro, lastimando, assim, a retirada de figura tão prestimosa do
referido estabelecimento de ensino, o qual só adquiriu a repercussão com
que actualmente se apresenta, mercê, em grande parte, da sua valiosa
acção, pelo que é credor das homenagens da cidade, através do seu
Município.»
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(Câmara Municipal de Aveiro, excerto da acta da reunião ordinária de
17-11-1969 )
«(...), se o Conservatório
tanto deve à total dádiva dos relevantes préstimos do sr. Dr. Orlando de
Oliveira, Aveiro muito deve à sua operosíssima e sacrificada devotação
em prol do estabelecimento educativo e formativo de que tanto se
orgulha. (...»>
(Litoral; 29-11-1969)
«Quando a história se fizer
(...) há dois nomes que ficarão juntos, indelevelmente juntos, ao do
Conservatório Regional de Aveiro: o Dr. Orlando de Oliveira e a Fundação
Calouste Gulbenkian. Para o Conservatório, quanto a nós, o Dr. Orlando
de Oliveira aparece-nos como o homem que foi o primeiro. Poderia ser
outro. (...). Mas foi ele (...). Ele sonhou – e do sonho soube passar à
concretização prática da obra. E a obra, tomada logo depois pelas
benemerências da Fundação Calouste Gulbenkian e do seu ilustre e
dinâmico Presidente, o Dr. Azeredo Perdigão, aí está nesta cidade, em
casa nova e com nome feito: Conservatório Regional de Aveiro.»
(Correio do Vouga;
5-12-1969)
«(...), a nota menos alegre
que há a referir neste ano lectivo foi o pedido insistente de não
reeleição feito pelo nosso Presidente do Conselho Administrativo, Sr.
Dr. Orlando de Oliveira, que por motivo de falta de saúde, se viu
obrigado a tomar tal atitude. Foi com sincera mágoa e muita compreensão
que o Conselho se resignou e atendeu tal pedido. É que o Sr. Dr. Orlando
de Oliveira não foi apenas o homem (...) que sonhou esta bela obra, lhe
amparou os primeiros passos e a dirigiu com paternal solicitude ao longo
de dez anos; mas também o responsável competente que soube ouvir e
informar-se antes de tomar resoluções definitivas, o
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amigo leal com quem apetecia colaborar, o perito actualizado e sempre
atento das leis que regem a educação nacional, o redactor inteligente e
primoroso de boa parte da nossa correspondência oficial, o enamorado da
sua Dama, a quem guardou perfeita fidelidade em todas as horas,
particularmente as que se mostraram mais difíceis ou temiam mais
perigosas. (...)»
(Conselho Administrativo do
Conservatório Regional de Aveiro; Relatório Anual 1968-1969)
«Na sua última reunião,
(...), a Direcção deste Clube, conhecedora de que V. Excia, por
imperiosos motivos de saúde, se vira f0rçado a abandonar as altas
funções de Presidente do Conselho de Administração do Conservatório
Regional de Aveiro, deliberou consignar em acta – 1) a mágoa que lhe
causava o afastamento de V. Excia, de um cargo que sempre exercera com
notável dedicação e inultrapassável eficiência; 2) os melhores votos de
um rápido e completo restabelecimento de V. Excia, de forma a, tão breve
quanto possível, poder retomar a orientação de uma obra que lhe deve
tudo, do muito que hoje é; 3) o seu reconhecimento pela acção que V.
Excia desenvolveu no Conservatório Regional de Aveiro, e que, se foi
utilíssima para este já prestigioso estabelecimento de ensino,
representou um benefício inestimável para a nossa Cidade.»
(Clube dos Galitos;
4-12-1969)
«(...) não posso esquecer
nesta hora o sonhador que idealizou, estruturou e dinamizou o
Conservatório Regional de Aveiro; (...). Esse homem é o senhor Dr.
Orlando de Oliveira, dedicado, infatigável, meticuloso e entusiasta
impulsionado r desta Escola que tão relevantemente administrou na
primeira década da sua existência. Com vénia de Vossa Excelência aqui
lhe expresso publicamente a minha admiração e respeito. (...)»
