PÁGINA 1
Editorial

H. Oliveira

 

 


PÁGINA 2

A Educação de Adultos
João Paulo

 

 


PÁGINA 3

Viagem pela Imprensa Escolar...
H. Oliveira

 

 

 

 

PÁGINA 4 
2 Contos tradicionais portugueses

 

 


PÁGINA 5
Debate: O Ensino de Adultos
João Paulo

 

 


PÁGINA 6

Dia da Poesia

 

 


PÁGINA 7

Adeus escudo! Viva o Euro
Cristina Campizes

 

 


PÁGINA 8
Adeus escudo! Viva o Euro (B.D.)
Emília R. Borges

 

 

 

PÁGINA 9
(In)Comunicação
Alcino Cartaxo

 

 

 


PÁGINA 10

Lenga-lenga
Linda Maria

 

 

 


PÁGINA 11

Para quando Arte para todos?

Claudette Albino

 

 


PÁGINA 12
Visita de Estudo - Ida ao teatro
Grupo de alunos

 

 

 


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Hora do Recreio

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(In)comunicação

Num tempo em que muito se fala de comunicação, afigura-se-nos oportuna uma breve visita a este universo muito “barulhento”, mas com muitas interrogações, também. Ela é, seguramente, um dos símbolos mais brilhantes do séc. XX, cujo ideal é aproximar os homens, os valores, as culturas, dar testemunho de todos os combates travados pela emancipação dos povos, pela liberdade, pelos direitos do homem, pelos ideais da justiça, da paz e da democracia. Todos nós pertencemos ao espaço da comunicação, onde se cruzam o público e o privado. Porém, nada garante, sobretudo no momento do seu triunfo técnico e económico, que os ideais da comunicação de ontem se inscrevam nos ideais de amanhã. Mas como salvar a dimensão humanista da comunicação quando triunfa a sua dimensão instrumental?

Aqui, ficam algumas ideias retiradas dos autores referidos na bibliografia. Para despoletar outras incursões reflexivas sobre este novo mundo da comunicação.

Propositadamente, apenas um título geral. Ao longo deste breve apontamento, os títulos podem ser criados ou imaginados ao sabor da leitura/das leituras. Texto/leitura inacabados. Forçosamente, inacabados.

Que sentido(s) para a palavra comunicação? (Wolton, 1997: 14-16)

Antes de tudo, é uma experiência antropológica fundamental. Comunicar consiste em estabelecer trocas com outro. É pela comunicação que se “tocam” e se manifestam, se revelam e se exprimem o individual e o colectivo. A comunicação constitui, assim, o fundamento da afirmação pessoal e colectiva, um modelo cultural produtor de linguagens e de formas de ser e de estar. Neste sentido, o acto comunicacional actualiza uma história, uma cultura, uma sociedade, essencialmente porque “a comunicação remete para o fundamento de toda a experiência humana” (ibid.: 36). Comunicar é, nesta lógica de sentido, partilhar, é o meio de entrar em contacto com outro. É a comunicação directa.

A comunicação é o conjunto das técnicas que, ao longo do tempo, foram substituindo a comunicação directa pela comunicação à distância. Hoje, comunicação significa quer a relação directa entre duas ou várias pessoas, quer a relação à distância mediatizada por tecnologias apropriadas. Hoje, comunicar é trazer à nossa presença o que se passa algures no planeta, tarefa simples e banal. A “aldeia global” aí está.Compreensível dum ponto de vista técnico, mas com algumas interrogações do ponto de vista histórico e cultural. É a comunicação técnica.

A comunicação tornou-se uma necessidade social funcional para economias interdependentes, pois o mercado mundial assim o requer. A abertura de “fronteiras” e a queda de “alguns muros” proporcionaram o terreno para o desenvolvimento da “comunicação mundial”. É a comunicação funcional (ou instrumental).

Um ponto comum a estes três níveis de comunicação: a interacção. É esta que define a comunicação. Mas a aceleração dos diferentes níveis comunicacionais arrasta o triunfo de uma ambiguidade: as interacções da comunicação funcional não são sinónimas de intercompreensão.

