Acesso à hierarquia superior.

André Ala dos Reis, Vida. Poemas, Coimbra, Coimbra Editora Ldª, 1963, pp. 38 e 39.

VIAGEM

 

Lembras-te do castelo em que há sinais estranhos?
lembras-te do passeio que eu nunca fiz por lá?
do parque à beira-rio, dos píncaros tamanhos,
daqueles muros verdes dum templo que não há?

Lembras-te do comboio em que tu nunca andaste,
e dos prados sem fim, que eu nunca visitei?
Lembras-te do rio grande por onde navegaste
e da pequena barca em que lá naufraguei?

E lembras-te de mim, do meu casaco novo,
dos óculos escuros e da mala amarela?
Do teu falar fidalgo, do meu palrar de povo,
e do vermelho e verde metido na lapela?


E lembras-te da Lua?
E lembras-te do Mar?

Ai! não te lembras, não,
que, para amar,
não se pode ter alma como a tua:
é preciso ter vela e saber-se vogar.

 

 

página anterior início página seguinte