(Excerto do discurso do
Presidente do Conselho Administrativo do
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Conservatório, Pedro Grangeon Ribeiro Lopes, na inauguração oficial das
actuais instalações; 30-3-1971)
«– A todos – os de ontem e
os de hoje – agradeço o entusiasmo com que sonharam esta obra e
contribuíram para a sua realização. Ela deve-se, fundamentalmente, à
confiança que souberam inspirar ao Conselho de Administração da
Fundação, confiança que se alicerçou na obra que vinham realizando desde
1960 por iniciativa de alguém, cujo nome, só cometendo uma grande
injustiça, poderia ser esquecido – o do Dr. Orlando de Oliveira – que,
sendo reitor do Liceu, tomou a iniciativa de criar o Conservatório, o
amparou e defendeu nas suas diversas vicissitudes e que só o deixou
quando o peso dos trabalhos – que não das responsabilidades – já
superava as suas forças físicas o Para ele as penúltimas palavras – de
saudação e de reconhecimento palavras que todos que o conhecem e o que
foi o seu esforço em prol do Conservatório, compreenderão e aplaudirão
sem reservas.»
(Excerto do discurso do
Presidente do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian,
Dr. José de Azeredo Perdigão, na inauguração oficial das actuais
instalações; 30-3-1971)
«Esta obra, de há muito
ambicionada não apenas por aquele que a sonhou - o que foi, justamente,
aqui lembrado – como por todos aqueles que deram realização a esse
sonho, é, com efeito, uma grande obra.»
(Excerto do discurso do
Presidente da República, Almirante Américo Tomás, na inauguração oficial
das actuais instalações; 30-3-1971)
Passados cinquenta anos da
sua fundação, este estabelecimento de ensino, continua a ser um
organismo vivo e dinâmico, honrando e dando continuidade à missão
idealizada e iniciada pelo seu fundador. Usando as suas palavras:
«(...), a obra do Conservatório está de pé e continuará a
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viver porque Aveiro já não a pode dispensar.»
A comunidade discente,
docente e funcionários, que actualmente estuda, trabalha e frequenta o
Conservatório, exprime aqui o seu voto de gratidão em honra da memória
do Dr. Orlando de Oliveira, o fundador do Conservatório de Música de
Aveiro de Calouste Gulbenkian – afinal e singelamente «o seu
Conservatório».
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DR. ORLANDO DE OLIVEIRA E A
UNIVERSIDADE DE AVEIRO
Professor Doutor Jorge
Arroteia
Introdução
Por deferência do Magnífico
Reitor da Universidade de Aveiro, cabe-me a honra de o representar nesta
sessão dedicada a recordar um dos aveirenses que se distinguiu em vários
domínios: nas letras, na cultura, no ensino, na cultura e na construção
do saber. Cidadão que não tendo nascido sob os telhados desta "cidade
salgada", soube granjear pelo seu trabalho e acção, o reconhecimento dos
seus pares, dos alunos e das gerações que lhe sucederam. Refiro-me ao
Sr. Dr. Orlando de Oliveira, reconhecido beirão que depois de ter
deixado o planalto Viseense e a Academia Coimbrã, iniciou a sua vida
académica nesta cidade no longínquo ano de 1932. Aqui regressou para
leccionar no Liceu Nacional, depois de 1946. Poucos anos depois, em
1957, assumiu as funções de Reitor e a partir de então, até 1974 – data
em que abandonou essas funções – não mais pugnou pela defesa do ensino e
da criação de novas escolas nesta cidade aveirense.
Tomei contacto com o Dr.
Orlando de Oliveira no final do ano lectivo de 1981 quando da realização
do "1º Encontro das Beiras sobre Regionalização", o qual teve lugar na
cidade de Viseu em 11, 12 e 13 de Junho. A iniciativa coube à PROVISEU e
reuniu diversos oradores e conferencistas. Cada um e à sua maneira deu a
conhecer as diferentes perspectivas sobre um assunto que à data começava
a agitar a sociedade portuguesa: a regionalização do país. De facto o
MAl havia publicado no ano anterior o "Livro Branco da Regionalização",
obra que reunia um conjunto de textos relacionados com esta temática e
que surgia como um dos grandes desafios para a classe política e para a
sociedade civil. Os académicos não podiam ficar indiferentes.