A comunicação é o paradigma cultural do século XX. Graças à técnica, é muito simples comunicar: o telefone, o telefax, a rádio, a televisão, a imprensa, a Internet, os transportes aéreos, tudo nos leva longe com uma rapidez que ainda nos surpreende. Os meios de comunicação, desenvolvidos até ao inacreditável, constituem o «quarto poder», um poder indiscutível testemunhado pela irrefutável expressão de que “só é real o que aparece nos meios de comunicação”, transformando os media numa referência do quotidiano e as novas tecnologias da informação nos veículos privilegiados de tais “transfigurações”. Citemos Lipovetsky: “Se a ética dos media tem como objectivo declarado criar uma imprensa mais responsável, mais respeitadora dos cidadãos e da verdade, também é, de facto, um vector inédito de sobre-exposição do poder mediático: a voz crítica da moral, nova maneira de reforçar a ideia do império dos media”, a ponto de se transformarem no “epicentro do real social, como instâncias superpoderosas, capazes de fabricar a opinião, de retocar as representações do mundo, de ser actores da história”. A omnipresença mediática constitui uma marca dos tempos, contribuindo este fenómeno para o reforço do seu “poder simbólico” e para a consagração do “quarto poder” (1994: 238-239).

A possibilidade de comunicarmos é um valor do nosso século, um valor que muito provavelmente ocupou o lugar dos valores ilustrados do progresso e da razão, pois o facto do paradigma da comunicação se ter convertido no paradigma da nossa cultura deve-se, é claro, à inovação técnica, mas também a uma série de descobertas teóricas das ciências humanas e sociais. A importância concedida à linguagem na filosofia contemporânea, a tese da própria sociologia do conhecimento de acordo com a qual «a realidade é uma construção social», têm uma relação directa com a suspeita sobre a verdade como anseio das ciências e com a aceitação do relativismo. De facto, “hoje, toda a gente sabe e aceita que não há uma visão do mundo única e privilegiada, que todo o saber é relativo ao ponto de vista do investigador ou do estudioso. As epistemologias não confiam na capacidade do sujeito para alcançar a verdade: falam da nossa realidade intersubjectiva, da inevitabilidade do diálogo. Só existe objectividade intersubjectiva, o consenso é o que existe de mais aproximado à verdade, a validade das teorias científicas repousa, em última análise, nas decisões das comunidades de cientistas e não em referentes empíricos indiscutíveis. A única episteme que existe é a que surge do confronto de doxas” (Camps, 1996: 144).

Admitamos, sem dúvida, que cada dia comunicamos mais e melhor, que vivemos na sociedade da comunicação. Mas só em certo sentido. O individualismo é uma realidade, a competitividade inevitável, o tempo não abre janelas para estreitar os laços afectivos: “a surdez, o ruído, a incompreensão tornam-se insuportáveis nos núcleos urbanos, assistimos impotentes, se não indiferentes, a frequentes expressões de insolidariedade, racismo e intolerância” (ibid.: 145).

Tanto no plano pessoal e afectivo, como no profissional, o interesse por ou pelo outro, primeiro passo para a comunicação, não é generalizado. Os vizinhos de um mesmo edifício nem sequer se conhecem; o historiador e o matemático não se entendem, na suposição de que sintam uma mínima curiosidade mútua; as linguagens do saber revelam-se um obstáculo às aproximações desejadas e anunciadas pela proliferação de formas múltiplas de comunicação. Somos “átomos” de um universo feito de “solidões”.

Assim, a comunicação, paradigma da nossa cultura, é um conceito equívoco, invadido pela(s) ambiguidade(s). Designa a facilidade informativa que nos permite saber muito mais coisas do que antes e sermos também mais conscientes das limitações de cada ponto de vista e das necessidades mútuas. Mas comunicação deveria designar também a existência de uma relação interpessoal assumidamente plena e humanizada, a realidade de uma convivência mais conseguida. Se o primeiro sentido é, efectivamente, uma constante do nosso tempo, e uma constante positiva, o segundo é só uma ideia ou um desejo com muitas barreiras e obstáculos, pese embora todo o apoio e sustento tecnológico. A comunicação e a compreensão entre os seres humanos não melhorou pelo facto das comunicações serem mais fáceis e rápidas. Pelo contrário, os protagonistas das sociedades da comunicação mostram-se incapazes de comunicar no segundo sentido. As intolerâncias não param. Cresce a desconfiança mútua. Aumentam os suicídios de adolescentes. As “distâncias” de todo o tipo estão “instaladas”.

Devemos perguntar-nos se não é precisamente o tipo de comunicação fornecido pela inovação técnica, a Internet e o audiovisual de uma forma geral, o que prejudica a outra comunicação, essa comunicação humana que a linguagem teria de tornar possível. Todos, de facto, estamos unidos pela linguagem, mas é também um facto que a «cultura da comunicação» não ajuda nem à escrita nem à leitura, não ajuda à linguagem: é uma cultura da imagem. O que tem valor é ver, ou fazer-se ver, não escutar. Para ver não é necessária a presença material do outro que é, em troca, imprescindível para falar. Tudo isso tem as suas repercussões no funcionamento da vida em comum.

Mas, o que é comunicar? Falar por telefone? Trocar faxes? Navegar em espaços virtuais?