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Tive oportunidade de fazer a
viagem em conjunto e de lhe referir alguns tópicos de uma comunicação
que havia elaborado sobre "Demografia e regionalização", nomeadamente os
aspectos relacionados com o contributo da populace neste processo. De
volta recolhi um rol extenso de informações relacionadas com a vida e as
preocupações do antigo Reitor do Liceu de Aveiro que me levaram a
conhecer no regresso e mais tarde, noutras oportunidades, o contributo
desta personagem na criação dos estudos médios e superiores na cidade de
Aveiro. Assim aconteceu com a instalação do Instituto Comercial de
Aveiro (ensino médio), do Conservatório Regional Calouste Gulbenkian e
da Universidade de Aveiro, que me cabe a honra de representar.
Tópicos de acção
A luta do nosso homenageado
pela criação de uma universidade em Aveiro remonta ao início da década
de sessenta de Novecentos, a par do cargo de Reitor do Liceu de Aveiro a
exercer cumulativamente as funções de Vereador da CMA (1960-1967), ao
tempo do Presidente Dr. Alberto Souto e do Dr. Artur Moreira.
No início do seu mandato,
consciente das responsabilidades que como professor lhe cabiam, soube
reclamar ao Ministro da Educação, em reunião ordinária da CMA (4NOV60),
"a muita necessidade de se instalar nesta cidade de Aveiro um dos
muitos estabelecimentos previstos nas suas palavras (Universidades)".
Fundamentava-se no crescimento da população estudantil do Distrito a
qual, no dizer das suas palavras, "seria o caminho logicamente
seguido pelos numerosos alunos (mais de 8000) que hoje frequentam o
Liceu, Escolas Técnicas e os Colégios do Distrito" (GASPAR, 1999, p.
39).
Logo no ano seguinte, em
1961, o Vereador Orlando de Oliveira na reunião ordinário da CMA
(3NOV61), reconhece que "o aumento gradual da população escolar das
três Universidades existentes torna ineficiente e quase impossível um
bom ensino e, consequentemente, um bom aproveitamento escolar e social
da massa estudantil dessas Universidades". Tendo em conta
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esta situação e tendo em consideração "o alto nível técnico do
Distrito de Aveiro", reclama ao Presidente do Município que "inclua
na sua agenda de realizações imediatas, como da maior importância, a
tentativa, junto do Governo da Nação, para que em Aveiro seja criada uma
Escola Superior, com as características aconselháveis pelas necessidades
de ordem local e com a orgânica que o Governo tiver como mais
conveniente" (op. cit., p. 41).
Esta proposta, aprovada por
unanimidade, vai dar continuidade à luta já assumida pelo Reitor do
Liceu de Aveiro na defesa da sua proposta, retomada em momentos vários
dos anos seguintes sempre reclamando para a cidade a criação de uns "Estudos
Gerais" (op. cit., p. 42). No ano seguinte, em 1963 C 4JAN63),
defende a criação de uma Secção da Faculdade de Ciências do Porto ou de
Coimbra e ainda a criação de "um estabelecimento de ensino agrícola"
(op. cit., p. 44).
O momento político escolhido
para a reafirmação desta proposta parece adequado uma vez que a mesma
vai ao encontro do pensamento do Reitor dos Estudos Gerais de
Moçambique, Prof. Veiga Simão, que advogava "a reforma do ensino
superior através do estabelecimento, sempre que possível, de vários
graus que satisfaçam as múltiplas exigências nacionais", permitindo
"a melhoria de nível cultural e científico e contribuirá para um aumento
sensível de técnicos e cientistas". (op. cit., p. 45).
Quando da tomada de posse do
Dr. Artur Alves Moreira como Presidente da CMA (20JAN64), mais uma vez o
Reitor do Liceu de Aveiro vem solicitar a sua intervenção na Assembleia
nacional para a criação, em Aveiro, "de estabelecimento de ensino
médio e agrícola e de nível universitário" (op. cit., p. 47). Em
complemento desta acção, o Dr. O. de Oliveira conseguiu, da parte do
Deputado e Presidente da edilidade aveirense, que lhe fossem facultados
elementos relacionados com a carta escolar e a demografia escolar do
Distrito no sentido de fundamentar tecnicamente, em fases futuras, as
suas propostas e pretensões (op. cit., p. 49).
O processo de democratização
do ensino iniciado nos anos sessenta e que se consubstanciaram no
prolongamento da escolaridade obrigatória e na
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criação, em 2JAN67 (decreto lei n.º 47480) do Ciclo Preparatório do
Ensino Secundário, reclamavam novas iniciativas relacionadas com a
formação docente e com a qualificação de quadros necessários ao
desenvolvimento económico do país. Foi com base nestes pressupostos que
o Reitor do Liceu e Vereador da CMA, O. Oliveira, veio a prosseguir a
sua luta promovendo, desta vez, a instalação na cidade, em 1965, de um
"Instituto Médio de Comércio" (op. cit., p. 55) destinado a ministrar o
curso de Contabilidade e, mais tarde, o "Conservatório Regional de
Aveiro".
Como temos conhecimento,
embora de natureza particular, estas escolas estiveram na origem de
outros estabelecimentos de natureza pública, de cursos e de formação de
recursos humanos, nestas diversas áreas do saber que hoje dignificam a
cidade e a sua região.
Nos finais dos anos sessenta
novos acontecimentos vão permitir alimentar a voz e o projecto deste
cidadão aveirense. Embora tendo saído da vereação da CMA, assiste à
evolução social e política do país a braços com a guerra do ultramar, as
lutas estudantis, a emigração e a mudança social causada pela
industrialização e urbanização, pelo acréscimo da mobilidade de
população portuguesa e pela procura social da educação. Por isso quando
o Prof. Marcelo Caetano ascendeu a 1º Ministro e trouxe consigo o Prof.
J. H. Saraiva para a pasta da Educação, numa visita sua a Aveiro
(12DEZ68), quer o Reitor do Liceu, quer o Governador Civil do distrito
de Aveiro encetam uma nova cruzada no sentido de não deixar apagar a
chama da criação do ensino superior universitário nesta cidade (op.
cit., p. 67-68).
São as mudanças de Governo
de 1970, quando Veiga Simão assume a pasta da Educação, que o cenário se
altera substancialmente. Confinado agora ao seu palco, como Reitor do
Liceu de Aveiro), mas apoiado no seu projecto pelo Governador Civil do
Distrito, Eng. Vale Guimarães, estes dois protagonistas (íntimos e
familiares), vão reforçar o seu projecto na ideologia, no discurso e na
prática de acção do novo Ministro da Educação. Valem-se do envolvimento
de diversos actores locais, personalidades públicas e meios de
comunicação social, para reforçar esta criação. Fazem-no agora com base
não só no discurso político mas já utilizando dados
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concretos da demografia e do desenvolvimento económico de Aveiro e do
seu distrito.
Em carta aberta datada de
Abril 70 (op. cit, p. 82), o Reitor do Liceu de Aveiro defende que "Aveiro
tem predicados, mais que bastantes, para merecer a distinção que
solicita: ensino universitário dentro dos seus muros". Isso o
reclamava mais de 8000 jovens que à data frequentavam os liceus, as
escolas técnicas e os colégios do Distrito. Como assinalou na parte
final desta missiva, "eles querem ascender, querem" mais e melhor" e
têm o direito de exigir". (op. cit., p. 82).
No palco da imprensa
regional refuta, à sua maneira beirã, os argumentos contra a criação de
uma Universidade em Aveiro e defende o seu projecto à exaustão,
reforçando os aspectos geográficos da região: "uma zona de alta
demografia, de notável sentido político evolutivo e evoluído, de
explosivo desenvolvimento económico e de valor social cada vez mais
marcante no quadro do Portugal hodierno", escreveu ele em 1970 (op.
cit., p. 98). Em Outubro de 1970 o Governador Civil de Aveiro, na
companhia de uma comissão de aveirenses, apresenta formalmente no
Ministério da Educação uma exposição na qual se lê: "Aveiro tem
direito a Estudos Gerais Universitários, coroamento do vasto aparelho
cultural de que o Distrito dispõe e onde se preparam seis centenas de
alunos que anualmente se matriculam nas Universidades, número sempre a
crescer" (op. cit., p. 105).
Da parte do Governo a
criação em Outubro de 1971 de uma Secção do Instituto Comercial do
Porto, estatuto que se altera em 1975 com a criação do Instituto
Comercial de Aveiro, dependente da Direcção de Ensino Superior e
precursor o ISCAA, hoje integrado na Universidade de Aveiro e a
autorização, em 1966, do Conservatório Regional de Aveiro ministrar
diversos cursos superiores, faz antever uma abertura para esta
iniciativa.