«Comunicar» tem um parentesco comum com «comunhão» e «comunidade». A comunicação implica reciprocidade. Na informação, pelo contrário, o emissor é o actor principal. Os meios de comunicação fazem fracassar, em vez de promover, aquilo que, de acordo com Habermas, nos constitui como seres humanos: a acção comunicativa.

Informar é dar conta dos factos, do que aconteceu, é dar vez e voz ao quotidiano do espaço humano, é fazer falar os “silêncios”. Se é certo que a informação dos meios de comunicação sensibiliza e cria atitudes e opiniões, transformar o particular em interesse geral é apenas tratar de sensibilizar toda a sociedade em relação a determinados temas e situações que, ainda que, de facto, não nos afectem, deveriam afectar-nos e mobilizar-nos. A boa informação deveria formar as pessoas, deveria ter um fim educativo consciente e fomentar uma apreensão crítica dos acontecimentos, já que toda a informação, em qualquer dos casos, tenha ou não essa intenção, influi nos seus receptores. A informação nunca é apenas informação. Aqui, reside a responsabilidade dos mass media. Um jornalista não se reduz a ser um mero informador de factos, é, também, um formador. A informação tem que reservar, para si, um espaço educativo, já que o dado puramente objectivo ocupa um território de reduzida dimensão. Poder-se-á, assim, afirmar que não há informação neutra? Por detrás dos textos há cidadãos que falam de lugares sociais próprios.

Acima, referimo-nos a dois significados diferentes de «comunicação»: a que é realizada pelos meios de comunicação e a comunicação interpessoal. A primeira poderia ser um veículo, um meio para a segunda, se propiciasse efectivamente a comunicação entre os povos, entre os grupos, entre os poderosos e os mais «incomunicados». Também os meios de comunicação poderiam ter realmente uma função «educativa» na sociedade, para contrariar o consumismo e a mercantilização de tudo, dando a conhecer, dando publicidade (boa publicidade, não simples espectáculo) àquilo que ninguém sabe nem quer saber, aos aspectos mais vergonhosos do nosso mundo. Deveriam ser esses critérios a avaliar a informação boa e justa, que é condição para que se estabeleça uma comunicação real, uma comunicação “cerebrada” e contextualizada na agenda existencial do quotidiano da humanidade.

 

Um remate

A nossa civilização edificou-se sobre as facilidades da comunicação, onde as fronteiras se esconderam ou se limitaram a um texto simbólico, onde o saber circula e se disponibiliza de forma quase total, onde a notícia surge instantaneamente, onde o tempo desaparece. Tudo pode ser visto em directo. Este cenário faria pressupor um universo “partilhado”, promotor de intersubjectividades e de companheiros.

Mas temos saudade da vida em comum que já não existe. O individualismo, marca do nosso tempo, criou outras fronteiras, legítimas, mas produtoras de distâncias e de outros muros.

A mediatização tecnológica da comunicação aí está a assumir, no nosso ponto de vista, a sua cumplicidade, nesta matéria. Reconheça-se, porém, o papel da técnica na quebra de solidões e de incomunicações: os idosos, os doentes, as situações de risco, etc.

 

O telefone móvel ou fixo e os meios informáticos postos ao dispor de situações como estas poderão despertar solidariedades e transformar as ausências em presenças. Do seu nicho, cada um pode, através do meio técnico ao seu alcance, fazer soar o alarme da comunicação. Estamos perante o que poderíamos designar de “técnica com rosto”. Esta assume-se como o porta-voz da inquietação e do(s) silêncio(s).

Mas, a comunicação directa escasseia. Os meios de comunicação, por estranho que pareça, não nos fazem comunicar, verdadeiramente, contribuindo antes para nos isolar no nosso próprio mundo.

Com Victoria Camps, diremos que “a sociedade da comunicação não é mais solidária nem mais afectiva. Não soube pôr os meios e o progresso técnico ao serviço da democracia e do entendimento mútuo. Muito menos ao serviço do ser humano. A técnica vale por si própria e só se submete ao poder económico” (1996: 21).

Alcino Cartaxo

BIBLIOGRAFIA:
● Camps, Victoria (1996), Paradoxos do Individualismo, Lisboa, Relógio d’Água.

● Fontcuberta, Mar de (1999), A Notícia: pistas para compreender o mundo, Lisboa, Notícias Ed.

● Lipovetsky, Gilles (1994), El crepúsculo del deber. A ética indolor de los nuevos tiempos democráticos, Barcelona, Ed. Anagrama.

● Wolton, Dominique (1997), Penser la Communication, Paris, Flammarion.


Escola Sec. José Estêvão

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Aveiro - Junho 2001