Depois da visita do Ministro
Veiga Simão à cidade, em 6JAN71, (op. cit., p. 123) Orlando de Oliveira
recorda o percurso das suas propostas e diligências, nos termos
seguintes (op. cit., p. 124): "Tive oportunidade de advogar nos
jornais a criação de estudos superiores em Aveiro, e fi-lo com
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a plena convicção de cavaleiro que defende a sua dama em torneio de
galanteria. Não por mero sentimentalismo de quem deseja uma Universidade
na terra dos seus filhos (...); mas, antes, por sentimento de crença nas
potencialidades aveirenses de fácil demonstração numérica e ainda pela
certeza de que, se a Região se desenvolve a ritmo acelerado e lhe
antevemos futuro promissor e talvez explosivo, esse desenvolvimento será
deformante, se o económico não for acompanhado pelo escolar".
O rumo seguido por estas
reflexões tivera eco no discurso do Ministro da Educação, Veiga Simão,
que em Abril de 1971 (op. cit., p. 127 e 128), no decurso do VI
Congresso do Ensino Liceal, realizado nesta cidade, afirma:
"(...) os estudos
superiores não devem ser apanágio exclusivo de Lisboa, Porto ou Coimbra.
É necessário expandirmos esse ensino par mais centros do nosso país.
Aveiro está nas minhas preocupações". A partir de agora aliavam-se
nesta projecto as forças vivas locais, o Ministro da Educação e o Centro
de Estudos e Telecomunicações dos C.T.T. (op. cit., p. 129), que se
disponibiliza para colaborar neste projecto cedendo parte das suas
instalações. Em 19DEZ72, Veiga Simão anuncia a sua reforma do ensino
superior com a criação de "uma Universidade no centro, possivelmente
na região de Aveiro".
Ao júbilo manifestado pelos
aveirenses e autoridades do Distrito, o Dr. Orlando de Oliveira (op.
cit., p. 137), refere: "Estou profundamente emocionado por tudo isto.
Sinto-me feliz por ver realizado um sonho, que sempre reputei de
extraordinária importância para a vida escolar de Aveiro".
Em artigo publicado na
revista da Junta Distrital: "Aveiro e o seu distrito" (1972), enuncia um
conjunto de reflexões sobre o seu desenvolvimento futuro que terminam
num desafio, aliás, alcançado: o de contribuir para as necessidades
regionais e o saber valorizar-se, desde o seu início, com o "prestígio
resultante do valor científico e cultural dos seus membros".
O projecto porque lutara
fica consignado com a publicação do Decreto-Lei n.º 402/73, de 11 de
Agosto, com a criação oficial da Universidade de Aveiro, conjuntamente
com a Universidade Nova de Lisboa, a Universidade do Minho e o Instituto
Universitário de Évora.
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A acção deste professor em prol da educação e, sobretudo, da criação da
Universidade de Aveiro ficou plasmada em diversas condecorações. No ano
de 1973, a Câmara Municipal (18DEZ73), decidiu atribuir-lhe a medalha de
prata da cidade de Aveiro; na abertura do ano académico de 1990/200, por
ocasião do 25 aniversário da sua criação, a Universidade de Aveiro,
decidiu igualmente prestar-lhe uma merecida homenagem.
Com o sentido de recordar e
de valorizar a memória dos que nos antecederam na construção deste
projecto, não podia a Universidade de Aveiro, na pessoa do seu Magnífico
Reitor, representante de toda a sua academia, alhear-se a esta sessão e
de associar à homenagem dos cidadãos aveirenses que hoje se reúnem para
evocar a acção desta personalidade: o Dr. Orlando de Oliveira. Como se
lê na fundamentação da "mercê honorífica" atribuída pela CMA – "sendo
Viseense pelo nascimento, a Aveiro se prendeu pelo coração".
Nesta sessão coube-me a
honra de testemunhar o reconhecimento da Academia aveirense através
desta singela alocução.
Obra consultada:
Gaspar, João Gonçalves
(1999) – Universidade de Aveiro – do sonho à realidade. Aveiro,
Universidade de Aveiro
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Agradecimentos
Família do Homenageado, na pessoa da Dr.ª Maria Filomena Vale
Guimarães de Oliveira
Universidade de Aveiro
Aluna Inês Bastos (violino)
Professora Isabel Santos
(piano) |